O Direito a Isonomia dos Proventos de Pensão por Morte e a Emenda Constitucional Nº 70/12

A Emenda Constitucional n.º 70/12 modificou a base de cálculo dos proventos de aposentadoria por invalidez e estendeu a isonomia entre proventos e remuneração a todos os aposentados por ela contemplados

Fonte: Bruno Sá Freire Martins

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1 - Introdução:

A Emenda Constitucional n.º 70/12 modificou a base de cálculo dos proventos de aposentadoria por invalidez e estendeu a isonomia entre proventos e remuneração a todos os aposentados por ela contemplados.

O mesmo texto reformador permitiu que os proventos de pensão, nos casos de óbito do aposentado por invalidez, fossem reajustados com fundamento na isonomia, tendo se interpretado, inicialmente, que somente os pensionistas daqueles que se inativaram por incapacidade após 31 de dezembro de 2003 estariam contemplados, desde que seu ingresso no serviço público tivesse ocorrido até a referida data.

Contudo tal posicionamento não ecoa o real sentido do texto reformador, conforme será demonstrado aqui.

2 – Isonomia Salarial:

A isonomia figurou como regra geral do reajuste dos proventos até o ano de 2003, quando foi substituída pelo princípio da preservação do valor real.

Hoje sua aplicação resume-se aos casos de direito adquirido e às regras de transição, pressupondo, nesse caso, previsão expressa no texto constitucional transitório.

Sua intenção desde o texto original da Carta Magna era a de garantir a paridade remuneratória entre ativos e inativos.

Daí afirmar-se que o chamado princípio da isonomia, também conhecido como princípio da paridade, consiste na igualdade entre ativos e inativos perante a legislação instituidora de remuneração para os primeiros, garantida aos que já deixaram o serviço público a extensão das vantagens concedidas àqueles que continuam em atividade. [1]

Hoje, a isonomia encontra-se regulada no artigo 7º da Emenda Constitucional n.º 41/03 que assim estabelece:

Art. 7º Observado o disposto no art. 37, XI, da Constituição Federal, os proventos de aposentadoria dos servidores públicos titulares de cargo efetivo e as pensões dos seus dependentes pagos pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, em fruição na data de publicação desta Emenda, bem como os proventos de aposentadoria dos servidores e as pensões dos dependentes abrangidos pelo art. 3º desta Emenda, serão revistos na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, sendo também estendidos aos aposentados e pensionistas quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão, na forma da lei.

Como se vê da redação constitucional, a isonomia possui grande abrangência à medida que permite que não só os aumentos de tabela sejam estendidos aos inativos, mas também aqueles decorrentes de modificações funcionais (transformação e reclassificação).

Além de inserir a possibilidade de extensão aos aposentados e pensionistas dos benefícios e vantagens concedidos genericamente aos ativos, sob a natureza de verbas remuneratórias.

A paridade é instrumento jurídico que estendia aos aposentados e pensionistas uma dupla garantia: revisão dos proventos sempre na mesma proporção e na mesma data em que se modificava a remuneração dos ativos e, ainda, extensão de quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidas aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes de transformação ou reclassificação de cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de base para a concessão de pensão. [

E nessa condição figura nas regras de transição contidas nos artigos 6º e 3º das Emendas Constitucionais n.ºs 41/03 e 47/05, respectivamente, e, agora na Emenda Constitucional n.º 70/12.

3 – A Emenda Constitucional n.º 70/12:

O texto reformador editado em 2012, afirmou categoricamente: 

Art. 1º A Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 6º-A:

"Art. 6º-A. O servidor da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que tenha ingressado no serviço público até a data de publicação desta Emenda Constitucional e que tenha se aposentado ou venha a se aposentar por invalidez permanente, com fundamento no inciso I do § 1º do art. 40 da Constituição Federal, tem direito a proventos de aposentadoria calculados com base na remuneração do cargo efetivo em que se der a aposentadoria, na forma da lei, não sendo aplicáveis as disposições constantes dos §§ 3º, 8º e 17 do art. 40 da Constituição Federal.

Parágrafo único. Aplica-se ao valor dos proventos de aposentadorias concedidas com base no caput o disposto no art. 7º desta Emenda Constitucional, observando-se igual critério de revisão às pensões derivadas dos proventos desses servidores."

Art. 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, assim como as respectivas autarquias e fundações, procederão, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias da entrada em vigor desta Emenda Constitucional, à revisão das aposentadorias, e das pensões delas decorrentes, concedidas a partir de 1º de janeiro de 2004, com base na redação dada ao § 1º do art. 40 da Constituição Federal pela Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, com efeitos financeiros a partir da data de promulgação desta Emenda Constitucional.

Em verdade, promoveu-se a inserção de um novo artigo na Emenda Constitucional n.º 41, vigente desde 2004.

E o novo texto, especificamente o parágrafo único do artigo 6º-A, afirma de forma clara que se aplica a regra de isonomia, prevista no artigo 7º da mesma Emenda, às revisões das pensões concedidas em razão de óbitos de servidores aposentados por invalidez, independentemente do momento em que ocorreu a inativação.

Isso porque, o caput do artigo 6º-A tratou das aposentadorias por invalidez indistintamente.

Num primeiro momento a conclusão poderia, como o foi, ser no sentido de que as regras contidas na Emenda n.º 70 alcançam apenas aqueles aposentados por invalidez que ingressaram no serviço antes da Emenda Constitucional n.º 41, mas se aposentaram após o advento da reforma de 2003 e, por conseguinte, tiveram seus proventos calculados com base na média contributiva.

Motivo pelo qual o reajuste dos proventos de pensão, nos casos em que o óbito do aposentado ocorreu após a edição da Emenda Constitucional n.º 41/03, mas a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez foi antecessora à modificação constitucional de 2003, deve tomar por base o princípio da preservação do valor real dos benefícios.

Posicionamento adotado pelo Ministério da Previdência Social:

a) a Emenda Constitucional nº 70/2012 modificou a base de cálculo e de reajustamento dos proventos das aposentadorias por invalidez concedidos ou a conceder aos servidores que ingressaram no cargo até 31/12/2003, e que se incapacitaram depois dessa data.

b) os proventos de invalidez desse grupo de servidores, quando integrais, corresponderão a 100% do valor da remuneração do cargo na data da concessão da aposentadoria e, se proporcionais, terão o percentual correspondente ao tempo de contribuição aplicado sobre essa remuneração;

c) foi alterada também a forma de reajuste desses benefícios e das pensões delas decorrentes, significando que, na revisão dos proventos, será aplicada a paridade dos benefícios com a remuneração do servidor no cargo correspondente, regra que substituirá o reajustamento anual até então empregado; [3]  
E consolidado por intermédio da Orientação Normativa n.º 01/12:

Art. 7º Não devem ser revistas as aposentadorias por invalidez concedidas antes de 01/01/2004 e as pensões delas decorrentes, visto que já foram calculadas, integral ou proporcionalmente, com base na remuneração do servidor no cargo e são reajustadas de acordo com as variações ocorridas nessa remuneração, com fundamento na Emenda Constitucional nº 20, de 1998. 

No que é acompanhado por parte da doutrina, conforme leciona o professor Marcelo Barroso Lima Brito de Campos in REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL DOS SERVIDORES PÚBLICOS, editora Juruá, 4ª edição, página 232:

Fica claro que não devem ser revistas as aposentadorias por invalidez concedidas antes de 01.01.2004 e as pensões dela decorrentes, visto que já foram calculadas, integral ou proporcionalmente, com base na remuneração do servidor no cargo e são reajustadas de acordo com as variações ocorridas nessa remuneração, com fundamento na EC 20/98 (art. 7º, ON/MPS/SPS 1/2012).

Contudo essa interpretação essa que não pode ser transposta aos benefícios de pensão de forma tão simplória.

Já que após a Emenda Constitucional n.º 41/03 diversas pensões foram concedidas em razão de óbitos de aposentados por invalidez, cuja inativação se deu antes da vigência da Emenda Constitucional supramencionada, mas o passamento ocorreu após 01 de Janeiro de 2004 ou como defendem alguns, após o advento da Medida Provisória n.º 167/04.

Não se podendo aceitar, com todo o respeito aos entendimentos em sentido contrário, que esse foi o intento da reforma constitucional promovida em 2012.

Pois o caput do artigo 6º - A da referida Emenda, foi claro ao afirmar que a nova metodologia de cálculo aplica-se à aqueles que ingressaram no serviço público antes de 31/12/2003, sem delimitar seu alcance apenas aos que tiveram seu benefício por incapacidade calculado com fundamento na Lei n.º 10.887/04 (norma federal que instituiu a metodologia de cálculo da média contributiva).

E o parágrafo único do mesmo artigo estabelece que as pensões decorrentes do óbito do aposentado, na situação prevista no caput, observarão o princípio da isonomia, sem qualquer distinção entre o fato de a aposentadoria do de cujus ter ocorrido antes ou depois do advento da Emenda Constitucional n.º 70/12.

Ou seja, em nenhum momento a redação reformista limita a aplicação do princípio da isonomia apenas aos pensionistas cujo benefício decorra de óbito do servidor que ingressou no serviço público antes de 31 de Dezembro de 2003 e se aposentou por invalidez sob a égide da Emenda Constitucional n.º 41/03 em sua redação original.

Nem mesmo a ementa da Emenda Constitucional n.º 70/12 restringe a aplicação da norma a apenas essa hipótese.

Nesse sentido, há de se reconhecer a inexistência de diferenças entre os pensionistas cujo óbito do aposentado tenha ocorrido antes ou depois da Emenda de 2003 e, por conseguinte, tiveram seus proventos calculados com base na última remuneração do cargo efetivo ou na média contributiva, respectivamente, para efeitos de definição da regra de reajuste dos proventos.

Uma vez que o fato ensejador do direito à paridade é o mesmo, qual seja, o ingresso no serviço público do inativado por invalidez antes de 31 de Dezembro de 2003.

4 – Aplicação das Normas Constitucionais:

Principal porque, a interpretação restritiva e baseada apenas e tão somente na “dita” vontade da norma, caracteriza, salvo melhor juízo, ofensa ao princípio da igualdade à medida que oferta tratamento desigual a pessoas que se encontram na mesma condição.

O qual se constitui em princípio jurídico fundamental que na visão de Canotilho citado por Raul Miguel Freitas de Oliveira in PREVIDÊNCIA DOS SERVIDORES PÚBLICOS, Editora Jhmizuno, página 109:

São princípio fundamentais historicamente objetivados e progressivamente introduzidos na cultura jurídica. São também valorações fundamentais, inseridas, expressa ou implicitamente, na Constituição. Podem possuir uma dimensão negativa e/ou positiva e fornecem sempre directivas materiais de interpretação das normas constitucionais. São eles que vinculam o legislador no momento da feitura da lei.

Além do que as regras constitucionais, mesmo as contidas nos textos reformistas, devem observar os princípios alusivos à interpretação e aplicação das normas contidas no Texto Maior.

Dentre os quais figuram o da máxima efetividade ou da eficiência segundo o qual a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe conceda e o da força normativa da constituição que apregoa que entre as interpretações possíveis, deve ser adotada aquela que garanta maior eficácia, aplicabilidade e permanência das normas constitucionais. [4]

A força normativa da Constituição determina que na solução dos problemas jurídico-constitucionais, deve-se dar prevalência aos argumentos que, levando em conta os pressupostos normativos da Constituição, contribuam ou conduzam a uma eficácia máxima. Necessariamente, isso implica uma primazia de soluções interpretativas que levem em conta a historicidade da estrutura constitucional e possibilitem sua “atualização” normativa, ao mesmo tempo que garanta eficácia e permanência às suas normas. [5] 

E essa eficácia somente pode ser alcançada, no caso em questão, reconhecendo-se a igualdade de direitos entre os pensionistas cujo benefício decorra de óbito de segurado aposentado por invalidez cujo ingresso tenha se dado antes de 31 de Dezembro de 2003, independente da data da inativação e da metodologia de cálculo de seus proventos.

Uma vez que o texto reformador não impõe a obrigatoriedade de os mesmos terem sido calculados pela média, restando, tal conclusão apenas no âmbito interpretativo, o que a torna afrontosa ao princípio da igualdade constitucional, inserido no artigo 5º da Carta Magna, bem como aos alusivos à interpretação das normas constitucionais, conforme já salientado.

5 – Conclusão:

Daí concluir-se ser possível a aplicação do disposto no parágrafo único do artigo 6º - A da Emenda Constitucional n.º 41/03 aos pensionistas quando o falecido tenha se aposentado por invalidez, independentemente da data de sua inativação.

Notas:

1 - MARTINS, Bruno Sá Freire. DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO DO SERVIDOR PÚBLICO. 2ª edição, editora LTr, página 50.

2 - FILHO, Inácio Magalhães. LIÇÕES DE DIREITO PREVIDENCIÁRIO E ADMINISTRATIVO NO SERVIÇO PÚBLICO. 2ª edição, editora Fórum, página 223.

3 - Nota Técnica nº 02/2012/CGNAL/DRPSP/SPPS/MPS.

4 - MORAES, Alexandre de. DIREITO CONSTITUCIONAL. 27ª edição, editora Atlas, página 16.

5 - FERNANDES, Bernardo Gonçalves. CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL, 2ª edição, editora Lumen Juris, página 158.


Bruno Sá Freire Martins

Bruno Sá Freire Martins

Bruno Sá Freire Martins, servidor público efetivo do Instituto de Previdência do Estado de Mato Grosso - MTPREV; advogado; consultor jurídico da ANEPREM, da APEPREV, da APPEAL e da ANORPREV; pós-graduado em Direito Público e em Direito Previdenciário; professor de pós-graduação; Coordenador do MBA em Regime Próprio do ICDS - Instituto Connect de Direito Social; membro do Conselho Editorial da Revista de Direito Prática Previdenciária da Paixão Editores; escreve todas as terças-feiras para a Coluna Previdência do Servidor no Jornal Jurid Digital (ISSN 1980-4288 - www.jornaljurid.com.br/colunas/previdencia-do-servidor) e para o site fococidade.com.br, autor dos livros DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO DO SERVIDOR PÚBLICO, A PENSÃO POR MORTE, REGIME PRÓPRIO – IMPACTOS DA MP n.º 664/14 ASPECTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS e MANUAL PRÁTICO DAS APOSENTADORIAS DO SERVIDOR PÚBLICO, todos da editora LTr, do livro A NOVA PREVIDÊNCIA DOS SERVIDORES PÚBLICOS (editora Alteridade) e de diversos artigos nas áreas de Direito Previdenciário e Direito Administrativo.


Palavras-chave: Direito Isonomia Pensão por morte Emenda constitucional

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