Revelia no processo penal brasileiro
Há como equivocado o entendimento de que, no processo penal, inexistiria a revelia. Em verdade, a revelia, no processo penal, incide com muito menos vigor se comparado ao processo civil. Neste, revel o suplicado, os fatos alegados serão tidos como verdadeiros, ante a ausência de contestação (art. 341 do Código de Processo Civil – Lei n. 13.105/2015). No processo penal, ao revés, não se cogita da imposição da pena de confissão ao réu revel ou, em outras palavras, a revelia do acusado não libera a acusação de fazer prova sobre o que alega, nos termos do disposto no art. 156 do codex. Mas, fincadas tais premissas, não cabe afirmar que inexistiria revelia no processo penal. Esta existe, tanto que poderia até culminar com a decretação da prisão do acusado[1]. Demais disso, sua ausência injustificada libera o juízo de intimá-lo para os atos subsequentes do processo, em hipótese menos provável de ocorrer atualmente, em virtude da concentração, em audiência única, de atos processuais
A origem etimológica da
palavra revelia advém do latim rebellis e corresponde a rebeldia,
contumácia[2], o ato de se opor a algo.
No juridiquês, consiste na condição do réu que apesar de citado regularmente,
não comparece para o oferecimento da defesa, e a falta de contestação por parte
do réu em relação à ação proposta por este.
No direito romano, a
inatividade[3]
do réu era vista como desobediência. No período das legis actiones, o
processo não se instaurava senão com a presença de ambas as partes, por isso, a
ius in vocatio, ou seja, o chamamento do réu tinha sempre caráter firmemente
coativo (in: ARU, Luigi. Il processo civil contumaciale. Studio
di diritto romano. Roma Anonima romana, 1934, p. 15-6); RISPOLI, Arturo. Il
processo civile contumaciale. Milano: Libraria, 1911, p.229).
Percebe-se a curiosa redação
da primeira Tábua da Lei das XII Tábuas que indicava bem a imprescindibilidade
do comparecimento do réu para o processo.
No direito italiano, que em
termos de inatividade e extinção do processo influenciou nossa atual redação do
art. 485, incs. II e III, do CPC/2015 (principalmente com a redação do art.
201, inc. V, do CPC/1939 e, posteriormente, com o art. 267, incs. II e III, do
CPC/1973), notava-se uma tendência em compreender a contumácia como um “fato
voluntário das partes”.
A principal justificativa para o abandono
dessas teorias voluntarísticas foi o constante interesse do Estado na rápida
solução do litígio, impondo uma marcha processual que não comportava mais
paradas ou retrocessos, tratava-se, portanto, da supremacia do interesse
público sobre o privado.
Os efeitos da revelia diferem
conforme se aplique no direito processual civil, seja no direito processual
penal, no primeiro há efeitos materiais e formais, isto é, além de não ser mais
intimado para os posteriores atos do processo, com exceção da sentença
condenatória, ainda vige a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo
autor.
E, nesse derradeiro efeito,
conhecido por ser um efeito material, não é aplicável no processo criminal
posto que fere de morte importantes princípios constitucionais que tutelam as
garantias individuais do réu durante o processo, além de corresponderem também
aos basilares princípios do processo penal acusatório, que possui dentre as
suas características identificar o réu também como sendo titular de direitos e,
não apenas mero objeto de investigação e, ainda, respeitar sua presumida
inocência.
Outro importante direito é de
permanecer em silêncio para evitar eventual produção de provas contra si mesmo,
também conhecido como sendo o princípio da inexigibilidade da autoincriminação.
Portanto, a revelia de forma
íntegra e absoluta revela-se incompatível com processo penal brasileiro, o que
é corroborado por doutrinadores como Aury Lopes Junior que afirma não existir
no processo penal à revelia em seu sentido próprio, porém, apenas seus efeitos
formais.
Relevante mencionar que uma
vez concretizada a citação, o acusado resta vinculado ao processo, ou seja,
devendo participar de todos os atos do processo. E, se este for citado e deixar
de apresentar a resposta à acusação, ou mudar de endereço sem previamente
comunicar o juízo de seu novo endereço, o processo correrá à sua revelia.
O mesmo se dá quando o acusado
apesar de notificado pessoalmente, deixar de comparecer a qualquer ato do
processo sem a devida justificativa.
Divide-se a revelia em dois
aspectos: materiais e formais. O primeiro consistente na inversão de cargas, ou
seja, serão presumidos como verdadeiros os fatos alegados pela acusação. E o
segundo aspecto, meramente processual, se trata apenas da não intimação do réu
para os atos posteriores até a sentença.
Frise-se que só se exige
intimação para a sentença, quando essa for condenatória proferida no primeiro
grau de jurisdição, pois somente relativo a ela é que o acusado revel possui
capacidade postulatória para interpor recurso.
Portanto, no processo penal
inexiste a aplicação do efeito material da e revelia, pois de acordo com o
princípio da presunção de inocência, jamais o réu será tido a priori como
culpado antes que transite em julgado a sentença condenatória. Sendo assim, o
único efeito da revelia no processo penal é a não intimação do acusado para os
demais e posteriores atos do processo.
Observemos os casos de revelia
mediante a citação com hora certa, ex vi o artigo 362 CPP, parágrafo
único e, quando o acusado não vier a comparecer para qualquer ato, nesse caso,
será nomeado defensor dativo, ou então, caso o réu seja citado ou intimado
pessoalmente e, vier a deixar de comparecer sem haver justo motivo ou ainda, mudar
de residência sem previamente comunicar ao juízo de seu novo endereço, ex vi
o artigo 367 CPP, e, o MP deverá se desincumbir de seu ônus probatório, caso
contrário, seu pedido condenatório poderá ser julgado improcedente, pois em
ambos os casos, não se cogita em confissão ficta ou presumida no processo
penal, ocorrendo a consequente presunção de veracidade dos fatos alegados pelo
autor.
A Lei 11.689/2008, o artigo
457 dispõe que o julgamento do Júri não será mais adiado, no caso de o acusado
solto e for intimado não vier a comparecer ao julgamento, por isso não
representa impedimento para que se dê a suspensão do julgamento pela prática de
crime inafiançável e, assim, prosseguirá normalmente.
Sublinhe-se que anteriormente
a retromencionada lei, não era possível em face do fato do julgamento ter que
ser realizado perante ao acusado. Isto é, na sua presença.
Convém diferenciar que no
processo civil brasileiro não depende de provas, os fatos alegados por uma
parte e confessados pela outra parte, ou ainda, aqueles admitidos no processo
como sendo fatos incontroversos.
Diferentemente, no processo
penal brasileiro não serão presumidas as alegações como verdadeiras por serem
afirmados pelo autor, mesmo que o réu não vier a contestar a ação, isto é, não
há a presunção de veracidade dos fatos afirmados pelo autor mesmo no caso de
revelia.
E, a razão de tal consequência
se deve ao respeito ao princípio da presunção de inocência ainda que o acusado
confesse a autoria do delito, e subsiste o ônus da acusação em comprovar a
imputação constante em peça acusatória, a denúncia.
E, assim, ainda que a revelia
venha a ser decretada com base no artigo 367 do CPP, o MP deverá cumprir seu
ônus[4] probatório, caso contrário
seu pedido condenatório e, poderá ser julgado improcedente.
Conclui-se que a única
consequência da revelia no processo penal é a desnecessidade de intimação do
acusado para os seguintes atos do processo até a sentença, pois essa deve ser
realizada sob qualquer circunstância, de acordo com o artigo 392 CPP, que prevê
a intimação do réu para a sentença. Isso se deve ao fato de o acusado permanecer
com a capacidade postulatória para interpor recurso, mesmo estando revel.
Entretanto, após decretada à
revelia, as intimações passarão a ser feitas apenas ao advogado, pois conforme
já mencionado, o acusado não será mais notificado ou intimado para nenhum termo
do processo, com exceção da sentença.
Na hermenêutica dos Tribunais
Superiores pátrios, a intimação da sentença, a que se refere o artigo 392 CPP,
só é exigível quando se tratar de sentença condenatória de primeiro grau de jurisdição,
por isso é só nesse caso que o réu tem capacidade postulatória para interpor
recurso.
Desta forma, em caso de
decisão de segundo grau jurisdição ocorre com a publicação da decisão no órgão
oficial de imprensa, sem prejuízo da prerrogativa do defensor nomeado, prevista
no artigo 370 § 4° CPP.
Em qualquer momento que o
acusado comparecer, cessam- se os efeitos da revelia, e ele passa a participar
normalmente do processo, no estado em que ele estiver.
Existem várias teorias e
correntes doutrinárias que disputam a explicação sobre a natureza jurídica[5] da revelia. E, a primeira
destas, foi penal, a qual entendia a contumácia que até então era considerada
como sinônima de revelia e, que consistia em rebelião contra o poder do juiz,
sendo um desacato à autoridade judiciária. E, tal teoria permaneceu enquanto o
processo tinha caráter privatística.
E, com a extinção da litis contestatio[6],
ou seja, a obrigação da presença física dos litigantes nos atos do processo
deixou de ser indispensável para que esse prosseguisse.
Então, passou a ser entendido
que a revelia não poderia impedir que o revel tivesse a proteção jurisdicional.
E, a partir dessa mudança, veio a teoria da renúncia, a qual postulava que a
revelia era uma renúncia ao direito de se defender.
Essa teoria foi muito
criticada na época, porque se o revel renunciou seu direito de se defender, ele
não poderia voltar a juízo, pois com isso, estaria revogando sua declaração de
vontade.
A teoria atual é a da inatividade
de Giuseppe Chiovenda[7], inspirada na teoria da
autodeterminação, passou a encarar a revelia mais objetivamente, desprezando o elemento
subjetivo da voluntariedade para a concretização desta, sendo analisado apenas
o ato do não comparecimento do acusado, independentemente da sua vontade de ser
ou não contumaz.
Ou seja, à revelia deixa de
ser analisada subjetivamente, para ser analisada simplesmente, como
inatividade.
No direito processual civil
brasileiro, à revelia é disciplinada como ato-fato processual, consistente na
ausência de apresentação da contestação tempestiva, isto é, se trata de um
estado de fato gerado pela ausência de contestação do réu no tempo certo.
Basicamente, possui dois
efeitos, o material que consiste na inversão de cargas, ou seja, os fatos
afirmados pelo autor serão relativamente presumidos como verdadeiros, tal
efeito é tido como presunção de veracidade ou confissão ficta, os prazos contra
o réu revel que não tenha advogado constituído fluem a partir da publicação da
decisão, possibilidade de julgamento antecipado da causa. E, o formal o réu não
poderá alegar algumas matérias de defesa, exceto aquelas do art. 342 CPC.
Frise-se que o efeito material
da presunção de veracidade foi mitigado pelo vigente Código de Processo Civil
(Código Fux), pois com sua entrada em vigor criou - se a necessidade de
verossimilhança dos fatos alegados pelo autor, para que haja tal presunção,
portanto ela não equivale ao reconhecimento da procedência do pedido.
E formal que consiste na
desnecessidade da intimação do réu para novos atos do processo, mas a qualquer
momento que ele aparecer, poderá participar do processo dali em diante, e na preclusão que
ocorre desfavorável ao réu não poderá alegar
algumas matérias de defesa, exceto aquelas do art. 342 CPC, que são as hipóteses em que é permitido o réu alegar
mesmo depois da contestação: “relativas a direito ou a fato superveniente; II -
competir ao juiz conhecer delas de ofício;
III - por expressa autorização legal, puderem ser formuladas em qualquer tempo e grau de jurisdição”.
Com a revelia decretada, o réu
revel continua sendo intimado, só que na figura de seu patrono, para os atos
posteriores do processo. Já o prazo para o revel que não tem advogado
constituído, fluirá da data de publicação do ato decisório no órgão oficial.
Portanto, seus efeitos se
restringem a parte formal, como mostra o artigo 367 CPP: O processo seguirá sem a presença do acusado
que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem
motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo
endereço ao juízo.
Uma vez ajuizada a ação
através da queixa-crime, proposta pela vítima ou seus sucessores, ou de
denúncia feita pelo MP, o julgador promoverá a citação do réu, de acordo com o
artigo 396 do CPP, para que ele tome ciência de que há contra ele uma imputação
de uma prática delitiva e, no prazo de dez dias ofereça defesa.
O Código de Processo Penal
brasileiro, as formas de citação são: pessoal, por carta rogatória, por edital,
carta precatória e, com a Reforma de 2008, foi instituída a citação por hora
certa, pela Lei 11719/2008.
Para ficar autorizada a
citação com hora certa, é indispensável que haja certeza de que o réu se oculta
e, assim, o oficial deverá fazer constar da certidão todas as diligências
promovidas, dias e horários, e quais os fatos que autorizaram a conclusão de
que o acusado está se ocultando.
A citação preferencialmente
usada é a pessoal, na qual o oficial de justiça entrega nas mãos do acusado o
mandado. Além do mais não se admite citação entregue a procurador, a não ser
que o acusado seja inimputável, nesse caso a citação será entregue ao curador.
Caso o réu não seja
encontrado, será utilizada a citação por edital, com o prazo de quinze dias. Já
se ele estiver se omitindo para não ser encontrado, e isso se verifica quando o
oficial de justiça vai à residência do acusado algumas vezes e percebe que ele
está se ocultando para não ser citado, será aplicada a citação por hora certa.
No caso de citação por carta
precatória que é usada para comunicar o réu que esteja em outra comarca,
enquanto que na carta rogatória é usada para comunicar o réu que esteja em
outro país.
No caso de o acusado ter sido
pessoalmente citado, e deixe de comparecer à audiência, sem haver motivo
justificado ou não comunique seu novo endereço ao juízo, no caso de mudança de
residência, o processo criminal seguirá sem a devida participação do réu, concretizando
à revelia.
Diante da citação ficta, por
meio de edital ou por hora certa, será nomeado um defensor dativo, posto que o
julgador poderá determinar a produção de provas urgentes, e esse defensor
acompanhará toda a produção probatória conforme prevê o artigo 366 do CPP.
Caso o acusado esteve ausente
para a citação ou foragido, a presença do defensor é obrigatória, para a
instrução do feito ou para a realização de provas consideradas urgentes. Nesse
sentido, Tourinho Filho (2008), assevera que:
“Se o acusado, citado por edital, não
comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo
prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas
consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos
do disposto no art. 312 do CPP”.
Entretanto, no processo penal
vigente, não há mais o extremo rigor de outros tempos, quando se proclamava que
contumax pro convicto et confesso habetur (o contumaz – o que não atende
ao chamamento – é tido e havido como confesso). Não.
É apenas esta: o réu não mais
será intimado de qualquer ato do processo (salvo condenação – art. 392), nem
notificado. O fato de ser ele tido como revel não significa deva ser
considerado culpado.
No mesmo sentido está o
entendimento de Eugênio Pacelli de Oliveira (2008): “Advirta-se que, em
processo penal, à revelia, verificada a partir da ausência injustificada do
acusado por ocasião da realização de qualquer ato relevante do processo, tem
como única consequência a não intimação dele para a prática dos atos
subsequentes, exceção feita à intimação da sentença, que deverá ser realizada sob
quaisquer circunstâncias”.
Destaque-se ainda que revelia
no processo penal significa a quebra da fiança, isto é, a perda de metade do
valor pago à título de fiança e, mesmo que seja absolvido, ao final do processo
criminal, não se dará a devolução do integral valor pago a título de fiança,
vide artigos 338 e 339 do CPP.
Não há de se cogitar em
presunção de veracidade de fatos em caso de ausência do réu, como ocorre no
processo civil brasileiro vigente, vez que ainda que haja a condenação, tal
decisão judicial deverá ser fundada em constantes provas nos autos, em razão da
ampla defesa e do contraditório.
Também não ocorre a inversão
do ônus da prova, e há ainda o direito ao silêncio e de não produzir provas
contra si mesmo, o que impede os efeitos materiais da revelia no processo
criminal.
Corrobora tal entendimento o
doutrinador Nestor Távora (2015) que afirma que não há hipótese de efeito
material da revelia, pois a presunção de veracidade dos fatos acusatórios por
se defrontar com jus libertatis que é princípio inadiável e indisponível.
A não ocorrência dos efeitos
materiais da revelia no Processo Penal, ele enfrenta resistências, como a de
Guilherme de Souza Nucci (2017), ressaltando que o réu citado, que não comparece
para ser interrogado, não se interessando por sua defesa, como os direitos são
sempre indisponíveis, nesse caso, terá defensor nomeado pelo juiz, nos termos
do art. 261 do CPP.
Portanto, o que ocorre na esfera
penal é a simples ausência do processo, consequência natural do direito de
audiência. O réu pode acompanhar a instrução pessoalmente, mas não é obrigado. É
indispensável a presença de seu defensor, ainda que seja ad hoc, não poderá ser
considerado revel.
In litteris,
leciona Aury Lopes Júnior (2017): “Não existe, no processo penal, revelia em
sentido próprio. A inatividade processual (incluindo a omissão e a ausência)
não encontra qualquer tipo de reprovação jurídica. Não conduz a nenhuma
presunção, exceto a de inocência, que continua inabalável”.
Devem estar presentes
Ministério Público e defensor dativo caso haja a necessidade de práticas
instrutórias de natureza urgente, principalmente relativo a provas periciais e
testemunhais, para isso devem estar.
Outro detalhe necessário a ser
ressaltado, é que com base no art. 366 do CPP, o juiz pode decretar prisão
preventiva, desde que estejam presentes os requisitos presentes nos artigos 312
e 313 do CPP[8],
pois devido sua natureza cautelar, ela é uma medida de urgência.
Esclarece se que o processo
não fica suspenso para sempre, mas o prazo para perdurar essa suspensão se
encontra seu limite nos prazos previstos para o reconhecimento da prescrição da
pena in abstrato, conforme está previsto no artigo 109 CP.
Nesse mesmo sentido, o STJ
corrobora tal pensamento, com a Súmula n° 415: “O período de suspensão do prazo
prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada”.[9]
Pairou dúvida diante da nova
redação que poderia ser aplicável em processo em andamento, por crimes
praticados anteriormente a Reforma do CPP de 2008, e ainda se questiona se
seria possível a retroação in mallam partem, ou seja, à prejuízo do réu.
Foi decidido que esse
dispositivo não seria aplicado a crimes passados. O STF reconhecendo a ligação
com o direito material, firmou a não aplicação deste dispositivo a crimes já
ocorridos, sendo a justificativa de que tal aplicação seria prejudicial, não é
exato, pois para isso é necessário conferir se no caso concreto.
O artigo 366 CPP não se aplica
a crimes de lavagem de dinheiro, por haver na sua lei o artigo 2°, §2º, que
prevê a não aplicação do artigo 366 CPP, embora parte da doutrina considere
essa não aplicação inconstitucional.
Tal artigo existente na lei de
Lavagem de Dinheiro[10] com foco nas condições
pessoais dos agentes que praticam a criminalidade macroeconômica, sendo,
portanto, injustificável um “tratamento desigual destinado aos acusados de crime
de lavagem”.
É interessante acrescentar a
prisão preventiva, que mesmo na hipótese de o acusado não comparecer e não
constituir advogado, ela não ocorre de maneira automática, pois este tipo de
prisão não ocorre se a infração for contravenção ou crime culposo.
A preventiva ao revel deve ser
motivada como em qualquer outro caso, com base nos artigos 312 e 313 CPP. Repara-se
que no processo penal pátrio não existe distribuição de cargas probatórias,
pois o réu é presumidamente inocente, assim, não tem a princípio qualquer dever
de atividade processual.
E, além disso, da sua inércia,
deverá acarretar prejuízo jurídico-processual. E, desta forma, toda a carga
estará em mãos do acusador.
E, de outro viés, é inegável
que existe por parte do réu, a assunção de riscos decorrentes de sua inércia e
quando surge uma oportunidade, nas diferentes situações processuais que poderão
ser probatórias ou defensivas, não se atribui nenhuma carga ou ônus, senão
apenas riscos.
É inegável que existe para o
réu, a assunção de riscos inerentes e decorrentes de sua inércia, quando assim,
o não agir probatório como no caso do exercício do direito ao silêncio, e se
recusa a participar de acareação, de reconhecimentos e, etc., isto não conduz a
nenhuma punição processual a elisão da presunção de inocência. Não existe
propriamente dever de agir para o réu ou acusado, para que seja punido em
decorrência dessa omissão.
Assim, o art. 367 CPP permite que o processo
prossiga sem a presença do réu citado, essa omissão processual gera apenas
riscos. Não se trata de prejuízo processual, pois não possui carga, de modo que
não se pode presumir nada diverso de sua inocência.
Portanto, não há que se cogitar
de revelia no processo penal, pelo menos no sentido próprio da palavra,
incluindo omissão e ausência, não encontra nenhuma reprovação jurídica.
Ressalte-se que a presença técnica, ainda que
o acusado esteja ausente (ou seja, citado não comparece, nem constitui
defensor) é uma imposição inarredável fruto de uma opção constitucional por um
procedimento em contraditório, que a produção dos efeitos.
Nesse sentido, endossa Nucci
(2017) que desconsidera a existência da revelia no direito processual penal,
argumentando que o réu que é citado e não comparece para oferecer defesa, por
tratar-se de direitos indisponíveis, será nomeado ao mesmo defensor, o qual
deverá realizar sua defesa de forma eficiente sob pena de ser substituído por
determinação judicial.
Vale lembrar que revelia confronta
com o princípio contido no art. 5°, LVII da CF/1988: “Ninguém será considerado culpado
até o trânsito em julgado da sentença condenatória”.
Como se refere Capez: (2001):
“Vemos uma aplicação prática deste princípio na proibição expressa de execução
provisória na Legislação Brasileira, pois em regra toda prisão deve acontecer
após o trânsito em julgado.”
Porém, o STF modificou seu
posicionamento a respeito deste tema recentemente, relativizando este
princípio, pois o seu órgão Pleno deliberou que após confirmação da condenação
penal por tribunal, no segundo julgamento, pode iniciar a execução de pena de
forma provisória, antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Tal julgado foi oposto aos
entendimentos antes firmados, que somente admitia a prisão provisória se
comprovado o requisito da cautelaridade, quesito presente no art. 312 CPP e é
visto como um (subprincípio da necessidade).
Este julgado foi alvo de
várias críticas doutrinárias, pois confronta com o princípio da presunção de inocência.
No entanto, STF reconheceu a
reafirmação da jurisprudência, afirmando que a execução provisória de pena[11] não ofende o princípio de
presunção de inocência, nem o artigo 283
CPP, que expressa a seguinte norma: “Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita
e fundamentada da autoridade judiciária
competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do
processo, em virtude de prisão temporária
ou prisão preventiva”. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
§ 1º As medidas cautelares
previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa
ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade. (Incluído pela Lei nº
12.403, de 2011).
§ 2º A prisão poderá ser
efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas
à inviolabilidade do domicílio. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
§ 1º As medidas cautelares
previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for isolada,
cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade. (Incluído
pela Lei nº 12.403, de 2011).
§ 2º A prisão poderá ser
efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas
à inviolabilidade do domicílio. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
O princípio da presunção de
inocência se dissemina por todo processo penal brasileiro, de modo que deve
haver redobrado cuidado para tomar medidas cautelares durante a persecução
penal, tais como a quebra de sigilo bancário, fiscal, telefônico, busca e
apreensão domiciliar, ou até a simples apresentação do indiciado ou réu na
mídia social ou meios de comunicação, pois é possível o prejuízo à sua imagem e
até de sua família.
Outra questão, a revelia não
mancha a presunção de inocência pois não ocorre a incidência dos efeitos
materiais da revelia.
É inegável que existe por
parte do réu, a assunção de riscos decorrentes de sua inércia. Um bom exemplo,
é quando o art. 367 CPP permite que o processo prossiga sem a presença do réu
citado, essa omissão processual gera apenas riscos.
Não se trata de prejuízo
processual, pois não possui carga, de modo que não se pode presumir nada
diverso de sua inocência. Portanto, não há que se cogitar de revelia no processo
penal, pelo menos no sentido próprio da palavra, incluindo omissão e ausência,
não encontra nenhuma reprovação jurídica.
Uma vez que admitir à revelia
e seus efeitos, seria absolutamente incompatível com o processo penal
contraditório.
A presença técnica, ainda que
o acusado esteja ausente (ou seja, citado não comparece, nem constitui
defensor) é uma imposição inarredável fruto de uma opção constitucional por um
procedimento em contraditório, que a produção dos efeitos.
Delmanto Júnior (2004)
complementa: “Sua aplicação afigura-se por si só, totalmente assegurados da
ampla defesa e do silêncio[12], de outro. Pois à revelia
no penal não constitui uma censura ou verdadeiro prejuízo ao réu que não
comparece ao interrogatório ou por exemplo: não permite que lhe seja extraído material
genético para que seja realizada a perícia”.
Pode-se concluir que geraria
um processo penal contumácia, totalmente incompatível com o contraditório,
assegurado no inciso LV do art. 5° CF/1988 e com respaldo no art. 261 CPP. Esta
frisa o caráter irrenunciável e indisponível da defesa técnica, postulando que
se o réu estiver desprovido de advogado, ainda que seja revel, deverá o juiz
nomear um defensor dativo ou público. Caso esta norma não seja cumprida, o
processo será contaminado de nulidade absoluta, por afronta a ampla defesa
(art. 564, III, c).
Em consonância com tal
pensamento, temos a Súmula 708 do Supremo: “É nulo o julgamento da apelação se,
após a manifestação nos autos da renúncia do único defensor, o réu não foi
previamente intimado para constituir outro.
Tal nulidade se dá devido ao
direito que o acusado tem de escolher seu próprio advogado, este direito
constitui um desdobramento do princípio da ampla defesa.
Portanto perante a renúncia do
único defensor, o juiz não pode nomear outro defensor, pois tal nomeação só é
possível mediante a inércia do acusado quando intimado regularmente e não
constitui advogado, nem realiza sua autodefesa, caso tenha habilitação para
tal.
Lembremos do vigente texto
constitucional brasileiro que: "Aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes". (artigo 5º, LV
CF/1988). E, “Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido
processo legal” (CF/1988, art. 5º, LIV).
Portanto, desdobra-se em dois
aspectos: a defesa técnica, exercida por profissional habilitado (indispensável
– CPP, art. 261), e a autodefesa, desempenhada pela própria parte (dispensável
a critério do acusado), e que se manifesta no interrogatório, no direito de
audiência com o juiz (audiência de custódia e comparecimento em juízo), na
possibilidade de interpor, por si, recurso etc. a própria ausência leciona
Fernando Capez poderá ser tida, pelo acusado, como a forma de defesa mais
adequada à situação concreta.
É indispensável, todavia, sob pena de nulidade
absoluta, que ele seja validamente citado ou então intimado a comparecer em
juízo, deixando-se a sua discricionariedade a análise da conveniência de
fazê-lo ou não, pois essa é a própria essência da autodefesa.
O julgamento não será adiado
pelo não comparecimento do acusado solto, do assistente ou do advogado do
querelante, que tiver sido regularmente intimado (art. 457, § 1º) e, no caso da
não condução do acusado preso, admite-se o adiamento do julgamento,
autorizando-se, no entanto, o pedido de dispensa de comparecimento subscrito
por ele e seu defensor (art. 457, § 2º).
Com isso, passou-se a admitir
o julgamento sem a presença do acusado preso, propiciando a ele, juntamente com
o seu defensor, a discricionariedade na análise da conveniência ou não de
comparecer a esse ato.
Saliente-se ainda que não é
dado ao juiz, no caso de ausência injustificada do réu validamente
cientificado, decretar-lhe a prisão preventiva, em vez de mandá-lo conduzir a
sua presença, visto que o encarceramento provisório possui pressupostos próprios,
de natureza cautelar.
A partir das alterações
promovidas pela Lei 10.792/2003, o Código de Processo Penal passou a prever
expressamente que:
“Art. 186. Depois de devidamente
qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado
pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer
calado e de não responder perguntas que lhe foram formuladas. Parágrafo único.
O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em
prejuízo da defesa”. Sobre isso, falaremos mais por ocasião do interrogatório.
Se regularmente citado ou
validamente intimado a comparecer em juízo, o réu deixar de fazê-lo sem motivo,
o processo seguirá à sua revelia, tornando-se desnecessário proceder a sua
posterior intimação para qualquer ato do processo, salvo da sentença.
O mesmo efeito verificar-se-á
na hipótese de o réu, depois de citado, mudar de residência ou dela ausentar-se
por mais de oito dias, sem comunicar à autoridade processante o lugar onde
possa ser encontrado. O subsequente comparecimento do acusado enseja a
revogação da revelia.
Em face dos princípios acima
aduzidos (direito ao silêncio[13], devido processo legal),
conjugados com o da presunção de inocência, fácil é notar que a revelia no
processo penal não possui os mesmos efeitos do processo civil, porquanto não
importa confissão ficta.
Em caso de citação por edital
e posterior desatendimento do chamamento a juízo, sem constituição de defensor,
o processo e o prazo prescricional da pretensão punitiva serão suspensos,
podendo o juiz determinar a produção antecipada de provas urgentes, bem como
decretar prisão preventiva, desde que presentes, neste último caso, os
requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal (cf. CPP, art. 366).
Convém ressalvar que, no caso em que o réu se
oculta para não ser citado, o oficial de justiça certificará a ocorrência e
procederá à citação com hora certa, na forma estabelecida nos arts. 251 a 254,
do CPC, não havendo mais que se cogitar em citação por edital, com os efeitos
do art. 366 (cf. CPP, art. 362).
No caso, completada a citação
com hora certa, se o acusado não comparecer, ser-lhe-á nomeado defensor dativo,
devendo o processo tramitar sem a sua presença (CPP, art. 362, parágrafo
único).
Verifica-se a jurisprudência in
litteris:
"Não é aceitável que o
acusado, após a mudança de endereço sem informar ao Juízo, venha a arguir a
nulidade em razão da revelia, porquanto a vedação ao comportamento
contraditório (venire contra factum proprium) aplica-se a todos
os sujeitos processuais do Direito Processual Penal". Órgão Julgador: STF|
Data da Decisão: 28/02/2023.
A regra que veda o
comportamento contraditório (venire contra factum proprium) aplica-se a
todos os sujeitos processuais. Não é aceitável, portanto, que, após o desinteresse
em acompanhar o processo, com a mudança de endereço sem informar o endereço ao
Juízo, venha o acusado agora arguir a nulidade da revelia.
Outra jurisprudência, in
verbis: 1/04/2020 - JUNTADA DE ACÓRDÃO (Desembargador Eugenio Achille
Grandinetti - 3ª Câmara Criminal) TJPR. Ata do Julgamento: 21/04/2020; Data da
Publicação: 21/04/2020
Ementa
PELAÇÃO CRIME. RECEPTAÇÃO
(ART. 180, CAPUT, DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. TESE DE NULIDADE POR
AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO ACUSADO PARA A AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E
JULGAMENTO. INOCORRÊNCIA. RÉU QUE NÃO ATUALIZOU O ENDEREÇO APÓS CITAÇÃO
PESSOAL. CORRETA A DECRETAÇÃO DA REVELIA. ART. 367, CPP. OBRIGAÇÃO DO ACUSADO
DE COMUNICAR O JUÍZO EVENTUAL MUDANÇA DE ENDEREÇO. PRECEDENTES. PLEITO DE
ABSOLVIÇÃO. DESCABIMENTO. ÔNUS DA PROVA QUE SE INVERTE COM A APREENSÃO DO BEM
NA POSSE DO ACUSADO. CONJUNTO PROBATÓRIO APTO A ENSEJAR A CONDENAÇÃO. AUTORIA E
MATERIALIDADE DEVIDAMENTE DEMONSTRADAS NAS PROVAS COLIGIDAS NOS AUTOS. DOLO
SUFICIENTEMENTE COMPROVADO. DOSIMETRIA ESCORREITA. DESNECESSIDADE DE QUALQUER
ALTERAÇÃO DE OFÍCIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS ARBITRADOS EM FAVOR DO DEFENSOR
DATIVO, COM BASE NA RESOLUÇÃO CONJUNTA Nº 15/2019 - PGE-SEFA, A SEREM
SUPORTADOS PELO ESTADO DO PARANÁ.RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO, COM FIXAÇÃO DE
HONORÁRIOS AO DEFENSOR NOMEADO.
Noutra jurisprudência,
literalmente: Nulidade em ação penal por falta de citação do réu ainda que
tenha havido participação de advogado que atuou no inquérito.
Origem: STJ - Informativo:
580
Ementa Oficial
PROCESSO PENAL. RECURSO
ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 619 DO CPP. NÃO OCORRÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE CITAÇÃO
PESSOAL OU POR MEIO DE EDITAL.
PROCESSO QUE SE DESENVOLVEU
ENTRE O ADVOGADO CONTRATADO NA DATA DA PRISÃO EM FLAGRANTE, O JUIZ E O
PROMOTOR. NÃO COMPARECIMENTO DO ACUSADO A NENHUM DOS ATOS DO PROCESSO.
INEXISTÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA DA CIÊNCIA DA DENÚNCIA. DECLARAÇÃO DA
NULIDADE, DE OFÍCIO, PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. POSSIBILIDADE. PREJUÍZO À
AUTODEFESA. RECURSO ESPECIAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO NÃO PROVIDO.
1. Não ocorre a violação do
art. 619 do CPP quando o acórdão, apesar de contrário à pretensão da parte, se
manifesta expressamente sobre a matéria controvertida.
2. Em matéria de nulidade,
aplica-se o princípio pas de mullet sans grief[14],
segundo o qual não há nulidade sem que o ato tenha gerado prejuízo para a
acusação ou para a defesa, o que, em alguns casos, pode ser evidente, por
raciocínio lógico do julgador.
3. Deve ser mantido o acórdão
estadual que, de ofício, reconheceu a irregular constituição do processo, desenvolvido
sem a presença do réu, pois a citação pessoal foi frustrada e, determinada sua
realização por meio de edital, a diligência também deixou de ser cumprida.
4. A citação é pressuposta de
existência da relação processual e sua obrigatoriedade não pode ser
relativizada somente porque o réu constituiu advogado particular quando foi
preso em flagrante. O fato de o Juiz ter determinado a juntada, nos autos da
ação penal, de cópia da procuração outorgada ao advogado no processo apenso,
relacionado ao pedido de liberdade provisória, bem como que o causídico
apresentasse resposta à acusação, não supre a falta de citação e nem demonstra,
sem o comparecimento espontâneo do réu a nenhum ato do processo, sua ciência
inequívoca da denúncia e nem que renunciou à autodefesa.
5. O prejuízo para a ampla
defesa foi registrado no acórdão estadual, não havendo falar em violação do
art. 563 do CPP. A ampla defesa desdobra-se na defesa técnica e na autodefesa,
esta última suprimida do réu, pois não lhe foram oportunizadas diversas
possibilidades, tais como a presença em juízo, o conhecimento dos argumentos e
conclusões da parte contrária, a exteriorização de sua própria argumentação em
interrogatório etc.
6. Recurso especial não
provido.
(REsp 1580435/GO, Rel.
Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 17/03/2016, DJe
31/03/2016)
Na verdade não é erro e sim
sugestão de adicionar o seguinte julgado do STF de 2017 com situação
semelhante, mas que se diferencia pelo fato de que houve a citação por edital.
(seria interessante a inclusão, pois no MPE-PI foi cobrada questão atinente a
esse julgado do STF e nos concursos ensejou bastante discussão, pois o
raciocínio da maioria foi no sentido do julgado do STJ do Info 580).
E, novamente, a jurisprudência
nos ensina:
PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS
CORPUS. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DO RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO.
HOMICÍDIO. ACUSADO CITADO POR EDITAL. ADVOGADO REGULARMENTE CONSTITUÍDO NOS
AUTOS. RENÚNCIA DOS PODERES 3 (TRÊS) MESES APÓS O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA.
SUSPENSÃO DO PROCESSO E DO PRAZO PRESCRICIONAL. INAPLICABILIDADE DO ART. 366 DO
CPP. NOMEAÇÃO DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA PATROCINAR A DEFESA DO ACUSADO.
IMPOSSIBILIDADE DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO ACUSADO PARA CONSTITUIR NOVO DEFENSOR.
AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE.
1. A Primeira Turma do Supremo
Tribunal Federal e as Turmas que compõem a Terceira Seção do Superior Tribunal
de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus,
passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de
impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão
da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.
2. A teor do art. 366 do CPP,
a suspensão do processo penal e do prazo prescricional, somente é possível
quando o acusado, após citado por edital, não comparece e não constitui
advogado nos autos.
3. No caso, embora o paciente
tenha sido citado por edital, constituiu, desde a fase inquisitorial, advogado
nos autos com amplos poderes, o que demonstra que conhecia da imputação contra
ele dirigida.
4. A renúncia do advogado
deu-se 3 (três) meses após o recebimento da denúncia, inexistindo ilegalidade
na decisão do Juízo de primeiro grau que determinou o prosseguimento do feito
com a nomeação da Defensoria Pública para patrocinar a defesa do acusado, uma
vez que não seria possível intimá-lo pessoalmente para constituir defensor de
sua confiança, tendo em vista encontrar-se em lugar incerto e não sabido. 5. Habeas
corpus não conhecido. (HC 338.540/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA
FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 14/09/2017, DJe 21/09/2017).
Há inclusive doutrinadores que
entendem que decretar o réu como revel no processo penal é incompatível com a
Constituição Federal.
Além disso, é importante
ressaltar que a revelia no processo penal não implica a ausência de defesa.
Mesmo na condição de réu revel, o acusado ainda tem o Direito de ser
representado por um defensor, seja um advogado particular ou um defensor
público nomeado pelo tribunal.
A revelia em situações
específicas, conforme estabelecido pelo Código de Processo Penal (CPP). Vejamos
algumas circunstâncias em que se pode decretar a revelia:
Artigo 366 CPP: estabelece que
caso o acusado citado por edital não compareça nem constitua advogado, o juiz
ordenará a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, podendo
determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o
caso, decretar prisão preventiva;
Artigo 367 CPP: pode-se
decretar a revelia quando o acusado, mesmo sendo citado ou intimado
pessoalmente para qualquer ato, deixa de comparecer sem motivo justificado.
É possível contestar a revelia
quando a sentença for proferida sem que tenha sido citado o réu, ou num caso em
que a citação foi inválida, ou infrutífera, podendo o réu propor demanda
autônoma para impugnar a sentença.
Referências
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CARVALHO LOPES, Bruno
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limite ao exercício do direito ao silêncio pelo réu: o abuso do direito ao
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DELMANTO JUNIOR, Roberto. "Inatividade
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GRECO, Rogério. Curso de
Direito Penal: Parte Geral. 19ª ed. Niterói: Ed. Impetus, 2017.
HADDAD, Carlos Henrique
Borlido. Conteúdo e contornos do princípio contra a autoincriminação.
Campinas: Ed. Bookseller, 2005.
JARDIM, Afrânio Silva. Reflexão
Teórica sobre o Processo Penal. Disponível em:
https://www.mprj.mp.br/documents/20184/2306220/Afranio_Silva_Jardim.pdf/ Acesso
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LEITE, Gisele; HEUSELER, Denise. Análise da revelia e seus efeitos. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-civil/analise-sobre-a-revelia-e-seus-efeitos-parte-i/#google_vignette Acesso em 9.2.2024.
MARQUES. José Frederico. Elementos
do Direito Processual Penal. 2ª ed. Campinas:
Millenium. Vol. II, 2000.
MARQUES. José Wilson. O
instituto da Revelia (2003): Disponível em: www.mp.ce.gov.br Acesso em
9.2.2024.
MENDES, Gilmar Ferreira. II. Limitações
aos Direitos Fundamentais. p. 156-211. In: MENDES, Gilmar Ferreira;
BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 15ª ed. São
Paulo: Saraiva Educação, 2020.
NUCCI, Guilherme. Organização
Criminosa. Rio de Janeiro: Forense, 2019.
______________. Código
Penal Comentado. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
PACELLI Eugênio de Oliveira. Curso
de Processo Penal. 10ª edição. Rio
de Janeiro: Editora Lumen Juris,2008
PACELLI. Eugênio. Curso de
Processo Penal. São Paulo: Atlas, 2017.
PASSOS, José Joaquim Calmon
de. Comentários ao código de processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 1983.
STJ. Súmula 415 do STJ "A
decisão que determina a produção antecipada de provas com base no art. 366 do
CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero
decurso do tempo".
Súmula 415 - O período de
suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada. Data da Publicação – DJ em 16-12-2009.
REZENDE FILHO, Gabriel José
Rodrigues. Curso de direito processual civil. 2ª ed. São Paulo: Saraiva,
1950.
TUCCI, Rogério Lauria. Da
contumácia no processo civil brasileiro. São Paulo: José Bushatsky, 1964.
TOURINHO, Filho da Costa,
Fernando. Manual de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2015.
Notas:
[1]
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a revelia de
réu não basta para que seja decretada a prisão preventiva dele. A pessoa
denunciada por crime tem o direito de não comparecer a interrogatórios e cabe a
ela decidir se quer suportar as consequências de não participar dos atos
processuais e da construção da sentença. Processo (s) Relacionado (s): STJ: HC
104617
[2] “Contumácia, ou revelia, é o não
comparecimento em juízo da parte - autor, réu, ou ambos, - omitindo-se
totalmente na efetivação de suas pretensões” (TUCCI, Rogério Lauria. Da
contumácia no processo civil brasileiro. São Paulo: José Bushatsky, 1964. p.
97); PASSOS, José Joaquim Calmon de. Da revelia...cit. p. 13-14; REZENDE FILHO,
Gabriel José Rodrigues. Curso de direito processual civil. 2ª ed. São Paulo:
Saraiva, 1950. p. 124. v. II.
[3]
A inatividade da parte deve ser encarada como a não observância de um ônus –
imperativo do próprio interesse – que acarreta uma desvantagem, excluindo-se,
ao menos a priori, o caráter subjetivo da omissão. Num primeiro momento, não
importa a voluntariedade da ausência, o que realmente interessa é a verificação
do fato dessa ausência no processo.
[4]
O ônus difere do dever, pois este seria um imperativo fixado para a satisfação
de interesse alheio ou público. A não observância de um dever implica um
ilícito, importando em uma sanção jurídica, quando a não observância de um ônus
implica tão só em efeitos econômicos negativos. O ônus e o dever têm em comum o
elemento formal, consistente no vínculo à vontade, mas divergem no elemento
substancial, na medida em que neste, o vínculo é posto para satisfação do
interesse alheio, enquanto naquele, é posto para satisfação do interesse
próprio.
[5]
No magistério de Guilherme Tambarussi Bozzo e Eduardo Espínola o termo
“revelia” também é igualmente equívoco. Alguns autores entendem se tratar
apenas da inatividade do réu em contestar ou responder. Outros, mais antigos,
utilizam o termo revelia tanto para a inatividade do autor, como para a
inatividade do réu. Etimologicamente, todavia, o termo deriva do latim, rebellis,
ou seja, rebelde, desobediente. A desvantagem da compreensão etimológica é
remeter o estudioso aos problemas da vontade na omissão dos atos processuais.
[6]
Para a adequada compreensão do significado da litis contestatio no processo
romano é necessário analisar individualmente cada um dos sistemas processuais
que se sucederam na época - as legis actiones, o processo formular e a cognitio
extra ordinem.
[7]
Tal tese é reforçada pela atual previsão do artigo 485, sexto parágrafo do
CPC/2015, no sentido de ser possível ao réu optar entre a extinção ou a
prosecuzione do processo, como já ocorria através da Súmula 240 do STJ.
[8] Segundo
a relatora, a prisão preventiva só pode ser decretada quando forem preenchidos
os requisitos do artigo 312 do CPP e não como decorrência automática do artigo
366. Ela avaliou que, a não ser a gravidade do crime, não há demonstração
concreta de que, solto, o denunciado colocará em risco a ordem pública.
Processo (s) Relacionado (s): STJ: HC 104617
[9]
Conclui-se que, decorrido o tempo máximo de suspensão, para o réu revel citado
por edital, nos termos da Súmula 415 do Superior Tribunal de Justiça, deve ser
retomado apenas o curso do prazo prescricional, mantendo-se a suspensão do processo,
pois determinar o prosseguimento da marcha processual sem a citação pessoal do
réu seria albergar um abrandamento dos princípios constitucionais do
contraditório e da ampla defesa, o que não pode ser admitido no Estado
Democrático de Direito.
[10]
A Lei nº 9.613 de 1998 descreve o crime de “lavagem” ou ocultação de bens,
muito conhecido como lavagem de dinheiro, que consiste no ato de ocultar ou
dissimular a origem ilícita de bens ou valores que sejam frutos de crimes. A
denominação de lavagem de dinheiro surgiu, pois o dinheiro adquirido de forma
ilícita é sujo, e necessita ter uma aparência de legalidade; ou seja, precisa
ser lavado para parecer limpo. Um exemplo desse tipo de crime é a compra, com
dinheiro ilícito, de obras de arte ou produtos de luxos para revendê-los em
seguida, para dar a aparência de uma operação comercial legal. A pena prevista é de 3 até 10 anos de
reclusão e multa. A Lei prevê penas maiores para os casos nos quais o crime
ocorra de forma reiterada ou por intermédio de organização criminosa.
[11] De forma geral, podemos dizer que a execução
provisória é aquela que executa a pena provisoriamente, ou seja, o juiz do
conhecimento manda cumprir a decisão judicial condenatória não transitada em
julgado enquanto ainda se aguardam o julgamento de recursos e a chegada de uma
decisão certa, definitiva. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento das Ações
Declaratórias de Constitucionalidade nº 43, 44 e 54, modificou o entendimento
até então vigente, para firmar orientação no sentido de que a prisão, para fins
de cumprimento de pena, somente é permitida após o trânsito em julgado da
sentença penal condenatória, salvo se presentes os requisitos do artigo 312 do
Código de Processo Penal, quando, então, poderá ser decretada a prisão
preventiva. Acórdão 1269675, 00147318820178070016, Relator: DEMETRIUS GOMES
CAVALCANTI, Terceira Turma Criminal, data de julgamento: 6/8/2020, publicado no
DJE: 17/8/2020.
[12] No âmbito penal, corroborando os abusos no exercício de um direito, abstraem-se as disposições dos excessos das excludentes de ilicitude. Um exercício irregular de um direito, como uma legítima defesa exercida além de seus limites. Sobre o excesso, os resultados que dizem respeito às condutas praticadas nos limites permitidos por essa excludente estão amparados por essa causa de justificação; os outros resultados que surgiram em virtude do excesso, por serem ilícitos, serão atribuídos ao agente, que por eles terá que ser responsabilizado. Tais excessos poderiam ser dolosos ou culposos: mas sempre imputáveis ao agente que incorreu no excesso, ou seja, abusou dos limites das excludentes entregues pela lei. No processo penal, há algumas pessoas que não poderão fazer uso do direito previsto ao réu, direito esse que possui caráter constitucional. Há, no ordenamento jurídico, previsão normativa da obrigação de falar. Mais: obrigação de dizer a verdade, em um interrogatório, sob pena de incorrer em crime.
[13]
A origem do direito ao silêncio ou do direito de não autoincriminação emana da
presunção de inocência: "Tais conseqüências - direito individual de não
produzir provas contra si mesmo, de um lado, e obrigação estatal de não tratar
qualquer pessoa como culpada antes do trânsito em julgado da condenação penal,
de outro - qualificam-se como direta emanação da presunção de inocência, hoje
expressamente contemplada no texto da vigente Constituição da República
(CF/1988, art. 5º, inciso LVII). A
máxima latina nemo tenetur prodere se ipsum, conexa à nemo tenetur se
detegere, não possui suas origens no direito romano, mas sim no Ius
Commune europeu. O direito da Europa Medieval – Ius Commune – era um
direito culto, formado por dois direitos: i) o direito civil, originário das
compilações do Corpus Iuris Civile de Justiniano; ii) o direito
canônico, cujos ditames estavam nas coleções que viriam a formar o Corpus
Iuris Canonici. A princípio, o direito canônico se destinava à
administração interna da Igreja Católica Apostólica Romana. Entretanto,
gradualmente, sua jurisdição estendeu-se para atingir: i) objetivamente, qualquer
matéria concernente à fé; e ii) subjetivamente, qualquer leigo que possuísse
relação com a Igreja.
[14]
Trata-se, então, de se voltar a atenção não aos efeitos jurídicos dos atos
processuais, mas sim às finalidades alcançadas, mesmo por efeitos jurídicos
diversos, inesperados, imprevisíveis ou colaterais dos atos questionados. Pas
de nullité sans grief não significa que a nulidade só será declarada se for
demonstrado o prejuízo. Seu sentido é outro. Quer dizer que não se declara a
nulidade se for possível demonstrar a inocorrência de prejuízo.