Sir Falstaff: quantos você conhece?
Analisando a carnavalização na peça teatral intitulada “Henrique IV”, de William Shakespeare, Sir Falstaff é o ilustre representante do vício e reúne em seu perfil, sua compleição física, por seu linguajar recheado de imagens relacionadas ao comer e beber e suas sinuosas críticas à sociedade elizabetana.
Logo
na primeira parte de Henrique IV, o príncipe Hall dirige-se a Falstaff tida
como “minha querida criatura dos exageros”. A essência dos exageros ou da
hiperbolização tida como base dos sistemas de imagens que caracteriza o
grotesco, principalmente, relacionado à Falstaff.
A pena
Henrique IV (Partes I e II) integra um rol de dez dramas de Shakespeare. O
objetivo maior dessas peças era usar a história, como contexto para dramas de
identidade nacional numa época em que a Inglaterra ainda se consolidava
politicamente.
Para a
compreensão do fenômeno da carnavalização foi Mikhail Bakhtin, na obra intitulada
"A cultura popular na Idade Média[1] e no Renascimento",
ao examinar a relevância do riso popular no entendimento do contexto da obra. A
relevância da carnavalização consistia em opor à cultura oficial, de tom
sisudo, religioso e feudal da época. E dentro de sua diversidade, essas formas e
manifestações, possuem uma unidade de estilo e constituem parcelas da cultura cômica
popular, principalmente da cultura carnavalesca, una e indivisível; (Bakhtin,
1993).
A
primavera parte que compõe o Henrique IV foi escrita entre 1596-1597, enquanto
a segunda parte foi escrita em 1598. Desconhece-se o motivo pelo qual o bardo
resolveu apresentar a peça peculiar. Alguns indícios levam a crer que essa
atitude do dramaturgo devido ao sucesso popular de Falstaff.
Henrique
IV retrata a vida do monarca que dá o título da peça e que lutavam para
solidificar a Inglaterra enquanto Estado, focalizando várias guerras que eram
deflagradas pela disputa do poder.
O
enredo da instabilidade política é permeado por aventuras e desatinos juvenis
promovidos pelo príncipe Hal, Príncipe de Gales e, futuro Henrique V.
Barbara
Heliodora comentou a rebeldia do herdeiro do trono inglês é justificada. pois
era parte da tradição inglesa, a existência de histórias e dúbias aventuras do
jovem príncipe que, com a morte do pai, se transformaria miraculosamente, no
melhor dos deuses, o mais admirado e cultuado de todo o passado. (Shakespeare[2], Henrique IV, p.06).
A peça
é lembrada não pelos feitos governamentais, nem tampouco pelas inconsequências
do jovem príncipe, mas sim, pelo personagem que literalmente “rouba a cena”, Sir
John Falstaff[3], o inseparável
companheiro do Príncipe Hal durante a temporada do Eastcheap.
O
homem que inspirou o personagem Falstaff era Sir John Fastolf
(1380-1459) foi proprietário de terras e cavaleiro inglês da Idade Média tardia
que lutou na Guerra dos Cem Anos[4]. Ganhou notoriedade pelo
mundo e reputação duradoura como o protótipo, em alguma parte, para o
personagem criado por Shakespeare. Também ficou conhecido por sua capacidade de
liderança em batalha, como patrono e até como empresário bem-sucedido.
Harold Bloom[5] aponta que Falstaff é o centro de ação da peça Henrique IV e que os demais personagens são ofuscados por ele. Falstaff era corpulento, obeso, caloteiro, mentiroso e covarde. É a encarnação do vício, sendo popular na dramaturgia medieval. E, sua atuação tem raízes nas moralidades medievais[6], morality play[7] cuja ação foi caracterizada pelo árduo duelo entre bem e o mal.
Confessou,
ainda, Bloom que se apaixonou por Sir Falstaff quando tinha doze anos.
Literalmente: “Era um garoto gordo e melancólico e me aproximei dele por necessidade,
porque estava sozinho. Encontrar-me nele libertou-me de uma timidez exasperante”.
Harold Bloom se autodenominava um "falstaffiano de uma vida", que no
drama do cavaleiro presunçoso encontrou forças para sair de sua concha
interior.
O
cômico e trágico Falstaff, que é personagem que aparece nas duas partes de Henry
IV e The Merry Wives of Windsor apenas para ser citado. O personagem
faz paródia de textos bíblicos, morre da dor causa pela rejeição do rei. E,
pronuncia a famosa frase: “A honra nada mais é do que o brasão dos que se usam nos
funerais”.
Em
Henrique IV (Henry IV), a ação é a todo tempo revezada entre o Castelo do Rei
Henrique IV, pai de Hal e a Taberna Cabeça de Javali em Eastcheap, dominada
pelo fanfarrão Falstaff. A luta entre o Bem contra o Mal é exponenciada ao
limite e, tão conhecido pelo público elizabetano pois o Bem sempre venceria o
Mal.
A
audiência sabia que, em algum momento, o Príncipe Hal despertaria para suas
responsabilidades. E, assim, Falstaff seria o perdedor. Shakespeare construiu
três peças teatrais no período de 1596 a 1598, a primeira parte de Henrique IV,
a segunda parte de Henrique IV e as Alegres Comadres de Windsor. E, todo os
tipos orbitam entorno de Falstaff que detém mil e duzentas linhas de discurso dramático,
perdendo em quantidade de falas comente para Hamlet, que comprova seu
hiperbolismo linguístico e sua importância cênica.
Hiperbolismo
que se desdobra e chega até às imagens ligados ao corpo, comida e bebida. Aliás, a embriaguez contumaz era recurso
muito usado para exacerbar críticas sinceras.
O
dramaturgo se volta para a representação do Príncipe, futuro Henrique V, antes
e depois assumir o trono. O príncipe é, carinhosamente, chamado de Hal por seu
inseparável amigo Falstaff.
A
relação esdrúxula entre o jovem príncipe e um velho boêmio, glutão e batedor de
carteiras, o que com que o público se identifique mais com o fanfarrão do que o
príncipe. E, de fato, a história agradou tanto que o bardo desdobra a história
original, em outro trabalho, no qual os defeitos e a linguagem grotesca são
explícitos e fluem sem qualquer filtro.
Falstaff
é bajulador derivado da comédia clássica[8], encarna o vício e, ainda,
provoca confusões. É o típico bufão que usa a pretensão ostensiva para manter a
animação. É personagem estereotipado, comum em peças de moralidades medievais
e, possui a infinita capacidade de beber[9].
Falstaff
brilha também e, parece reivindicar vida própria, tanto que aparece mais do que
o rei e mais até que o Príncipe Hal. E, o gigantismo do personagem faz com que
o bardo coloque um ponto final na trajetória de um de seus personagens mais
emblemáticos.
Encerra
a peça declarando que Falstaff há de morrer de tanto suar, a não ser que já
tenha sido morto por suas opiniões cruéis. A verdadeira causa a morte de
Falstaff não foi a gordura desmedida, mas sim, o fato de Henrique V, tê-lo
renegado.
Os
bufões (bobos da corte) têm sua origem na Idade Antiga, onde ganhavam a vida
como bajuladores ou parasitas. Mais tarde, passaram a ser os servos
"perspicazes e cômicos", que divertiam o povo nas feiras populares ou
apresentavam-se nas festas da corte.
Bobo
da corte, bufão ou bufo, era o "funcionário" da monarquia encarregado
de entreter o rei e rainha e fazê-los rir. Muitas vezes eram as únicas pessoas
que podiam criticar o rei sem correr riscos, uma vez que sua função era fazê-lo
rir, assim como os palhaços fazem nos dias atuais[10].
Na
fala e confissão da taberneira quando afirma que o rei já enterrou o coração de
Falstaff tem-se o destronamento do bufão e, a alegre relatividade do mundo às
avessas e, tudo entra nos eixos.
A
trilogia de dramas históricos composta de Henrique IV (a primeira e segunda
parte) e Henrique V e a morte de Falstaff representa mais que um fim de um
personagem, devido a sua alta complexidade. Afinal, representa o fim de uma
época de instabilidade política e a ordem política do Estado inglês, é,
finalmente, reestabelecida.
Mas a voz de Falstaff não é calada com sua morte, pois a linguagem imortalizou e se desdobou através da estética e da arte. Tanto que o italiano Guiseppe Verdi transformou o bufão, em personagem central em título de uma de suas óperas[11] mais famosas. Outras representações igualmente significativas também são encontradas como no óleo sobre a tela intitulada “Falstaff Raising Recruits” (Selecionando recrutas) pintado por Francis Hayman[12] em 1760. Suas principais características são: o ventre avolumado e o ar de bonachão e, ainda, um ar de riso[13] de canto de boca, que nos instiga a pensar sobre o que o faz feliz.
As
representações do exagero sempre estiveram ligadas à comicidade[14] e, segundo Vladimir Propp
existem três formas fundamentais de exagero, a saber: a caricatura, a hipérbole
e o grotesco. Na caricatura, tem-se exagero de um detalhe, de um pormenor do
personagem. Já o grotesco é considerado
o mais alto grau do exagero e de tão aumentado, assume a dimensão do
monstruoso. É a lógica do exagero e o hiperbolismo consolida o realismo
grotesco. Assim, como Falstaff, Sancho Pança[15] e Panurgo são
descendentes diretos dos demônios pançudos da fecundidade.
Para Pavis (1999), o grotesco é uma deformação significativa de uma forma conhecida ou aceita como norma e aparece estreitamente associado ao tragicômico[16], mantendo instável equilíbrio entre o risível e o trágico[17].
Eis a
fala de Falstaff, in litteris: “Eu tenho todo um cardume de línguas
nesta minha barriga, e nenhuma delas sabe dizer nada eu não seja meu nome. Se
eu tivesse uma barriga mais comum, eu seria o sujeito mais ativo de toda
Europa; meu ventre, meu ventre é o que acaba comigo.”[18]
O
próprio Sir John Falstaff personifica a baixa camada da sociedade[19] londrina, ainda que
superficialmente alterado pela inteligência e pelas maneiras de um cavalheiro
elizabetano caído em desgraça em tempos difíceis. Tudo o que ele diz e faz é em
grande escala, da gula e embriaguez à mentira, que eleva a uma forma de arte, dissimulando
sua vilania com uma espessa camada de hipérboles, releituras mentirosas dos
acontecimentos e fantasias das mais imaginativas e coloridas.
Como
todo bom mentiroso, Falstaff mostra grande engenho em negar descaradamente que
ele tenha dito qualquer mentira em absoluto. “Ei, se te digo uma mentira, cospe
em minha cara, chama-me de cavalo”. Em uma de suas mais escandalosas mentiras,
Falstaff afirma haver matado ao líder rebelde Percy Hotspur em uma batalha da
qual ele tinha fugido.
Quando
o Príncipe Henry o contesta, segue-se o seguinte diálogo cômico: Príncipe
Henrique: “Mas se Percy foi morto por mim, ao tempo em que te encontravas sem
vida”. Falstaff: “Por ti? Senhor! Senhor! Como este mundo é mentiroso! Concedo
que me achava no solo, sem fôlego. Ele se dava com ele; mas nos levantamos logo
e combatemos uma boa hora, calculada pelo relógio de Shrewsbury”. Se
acreditarem no que eu digo, bem; se não, que semelhante pecado recaia sobre a
cabeça dos que têm por obrigação premiar o valor. Morro dizendo que fui eu que
lhe fiz esta ferida da coxa. Se o homem estivesse vivo e quisesse negá-lo,
obrigá-lo-ia a engolir um pedaço de minha espada. (Henrique IV, parte 1, ato 5,
cena 4)
Embora
Falstaff não esteja em seu melhor nos campos de batalha, ele está em seu
elemento no ambiente da taberna. De fato, enquanto outros lutam pela honra, ele
come e bebe em seu trajeto por toda a peça de Henrique IV.
Uma
breve digressão histórica serve para entender os motivos que levaram
Shakespeare a potencializar a imagem da gula da peça Henrique IV. Já se
afirmou, anteriormente, que a sociedade elizabetana primava pela moderação em
todos os seus aspectos, entre os quais, o hábito alimentar. Tal culto à
moderação teve, possivelmente, seu início no fim do século VI, quando o papa
Gregório Magno apresentou o rol de sete atitudes humanas que iriam de encontro
com as leis divinas.
A
lista corresponde aos sete pecados capitais, são estes: a luxúria, a gula, a
avareza, a ira, a soberba, a vaidade e a preguiça. O pecado da gula consiste em
comer apenas por prazer e, em quantidade exagerada, bem superior àquela que o
corpo precisaria para nutrir-se adequadamente. O referido Papa nomeou ainda as
cinco formas do pecado da gula, a saber: prae-propere (comer rápido); laute
(alimentos onerosos); nimis (comer demais), ardente (com avidez) e studiose
(em pequenos bocados e de forma graciosa).
Falstaff
é exposto a pujança de seus vícios e, através da fala de Hal, o público é
apresentado a dimensão do vício da obesidade, de muito comer e beber. O boi é
outro animal com o qual o bufão é comparado. Em cena em que agride Falstaff
verbalmente, por conta de seu aspecto físico, o Príncipe Hal o compara ao “boi
de Mainningree”.
Há uma
miríade de palavras e metáforas utilizadas para descrever a obesidade do bufão
o que acentua ainda mais o hiperbolismo grotesco do personagem.
Em
outro momento, é a vez de Falstaff agredir o herdeiro do trono. Os insultos
escolhidos são sua enguia, seu bacalhau seco. Pela imagem da enguia tem-se a
descrição do Príncipe Hal, por ser um peixe alongado. E, a metáfora revela o
príncipe como um ser alto e magro. Além disso, a enguia apresenta uma pele lisa
e sem escamas, o que o torna escorregadia e difícil de capturar.
O fato
de está convivendo com os marginais frequentadores de Eastcheap sentando-se
como eles na mesma taverna e, fingindo ser doutrinador por eles e por Falstaff,
não o torna um deles.
Hal,
tem consciência que, brevemente, tal como a imagem da enguia, escorrega desse
mundo, e irá tomar seu lugar no trono na corte da Inglaterra, conforme acontece
na peça Henrique V. Além da enguia, a imagem do príncipe é também associada ao
bacalhau, um peixe típico de águas geladas, de forma longilínea, o que coincide
com a compleição física do futuro rei.
Segundo
Chevalier, o vinho é associado ao sangue, tanto pela cor como pelo seu caráter,
o que transforma a poção de vida ou de imortalidade. Chevalier, ainda indica
que o vinho pode também significar conhecimento e sabedoria. Mas, em outro
contexto, na Grécia Antiga, o vinho substituía o sangue de Dionísio e, era para
acreditar que o vinho seria uma bebida dotada de alegria, que Dionísio
embriagava seus fiéis.
Por
fim, segundo Falstaff, a primeira ação do vinho seria sobre o cérebro,
tornando-se mais ágil e franco e deixando o espírito fogoso e mais bem-humorado.
A inovação da fala de Falstaff vem quando associa o vinho à coragem, à bravura,
toda essa qualidade vem do xerez e, ainda, afirma que a guerra não é nada sem o
vinho.
Justificando que a causa de o Príncipe Henry ser valente não é por sua origem nobre e o sim, o xerez[20], que ele consome, que o torna valoroso.
Mas, a pergunta capciosa persiste... quantos Falstaff você conhece? Eu, particularmente, conheço muitos. Uns disfarçados, outros exibicionistas e, outros até secretos.
Referências
BAKHTIN,
Mikhail. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento. São
Paulo/Brasília: Hucitec, 1993.
BERGSON,
Henri. O riso. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
BLACKSTONE,
William. Commentaries on the Law of England. Londres: Wentworth
Press, 2019.
CHEVALIER,
Jean; GHEERBRANT, Alain. Dicionário de Símbolos. Rio de Janeiro: José Olympio,
2009.
Equipe
Editorial de BookToBook. 29.10.2019. Harold Bloom: o amor sem limites
de Shakespeare pelo mundo. Disponível em: https://www-booktobook-it.translate.goog/autori-libri/harold-bloom-l-amore-per-shakespeare/?_x_tr_sl=it&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt-BR&_x_tr_pto=sc Acesso
em 31.12.2021.
FREUD,
Sigmund. O humor. In: Obras. Rio de Janeiro: Imago, 1974.
HELIODORA,
Barbara. Falando de Shakespeare. Rio de Janeiro: Perspectiva, 2009.
_________________.
Shakespeare: o que as peças contam: Tudo o que você precisa saber para
descobrir e amar a obra do maior dramaturgo de todos os tempos. Rio de
Janeiro: Edições de Janeiro, 2014.
HUGO,
Victor. William Shakespeare. Tradução de Renata Cordeiro e Paulo
Schmidt. Londrina: Campanário, 2000.
OLIVEIRA,
Elinês de A. V. e. Sir John Falstaff: Gula e Carnavalização em
Henrique IV. Revista Graphos. Volume 16, nº2, 2014.
PAVIS,
Patrice. Dicionário de teatro. São Paulo: Perspectiva, 1999.
PROPP,
Vladimir. Comicidade e riso. São Paulo: Ática, 1992.
RIBEIRO
JR., W.A. A comédia clássica / antiga. Portal Graecia Antiqua,
São Carlos. Disponível: greciantiga.org/arquivo.asp?num=0255. Acesso em
23.12.2021.
SANTOS,
Boaventura de Souza. Pela mão de Alice - o social e político na pós-modernidade.
São Paulo: Cortez, 1995.
SHAKESPEARE,
W. Henrique IV. Tradução de Barbara Heliodora. Rio de Janeiro: Lacerda,
2000.
Notas:
[1]
A cultura medieval é um conjunto de manifestações filosóficas, literárias,
religiosas, científicas, que mistura fatores das culturas greco-romanas e
germânicas, numa síntese permeada por aspectos cristãos. Vale destacar que a
Igreja Católica teve uma preponderância marcante durante todo o período
medieval (século IV ao XV), sobretudo quando os francos e as tribos germânicas
aderiram ao Cristianismo. Seu marco inicial é a desestruturação do Império
Romano do Ocidente. A Idade Média permaneceu até os séculos XIV e XV, com a
crise do feudalismo e ascensão dos estados nacionais. Contudo, foi entre os
séculos XI e XIII que a “cultura medieval” atingiu seu apogeu. A partir do
século X, na Europa Ocidental tem início uma reestruturação econômica, social,
política e cultural que irá culminar no Renascimento Cultural e Urbano
perpetrado pela burguesia. Além disso, as peregrinações, feiras e o movimento
copista dos Monastérios contribuíram para a difusão cultural durante toda a
Idade Média.
[2]
Shakespeare sofreu, pois, do seu meio, de uma parte, o vigoroso abalo
sentimental do patriotismo, fortalecido, nele, pela consciência de estar
servindo a uma grande nação; de outro, poderoso lastro de cultura e, em torno
de si, um ambiente espiritual em condições de reconhecer as manifestações mais
palpáveis do seu gênio. O bardo atravessou o seu século e transpôs os mares,
para tornar-se o maior intérprete da alma humana eterna e universal.
[3]
O personagem foi originalmente chamado de Sir John Oldcastle e foi renomeado
Falstaff por causa de seu status igual com um cavaleiro bem conhecido. A figura do Falstaff foi muito popular e foi
ocupada por Shakespeare e outros escritores e compositores e trabalhou como
figura cômica em suas próprias obras. Em Henrique V, Falstaff é um dos amigos
de adolescência do rei que, após a ascensão de Henrique ao trono, acaba sendo
desrespeitado e abandonado pelo rei, assim triste e abatido morre numa taverna
junto a antigos amigos. O nome Falstaff é frequentemente usado para um show-off
e conhecedor de gordura. O personagem foi originalmente chamado de Sir John
Oldcastle e foi renomeado Falstaff por causa de seu status igual com um
cavaleiro bem conhecido. A figura do Falstaff foi muito popular e foi ocupada
por Shakespeare e outros escritores e compositores e trabalhou como figura
cômica em suas próprias obras. Em Henry V, Sir John Falstaff, bem como seus
seguidores e sua família, também desempenham um papel importante na estrutura.
Estamos vivendo o Falstaff moribundo, que caiu na desgraça real, que já não
experimentou a campanha francesa do seu Rei de 1415.
[4]
A Guerra dos Cem Anos foi uma série de conflitos travados de 1337 a 1453 pela
Casa Plantageneta, governantes do Reino da Inglaterra, contra a Casa de Valois,
governantes do Reino da França, sobre a sucessão do trono francês. Cada lado
atraiu muitos aliados para a guerra. Foi um dos conflitos mais notáveis da
Idade Média, em que cinco gerações de reis de duas dinastias rivais lutaram
pelo trono do maior reino da Europa Ocidental. A guerra marcou tanto o auge da
cavalaria medieval quanto seu subsequente declínio e o desenvolvimento de
fortes identidades nacionais em ambos os países. Depois da Conquista Normanda,
os reis da Inglaterra eram vassalos dos reis da França para suas posses em solo
francês. Os reis franceses se esforçaram, ao longo dos séculos, para reduzir
estas posses, no sentido de que apenas a Gasconha fosse deixada para os
ingleses. A confiscação ou a ameaça de confisco deste ducado faziam parte da
política francesa para controlar o crescimento do poder inglês, particularmente
quando os ingleses estavam em guerra com o Reino da Escócia, um aliado da
França. Historiadores comumente dividem a guerra em três fases separadas por
tréguas: a Guerra da Era Eduardiana (1337-1360); a Guerra Carolina (1369-1389);
e a Guerra de Lancaster (1415-1453). Os conflitos locais nas áreas vizinhas,
que estavam contemporaneamente relacionados com a guerra, incluindo a Guerra da
Sucessão Bretã (1341-1364), a Guerra Civil de Castela (1366-1369), a Guerra dos
Dois Pedros (1356-1375) em Aragão e a Crise de 1383–1385 em Portugal, foram
aproveitados pelas partes para fazer avançar as suas agendas. Posteriormente, os historiadores adotaram o
termo "Guerra dos Cem Anos" como uma periodização da historiografia
para abranger todos esses eventos, construindo o mais longo conflito militar da
história europeia. Com relação aos beligerantes, na França, guerras civis,
epidemias mortais, fomes e mercenários reduziram a população drasticamente. As
forças políticas inglesas ao longo do tempo vieram a opor-se à arriscada
aventura. A insatisfação dos nobres ingleses, resultante da perda de suas
terras continentais, tornou-se um fator que levou às guerras civis conhecidas
como Guerras das Rosas (1455-1487).
[5] Bloom buscou a interpenetração de significados, na vida de seus personagens ele leu a sua e a nossa. Ele escreveu sobre ele: “Shakespeare escreve e compõe como se soubesse tudo e nada. É inútil perguntar se ele era católico ou protestante, bissexual, casado ou separado, humanista ou niilista. Shakespeare contém tudo e todos [...] Suas ações se tornaram nossas emoções, seus sonhos povoam nossos pensamentos”. Para homenagear seu maior amor literário, ele se apresenta para Rizzoli Libri Demônio de Shakespeare, volume em que se reúnem as intervenções críticas dedicadas a dois dos maiores personagens do mundo shakespeariano: Falstaff e Cleópatra.
[6]
A tônica no conceito de retitude é uma constante da ética. Isidoro de Sevilha
(c.560-c.636) é a fonte para esclarecer este significado. No tratado Etymologias
reconheceu a ética como constituinte da Filosofia e vinculada à moral, no
sentido de costumes (consuescere; habitus) apropriados à condução de uma
vida ordenada pela retitude da intenção. À ética é-lhe atribuída uma dimensão
prática que a torna distinta de outras áreas da Filosofia. Transcreve-se quase
literalmente: a filosofia é o conhecimento das coisas humanas e divinas, unido
ao conhecimento de uma vida reta e divide-se em três partes: a filosofia
natural, que trata do conhecimento da natureza; a moral que em grego se chama
‘ética’, e que trata dos costumes; a filosofia racional, em grego “lógica”, que
busca a verdade das coisas e dos costumes.
[7]
É termo usado por estudiosos da História Literária e dramática para se referir
a um gênero de textos teatrais do século XIV ao século XVI que apresentam
conceitos personificados na maioria das vezes, virtudes e vícios, mas, às vezes
práticas ou hábitos, ao lado de anjos e demônios que estão engajados em luta
para persuadir um protagonista que representa um personagem humano genérico
para bem ou o mal. O arco comum da história dessas peças segue a tentação,
queda, redenção do protagonista.
[8]
A mais antiga comédia completa que chegou até nós, da autoria de Aristófanes,
data de -425, e a última de suas comédias eminentemente “antigas”, Rãs. Isso
significa que, embora cronologicamente a fase antiga da comédia ática tenha
durado de -486 a -405, só a conhecemos razoavelmente em suas décadas finais,
durante a Guerra do Peloponeso. A comédia antiga se caracterizava pela sátira
direta aos políticos do momento, aos cidadãos proeminentes e às instituições da
cidade. Eram notáveis, ainda, os temas fantásticos, as paródias de episódios
mitológicos e a caracterização extravagante do coro. Havia também uma parte
característica da representação, a parábase, situada mais ou menos no meio da
peça, quando o coro suspendia parcialmente a ilusão dramática e se dirigia
diretamente ao público. Itália, musa da comédia Aristófanes é o único poeta da
comédia antiga de quem temos dramas completos; mas sabemos o título e algumas
outras coisas sobre a obra de outros poetas, mais antigos ou contemporâneos de
Aristófanes, graças a recentes descobertas papirológicas ou a pequenas
passagens conservadas por outros autores da Antiguidade. A comédia antiga
influenciou diversos autores modernos de sátiras políticas, notadamente
François Rabelais, Miguel de Cervantes, Jonathan Swift e Voltaire. As
características das duas últimas comédias de Aristófanes, representadas entre
-400 e -388, sinalizam o esgotamento da comédia antiga e o início de nova fase,
intitulada comédia intermediária e que se estendeu de -404 a -321,
aproximadamente.
[9]
Para os ingleses do tempo de Shakespeare, os alemães seriam os maiores
beberrões da Europa. Dos alemães do século XVI, dizia Montaigne, nos
"Ensaios": "Os alemães
bebem quase indiferentemente de qualquer vinho com prazer; seu propósito é mais
ingerir do que saborear" Comessa irreverência do escritor francês está de
acordo a graciosa Portia (Pórcia) do "Mercador de Veneza" O pai de
Portia decidira que os candidatos à mão da filha se submetessem a uma espécie
de sorteio. A cada um deles, isoladamente, seriam apresentados três cofres, —
um de ouro, outro de prata, o terceiro de chumbo, — para que escolhesse. Em um dos cofres estava o retrato da moça; e o
candidato que acertasse seria o preferido.
[10]
Os bobos da corte eram quase sempre ótimos comediantes e, diferentemente do que
supõe o senso comum, muito bem pagos e estavam longe de serem idiotas. Nada
tinham de bobos. Hábeis malabaristas, exímios mímicos e ótimos declamadores de
poesia, eram artistas múltiplos e com muito talento e sensibilidade, como demonstrou
o grande bardo inglês, o maior entre os maiores, que em suas peças,
apresenta-os como sagazes personagens, com licença para dizer, com graça e
picardia, aquilo que ninguém diria ao rei, embora fosse tudo o que o povo
pensava e comentava às escondidas. Os bobos divertiam o rei e todos que o
cercavam, mas, atrevidos, argutos e astuciosos, mostravam as entranhas da
sociedade, revelavam os bastidores da corte, ironizavam os áulicos, expunham as
ambições do rei e troçavam de todos, inclusive deles mesmos. Os mais famosos
bobos da corte foram Mitton e Triboulet, das cortes de Carlos V e Francisco I,
respectivamente.
[11]
Falstaff é uma ópera cômica de Giuseppe Verdi, inspirada na adaptação por
Arrigo Boito de The Merry Wives of Windsor (As alegres comadres de Windsor) e
Henry IV (Henrique IV) partes I e II, de William Shakespeare. Assim, como em
Othello, Falstaff apresenta um libreto que, além de se basear no texto de
Shakespeare, respeita e dialoga com as características desse grande dramaturgo.
Por ser uma ópera onde breves temas predominam ao invés de grandiosas melodias,
Verdi continua mantendo sua produção com um alto grau de elegância e inovação.
Em Falstaff, sua última ópera, exibe determinados solos imponentes, mas o foco
está na atuação em grupo, sejam em trios, quarteto ou quinteto. (musical ou
canto?). A história de Falstaff se resume em uma comédia de vingança e lição de
honra. O personagem principal, cujo nome intitula a própria ópera, é um homem
sem escrúpulos que usa a mentira para zombar e se aproveitar de todos ao seu
redor. Depois de tentar conquistar mulheres casadas, invadir e roubar a casa de
um homem e demitir injustamente seus criados, Falstaff está na mira de todos
aqueles que foram prejudicados por ele. Diante disso, várias armadilhas põem Falstaff
em situações de vexames e repletas de muita confusão durante todos os 3 atos da
ópera. O fechamento, porém, apresenta um final alegre tendo como, pano de
fundo, um casamento entre dois personagens apaixonados e cantoria de todos
sobre cantoria que diz: “Ri melhor quem ri por último”.
[12]
Francis Hayman (1708-1776) foi pintor e ilustrador da Inglaterra e, um dos
fundadores da Royal Academy e seu primeiro bibliotecário. Ele contribuiu
com 31 imagens para uma edição de 1744 das peças de Shakespeare de Sir Thomas
Hanmer e mais tarde retratou muitos atores contemporâneos líderes em papéis de
Shakespeare, incluindo David Garrick como Richard III (1760). Ele também
ilustrou Pamela, uma novela de Samuel Richardson, Paradise Lost de
Milton e Paradise Regained, tradução de Tobias Smollettde, Don Quixote e outras
obras bem construídas. Na década de 1760, Hayman foi contratado por Jonathan
Tyers, proprietário da Vauxhall Gardens, e da propriedade Denbies, para fazer
uma série de pinturas de história em larga escala que retratam vitórias
britânicas na Guerra dos Sete Anos. Também foi bom professor, ensinando, entre
outros, Mason Chamberlin, Nathaniel Dance-Holland, Thomas Seton e Lemuel
Francis Abbott, e exercendo forte influência sobre Thomas Gainsborough.
[13]
Em termos práticos, dispõe que o riso se revela em dois campos distintos, num
sentido temos o corpo humano, e junto com ele, como presente dos Deuses, o
riso, e, no outro, a concepção do homem como ser racional, e a outra forma do
riso, produto desta racionalidade. "O riso é a sabedoria, e filosofar é
aprender a rir. Sem a liberdade de rir, de caçoar e fazer humor, não há
progresso da razão". Georges Minois.
[14]
Outro mecanismo de comicidade ocorre quando se dá uma transferência de atenção
da alma para o corpo. A corporalidade do personagem e suas necessidades físicas
e fisiológicas nos remetem ao cômico. Segundo Bergson (2001) essa é a razão
pela qual o poeta trágico evita “tudo o que possa chamar a nossa atenção para a
materialidade de seus heróis”. Esse princípio pode ter vários desdobramentos,
como, por exemplo, a forma que se impõe ao conteúdo, o ridículo físico e o
ridículo profissional. Dentro da comicidade
de situação e de palavras Bergson destaca a inversão, que pode ser entendida
também como o contraste, um dos mecanismos mais tradicionais, sempre presente
nas comédias antigas.
[15]
Em castelhano é Sancho Panza, personagem da obra Dom Quixote de La Mancha, de
Miguel de Cervantes. E, atua em contraste ao personagem principal, o próprio
Dom Quixote. Enquanto Quixote é sonhador e fantasioso, Sancho é o realista e
sério. Mas na medida em que o relato avança ele vai se perdendo cada vez mais,
e, aos poucos, vai aceitando os "delírios" do cavaleiro de quem é o
fiel escudeiro. Sancho Pança decidiu acompanhar Dom Quixote após este ter
prometido que lhe daria a governação de uma ilha. Mesmo pobre, continua fiel a
Dom Quixote como no ditado dos cavaleiros (um cavaleiro nunca foge a uma luta),
Sancho nunca fugiu de Dom Quixote. Nunca lhe faltava com o respeito, sendo
sempre fiel. Normalmente andava em cima de um burro, junto de Dom Quixote, que
andava em cima do seu cavalo, o Rocinante, o que marca umas das evidências do
contraste dos personagens. Sancho Pança era gordo e baixo.
[16]
A tragicomédia é uma modalidade do gênero dramático criada no século XVI, na
época do Renascimento. Ela surgiu a partir de duas outras modalidades: a
tragédia e a comédia. É a mistura do trágico e do cômico. Nela, os
acontecimentos são dramáticos, funestos, mas o final é sempre feliz, embora não
seja cômico. A tragicomédia é um subgênero teatral que alterna ou mistura
comédia, tragédia, farsa, melodrama. A mistura de gêneros foi também adotada
durante o Renascimento inglês, pelo teatro elisabetano. Algumas peças de
Shakespeare (1564 -1616), como A Tempestade e O Rei Lear, têm muito de
tragicomédia, sendo que a ironia e a comicidade contribuem para a maior riqueza
de significados do texto. Em França, o termo foi introduzido pelo dramaturgo
Robert Garnier (1545-1590). No início do século XVII, esse tipo de teatro era
moda, mas o estilo ainda não estava claramente definido. Pouco a pouco,
entretanto, os autores foram submetendo suas peças às regras do teatro
clássico. Entre os clássicos franceses do século XVII (Molière, Corneille,
Racine), designava uma história trágica com desfecho feliz. Todavia, o gênero
nem sempre agradou ao público. "El Cid" de Corneille, por
exemplo, teve que ser reescrita para se transformar em uma tragédia, depois que
a primeira versão recebeu numerosas críticas desfavoráveis.
[17]
A etimologia de tragicomédia foi criada pelo dramaturgo Plautus no século II
antes de Cristo no apogeu cultural da Roma Antiga, sendo apreciado em sua obra Amphitryon
(Anfitrião), na qual os deuses Júpiter e Mercúrio assumem papéis de meros
mortais representando diferentes classes sociais e infortúnios.
[18]
Sir John Falstaff é provavelmente o mais popular dos personagens de
Shakespeare. Ele é o arquétipo do “amável desonesto”, um beberrão, mentiroso,
fanfarrão e ladrão. Seu centro de operações está em Southwark, uma área de
Londres que se encontra do lado de fora de seus muros ao sul do Rio Tâmisa, que
era o refúgio de criminosos e prostitutas. Era o lugar onde o povo de Londres
vinha para se divertir nas tabernas, bordéis e teatros. Era também onde se localizava
o Teatro Globe de Shakespeare, já reconstruído e que continuava a mostrar as
peças de Shakespeare.
[19]
Os companheiros de Falstaff são desonestos, beberrões, ladrões e assassinos,
como ele próprio, mas também incluem o Príncipe de Gales, o futuro Henrique V,
que participa com gosto de suas escapadas imorais e ilegais na peça Henrique
IV, partes 1 e 2. Entre seus comparsas da Taberna Boar’s Head (Cabeça de
Javali) estava Pistol, um velho soldado, um fanfarrão covarde e um “gabola”,
Poins e Bardolph – um ladrão cujo nariz grande e vermelho e o rosto coberto de
carbúnculos sugerem um avançado estágio de alcoolismo. Estes lumpemproletários
são exemplos bastante típicos do submundo londrino, com o qual Shakespeare
parece estar muito bem familiarizado.