Tudo está bem quando acaba bem. A teia da vida e do Direito

A peça é, presumivelmente, uma comédia. Embora, alguns estudiosos a reconheçam como tragédia. Envolve pactos, promessas, contratos e condição puramente potestativa. Entre nulidade e execução contratual, entendemos a importante função social dos contratos.

Fonte: Gisele Leite

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No original o título é “All’s well that ends well”, trata-se de uma comédia, ou ainda, “Tudo fica bem quando acaba bem”. Porém, o título da peça indica que nem tudo vai bem, as coisas apenas terminam bem, mas existem turbulências que permeiam toda a peça teatral.

Os especialistas chamam de a “peça-problema” e, logo o início da obra é bem marcante, pois começa em Rousillon, na França, onde choram a morte do conde. Estão todos desolados, especialmente, a condessa e seu filho Bertrand, a primeira, naturalmente por ter ficado viúva e, o outro por ter ficado órfão. A tristeza é ainda maior porque o jovem tem que deixar a mãe, para ir a corte, em Paris, de quem é pupilo e eterno vassalo do Rei da França.

Descobre-se que o Rei sofre de uma úlcera incurável no estômago. É introduzida Helena que é a protegida da condessa, pois é filha do falecido médico da família do conde. Segundo a condessa, Helena herda as disposições que embelezam as melhores qualidades, afinal, de nada adiantam boas qualidades quando dirigidas por um espírito grosseiro, logo se convertem em qualidades traidoras. (Ato 1, Cena 1).

Logo, o bardo expõe o amor da virtuosa Helena pelo jovem e nobre Bertrand, não obstante, haver o distanciamento social entre os dois. Na época de Shakespeare, o médico não goza de bom status social, era visto como mero comerciante de porções e ervas. Portanto, Helena goza de crassa inferioridade[1], com relação à condessa, era uma plebeia. E, por essa pesarosa razão, Helena esconde seu amor por Bertrand, jamais seria a eleita pelo jovem conde.  Sua mãe, a condessa, persuade Helena a compartilhar o que ela sente sobre Bertram, e eles apresentam um plano para Helena viajar para Paris para curar o rei, não importa o custo.

Ao chegar em Paris, Helena oferece seus serviços ao rei, alegando que pode curá-lo usando uma droga especial que seu pai, um médico famoso, desenvolveu.

Em troca, ela pede que ela tenha algum marido de sua escolha da corte do rei. Ele concorda, e Helena o cura. Evidentemente, ela escolhe Bertram. O rei também lhe agradece dando-lhe um anel.

Helena recorda-se que seu falecido pai tinha um remédio pronto para curar tal moléstia do rei, sendo um remédio infalível. Assim, Helena segue também para Paris com o fito de salvar o rei francês e, ainda, conquistar o coração de Bertrand.

Uma vez na corte em Paris, Helena tenta convencer o rei de que pode reverter o mal que lhe aflige. O rei, por sua vez, é reticente e, apesar de conhecer a fama do pai falecido de Helena como médico e curandeiro. Helena propõe ao rei que experimente o seu remédio.

Helena acaba por oferecer a própria vida como garantia de eficácia do tratamento ofertado. Assim, ela se oferece pela cura do rei, dando uma valorosa garantia. E, Helena, a seu turno, pergunta qual seria a contraprestação. E, propõe, caso o rei fosse curado, que ela poderia escolher um de seus vassalos nobres solteiros como marido. E, assim, o rei consente, eis que se pactuou verbalmente um contrato.

Para que o contrato verbal seja considerado válido, a lei brasileira, exige no artigo 104 do Código Civil a necessidade de quatro simultâneos requisitos, a saber: agente capaz, objeto lícito, possível determinado ou determinável, forma prevista ou não defesa em lei.

Convém recordar que segundo o artigo 107 do Código Civil brasileiro, in verbis: “A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir” e já nesse artigo verificamos que o negócio/contrato verbal é sim válido, salvo nas hipóteses em que a lei exige sua formalidade.

Decorre a importância do princípio do consensualismo, apresentado como um esteio para o que os contratantes busquem na relação jurídica decorrente do contrato, segurança jurídica e cumprimento dessa obrigação.

No direito romano, conforme José Carlos Moreira Alves (2018), o efeito do contrato estava relacionado ao interesse pecuniário, fazendo nascer a obrigação e somente os acordos que se destinavam a criar relações jurídicas obrigacionais eram considerados contratos. Se uma das partes tinha interesse em fazer um negócio, deveria prolatar palavras solenes diante da outra parte para criar uma obrigação.

O rei, finalmente, fica curado de sua insistente úlcera pelo remédio ministrado por Helena. E, para cumprir o contrato, o Rei convoca os senhores da corte, para que Helena faça a sua escolha, apontando seu futuro marido.

Naturalmente, Helena escolhe Bertrand, mas este contudo, revela seu desagrado com a possível união devido Helena pertencer a classe inferior. Bertrand não quer casar-se com a plebeia[2] e, questiona se precisa satisfazer o rei com seu rebaixamento. O rei insiste e explica que, seu desdém por falta de títulos não se justifica, pois, estes, podem ser concedidos. Igualmente como títulos, dinheiro é algo que se ganha.

E o rei, pondera: “Se fossem misturados os nossos diversos sangues, seria impossível distingui-los pela cor, pelo peso, pelo andor, de que depende, pois essas diferenças que o separa? (...) É pela qualidade que devemos classificar, não pelo título”.

Trata-se de pertinente manifestação contra qualquer forma de preconceito, uma autêntica ode à igualdade entre os seres humanos. Todavia, Bertrand não se comove. De fato, não se pode ajustar o amor por contrato. Amar é sentir, não querer. O Direito tem seus limites. (Ato III, Cena 3).

O rei, novamente, insiste, pois, quer cumprir a obrigação assumida contratualmente, sob pena de severas represálias. Bertrand, enfim, aceita tomar a mão de Helena.

O rei demonstra saber que o casamento tem natureza de contrato. Nesse particular, a relação, inicialmente, do cumprimento do dever ao rei, estabelecido no acordo feito com Helena. Bertrand casa-se em respeito ao seu dever de vassalagem. Novamente, o rei confirma que o casamento é negócio[3] formal, cuja eficácia requer solenidade.

Eis porque convoca a cerimônia. Bertrand, porém, não tem intenção de cumprir plenamente a obrigação, pois não pretende compartilhar o leito com Helena, e confessa reservadamente ao seu criado e conselheiro paroles que é um patife perfeito e uma péssima influência, tanto que retruca: “Jovem casado é homem perdido”.

Bertrand, logo depois da celebração matrimonial vai para a guerra na Itália, escanado assim de consumar o casamento. Não se deita com Helena. A rigo, pede que a esposa volte a Rousillon, junto da condessa. Bertrand entrega uma carta à Helena onde expõe duas condições para que esta possa chamá-lo de marido[4].

In litteris:

“Quando tiveres conseguido o anel que uso no dedo, do qual nunca sairá, e quando me mostrares um filho nascido de tuas entranhas, cujo pai seja eu”. (Ato III, Cena 2).

Bertrand aponta duas condições[5] para negócio que é o casamento se concretize plenamente. A sua eficácia, ou seja, a idoneidade para produzir a idoneidade para produzir efeitos jurídicos resta subordinada às condições.

No Brasil, embora apenas três tipos de casamento sejam mais utilizados e comuns, há cinco regimes de bens distintos previstos pelo Código Civil, a saber: comunhão parcial de bens[6]; comunhão universal de Bens; participação final nos aquestos; separação de Bens; e, separação obrigatória de bens.

Uma vez reconhecido como a união entre duas pessoas, sendo que sua formalização deve ser feita por meio do Cartório de Registro Civil.

O processo do casamento se inicia a apresentação de documentos que comprovem que ambos não são casados ou tenham impedimentos[7] e assim, possam constituir família. Posteriormente, é feita a publicação do casamento por meio de edital em jornal do referido município onde o casal reside.

A oficialização da união, neste caso, será realizada por um juiz de paz[8] sendo necessária a presença de testemunhas. A partir deste momento, é formalizado com a emissão da certidão de casamento.

Sobre as dúvidas da validade do casamento religioso é importante ressaltar que é feito de acordo com a crença religiosa de cada um, no entanto, somente será reconhecido legalmente, se os noivos fizerem o registro em Cartório.

Esta modalidade é conhecida como casamento religioso com efeito civil quando é feita a celebração e o casal apresenta, no prazo de 90 (noventa) dias, o termo de casamento emitido pela autoridade religiosa. No entanto, o casal também é submetido à habilitação que é a análise documental.

A modalidade de celebração de casamento denominada nuncupativo, representa a hipótese em que um dos contraentes está em iminente risco de morte, não havendo tempo para a celebração do matrimônio dentro das conformidades e formalidades previstas pelo Código Civil.

Em outras palavras, para que seja conferida validade ao casamento nuncupativo, faz-se necessário que: a) A celebração ocorra na presença de 6 (seis) testemunhas, as quais não podem ter relação de parentesco em linha reta ou colateral (até o segundo grau) com os nubentes; b) As testemunhas tenham sido convocadas pelo enfermo; c) O enfermo aparentava estar em risco de morte, mas sem afetação do juízo; d) A declaração dos nubentes, por livre e espontânea vontade, de receberem-se como marido e mulher; e, e) A instauração, dentro do prazo de 10 (dez) dias, do procedimento judicial para confirmação e validação do casamento.

Voltem ao enredo da peça teatral em comento. As duas condições impostas unilateralmente por Bertrand, o jovem conde, são absolutamente nulas na medida em que sua verificação depende tão-somente de uma das partes.

É a chamada condição puramente potestativa[9] posto que subordine a eficácia do negócio jurídico ao total arbítrio de uma das partes, o que não se admite em Direito. Com efeito, basta que Bertrand se nega a entregar o anel e se abstenha de ter relações sexuais com Helena para concretizar a impossibilidade de verificação das condições impostas.[10]

Helena, com a notícia foge de casa e, alardeia que sairá em peregrinação a Santiago. E, envia a condessa, a falsa informação que havia morrido. Em verdade, Helena vai até a Itália, atrás de Bertrand. Na guerra, Bertrand teve destacado papel e, descobre Helena que ele tem assumido um comportamento vulgar e libertino.

E, fica ciente que Bertrand tenta seduzir uma jovem viúva Diana. Helena conta para Diana que Bertrand é seu marido, oficialmente, mas que, no entanto, se negou a honra o casamento com ela.

Para recuperar o bom nome e fama do conde de Rousillon, Helena trama um plano com Diana, pede que finja concordar com a proposta de Bertand, mas, na hora de ir para cama, Diana troca de lugar com Helena.

Helena pede, ainda, que Diane solicite o anel de Bertrand prometendo-lhe devolver quando os dois se encontrarem novamente. Diana, em verdade, deve trocar o anel entregando a Bertrand, outro anel que lhe fora dado pelo Rei de França à Helena, como uma forma de extraordinária gratidão pela cura de suas dores estomacais.

Diana, a viúve e a mãe não aceitam participar desse auspicioso plano por mera generosidade e, fazem um acordo financeiro com Helena. Repare que também Helena não curou o Rei por generosidade humanitária. E, assim, Helena entrega uma bolsa de ouro para comprar a mediação da amizade de Diana.

Admite, Helena, ao final, acrescentar três mil coroas ao dote da jovem viúva, o que certamente, lhe facilitará conseguir novo matrimônio. O plano é executado com perfeição e o encontro com Diana e Bertrand é um oceano de promessas falsas[11].

Ao final, ao deixar o leito para que Helena ocupe o seu lugar, Diana reflete: “Não considero, entretanto, o estratagema um pecado, pois é justo enganar um desleal”.  Julgando Bertrand por sua conduta com sua esposa Helena.

Juridicamente, ninguém está autorizado a ser desleal, ainda que a outra parte atue de forma incorreta ou errônea e, mesmo desonesta. Nos contratos, a parte pode deixar de cumprir sua prestação, se a contraparte deixa igualmente de cumprir a parte que lhe toca. É a conhecida exceção do contrato não cumprido[12].

Entretanto, o Direito jamais tolera a deslealdade[13] ainda que feita por quem antes fora vitimado pela vil conduta. Helena, enfim, apodera-se do anel de conde de Bertrand e, ainda, consegue deitar-se com ele. Eis que cumpre as duas condições suspensivas[14] impostas sobre a eficácia do casamento.

Bertrand fica com o outro anel dado por Diana, sem saber que este fora um presente do Rei de França a Helena. A rigor, Bertrand acreditava que Helena havia morrido, na dita peregrinação e, lamenta o que perdeu. Aliás, o sofrimento consiste exatamente em sentir a falta daquilo que não se tem, vale lembrar a lição budista.

As Quatro Nobres Verdades são a essência central do budismo, em torno da qual todos os demais ensinamentos budistas se baseiam. Segundo Shariputra, um dos principais discípulos do Buda, as Quatro Nobres Verdades englobam todos os dharmas[15].

A primeira Nobre Verdade refere-se a um sofrimento, conhecido em Pali como dukkha, caracterizado por uma dor multifacetada que se expressa tanto como tristeza, insatisfação, aflição, desilusão como desespero, podendo inclusivamente assumir formas sutis como o tédio ou uma sensação generalizada de que nada corresponde às expectativas.

Esta é a nobre verdade do sofrimento: nascimento é sofrimento, envelhecimento é sofrimento, enfermidade é sofrimento, morte é sofrimento; tristeza, lamentação, dor, angústia e desespero são sofrimento; a união com aquilo que é desprazeroso é sofrimento; a separação daquilo que é prazeroso é sofrimento; não obter o que se deseja é sofrimento; em resumo, os cinco agregados influenciados pelo apego são sofrimento."

Terminada a guerra, Bertrand volta à corte do Rei da França, mostrando-se mais amadurecido e sensato. Nesse momento, mais uma candidata se apresenta, contando novamente com a aprovação do rei. Nessa ocasião, Bertrand mostra-se logo obediente e oferece como presente de noivado[16] justamente o anel que foi dado por Diana, o que antes fora de Helena.

Assim que o vê, o rei reconhece o anel e, pergunta a Bertrand como ele conseguiu o anel, que não sabe explicar ao certo. Logo, se instaura uma confusão indigesta.

Nesse crucial momento, chega às mãos do rei uma carta assinada por Diana de Capuleto (provavelmente, parente de Julieta de Capuleto). Na missiva informa que o conde Rousillon a seduziu e prometera casamento, assim que ficasse viúvo. Menciona, ademais, que Bertrand saiu da Itália, sem sequer dizer adeus. E, requer, ao Rei que faça justiça, determinando que Bertrand o cumprimento fiel do prometido, casando-se com ela.

A promessa de matrimônio não é, propriamente, nem contrato nem pré-contrato, segundo a doutrina, pois dela não decorrem nem efeitos pessoais nem patrimoniais no Direito de Família. Deve-se afirmar, portanto, que não cabe cogitar em parentesco por afinidade, em dever de fidelidade, coabitação e mútua assistência.

Nesse tema, especificamente, com relação ao rompimento da promessa de casamento, importante o ensinamento de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, in litteris:

    “Romper qualquer relação de afeto é, sem dúvida, doloroso. Isso vai desde um simples namoro ao mais longo dos casamentos. Todavia, o que não se pode deixar de reconhecer é que se trata de exercício permitido de um direito, não se caracterizando, por isso, como um ato ilícito capaz de gerar responsabilidade civil. Isso não quer dizer, porém, que as partes possam fazer isso de maneira agressiva ou atentatória à dignidade do outro (2012)”.

Sérgio Cavalieri Filho ensina que:

    “[...] só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo a normalidade, interfira intensamente ao comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústias e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral”[17] (1996).

Convém ressaltar a polêmica sobre a responsabilidade pré-negocial no casamento, isto é, a quebra de promessa de casamento como gerador do dever de indenizar, incluindo-se os danos materiais. Dever de indenizar nos esponsais está presente, por exemplo, no Código Civil Alemão, em seus §§ 1.297 a 1.032 (Verlöbnis).

O tema divide opiniões. Há os que são favoráveis, cita Tartuce o doutrinador Inácio de Carvalho Neto (2013) que lembra o fato de que o nosso Código, ao contrário dos Códigos alemão, italiano, espanhol, peruano e canônico, não regular sequer os efeitos do descumprimento da promessa.

Para o mesmo doutrinador citado por Tartuce, o que não impede cogitar em obrigação de indenizar com base na regra geral de responsabilidade civil.

Posiciona-se, em sentido contrário, Maria Berenice Dias (2021) que, prega, que em tais casos, são indenizáveis apenas os danos emergentes ou danos positivos, realmente experimentados diretamente por conta da quebra do compromisso, é o caso das despesas relativas à celebração matrimonial. Enfim, para a doutrinador não se pode cogitar em danos morais, ou até lucros cessantes ou danos negativos.

Nem a ruptura de noivado, em si, seria fonte de responsabilidade. Anteriormente, quando o noivado era tratado sob o nomen de esposais, era tratado como promessa de contratar, ou seja, a promessa do casamento, que poderia ensejar indenização.

Quando se dissolve o noivado, com alguma frequência é buscada a indenização não só referente aos gastos feitos com os preparativos do casamento, que se frustrou, mas também aos danos morais. Compete à parte demonstrar as circunstâncias prejudiciais em face das providências porventura tomadas em vista da expectativa do casamento.

Não se indenizam lucros cessantes, mas tão somente, os prejuízos diretamente causados pela quebra do compromisso, a outro título que não o de considerar o casamento como um negócio, uma forma de obter o lucro ou vantagem. Esta é a postura que norteia a jurisprudência" (In: Manual de direito das famílias. 14. ed. São Paulo: RT, 2021).

Na jurisprudência brasileira podem ser encontrados julgados que apontam para a reparabilidade dos danos morais em casos tais. Do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, como primeiro exemplo, merece destaque: "a ruptura do noivado, embora cause sofrimento e angústia ao nubente, por si só, não gera o dever de indenizar, pois, não havendo mais o vínculo afetivo, não faz sentido que o casal dê prosseguimento ao relacionamento. Todavia, se o rompimento do noivado ocorreu de forma extraordinária, em virtude de enganação, por meio de promessas falsas e mentiras desprezíveis, causando dor e humilhação na noiva abandonada, configuram-se os danos morais” (TJ/MG, Apelação Cível n. 1.0701.12.031001-9/001, Rel. Des. Rogério Medeiros, julgado em 16/06/2016, DJEMG 24/06/2016). Ou, do Tribunal de Justiça do Paraná, entre acórdãos mais antigos: "noivado não tem sentido de obrigatoriedade. Pode ser rompido de modo unilateral até momento da celebração do casamento, mas a ruptura imotivada gera responsabilidade civil, inclusive por dano moral, cujo valor tem efeito compensatório e repressivo, por isto deve ser em quantia capaz de representar justa indenização pelo dano sofrido” (TJPR, Acórdão n. 4651, Apelação Cível, comarca Londrina, 3ª vara Cível, Órgão Julgador 5ª Câmara Cível, Rel. Des. Antonio Gomes da Silva, publicação 13/03/2000).

A partir daí, o Rei então passa a suspeitar que o jovem conde possa ter assassinado Helena para ficar com a jovem viúva Diana e, isso explicaria o porquê o conde tem o anel dado pelo Rei.

Diana, a viúva e a mãe são colocadas na frente de Bertrand. Diana pleiteia o cumprimento da promessa, ou seja, o conde deve casar-se com ela, uma vez que ficara viúvo. Para se proteger Bertrand, acusa Diana, e a chama de prostituta que se entregava a todo acampamento. O que era mentira. Diana, então, apresenta o anel original de Bertrand, o mesmo objeto que pertencia há gerações aos condes de Rousillon e do qual o jovem jamais se separava. Este anel lhe força dado por Helena, exatamente para desmascarar Bertrand.

Diante disso, é a própria condessa, a mãe de Rousillon, quem afirma: “O anel é dele. Há seis gerações, esta joia foi transmitida em testamento de pai para filho e sempre usada pela família. O anel serve mil provas de prova”. (Ato V, Cena 3).

No final da confusão, finalmente, Helena reaparece, revelando que não morreu. E, todo o estratagema é esclarecido. Sob os olhares estupefatos de todos. A troca de anéis, a troca de parceiras no leito e, ainda, o cumprimento das condições impostas por Bertrand. O jovem conde se arrepende e, promete amar Helena dedicando-se ternamente. “Mais amargo passado, mais doce o porvir. Sendo o fim doce, que importa que o começo amargo fosse?”

Registra, finalmente, o Rei: Tudo está bem quando termina bem. Observemos que a personagem Helena, mostra-se ser ambígua e enigmática. Pois seria ela um ser humano bom e generoso, como tudo que a própria diz, ou seria uma pessoa maquiavélica que se movo para atingir seus objetivos?

Nas obras de Shakespeare, analisando o vasto espectro humano e, na vida, o cordeiro e o lobo sentam-se à mesma mesa. O lobo se veste de cordeiro e, o cordeiro tem os mesmos propósitos do lobo.

O jovem conde Bertrand é todo é imaturo e no transcorrer da peça teatral, talvez adquira algumas habilidades. O que justifica o interesse de Helena por Bertrand é a lição de Ortega y Gasset: “Com frequência, ouvimos dizer que as mulheres inteligentes se enamoram de homens tolos”. (In: Ortega y Gasset, José. Ensaio sobre o amor. Rio de Janeiro: Livro Ibero-americano, 1960, p. 59).

Resumidamente, a peça em comento enfeixa quatro contratos que são todos pactos com condições suspensivas. Os negócios são responsáveis pela dinâmica da riqueza humana, os contratos estão presentes na sociedade de massa, onde até para prover necessidades básicas tais como comida, luz, água que são obtidas por meio de contratos.

O contrato é a fonte de obrigações por excelência e funcional como ferramenta social. Por isso, é tão importante visualizar a função social do contrato. Tanto a função social como a boa-fé objetiva erigem-se como princípios

fundamentais positivados e valorados pelo Código Civil brasileiro de 2002. E, a concretização de tais principios é norteada pelos direitos fundamentais da Constituição Federal brasileira vigente. Afinal, o contrato visa o bem-comum, isto é, a cooperação. O contrato representa amarras que vinculam pessoas e geram direitos, poderes e deveres.

O Estado tem todo interesse de proteger os vínculos contratuais e, ainda, priorizar a segurança jurídica.

Diana, a jovem viúva, cumpre o contrato, apesar de que este seja imoral, ela reconhece e cria a justificativa ética para sua deslealdade, afinal, se a outra parte é canalha, eu também posso ser.

Helena é personagem que se mostra sempre adimplente, com seus deveres, cura o rei e, ainda, paga Diana. Apenas Bertrand não cumpre suas obrigações, primeiro por não cumprir o dever assumido com o casamento, vai para guerra e, ainda cria unilateralmente duas condições praticamente impossíveis. No segundo caso, no dever assumido com Diana e, tenta desqualificá-la como credora.

Ao celebrar um contrato é mais importante saber com quem se contrata do que propriamente o objeto do negócio. Se sobreviver alguma dúvida no cumprimento obrigacional, o contratante correto e bem-intencionado sempre atuará para solucionar a questão, guiado pela boa-fé objetiva[18].

Tudo está bem quando termina bem, mas terminada a peça, o rei doravante é mendigo.

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Notas:

[1] A desigualdade social é tema recorrente, sendo processo existente dentro das relações da sociedade, presente em todos os países do mundo. Faz parte das relações sociais, pois determina um lugar aos desiguais, seja por questões econômicas, de gênero, de cor, de crença ou de grupo social. Essa forma de desigualdade prejudica e limita o status social das pessoas, além de seu acesso aos direitos básicos, tais como: acesso à educação, à saúde, à propriedade, direito ao trabalho, direito à moradia, e ter boas condições de transportes e locomoção, entre outros.  Por essa razão, a meritocracia é um mito: não há como clamar que uma classe social alcança bons feitos por mérito, frente a outra que sequer consegue acessar as mesmas oportunidades. Um princípio do direito prega em tratar os iguais como iguais e os desiguais como desiguais, com o intuito de reconhecer como a força das vivências, dos locais de origens e da vida social tendem a se manter os mesmos por décadas.

[2] Os plebeus eram povos oriundos de cidades conquistadas pelos romanos. Embora fossem pessoas livre, eles não tinham direitos de cidadãos como os plebeus. Já os clientes, dizem respeito, aos prestadores de serviços. O termo plebeu costuma se referir em geral a indivíduos que não pertencem à nobreza. Historicamente, a nomenclatura é usualmente mais utilizada em referência à República Romana, ao período feudal e à era moderna. Atualmente, o termo pode também casualmente ser usado em relação àqueles sem refinamento social. Diferentemente dos patrícios, que seriam os descendentes dos fundadores lendários de Roma, os plebeus eram os descendentes das populações imigrantes de outras regiões da Península Itálica. Assim sendo, não tinham direitos políticos, e eles não poderiam participar do governo ou mesmo se casar com patrícios. Com o aumento da pressão por parte da classe, porém, eles conseguiriam garantir mais direitos, em um processo político liderado pelos irmãos Graco.

[3] Podemos conceituar o casamento como instituto civil pelo meio do qual, atendida às solenidades legais (habilitação, celebração e registro), estabelece entre duas pessoas a comunhão plena de vida em família, com base na igualdade de direitos e deveres, vinculando os cônjuges mutuamente como consortes e companheiros entre si, responsáveis pelos encargos da família. Em outras palavras, podemos dizer que o casamento, sob a ótica do Direito Civil Brasileiro, consiste na entidade familiar constituída com base no atendimento das solenidades legais. Existe controvérsia quanto a natureza jurídica do casamento. O direito pátrio deixou este mister à cargo da doutrina, qual, por sua vez, se dividiu em três posicionamentos, compreendendo-a, como: a) um contrato; b) instituição; c) ato complexo, de caráter híbrido, misto ou eclético.

[4] Etimologia da palavra, latim, maritus. Aquele que se uniu a uma mulher pelo matrimônio. Já esposo significa, segundo o Dicionário Eletrônico Houaiss, homem casado, em relação à sua mulher, marido e deriva do étimo latino, sponsus, que, por sua vez, significa noivo ou marido. Já o substantivo feminino esposa é a mulher casada, em relação ao seu marido, mulher. Os termos esposo e esposa também podem ser utilizados para se referirem a noivos, no âmbito de uma cerimônia de noivado, embora essa aplicação esteja em desuso em tempos atuais.

[5] Requisitos de condição: Para a configuração da condição será preciso a ocorrência dos seguintes requisitos: a) Aceitação voluntária, por ser declaração acessória da vontade incorporada à outra, que é a principal por se referir ao negócio que a cláusula condicional se adere com o objetivo de modificar uma ou algumas de suas consequências naturais; b) Futuridade do evento, visto que exigirá sempre um evento futuro, do qual o efeito do negócio jurídico dependerá; c) Incerteza do acontecimento, pois a condição relaciona-se com um acontecimento incerto, que poderá ocorrer ou não.

[6] O regime da comunhão parcial de bens é o regime legal, previsto no Código Civil brasileiro nos artigos 1658 ao 1666, que será aplicado se os nubentes silenciarem ou se ocorrer nulidade ou ineficácia no momento da escolha do estatuto. Esse regime é formado pelos bens particulares dos consortes e pelos bens comunicáveis que são aqueles adquiridos na constância do casamento. O regime da comunhão universal de bens está previsto nos artigos 1.617 ao 1.671 do Código Civil. Foi considerado o regime legal até a entrada em vigor da Lei n. 6.515/77(Lei de Divórcio) que estabelece o regime da comunhão parcial de bens como o regime legal.

[7] Impedimentos matrimoniais são condições positivas ou negativas, de fato ou de direito, físicas ou jurídicas, expressamente especificadas pela lei, que, permanente ou temporariamente, proíbem o casamento ou um novo casamento ou um determinado casamento; impedimento matrimonial é a ausência de requisitos para o casamento.

[8] Os Juízes de Paz são juízes leigos competentes para, na forma da lei, celebrar casamentos, verificar processos de habilitação, sem, contudo, ter caráter jurisdicional. A lei enumera as condições para habilitação à eleição para o cargo de juiz de paz: ser brasileiro nato ou naturalizado; estar em pleno exercício dos direitos civis e políticos; estar em dia com as obrigações eleitorais; estar quite com as obrigações militares; ser do sexo masculino; ter domicílio eleitoral no distrito ou subdistrito pelo qual se candidatar pelo prazo de, pelo menos, um ano antes da data da eleição; ter filiação deferida pelo partido um ano antes das eleições; idade mínima de vinte e um anos; comprovar idoneidade moral mediante atestado de autoridade judiciária ou policial e ser alfabetizado. Somente processo administrativo instaurado junto ao juiz de direito permitirá a perda do mandato do juiz de paz.

[9] Há cláusula puramente potestativa quando os efeitos de um contrato ficam ao puro e livre arbítrio de uma das partes.  Quanto ao tema, vale trazer à tona, os ensinamentos do professor Carlos Roberto Gonçalves, a saber: “Potestativas são as que decorrem da vontade de uma das partes, dividindo-se em puramente potestativas e simplesmente potestativas. Somente as primeiras são consideradas ilícitas pelo artigo 122 do Código Civil, que as inclui entre as condições defesas por sujeitarem todo o efeito do ato ‘a puro arbítrio de uma das partes’, sem a influência de qualquer fator externo.”. Quanto às cláusulas dessa natureza, o Superior Tribunal de Justiça proferiu a seguinte orientação: “O conteúdo puramente potestativo do contrato impôs a uma das partes condição, apenas e tão-somente, de mero espectador, em permanente expectativa, enquanto dava ao outro parceiro irrestritos poderes para decidir como bem lhe aprouvesse. Disposições como essa agridem o bom senso e, por isso, não encontram guarida em nosso direito positivo. Entre elas está a chamada cláusula potestativa.  É estipulação sem valor, porque submete a realização do ato ao inteiro arbítrio de uma das partes.” STJ – 3ª Turma, REsp 291.631-SP, Rel. Min. Castro Filho, v.u. j. 4.10.2001, DJU 15.4.2002.

[10] “Condição potestativa, a que depende da vontade de uma parte, mas não exclusivamente do seu arbítrio. Se sujeita o negócio ao arbitrium mero de um dos contratantes, chama-se meramente potestativa (quae in mera voluntate consistunt), ou arbitrária. Exprime-se em cláusula deste teor: se eu quiser, se achar bom). Vide, Orlando Gomes. Introdução do Direito Civil, 21ª edição, atualizada por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Forense, 2016, página 305. Consta no artigo 122 do Código Civil, que assim preceitua: “São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo o efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes”. 

[11] Assim como a nomenclatura traz a promessa é um juramento, sendo passível de retratação, diferente do compromisso que é uma assunção de obrigação irretratável. A Promessa de compra e venda é um contrato preliminar. Promessa de compra e venda, por exemplo, é um contrato preliminar em que as partes pactuam que celebrarão o contrato definitivo de compra e venda. É somente o contrato definitivo de compra e venda que é hábil para transferir a propriedade do imóvel, com o seu devido registro. Portanto, a promessa de compra e venda não altera a situação da coisa, apenas cria uma obrigação. A obrigação é comprar/vender a coisa, de acordo com o preço, prazo e demais condições estabelecidas. Ocorre que, no compromisso de compra e venda existe a cláusula de irretratabilidade e irrevogabilidade. Tal cláusula não se confunde com a situação de descumprimento do contrato, havendo o descumprimento dele, por exemplo, a falta de pagamento, pode ser feita a resolução do contrato.

[12] Através da edição da Lei nº 14.181/21. Objetiva-se analisar a relevância da cláusula geral da boa-fé para a delimitação do campo de incidência deste novel diploma normativo e as suas funções na concessão de crédito, para se evitar e combater este sério problema que atinge cerca de  30 milhões de brasileiros. Considera-se superendividada, de acordo com o artigo 54-A, parágrafo 1º, da Lei nº 8.078/90, a pessoa natural, de boa-fé, que se encontra manifestamente impossibilitada de pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sob pena de comprometer seu mínimo existencial.  Há a imprescindibilidade de se aquilatar a conduta proba do devedor, eis que, explicitamente, veda-se a proteção para aqueles cujas dívidas tenham sido contraídas por fraude, má-fé ou que sejam oriundas de contratos celebrados dolosamente com o propósito de não realizar o pagamento. Ademais, não serão tutelados os que estejam em intenso desequilíbrio financeiro decorrente da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor, bem como de dívidas vinculadas à garantia real, ao financiamento imobiliário e ao crédito rural. Caso a conduta do consumidor não esteja pautada na lealdade na obtenção do crédito, não poderá obter a salvaguarda prevista.

[13] No fundo, o princípio da boa-fé assenta-se na cláusula geral da tutela da pessoa humana inserida no art. 1º, da CF/1988, que ao lado da cidadania compõe a atual tábua axiológica praticada pelo Direito Civil Contemporâneo. Derrubando-se os muros de Berlim existentes outrora entre a órbita privada e órbita pública. A virtude da boa-fé consiste em acreditar no que se diz e, dizer aquilo em que acredita, naturalmente, quem está de má fé, deliberadamente mente, mas nem todos que mentem estão necessariamente de má fé. In: LEITE, G. Roteiro do princípio da boa-fé objetiva. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-civil/roteiro-do-principio-da-boa-fe-objetiva/Acesso em 31.12.2021.

[14] Diversos são os contratos que possuem cláusulas que afetam a eficácia do acordo celebrado a depender do acontecimento ou não de evento futuro e incerto. Caso fosse um evento futuro e certo (como, por exemplo, a virada do ano 2021/2022), estaríamos falando de Termo, e não de Condição. Ou seja, a eficácia do Contrato possui ligação com uma condição futura e incerta. E, a condição pode ser Suspensiva ou Resolutiva. Caso se trate de condição suspensiva, enquanto tal condição não ocorrer, o credor não terá adquirido o direito.  Ou seja, até que a condição ocorra, o que há é uma expectativa de Direito, mas não o direito em si. Cabe frisar que não se sabe se tal condição se implementada, justamente por ser algo futuro e incerto. O contrato existe e é válido. Mas, a cláusula contendo a condição suspensiva só ganha eficácia caso a condição seja implementada.

[15] O bardo em diversas obras trouxe insights sobre o dharma. É o que se pode entender na peça Ricardo III. É praticamente ao final da peça, que Ricardo acorda assustado, após pesadelo. Todos os fenômenos são como sonhos. E, todos os fenômenos são percebidos pela mente. Ricardo III – Ter medo de quem? Esse tema aparece ao final da peça Ricardo III, de W. Shakespeare (Ato 5, Cena 2). Ricardo acorda sobressaltado, após um pesadelo, e diz estas palavras: “Tenho medo do quê? De mim mesmo? Não tem mais ninguém aqui.”

[16] O noivado, na medida em que atesta compromisso de casamento, e considerado o casamento como um contrato, revela-se como pré-contrato; O noivado merece estudos mais acurados na seara do Direito Obrigacional, mais especificamente no campo da Responsabilidade Civil. Esponsais é o nome derivado da palavra latina "spondere" (prometo), que selava o compromisso matrimonial. Essa terminologia (jurídica) é adotada popularmente por noivado. Será enfatizado a possibilidade de indenização material e moral quando ocorrer a ruptura desse laço de modo injustificado ou vexatório.

[17] A promessa de casamento pode ser enquadrada na seara do Direito das Obrigações e será através do instituto da responsabilidade civil que existirá a pretensão de indenização para reparação dos danos do prejudicado, tal regra está preceituada nos artigos 186 e 927, ambos do Código Civil (2002), pois embora não haja um contrato formal de noivado, existe o dever de indenizar em face da justa expectativa gerada. Sobre o assunto Bernardo Castelo Branco ensina que: “Havendo violação dos direitos da personalidade, mesmo no âmbito de família não se pode negar ao ofendido a possibilidade de reparação do dano moral, não atuando este como fator desagregador daquela instituição. Mas de proteção da dignidade [...]. A reparação, embora expressa em pecúnia, não busca, nesse caso, qualquer vantagem patrimonial em benefício da vítima, revelando-se na verdade como forma de compensação diante da ofensa recebida, que em sua essência é de fato irreparável, atuando ao mesmo tempo em seu sentido educativo, na medida em que representa uma sanção aplicada ao ofensor [...]” (2006).

[18] A boa-fé subjetiva é plenamente aplicável no ordenamento jurídico brasileiro, constituindo exemplos de sua concretização no Código Civil de 2002:  no direito possessório, quanto a classificação entre posse de boa-fé ou má-fé, no direito de família, como no caso do casamento putativo, no direito sucessório, como no caso do herdeiro aparente, entre outros. Além de outros casos, como o usucapião, a revogação de mandato, cessão de crédito, o pagamento indevido, etc. Lado outro, a boa-fé objetiva tem sido proclamada, segundo Carlos Roberto Gonçalves (Contratos e Atos Unilaterais, 2014, pg. 43), como uma regra de conduta, sendo também denominada boa-fé lealdade, tratando-se de uma exigência de uma conduta ética, caracterizando-se pela imposição de deveres. Ela se expressa na lealdade, na honestidade, na probidade e na confiança em um comportamento, estando as partes contratantes em todas as fases do contrato (inclusive na pré-contratual e pós-contratual) sob o dever de agir de acordo com esses comportamentos. É ela a regra do Direito Civil. É, então, a boa-fé objetiva um princípio, uma norma que impõe condutas e estabelece, para as partes, direitos e deveres. Enquanto isso, a boa-fé subjetiva aparece como um estado psíquico, uma boa intenção, uma ideia na cabeça do sujeito que não está fazendo nada de errado. Temos, então, que a regra no Direito Civil é da boa-fé objetiva, e em alguns casos pontuais, como no da possessória, aparece a boa-fé subjetiva. É, então, a boa-fé objetiva um princípio, uma norma que impõe condutas e estabelece, para as partes, direitos e deveres. Enquanto isso, a boa-fé subjetiva aparece como um estado psíquico, uma boa intenção, uma ideia na cabeça do sujeito que não está fazendo nada de errado.


Gisele Leite

Gisele Leite

Professora Universitária. Pedagoga e advogada. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Conselheira do INPJ. Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Consultora Jurídica.


Palavras-chave: Boa-fé Objetiva Função Social dos Contratos Responsabilidade Civil Dano Moral Casamento

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