O histórico do Tribunal do Júri no sistema penal brasileiro

O Tribunal de Júri sintetiza tudo do inquérito policial todo enredo até a apreciação do plenário, segundo alguns, é uma caixa de surpresas. Por ser um Tribunal Popular representa canal aberto e comunicante, do povo com a Justiça, sendo expressão máxima de democracia.

Fonte: Gisele Leite

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Introdução

Piero Calamandrei nos legou uma frase primorosa, in litteris: "Para encontrar a justiça, é necessário ser-lhe fiel. Ela, como todas as divindades, só se manifesta a quem nela crê".

O Tribunal do Júri desde a Antiguidade Clássica e a Idade Média e até sua instituição no ordenamento jurídico pátrio percorreu longo trajeto histórico e doutrinário. O tribunal do júri é também conhecido

como tribunal popular e se encontra presente na ordem jurídica brasileira desde 1822 e, veio sofrendo alterações até chegar a patamar atual e vigente previsto no Código de Processo Penal brasileiro e na Constituição Federal brasileira de 1988.

As referidas modificações ocorreram no âmbito procedimental, no de sua competência e expõe tanto pontos positivos como negativos, sob a leitura doutrinária e jurisprudencial. A origem do Tribunal do Júri nos faz analisar os sistemas que regem o Processo penal brasileiro.

Esclarece a doutrina clássica, em geral, os sistemas processuais são classificados em: inquisitivo, acusatório e misto, por força de suas características como os procedimentos de acusação e defesa, meios e sistemas de prova e eficácia de suas decisões.

Lembremos que o sistema inquisitivo, a priori, consiste no julgamento realizado por um magistrado, que é sempre funcionário ou autoridade governamental. Nesta modalidade, as tarefas de acusar, defender e julgar eram de incumbência do próprio magistrado e, por conta disto, não haveria contraditório e ampla defesa, tendo a prova valor tarifário. Por derradeiro, destaca-se a inexistência de trânsito em julgado da decisão, podendo esta ser revista a qualquer momento.

Em relação ao sistema acusatório, trata-se de um sistema em que o julgamento incumbia aos populares (jurados) ou a órgãos jurisdicionais imparciais.

Nesse aspecto. percebe-se a distinção entre a atividade persecutória e a jurisdicional, não podendo o magistrado exercer ambas, lhe cabendo apenas, por força de seu cargo, a atividade jurisdicional. Quanto às provas, rege sobre esse sistema o princípio do livre convencimento e já se reconhece a existência de coisa julgada das decisões.

No sistema misto, o processo é compreendido em duas fases, a saber: a instrução[1] e o julgamento, sendo evidente a divisão de tarefas dos órgãos estatais, cabendo a um destes, a atividade persecutória e, a ouro, a atividade jurisdicional.

Interessante destacar o sistema antropológico de Heráclito Mossin (In: Curso de Processo Penal, 1997). Tal sistema é proveniente da escola positivista italiana e tendo pela frente o magistrado. Garofalo, o professor de direito penal Ferri e o médico Lombroso, baseava-se em fatores antropológicos, com mescla de elementos do tipo acusatório e inquisitório.

Assim, no que tange ao surgimento do tribunal do júri, os historiadores acreditam que os povos primitivos como chineses e hebreus já apresentavam organização semelhante ao que se reconhece como júri e tribunal popular.

É fato notório é que a civilização romana reúne a maior semelhança, sendo considerada seu leito de origem. É bem verdade que, na Grécia antiga também já existia organização que parecida, qual seja os heliastas, devendo-se registrar ainda, os centeni comites assim denominados entre os germânicos.

Ainda assim, há quem entenda que do credo religioso teria sido instituído, inicialmente, a primeira forma de júri, dado ao silogismo que este até hoje mantém. Ademais, o termo "júri" detém uma conotação originária religiosa, eis que advém de “juramento", ou seja, uma invocação a Deus.

Apontando a influência religiosa Tourinho Filho (Processo Penal, 2003, vol. 4, p. 82), aponta que: A denominação “jurados” adveio precisamente do fato de aquelas pessoas prestarem um juramento – ‘This body of twelve was called a jury (jurata), because it was put on oath before giving its verdict; its members were jurors (juratores) persons who have been sworn’.

‘Este corpo de doze foi chamado de júri (jurata), porque foi jurado antes de dar seu veredicto; seus membros eram jurados (juratores) pessoas que prestaram juramento”.

Remontam as origens do Tribunal do Júri à Grécia, mais particularmente, a Atenas, quanto em Roma que guardam semelhanças com a organização e forma do Tribunal do Júri. Em Atenas já se notava a distinção entre os delitos de natureza pública e os de natureza privada. E, ipso facto, cada um destes delitos possuía seus respectivos processos penais (iudicium privatum e publico).

Naturalmente, os delitos de natureza pública reconhecidos como maiores potenciais ofensivo pois atingiam os interesses coletivos, e, assim, o direito à persecução cabia aos cidadãos. Todavia, o crime contra a pátria, o ordenamento jurídico pátrio atribuía ao magistrado a competência para promover a peça exordial da ação competente, restando o julgamento a cargo do Senado ou da Assembleia do Povo e a persecução a um cidadão nomeado para tal fim.

Já em relação aos crimes de natureza privada, o próprio ofendido e seu representante detinham a legitimidade para a propositura da ação competente e, em Atenas, o Tribunal dos Heliastas consistindo esse tribunal um órgão julgador de causas públicas e privadas, com exceção de crimes de sangue que competiam ao Areópago. Os heliastas, que eram membros do tribunal, eram escolhidos dentre os atenienses que tiveram pelo menos trinta anos, uma conduta ilibada e que não fossem devedores do Erário.

E, o número de integrantes desse tribunal alcançava cerca de seis mil. O julgamento de diferentes causas era sempre acompanhado de dois sentidos, um referente aos jurados, que se dava por meio de escolha de bolas brancas (participação em julgamentos por um ano) e bolas pretas (dispensa do julgamento).

Já o segundo sorteio[2] era referente ao local do julgamento (Ágora ou Odeon) evitando-se as possíveis fraudes.

Para cada causa, de acordo com a relevância do julgamento, sempre em número ímpar para que não ocorresse o empate, devendo-se registrar que a atividade era remunerada por sessão de trabalho. Já no âmbito procedimental era formulada a denúncia perante o magistrado, sendo exigido do acusador as provas que demonstrassem a existência do crime, sendo depois convocados os cidadãos que fossem compor o juízo, prestando o respectivo juramento.

A acusação era feita no pretório e tinha por fim de permitir a produção de provas que pudesse ou repelir ou fortalecer os argumentos expostos. Assim, o acusado era intimado para reclamar o prazo[3] para o oferecimento de sua defesa.

Após as razões da acusação, era o momento que o acusado tinha para expor a sua defesa e ouvir testemunhas. Se este não comparecesse implicaria em revelia, prevalecendo-se as alegações do acusador. Por fim, era determinada a colheita dos votos, sobre a culpabilidade e aplicação de pena, devendo o julgamento ser realizado até o pôr do sol e publicamente.

As sessões de trabalho para julgar os casos apresentados eram chamadas dikasterias e as pessoas que compunham o júri eram referidas como dikastas em vez de heliastas. Os dikastas eram apenas cidadãos exercendo um serviço público oficial, e sua função se aproximava mais da de um jurado moderno. A decisão final do julgamento era dada por votação secreta, refletindo a vontade da maioria.

Registram-se relatos de que a Lei do Ostracismo, contra os crimes que atentavam à democracia e os crimes de pleito a tirania, que fora criada por Clístenes, também constituía um tribunal popular. E o julgamento ocorria através de um pedaço de argila, chamado de ostracum, onde a assembleia votava.

Quanto ao Areópago, sua competência era exclusiva para julgamento de crimes de sangue e seus integrantes seguiam somente os ditames de sua consciência, guiados pela prudência ditada por um senso comum jurídico.

Em Roma deu-se a mesma distinção de delitos havida entre os gregos, em face da natureza dos delitos, de forma a existir três períodos no processo penal romano, a cognitio, a inquisitio e a accusatio.

Na República romana, a transição entre a cognitio e accusatio, deu origem a chamada justiça centurial.

Denota-se na organização jurisdicional romana as chamadas quaestiones perpetuae, órgão composto inicialmente por patrícios, visto que os plebeus vieram a integrar a atividade jurisdicional em momento posterior, presentes nesse procedimento a oralidade e publicidade.

Walter Vieira do Nascimento ressalta que (Lições de história do direito, 1999, p. 153-154): Aliás, a lex Licínia, de 55 a.c., que continha dispositivo sobre a formação por sorteio de um corpo de jurados em número de cinquenta e um. Esses jurados[4] prestavam o compromisso de bem desempenharem suas funções judiciárias no processo, e seus nomes passavam a constar de uma lista que ficava arquivada no gabinete do pretor.

Tratava-se de um órgão cuja composição variava de 35 a 75 membros, sendo presidido por um quaestor que, além de organizar e sortear os membros, pronunciava o resultado do julgamento.

Com a acusação por parte de um cidadão, ficando este comprometido com o processo sob pena de abandono, o quaestor verificava os pressupostos de procedibilidade, se o fato constituía crime, bem como outros critérios de competência.

No sistema romano, qualquer cidadão (pessoa com mais de 30 anos) poderia exercer o direito de acusação, com exceção dos incapazes (mulheres), escravos e dos indignos – pessoas reprováveis - as quais fora cominada a infâmia.

Uma vez verificada a admissibilidade do procedimento, a acusação era formalizada através da nominis delatio, ou seja, peça em que eram descritos os fatos típicos, a qualificação do acusado e, ainda, de sua conduta.

A eleição dos membros do tribunal, judices jurati, se dava através dos senadores, cavaleiros e, depois, dentre os cidadãos desde que observadas as condições morais, econômicas, sociais e culturais podendo haver recusas imotivadas pelas partes convocadas.

Depois, era finalmente designada a data de audiência dirigida pelas partes, sendo o quaestor e os iudices espectadores, momento em que eram produzidas as provas, além da realização de debates. A sentença era formalizada pelo quaestor, não se conhecendo qualquer modalidade de recurso, pois as decisões eram proferidas pelo próprio povo, não havendo, portanto, o órgão competente para apreciação.

Há outra instituição romana que igualmente guarda similitude com o Júri que era a provocatio ad populum, espécie de recurso, julgado por populares que revisava as decisões do Cônsul. Essa competência passou, em momento posterior ao visto que as reformas das decisões do Cônsul, traziam um certo desprestígio.

No direito comparado moderno, o Tribunal do Júri surge como uma das instituições jurídicas que detém expressiva legitimidade para a aplicação do ius puniendi sendo inserido nas mais diversas ordenações legais mundiais. Que guarda em sua essência, a ideia de julgamento popular seja de uma infração cível ou criminal.

Alguns estudiosos acreditam que na Inglaterra antiga, no período depois do Concílio de Latrão, em 1215, no século XIII, quando este Concílio aboliu a ordália ou Juízos de Deus, se desenvolveu a instituição do Júri.

E, nesse sentido, endossou Tourinho Filho, in litteris: “Antes da instituição do júri, na Inglaterra, as infrações penais graves eram reprimidas de duas formas, ambas brutais: execução sumária, para os que fossem presos em estado de flagrância, e o appeal of felony, pelo qual o acusado submetia-se a um duelo judiciário com a pessoa que o denunciara (vítima ou familiares). Se fosse vencido antes do anoitecer, era condenado; se ganhasse ou não fosse vencido naquele espaço de tempo, era absolvido”.

Percebe-se que o júri surgiu envolto em aspecto religioso e por conta da necessidade de julgar os crimes praticados com caráter místico. E, assim, o julgamento era arquitetado com a participação de doze homens da sociedade que teriam a "consciência pura" e que se julgavam detentores da verdade divina para a apreciação de fato lido como ilícito e para a aplicação do respectivo e merecido castigo.

Segundo Antonio Scarance Fernandes, in Processo Penal Constitucional, in verbis (p.168-169): “Lembra Greco Filho que, antes de João Sem Terra, no tempo de Henrique I, este “outorgara uma Carta que prometeu cumprir, e se desenvolveu a instituição do júri, composto de pessoas do local, convocadas para apreciar a matéria de fato nos processos criminais, o que representava uma garantia de justiça.” Salienta que o “crime passou a ser considerado um atentado à paz real e foi avocado para as cortes oficiais, primitivamente presididas pelos sheriff e, posteriormente, pelos juízes vindos da Corte Real, assistidos pelos júris locais”.

Dada a seriedade do julgamento, particulares passaram a pedir para usar do júri real para a solução de suas pendências, o que foi admitido mediante pagamento”. Representou “enorme evolução das ordálias ou juízos divinos”, e assim, “todo indivíduo passou a preferir ser julgado por ele, porque composto de vizinhos que apreciavam a informação de testemunhas”. É, assim, o júri na Inglaterra anterior à Magna Carta.

Com esta, o júri é mantido e reafirmado, figurando como garantia do indivíduo: “Nenhum homem livre será encarcerado ou exilado, ou de qualquer forma destruído, a não ser pelo julgamento legal de seus pares e por lei do país”.

Destaca-se, portanto, o nítido viés religioso não apenas no juramento feito por seus integrantes, como também no número de jurado, uma provável alusão aos doze apóstolos de Cristo, eis que o poder dado aos homens comuns reunidos sob a invocação divina para análise dos fatos, implicaria na verdade real, eis que a tarefa era exclusivamente encarregada a Deus.

Também a própria fórmula do juramento do júri inglês também denota o caráter místico, tendo expressa a invocação de Deus. No direito britânico, o juiz se externaliza através da Assize of Claredon e da jurata, sendo a primeira a instituição encarregada de julgar ações relativas ao proprietário, isto é, um corpo de jurados para definir questões definidas e específicas.

E, a jurata, referia-se a um conselho convocado com o fim de decidir questões de fato que pudessem surgir, eventualmente, no trâmite do julgamento de uma ação que não se referia ao proprietário;

Com o tempo, a jurate absorveu a Assize, sendo igualmente o procedimento criminal absorvido.  E, a respeito da Assize of Claredon, Tourinho elucidou que: "(...) passou a haver, em cada localidade, o Grand Jury, constituído, em princípio por, de 12, e, mais tarde, de 24 cidadãos. (...) os ingleses criaram o Petty Jury. Durante muitos séculos coexistiram o Grande Júri e o Pequeno Júri, este constituído de 12 cidadãos e aquele de 24. Enquanto o Grand Jury limitava-se a arregimentar provas acusatórias, cumpria ao Petty Jury apreciar o mérito, condenando ou absolvendo."

Destaca-se que o Pequeno Júri, de início, não era composto de cidadãos imparciais, mas de testemunhas do fato que, inclusive, na ausência de indícios, deveriam realizar diligências investigatórias.

Quanto ao Grande Júri, cabia a manifestação sobre a pronúncia ou impronúncia do acusado. Noutros termos, tratava-se de um juízo de probabilidade de indícios de materialidade delitiva e de autoria. Não apenas na Inglaterra, mas o povo germânico também adotou a votação por julgamento popular, através dos centeni comites.

A França também adotou o júri, conforme relata Lise Anne de Borba: “No ano de 1789, a Revolução Francesa, baseada em ideias iluministas, refletiu também sobre a organização judiciária, tanto que pouco tempo depois, em trinta de abril de 1790, foi baixado Decreto consagrando o Júri criminal como instituição judiciária”.

A similitude do modelo francês ao das colônias inglesas, no que se refere à formulação da declaração dos direitos humanos e ao Tribunal do Júri, é bem visível. Todavia, o júri na França tinha conotação política.

A referida conotação decorreu do fato de que os votos do eleitor e do jurado eram reais símbolos da soberania, sendo que o sufrágio era direito, enquanto o julgamento era obrigação.

O julgamento popular na França, em geral, se resumia à matéria criminal, observando-se que o cidadão deveria alistar-se como jurado. E, a não inscrição deste como jurado, o impedia de concorrer a qualquer função pública pelo prazo de um biênio.

O júri, na América do Norte, se consolidou por volta do século XVII, ainda que não existisse constituída uma nação independente, abrangendo o julgamento de diversas causas.

Enumeramos abaixo seis julgamentos brasileiros considerados emblemáticos e que tiveram grande repercussão na imprensa nacional e internacional:

CASO DOCA STREET (1976): Raul Fernando do Amaral Street (Doca Street) seguiu sua amásia Ângela e desferiu vários tiros contra sua face e nuca, culminando por matá-la. Houve dois júris, no primeiro, a pena de Doca Street foi de dois anos, com direito à sursis, o segundo, por sua vez, elevou a pena do acusado para 15 anos de reclusão.

CASO RICHTHOFEN (2002): O casal Manfred Albert von Richthofen e Marísia von Richthofen foi assassinado a pauladas enquanto dormiam pelos irmãos Daniel e Cristian Cravinhos a mando da filha Suzane von Richthofen. Suzane e Daniel foram condenados a trinta e nove anos de reclusão, mais seis meses de detenção. Cristian foi condenado a 38 anos de reclusão, mais seis meses de detenção.

CASO ELOÁ (2008): Trata-se do mais longo sequestro (mais de 100 horas) em cárcere privado já registrado pela polícia do Estado de São Paulo que adquiriu grande repercussão nacional e internacional. Lindemberg Fernandes Alves (22 anos), invadiu o domicílio de sua ex-namorada, Eloá Cristina Pimentel (15 anos) onde ela e colegas realizavam trabalhos escolares. Dois reféns foram liberados, restando no interior do apartamento, em poder do sequestrador, Eloá e sua amiga Nayara Silva. Durante a invasão da polícia no apartamento, Lindemberg atirou no rosto de Nayara e em Eloá, que não resistiu. O sequestrador foi condenado à pena de 39 anos e três meses de prisão por um homicídio, duas tentativas de homicídio, cinco cárceres privados e quatro disparos de arma de fogo.

CASO ISABELLA NARDONI (2008): Também em São Paulo, Isabella de Oliveira Nardoni de apenas cinco anos foi jogada do sexto andar por Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, respectivamente pai e madrasta da criança. O júri considerou o casal culpado por homicídio triplamente qualificado e fraude processual. Alexandre Nardoni foi condenado a 31 anos, 1 mês e 10 dias e Anna Carolina Jatobá, a 26 anos e 8 meses, em regime fechado. Pela fraude processual, devem cumprir ainda 8 meses e 24 dias, em regime semiaberto.

CASO ELIZA SAMUDIO (2010): Após investigações sobre o desaparecimento da modelo e atriz Eliza Silva Samúdio, Bruno Fernandes, que era goleiro do Flamengo, juntamente com outros réus, foram acusados de homicídio. Bruno foi condenado a 22 anos e 3 meses de prisão em regime fechado.

MÉRCIA MIKIE NAKASHIMA (2010): A advogada Mércia Mikie Nakashima de 28 anos foi trancada dentro do carro e morreu afogada na represa de Nazaré Paulista, interior de São Paulo pelo seu ex-namorado e seu ex-sócio, Mizael Bispo de Souza. Mizael foi condenado a 22 anos e 8 meses de reclusão. Foram consideradas circunstâncias agravantes que qualificaram o crime: motivo torpe (fim do namoro), emprego de meio cruel (tiros em pontos vitais do corpo) e impossibilidade de defesa da vítima. Ele cumpre pena no presídio militar Romão Gomes, na capital, por ser policial reformado.

Como bônus, no cenário internacional, indicamos para estudo o caso O.J. SIMPSON (1994): Em 1994, o jogador de futebol Orenthal James (O.J.) foi acusado e preso pelo assassinato (golpes de faca) de sua ex-esposa Nicole Brown e de seu amigo Ronald Goldman. O julgamento sofreu inúmeras tensões e influências oriundas de manifestações contra a truculência e racismo pela polícia americana, dividindo, inclusive a opinião popular. O júri inocentou O.J. por dez votos contra dois. A série "American crime story: The people X O.J. Simpson" retrata da data do fatídico episódio até o veredicto final.

Para proteger seus súditos normandos de natural hostilidade dos conquistados, Guilherme instituiu o presentment of Englishery, o primeiro júri inglês. Naquela época, o irracional dominava o processo, até 1215, o júri então era chamado genericamente jury of presentment, apenas apresentava o suspeito ao sheriff. A palavra derivada de shire, reeve, isto é, oficial do rei do condado que o admitia a julgamento nas shire and hundred courts, por ele presididas.

Entretanto, parece ter havido uma razoável presunção de inocência e certa incapacidade de produzir ou aceitar as provas de autoria fornecidas pelo jury of presentment, pois era corrente os recursos às ordálias, procedimento místico que proporcionava ao acusado a possibilidade de um juízo indubitável e soberano - o de Deus.

O rigor dos juízos, entretanto, era frequentemente abrandado pela fraude nas ordálias, inspirada pela dúvida, evidentemente velada, sobre a justiça do método e pela compaixão que frequentemente o suplicado suscitava.

As ordálias consistiam em submeter o réu às provas físicas, muitas vezes supliciantes, em que se acreditava que a intervenção divina imprimiria no corpo do verdadeiro criminoso a sua culpa. Os clérigos aplicativos as provas, que, segundo consta, eram ponto culminante da missa.

Henrique II (1154-1189) bisneto por linha materna de Guilherme, o Conquistador, introduziu as inovações judiciárias que marcaram o início do triunfo da common law, isto é, o direito comum a toda a Inglaterra, sobre os ordenamentos jurídicos particularistas, baseados nos costumes de cada localidade e submetidos à autoridade de um senhor eclesiástico ou temporal inferior ao rei.

Para potencializar a tendência centralizadora deste período da monarquia inglesa, o soberano recorreu sobretudo a duas construções de inspiração jurídica, mas com profundas implicações políticas: o conceito de King's peace e o domínio pessoal do rei sobre a totalidade das terras.

O júri inglês é instituição de origem medieval e foi irradiada para todos os países onde se deu o expansionismo britânico. Era baseado na common law e, surgiu a partir de 1066 pelo conquistador normando Guilherme, tendo como remota reminiscência direta a inquisitio praticada pelos reis carolíngeos, que tinha uma inquirição coletiva sob juramento que o soberano dirigia aos seus cavaleiros.

O Rei Conquistador aportou na Inglaterra juntamente com as hordas de guerreiros leais que se instalaram por toda parte, desapossando os senhores anglos e saxões, introduzindo nova cultura e novos costumes. 

Os historiadores costumam apontar a adoção do estatuto da terra vigente no continente como marco inicial do feudalismo inglês clássico. E, seguindo o costume feudal, a propriedade fundiária passou a ser regulada por hierarquia, cujo topo estava o rei suserano último da terra e, na sua base, os servos da gleba, provedores de todo o trabalho produtivo.  

Os extremos eram intermediados por complexa rede de direitos e obrigações sociojurídicas envolvendo os senhores de variado poder e riqueza, que pode ser simplificada assim: concessão de terra e proteção física por parte do senhor superior, em troca de fidelidade militar, tributos e diversos serviços por parte do senhor inferior.

O primeiro conceito corresponde ao movimento de publicização do direito criminal, isto é, o predomínio da ideia de perturbação da paz pública sobre a ênfase no dano privado. Seus instrumentos jurídicos foram o Assize of Clarendon (1166) e o Assize of Northampton (1176), ordenações que excluíram a competência das cortes costumeiras e senhoriais para o julgamento dos crimes mais graves, atribuindo-a aos King's Justices, juízes itinerantes que iam de condado em condado acolhendo indiciamentos pelo júri e determinando os procedimentos do juízo[5].

Esta é a origem histórica da Court of the King's Bench. Já o segundo conceito radicaliza uma concepção feudal dos direitos de propriedade imobiliária e possibilita ao rei a avocação dos conflitos de terra, o que foi possível graças ao writ of right, instrumento mandamental que da ao seu detentor acesso à corte que futuramente receberia o nome de Court of Common Pleas.

No ano de 1215, o Quarto Concílio de Latrão[6], comandado pelo Papa Inocêncio III, provocou uma significativa reviravolta na instituição do júri, ao proibir aos clérigos sua participação nas ordálias. Sem o concurso dos religiosos, o método místico de determinação da verdade judicial perdeu totalmente seu prestígio.

Em face da decadência do procedimento da ordália, os ingleses adotaram, criativamente, o trial jury ou petty jury.

Os grupos de membros da comunidade, que até então apenas pronunciava um acusado, passaria, a partir de então, a efetivamente julgá-lo com base no seu conhecimento pessoal dos fatos. O já conhecido e disseminado jury of presentment era, no entanto, necessariamente parcial, devido às suas características intrínsecas, pois tratava-se de um concurso de opiniões acusatórias.

O trial jury deveria, portanto, ser composto de um número maior de pessoas, até quarenta e oito, para além das que haviam apresentado o suspeito, possibilitando algum equilíbrio em suas deliberações. Uma salutar medida, óbvia para observadores modernos,

seria a simples proibição de que uma mesma pessoa participasse dos dois júris. À época, essa proibição não deve ter parecido tão evidente, pois só passou a vigorar, ainda segundo Kempin, em 1351 ou 1352, quando ainda se estabeleceu a possibilidade de as partes rejeitarem jurados (challenges).

Já em 1450, deu-se a transição do sistema em que os jurados decidiam com base em seu conhecimento pessoal dos fatos para o sistema da decisão com base exclusivamente nas provas aduzidas pelas partes. E, em 1670, os jurados são finalmente declarados absolutamente livres na formação de sua convicção.

A instituição do júri consolidou-se numa lenta evolução durante quatro séculos, e ao fim dos quais, no século XVII, tomou a forma geral e definitiva pela qual se tornou conhecida, em torno do que viria ser adotada por outros países e sistemas penais.

O século XVII foi marcado historicamente pela consolidação de liberdades inglesas, instituídas pelo poder revolucionário que opunha o esclarecimento político-liberal ao absolutismo dos Tudors e Stuarts.

E foi a época da vitória do regime parlamentar burguês e do modelo jurídico do constitucionalismo inglês, em que a classe emergente obteve significativas conquistas tais como o writ of habeas-corpus, a limitação da tortura nos interrogatórios, o direito de recusar-se ao juramento e à autoincriminação, e, especialmente a garantia constitucional do julgamento pelo júri.

Tais conquistas constituem o arcabouço básico do regime de liberdades do constitucionalismo inglês, que era inovador e avançado para a época, consistindo em seu conjunto numa inspiração a ser seguida pelas revoluções liberais posteriores, especialmente, a norte-americana.

A laicização, racionalização e publicização do juízo criminal estão inseridas em um processo mais amplo de modernização do direito, característica a Baixa Idade Média. Por essa época, já haviam sido fundadas e se encontravam em plena atividade, principalmente na Itália, em França e na Inglaterra, várias universitas magistorum of scholarium, guildas de mestres e alunos com chancela real, papal ou cardinalícia, que seriam o embrião das modernas universidades. Uma das causas da reviravolta no processo judicial e da superação dos métodos místicos foi o desenvolvimento de estudos do direito romano, reabilitado pelos glosadores daquelas universitas, que faziam a exegese dos textos clássicos, comentando-os à margem.

A prática política americana exigiu uma constituição escrita, ou seja, um contrato social material e não meramente metafórico. Ousaram, por meio de uma síntese liberal criadora, instituir uma república federal onde antes havia uma pluralidade de estados confederados com intensas contradições.

Pela primeira vez organizava se uma república com governo central forte, sobre uma base territorial e populacional ampla, em contraste com os modelos historicamente conhecidos, e doutrinariamente aceitos sejam em Montesquieu e Rousseau, por exemplo, de repúblicas pequenas e internamente coesas.

Para conjurar as ameaças a tão inovador projeto político, lançaram mão simultaneamente de uma retórica liberal e idealista (para preservar as liberdades fundamentais), de uma prática política realista (prevenida contra os "excessos democráticos") e de um sistema constitucional de freios e contrapesos, distribuindo convenientemente o poder entre os órgãos do Estado (para assegurar os Estados Federados contra uma eventual opressão do governo central).

É Celso Lafer é quem ressaltou que: "Este padrão [checks and balances] levou, na prática norte-americana e nos seus desdobramentos, ao federalismo, ao princípio da legalidade e à separação dos poderes, que criaram nos Estados Unidos um regime político onde o governo é o produto de várias instituições que compartilham a máquina do Estado, e onde existe uma fusão de funções e uma divisão de poderes, cuja origem é fruto das preocupações dos fundadores da República Americana con, uma adequada distribuição de poder no sistema político. (..)

[Este é um dos elementos que explicam] porque, nos Estados Unidos, a sociedade civil não é tão fraca, tão inerte em relação ao Estado como em tantas outras partes do mundo.

A característica marcante da sociedade americana, tal como a vemos tradicionalmente, que é o engajamento dos cidadãos na administração cotidiana da coisa pública e a consequente sensibilidade e receptividade dos órgãos do Estado aos seus anseios e necessidades, é nitidamente visível na justiça criminal americana e particularmente na instituição do júri.

O máximo freio possível a um eventual despotismo judicial é o significativo contrapeso do corpo de jurados, selecionado ao acaso, a partir do conjunto de cidadãos, dentre os minimamente aptos cívica e intelectualmente, cuja decisão é soberana e impõe-se exatamente onde o nervo da justiça é mais sensível - a esfera das sanções penais.

Dentro da lógica da democracia constitucional americana, nenhum outro órgão senão o tribunal do júri teria suficiente legitimidade para ministrar sanções tão severas.

O júri coloca face a face as partes que idealmente consentiram em aderir à limitação contratual de sua liberdade, tomaram parte, por meio dos instrumentos da democracia representativa, na deliberação sobre a extensão dessa limitação, e fiscalizaram de perto sua execução.

E, portanto, opor, de maneira quase concreta, o credor ao devedor, a indenização ao dano, o castigo ao crime - mais um esforço americano para materializar urna metáfora.

A recepção da common law e do Tribunal do Júri nos EUA deu-se através da transposição dos princípios da common law para os EUA não foi automática e, tais princípios foram gerados em ambiência social de tipo feudal, bem diferente e distanciado da realidade das colônias norte-americanas, com seus problemas sem respostas naquele sistema penal.

Foi necessário à consolidação da common law americana o desenvolvimento de um número razoável de precedentes que contemplassem os peculiares problemas daquela realidade social, solucionados com intenso concurso de criatividade dos profissionais de direito das colônias, à luz dos princípios básicos da English Law.

E, com os devidos e necessários ajustes, os EUA, consagraram um ordenamento jurídico consuetudinário judicialmente aplicado, já que conservaram, em geral, os conceitos, o modo de raciocínio e, a teoria das fontes do direito inglês, ocupando, não obstante, um lugar destacado devido as certas características dotadas de extrema originalidade.

Assim, a instituição do júri, entretanto, enquanto locus processual diferenciado e privilegiado do direito britânico, foi muito bem-sucedida em terra norte-americana. E, mesmo desde a época colonial, o julgamento pelo júri fora amplamente incorporado às práticas judiciárias da nação emergente.

E, foi a privação em muitos casos, dos benefícios do julgamento do júri, foi um dos fatos invocados por Jefferson, na Declaração de Independência, para então justificar o rompimento da submissão política ao soberano britânico.

Com a vitória do espírito da revolução de caráter cívico-republicano encontrou-se a expressão constitucional escrita no âmbito de cada um dos trezes Estados independentes.

O Tribunal do Júri era em todos estes empregado fosse na esfera cível e criminal, estando fora de sua jurisdição, as questões de equity, tradicionalmente de competência dos justices of the peace e, as controvérsias de direito marítimo, afeitas ao tribunal próprio. Promulgadas as constituições estaduais, a maior parte destas contemplou a instituição do Júri.

O Bill of Rights que fora redigido por James Madison, expressou o ânimo profundo daquela Revolução, que era um desejo a ser positivado o direito natural básico de resistência à opressão governamental e, eloquentemente defendido e afirmado pelas armas vitoriosas, tomando assim a forma de salvaguardas constitucionais escritas, em contraste com o modelo inglês de constituição não-escrita (e consuetudinária).

De fato, o julgamento pelo júri foi considerado uma das mais relevantes daquelas salvaguardas, pelo que ele foi consagrado na Sexta e Sétima Emendas de 1791, na esfera criminal e cível, respectivamente. E, estendeu-se ao vigor e efetividade do regime das liberdades a extensa e detalhada regulamentação constitucional limitativa do direito do Estado de restringir a liberdade dos cidadãos e punir os ilícitos.

Nada menos do que doze dos vinte e três direitos autônomos constantes das oito primeiras emendas à Constituição Norte- Americana dizem respeito à justiça criminal, setor da Justiça estatal em que a justiça estatal em que os bens jurídicos reconhecidamente mais valiosos, a liberdade e a vida, podem ser postos em perigo.

No clássico "A democracia na América" de Alex de Tocqueville sintetizou literalmente: "[A instituição do júri situa a direção real da sociedade nas mãos dos governados. (..) O homem que julga o criminoso é, pois, realmente, o senhor da sociedade"].[7]

Nos Estados Unidos, a participação do cidadão nas atividades dos tribunais é qualitativa e quantitativamente bastante elevada. O júri assume todos os caracteres que seus apologistas tradicionalmente lhe atribuem. O júri exerce plenamente sua função educativa, formadora de cidadãos respeitadores da lei.

Cada um sabe que, mais dia, menos dia, será convocado para o serviço do júri, o que certamente não constituirá embaraço, pois o tribunal e sua mística são profundamente acolhidos pela cultura popular. O estereótipo do advogado do júri é um sempre presente ícone de massa, um herói da América.

O caráter meramente diretivo da atuação do juiz no processo pelo júri nos E.U.A. é um traço característico daquele sistema. O júri é profundamente adversaria! e cabe ao juiz garantir que as partes tenham um acesso igualitário à consideração dos jurados.

As partes são livres para produzirem a prova, cabendo-lhes a convocação e preparação das testemunhas, a contratação de peritos e o recolhimento de provas que eventualmente lhes possam ser favoráveis. Incumbe, portanto, ao juiz, a tarefa de, no espaço de tempo em que transcorre o duelo no recinto do tribunal, zelar pela (fairness dos procedimentos, aplicando a law of evidence, extenso e detalhado conjunto de normas costumeiras e legais que rege a admissibilidade e relevância das provas oferecidas à apreciação do tribunal.

Os procedimentos devem, preferencialmente, ser fluentes, em vista da agenda do tribunal, da disponibilidade dos jurados e sobretudo do princípio da apreciação compacta das provas; por isso, as controvérsias de direito, que geralmente dizem respeito à aplicação da law of evidence, são resolvidas de plano pelo juiz, o que não impede que, eventualmente, uma questão de direito seja extensamente discutida, pois uma má aplicação da law of evidence pode ensejar a posterior nulidade. Resumindo as funções do juiz, Lakoff nos dá a clara noção de sua atuação no tribunal:

     "The trial judge determines what evidence will be introduced, what questions can prospective jurors be asked (...), what testi111ony can be introduced, what instructions will be given jurors, how long jurors may deliberate before a mistrial is declared (... ) or whether a mistrial can be declared for other reasons, and what sentence will be pronounced".

Nos Estados Unidos, a principal garantia é a da igualdade de condições (fairness) no esforço pela descoberta da verdade. O confronto, ainda que violento, faz com que a verdade apareça das provas e debates apresentados durante o julgamento.

Trata-se de demonstração prática daquilo que os jusfilósofos americanos de teoria do direito já haviam delineado em seus trabalhos, como Oliver Holmes e Roscoe Pound.

Este último nos dá uma visão bastante clara dessas ideias quando descreve o que considera as três características dos padrões legais:

"The all involve a certain moral judgment upon conduct. It is to be "fair" or "conscientious", or reasonable, or "prudent, or "diligent". They do not call of exact legal knowledge exactly applied, but for common sense about commons things or trained intuition about things outside of everyone's experience. The are not formulated absolutely and giver an exact content, either by legislation or by judicial decision, but are reltive to time and places and circumstances and are to be applied with reference to the facts of the case in hand. They recognize that, within the bounds fixed by the law, each case is to a certain extent unique."

Segundo Celso Lafer foi o antiformalismo que caracterizou tal abordagem da Filosofia do Direito, resultante do contraste entre Direito posto e Direito aplicado, da distância entre o direito formalmente válido e a realidade social.

A consequência desta visão é o realismo jurídico, com a análise deslocada para o momento de aplicação da norma que é o momento em que esta produz impacto e atua na realidade social. E, é a partir da posição do realismo jurídico norte-americano que esta compreensão da lei e do julgamento se estruturam.

Outra característica marcante do sistema americano é a discricionariedade dos atos do Promotor de Justiça.

O promotor controla e supervisiona todo o inquérito, sendo o responsável pela correção e efetividade da colheita de elementos probatórios. O Chefe da Promotoria é, na maioria das vezes, eleito, dispondo de verbas significativas e pessoal próprio e efetuando diligências com razoável autonomia, sendo requerida autorização judicial nos casos em que estão envolvidos direito básicos dos investigados.

Pode arquivar inquéritos por conta própria; quando dá curso à ação, submete a denúncia. cm alguns estados, ao Grand Jury. Geralmente. ele oferece a denúncia diretamente ao Juiz-Presidente do Petty (ou Petit) Jury. É aí que tem lugar a plea bargaining, oportunidade em que a acusação pode pleitear uma plea of guilty de iniciativa do acusado cm troca de uma capitulação do crime mais branda.

O réu tem seus direitos constitucionais e civis zelosamente observados e ditados, pois sua violação pela política ou pelo Promotor de Justiça poderá viciar as etapas posteriores do processo penal.

E, por exemplo, desde Miranda versus Arizona, em 1966, o júri é obrigado a desconsiderar as declarações feitas pelo acusado antes de explicitamente advertido de seu direito de recusar-se a falar à polícia.

O júri norte-americano, apesar de também ter sido, ao longo de sua história, objeto de críticas, sobreviveu às provas da experiência. A crer no testemunho Zeisel & Kalven, é somente nos EUA que a instituição tem, contemporaneamente, tanta pujança. In litteris:

"The effort to introduce it outside the Anglo-american legal orbit has falled; in England itself, its use was limited by statute to small category of cases; and thus, the United States has emerged today as the home of the jury system for both criminal and civil cases. Some 120.000 jury trials are conducted there annualy, more than 90% of all jury truals in the world."

O funcionamento do jury system é tão complexo e com competências tão amplas. Todavia, o direito do acusado de renunciar ao julgamento pelo júri, optando pelo julgamento pelo juiz, e a prerrogativa da acusação de negociar com os indiciados uma denúncia mais branda, em troca de uma admissão de culpa - que é quase sempre aceita pelo juiz - fazem com que o número de ofensas criminais que efetivamente vão a julgamento pelo júri seja extremamente menor do que o número de casos que chegam ao conhecimento da Justiça.

A história da instituição do júri na tradição anglo-americana registra uma evolução lenta, porém, nítida, no sentido da democratização dos requisitos de acesso à condição de jurado. A partir de um modelo absorvido da metrópole inglesa e, portanto, adequado a uma sociedade aristocrática e estamental, a democracia americana desenvolveu gradativamente um sistema mais consentâneo com sua feição republicana.

A viragem, ao fim do processo, foi radical: de um sistema que privilegiava deliberadamente a formação de júris de elite, passou-se ao ideal da não discriminação e daí para o sistema contemporâneo, de democracia radical, acolhendo integralmente o ideal da representação de todo o espectro social.

O veredicto criminal deverá estar relacionado aos nexos lógicos aos elementos probatórios apresentados e admitidos à consideração dos jurados. E, sabemos que os jurados estão proibidos de considerar provas que não tenham passado pelo crivo do juiz, aplicador da law of evidence e, que não tenham sido apresentadas oralmente no recinto do tribunal, em que as partes duelam em igualdade de condições.

O momento em que o juiz faz a sua explicação aos jurados é crucial no sistema norte-americano, ao proferir o directed veredict, isto é, condicionado pelo comentário do juiz sobre peso e a relevância das provas, é geralmente proibido hoje em dia, embora ainda subsista em alguns Estados.

O Tribunal do Júri norte-americano exige por definição um processo acusatório ou adversarial, onde a prova é produzida totalmente pelas partes e o juiz não toma iniciativas investigatórias sequer em audiências preliminares, as chamadas hearings.

Valendo-se da lição de Hannah Arendt, em suas palestras sobre Immanuel Kant, que teria afirmado que o pensamento, muito embora seja uma ocupação solitária, depende dos outros para ser possível. Desta forma, o pensamento crítico consiste nesse tipo de análise que, por sua vez, pressupõe que todos estejam dispostos e sejam capazes de prestar contas do que pensam ou dize.

E, endossou Arendt, Platão ter-se-ia destacado dos seus antecessores ao "prestar contas", não provar, mas estar apto a afirmar como se chegou a uma opinião e por quais razões se a formou.

 Explicando como o pensamento crítico se forma, prossegue tecendo as considerações sobre a imparcialidade, que seria obtida por meio da consideração de pontos de vista dos outros, a imparcialidade não seria resultante de um ponto de vista mais elevado, que pudesse resolver a disputa por estar totalmente acima dela.

Conclui ser o pensamento crítico possível apenas na medida em que os pontos de vista dos outros estão abertos à inspeção.

Ora, o processo de decisão levado a cabo pelos jurados no sistema norte-americano, quando se reúnem para decidir o destino do acusado após ouvirem a prova e os debates e, seguir fielmente o procedimento descrito por Hannah Arendt. E, por isso as deliberações podem ser demoradas e dependem do tipo de pessoa previamente selecionada.

E, dentro da sala de deliberações não há ninguém a mais, sendo os jurados tem permissão para entrar, chegando sozinhos ao veredicto.

E, a partir dessa socialização do grupo de jurados em um corpo próprio que surgem alianças e estruturas de poder, já que os jurados, como qualquer outro grupo, também criam suas lideranças. De relevante é a escolha ou identificação da foreperson, que no sistema do júri norte-americano adquire pela sua liderança pessoal a missão de conduzir os trabalhos na sala secreta, e tem grande destaque em relação ao grupo de jurados.

A grande missão do júri é mesmo a construção pela colaboração recíproca da narrativa dos fatos de modo a chegar ao termo de sua tarefa deliberativa. E, que não acontece, quando a unanimidade não é atingida, ocorre um dos fenômenos mais interessantes, o hung jury, que obriga o juiz, muito a contragosto, a declarar um mistrial e convocar novo julgamento.

A Allen charge, do caso Allen versus USA, de 1896, é gradualmente considerada o máximo de pressão que o juiz pode imprimir ao júri, no sentido de chegar ao veredicto final, sem ferir a consciência dos jurados e o princípio de que os norte-americanos consideram o mais importante de todo seu direito processual penal, o de firma estabelecimento da culpa beyond a reasonable doubt. (Sobre a razoável dúvida).

Afirmou o juiz de Allen versus USA: That in a large proportion of cases absolute certainty could not be expected; (...) that it was their duty to decide the case if they could conscientiously do so: that a issenting juror should consider whether his doubt was a reasonable on which made no impression upon the minds of so many men, equality honest, equally inteligente with himself".

A Allen charge, entretanto, vem sendo rejeitada como abusiva desde os anos quarenta e, principalmente, a partir dos sessenta.

Em 1962, em Green versus USA, a US Court of Appeals for the 5th Circuit negou aplicação à Allen charge com as seguintes palavras:

   " I think a mistrial is a safeguard to liberty (...) There is a uty to consider the views of others but (...) a conscientious person has finally the right and duty to stand by conscience. If it the Allen charge says more to declare that there is a duty to decide, it is leally incorrect as an interference with that rightful independence (..._ The cost in fundamental fairness is to great."

Segundo Hannah Arendt em suas lições sobre Kant, há duas operações do espírito no juízo. A primeira é a operação da imaginação, em que são julgados objetos não mais presentes, que foram removidos de nossa percepção sensível imediata e, portanto, não mais nos afetam diretamente.

A segunda operação, reflexiva, é a verdadeira atividade de julgar. Parece-nos que a capacidade para julgar no Tribunal do Júri está ligada à capacidade de escolher entre as alternativas apresentadas ao Jurados, efetuando-se as duas operações acima descritas. Primeiro, durante o julgamento, apresentam-se as versões dos fatos, para, em segundo lugar, passar-se à reflexão - coletiva e mediatizada pelo discurso nas deliberações da sala secreta - sobre estas versões, decidindo-se, a final, sobre a participação do acusado no crime, e o grau de sua culpabilidade.

Esse poder assume uma especial relevância na administração da Justiça, porque investido em pessoas que não fazem parte da estrutura regular do Poder Judiciário, mas que o compõem de forma a aproximar o cidadão comum do processo decisório que julga os crimes, especialmente naqueles contra a vida humana, representando, muitas vezes, sua única experiência participativa no processo democrático.

O processo deliberativo do Tribunal de Júri norte-americano traz especulações sobre o juízo. E, sentido, as relações de poder entre os jurados e os outros atores de julgamento são direcionadas so grupo, ao alguém em particular que poderá ter um papel preponderante nas deliberações do conselho de sentença, inclusive contribuindo para que na falta de consenso a decisão fique pendente.

Frise-se que a linguagem é um instrumento poderoso, que oscila entre a tentativa de impressionar os jurados com um discurso elaborado, ao mesmo tempo, em que se quer promover a popularização desse discurso para seu melhor entendimento. Principalmente de conceitos como beyond a reasonable doubt no júri norte-americano, no que servirão aos jurados no momento de responder à indagação da culpa ou inocência do acusado.

E, sua solenidade ritual imprime sua marca na linguagem verbal e não-verbal empregadas bem como procedimentos legais, procurando conferir legitimidade a um processo cognitivo que depende fundamentalmente de não profissionais para sua plena realização.

Arendt elucidando sobre Kant nos ensinou que há duas operações do espírito no juízo. A primeira é a operação da imaginação em que são julgados objetos não mais presentes, que foram removidos de nossa percepção sensível imediata e, portanto, não mais nos afetam diretamente.

A segunda operação é reflexiva, sendo a autêntica atividade de julgar. Afinal, a capacidade de julgar no Tribunal de Júri está relacionada à capacidade de escolher entre as alternativas apresentadas aos jurados, efetuando-se as duas operações retrocitadas.

Primeiro, durante o julgamento, apresentam-se as versões dos fatos apresentados, para em segundo lugar, passar-se à reflexão, coletiva e mediatizada pelo discurso nas deliberações da sala secreta, e afinal, decidem sobre a participação do acusado no crime e, seu grau de culpabilidade.

Desenvolvimento

A instituição do Júri no Brasil se deu, preliminarmente, através de um projeto de iniciativa do Senado do Rio de Janeiro, cuja proposta versava sobre a criação de juízo de jurados. E, assim, foi instituído em 18 de junho de 1822, o primeiro Tribunal de Júri, sendo seus componentes denominados de "juízes de fato".

Composto de vinte e quatro juízes, homens considerados bons, honrados, inteligentes e patriotas, a nomeação destes juízes era atribuição do Corregedor, em atendimento a requerimento do Procurador da Coroa e Fazenda.

Há dois detalhes que devem ser destacados, relacionados ao fato de que os réus podiam se recusar da escolha de dezesseis dos vinte e quatro nomeados podendo, ainda, apelar da decisão para a clemência real, cuja apreciação do recurso cabia ao Príncipe, a única pessoa capaz de alterar a sentença.

Posteriormente, com a promulgação da Constituição brasileira de 1824, a parte relativa à organização do Poder Judicial, ou seja, o capítulo único, do título 6º, expressamente passou a prever em seu artigo 152, o Tribunal do Júri como órgão competente para julgar ações cíveis e criminais, conforme disposto no artigo 151, ora transcrito:

Art. 151. O Poder Judicial independente, e será composto de Juizes, e jurados, os quaes terão logar assim no Civel, como no Crime nos casos, e pelo modo, que os Codigos determinarem. (sic)

O Código de Processo Criminal, editado em 29 de novembro de 1832, ampliou competência do júri, cuja regulamentação, até então, era feita pela Lei de 20 de setembro de 1830.

O Código Criminal do Império deu à instituição do Júri uma abrangência exagerada. Segundo o estabelecido neste Código, em cada distrito havia um juiz de paz, um escrivão, oficiais de Justiça e inspetores de quarteirão.

Em cada termo encontrava-se um juiz municipal, um promotor público, um escrivão das execuções, oficiais de justiça e um Conselho de Jurados. No entanto, poderiam reunir-se dois ou mais termos para formação do Conselho, sendo que a cidade principal seria aquela que proporcionasse maior comodidade para a realização das reuniões.

A mudança foi significativa, pois, a partir daquele momento estavam extintas quase todas as formas de jurisdição ordinária, restando somente o Senado, o Supremo Tribunal de Justiça, as Relações, os juízes militares, que tinham competência unicamente para crimes militares, e os juízos eclesiásticos, para tratar de matéria espiritual.

Havia, ainda, os juízes de paz, aos quais cabiam os julgamentos das contravenções às posturas municipais e os crimes a que não fosse imposta a pena de multa de até cem mil-réis, prisão, degredo, ou desterro até seis meses.

O Código de Processo Criminal havia criado dois conselhos de jurados. O primeiro se tratava de um Júri de acusação, composto por vinte e três jurados, enquanto o segundo, o Júri de sentença, era formado por doze membros, como dispunham os arts. 238 e 259, respectivamente.

Formado o conselho de acusação, este proferia a decisão, permitindo que os réus fossem acusados perante o conselho de sentença[8]. À medida que o juiz de direito realizava o sorteio dos integrantes desse conselho, havia a possibilidade, tanto do acusador como do acusado de fazer até doze recusas imotivadas, excetuados os impedidos.

A Lei nº261, de 03 de dezembro de 1841, extinguiu o Júri de acusação, fortalecendo a figura do juiz sumariante e da autoridade policial. Manteve a apelação de ofício, interposta pelo juiz de direito perante a Relação, órgão correspondente ao atual Tribunal de Justiça, sempre que o magistrado se convencesse de que a decisão fora contrária às provas.

Foi além, alterando o quórum[9] necessário, que no caso de pena de morte, até então era unanimidade, passando a ser de dois terços, enquanto as demais decisões poderiam ser tomadas por maioria absoluta. No caso de empate, adotava-se a decisão mais benéfica ao réu.

Todos os eleitores de bom senso que se pautavam pela probidade podiam ser jurados, excluindo-se os deputados, senadores, conselheiros e ministros de Estado, dentre outras autoridades militares, administrativas e jurisdicionais, inclusive eclesiásticas.

As listas de jurados eram feitas em cada distrito, por uma junta integrada por um juiz de paz, um pároco e o presidente da câmara municipal. Essa lista seria divulgada publicamente, sendo remetida uma cópia às câmaras municipais, enquanto outra cópia ficava nas mãos do juiz.

Diante da liberalidade existente no Código de Processo Criminal, adveio, em 31 de janeiro de 1842, o Regulamento nº 120, introduzindo diversas alterações no Júri e na organização judiciária nacional.

Esse regulamento criou o cargo de chefe de Polícia, que podia ser ocupado por um juiz de direito ou um desembargador, e delegados distritais, cargos acessíveis a quaisquer juízes ou cidadãos.

Já em 1871, por conta da reforma processual, o juízo de probabilidade, ou seja, a pronúncia, passou a ser competência dos juízes de direito, nas comarcas especiais, e dos juízes municipais, nas comarcas gerais.

A partir de 1872, por força do Decreto nº4.992, de 3 de janeiro, as sessões do Júri passaram a ser presididas pelo desembargador da Relação do distrito, cuja designação ficava a cargo do presidente segundo o critério de antiguidade.

A Proclamação da República, em quinze de novembro de 1890 não deu ensejo a alterações na estrutura do júri. Com a criação da Justiça Federal por meio do Decreto nº848, de 11 de outubro de 1890, adveio a instalação do Júri Federal (Decreto nº 3.084, de 1898), composto de doze jurados, sorteados entre o corpo de jurados da comarca.

Com a promulgação da Constituição de 1891, o art. 72, § 31 da Carta, alocado na seção II, do título IV, parte relativa à Declaração de Direitos, manteve o júri e sua soberania.

Por força do Decreto nº 4.780, de 27 de dezembro de 1923, o júri federal, já apontado anteriormente, deixou de apreciar os crimes de peculato, falsidade, violação do sigilo de correspondência, desacato e desobediência, concussão, estelionato, dentre outros, que se tratava de delitos de competência da justiça federal comum.

A próxima alteração relativa ao júri se deu quando da promulgação da Constituição de 1934 que, em seu capítulo IV, na seção I, parte relativa às disposições preliminares do Poder Judiciário manteve o júri, como se observa do art. 72, abaixo destacado: Art 72 - É mantida a instituição do júri, com a organização e as atribuições que lhe der a lei.

Constata-se a vaga previsão do Tribunal do Júri em sede constitucional. Contudo, novamente, adota-se o critério já existente na Constituição de 1824, de alocação da referida instituição na parte concernente ao Poder Judiciário.

A Constituição dos Estados Unidos do Brasil decretada em 10 de novembro de 1937, não se referia ao Júri, gerando ampla discussão, cogitando-se, inclusive sua extinção do ordenamento jurídico, diante do silêncio constitucional.

A Constituição de 1937 não tratou do Júri, e, por isso, a matéria foi disciplinada pelo Decreto-Lei nº167, de 5-1-1938. Surgiram então, duas grandes novidades: o número de jurados passou a ser 7 e extinguiu-se a soberania.

Essa lei trouxe alterações positivas, eis que a extinção da soberania permitiu que as decisões pudessem ser vistas quando fundadas em desacordo com as provas podendo o próprio Tribunal aplicar a condenação correta ou a absolvição, nos termos dos art. 92, “b”, do Decreto-lei 167/38.

As modificações permitiram uma sensível diminuição nos abusos cometidos no Tribunal do Júri, sendo considerado, por muitos, verdadeiro avanço na legislação processual penal brasileira.

Através da Constituição de 18 de setembro de 1946, especificamente no capítulo II, do título IV, há um retorno da previsão do Tribunal do Júri, sendo alocado, não mais na parte relativa ao Poder Judiciário, mas, na parte que tocava a Declaração de Direitos – onde se previam os direitos e das garantias individuais, resgatando-se ainda, sua soberania.

Inovou a referida Carta Magna, eis que passou a prever a plenitude de defesa, o sigilo das votações e a soberania do tribunal, até então afastada pela legislação infraconstitucional. Passou ainda, a prever, expressamente, o critério de competência do tribunal popular, para o julgamento os crimes dolosos contra a vida[10].

Sendo estabelecido o critério ímpar para a formação do conselho, afastou-se o número par (doze membros) tradicionalmente utilizado.

O fato de a Constituição ter previsto a competência exclusiva do júri para os crimes dolosos contra a vida, não impedia que outras matérias pudessem ser examinadas por esse tribunal. Na realidade, o referido critério apenas buscava evitar que outros órgãos judiciários pudessem apreciar esses crimes.

Portanto, para que houvesse Tribunal do Júri, os comandos definidos pela Constituição de 1946 (art. 141, § 28) deveriam ser rigorosamente observados. O desrespeito à referida norma configuraria flagrante inconstitucionalidade.

A Lei nº 263/48, sancionada em 23/02/1948 revogou expressamente os dispositivos incompatíveis com a nova Constituição, sendo a referida lei incorporada ao atual Código de Processo Penal.

Trouxe diversas inovações, principalmente no campo da competência, que passou a ser fixada tanto em razão da matéria como em razão da conexão ou da continência.

Pela nova ordem constitucional, através da Carta de 1967, que em seu capítulo IV, no título II, manteve a previsão do júri, seguindo a mesma orientação da Constituição anterior, inclusive, em relação à parte alocada, que era a relativa aos direitos e garantias individuais.

Por força da Emenda Constitucional nº 01, de 17 de outubro de 1969, manteve-se o júri sendo, todavia, omitida a referência de sua soberania, como denota-se do art. 153, § 18, alocado no capítulo IV, do título II, na parte relativa aos Direitos e Garantias Individuais, in litteris:

Art. 153. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança[11] e à propriedade, nos têrmos seguintes:

 § 18. É mantida a instituição do júri, que terá competência no julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

Sustentou-se que a soberania dos veredictos estava suprimida, mas o entendimento jurisprudencial foi o de que não se compreendia a instituição do Júri sem sua soberania.

Diante do silêncio do legislador, foram mantidas as disposições definidas pelo Código de Processo Penal.

Finalmente, com o advento da Lei nº5.941, de 22 de novembro de 1973, foram implementadas diversas alterações no Código de Processo Penal, como a possibilidade de o réu pronunciado, desde que primário e com bons antecedentes, continuar em liberdade.

A atual Constituição Federal, promulgada em 05 de outubro de 1988, denominada constituição-cidadã, alocou em definitivo a instituição do Tribunal do Júri nas denominadas cláusulas pétreas, consagrando o Tribunal do Júri como elenca seu art. 5°, XXXVIII:

XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) a plenitude de defesa,

b) o sigilo das votações;

c) a soberania dos veredictos;

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;

Denota-se que a Carta de 1988 passou a prever, expressamente, a soberania dos veredictos do Tribunal do Júri, a plenitude de defesa, o sigilo das votações e competência para julgar os crimes dolosos contra a vida, rompendo a tradição das constituições que a antecederam.

Diante dos questionamentos acerca da soberania do júri, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou a respeito.

A soberania dos veredictos[12] do Júri não obstante a sua extração constitucional ostenta valor meramente relativo, pois as manifestações decisórias emanadas do Conselho de Sentença não se revestem de intangibilidade jurídico-processual. A competência do Tribunal do Júri, embora definida no texto da Lei Fundamental da República, não confere a esse órgão especial da Justiça comum o exercício de um poder incontrastável e ilimitado. As decisões que dele emanam expõem-se, em consequência, ao controle recursal do próprio

Poder Judiciário, a cujos Tribunais compete pronunciar-se sobre a regularidade dos veredictos. A apelabilidade das decisões emanadas do Júri, nas hipóteses de conflito evidente com a prova dos autos, não ofende o postulado constitucional que assegura a soberania dos veredictos desse Tribunal Popular. (HC 68.658, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 26/06/92)

(...) mesmo após o advento da Constituição de 1988, o subsistente a norma do artigo 593, III, d, do Código de Processo Penal, segundo a qual cabe apelação contra o julgamento perante o Júri, quando a decisão dos jurados for manifestamente contrária à prova[13] dos autos. (HC 73.686, Rel. Min. Sydney Sanches, DJ 14/06/96).

O Pretório Excelso quando se pronunciou acerca da competência desse tribunal, eis que o foro por prerrogativa de função, previsto na Carta Magna, afasta a competência do júri (STF – 2ª T. – HC 70.581- - AL, RTJ 150/832-3)

No que se refere à plenitude defesa, a CF nada mais faz do que reforçar o princípio da ampla defesa, previsto no art. 5º, LV, eis que a interpretação constitucional deve ser sistemática, por conta do princípio da unidade.

Por fim, em relação à organização do Tribunal do Júri, atualmente, é presidido por um juiz togado e constituído por 21 juízes de fato (jurados), sorteados dentre os cidadãos regularmente alistados. Destes 21 jurados, 07 serão selecionados para compor o Conselho de Sentença.

A grande controvérsia gira em torno do surgimento do Tribunal do Júri na Inglaterra. Mas como amplamente demonstrado, a Grécia e, principalmente, Roma, apresentaram fortes semelhanças.

As formas de escolha, as garantias de defesa, os procedimentos relativos ao julgamento, dentre outros fatores das instituições da antiguidade, guardavam muita semelhança a atual forma do tribunal popular.

Não se pode olvidar que o júri da Inglaterra, por ser mais contemporâneo e evoluído, se assemelha de forma mais límpida ao existente atualmente. Todavia, a Heliaia e as antigas quaestiones perpetuae podem ser consideradas as primeiras espécies de tribunal popular.

De fato, observa-se a influência religiosa inserta no júri seja pela invocação a Deus, seja pelo número de membros, como apresentam determinadas civilizações.

Duas Constituições que trouxeram ampla discussão sobre o tribunal popular foram as de 1937, que nada se pronunciou a respeito, e a de 1969 que expurgou sua soberania. Entretanto, coube ao legislador, a doutrina e a jurisprudência integrarem os princípios ínsitos ao júri à luz da Constituição.

Cumpre também aduzir sobre as principais modificações trazidas ao Tribunal do Júri pela lei 11.689/2008 que ofereceu nova redação aos dispositivos do vetusto Código de Processo penal brasileiro no que se refere ao Tribunal do Júri.

E, entrou em vigência em agosto do mesmo referido ano e, promete trazer novo rito inspirado nos ideais de celeridade, simplicidade, eficiência e segurança, contribuindo com uma significativa melhora para a efetivação da lei e julgamento dado aos crimes contra a vida.

Destaque-se que com a promulgação da Constituição Federal do Brasil em 05 de outubro de 1988, os princípios regentes do processo penal continuaram a serem assegurados, incluindo, novamente, o Júri no rol de cláusulas pétreas elencadas no artigo quinto, inciso XXXVIII. “é reconhecida a instituição do Júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) A plenitude de defesa;

b) O sigilo das votações;

A soberania dos veredictos;

Competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida”

A título de esclarecimento, tem-se por Plenitude de Defesa, uma garantia constitucional assegurada aos réus, no Tribunal do Júri. Trata-se de um princípio constitucional do Tribunal do Júri

No que tange ao sigilo das votações, o julgamento pelos jurados acontecerá em Plenário do Júri, vazio ou em sala especial, longe dos olhares do público. A exemplo da Plenitude de Defesa, também é um princípio constitucional regente do Tribunal Popular.

A soberania dos veredictos “é a última palavra, não podendo ser contestada, quanto ao mérito, por qualquer tribunal togado.” [3] Não é possível que cortes togadas substituam os veredictos dos jurados, invadindo seu mérito.

O CPP em seu artigo 447 prevê a organização do Tribunal do Júri. De acordo com esse dispositivo, é composto por um juiz de direito, que é seu presidente e, por vinte e cinco jurados, sorteados dentro os aliados.

Aliados são todos selecionados pelo juiz-presidente, no decorrer, no decorrer de um ano, para servirem no seguinte, nos termos estipulados pelo artigo 425 do CPP. As pessoas alistadas podem servir como juradas ou não, dependendo do sorteio realizado para composição dos grupos das sessões.

Em cada sessão de plenário, sete dos vinte e cinco jurados alistados são escolhidos, de forma igual, por sorteio, para fazer parte do Conselho de Sentença, dividindo o plenário com a defesa e a acusação. A responsabilidade de convocar os jurados para a sessão de julgamento é do juiz presidente do Tribunal do Júri. Defesa e acusação podem acompanhar o processo, mas não devem opinar, decisivamente, na escolha final.

De acordo com o doutrinador Guilherme de Souza Nucci, “a Lei nº 11.689/2008, no artigo 425 do Código de Processo Penal, pouca modificação trouxe ao quadro de deficiência de jurados, embora tenha aberto a possibilidade de se elevar o número dos alistados (artigo 425, parágrafo 1º, Código de Processo Penal).

Embora devesse, não mencionou o instrumento pelo qual seria viabilizado o aumento do número de jurados. “Entendemos que deva ser mantido o sistema de resolução ou provimento editado pelo Tribunal de Justiça (ou Tribunal Regional Federal)”.

Devem ser escolhidos para compor o plenário cidadãos de notória idoneidade, maior de idade (isentos os indivíduos com idade superior a 70 anos), optar por aqueles que preencham os requisitos legais, por aquelas que tenham sido indicadas por pessoa de sua confiança ou pessoa que o próprio juiz tenha conhecimento de boa conduta social.

Entretanto, o artigo 425, parágrafo 2º, do Código de Processo Penal sugere que o magistrado oficie às autoridades locais, associações de classes e de bairro, repartições públicas, sindicatos, universidade etc.

Vale ressaltar que a idade superior a 70 anos, trata-se de outra modificação trazida pela reforma, visto que antes a isenção era dada aos maiores de 60 anos.

Segundo o artigo 437 do Código de Processo Penal, ficam excluídos do serviço obrigatório do Júri:

“o Presidente da República e os Ministros de Estados, os Governadores de Estado e seus Secretários, os membros do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e Distrital e das Câmaras Municipais, os Prefeitos Municipais e os membros do Ministério e da Defensoria Pública, os servidores do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública, as autoridades e servidores da política e da segurança pública, os militares em serviço ativo, os cidadãos maiores de 70 anos que requeiram sua dispensa, aqueles que o requererem, demonstrando justo impedimento.” 

Com a alteração do Código de Processo Penal, em agosto de 2008, a recusa imotivada em caso de não comparecimento a sessão de julgamento terá como penalidade multa de um até dez salários-mínimos.

Por conseguinte, a recusa motivada por questões religiosas, políticas ou filosóficas acarretará perda ou suspensão dos direitos políticos, se o jurado não se manifestar quanto à prestação de serviços alternativos.

Em relação à recusa devidamente justificada, cria-se possibilidade, através de cláusula aberta, de o magistrado dispensar quem quer seja que tenha justo motivo para o não comparecimento.

Também com a alteração, criou-se direito de preferência em concurso público para aquele que tenha exercido a função de jurado, assim como nas hipóteses de promoção funcional ou de remoção voluntária.

Como mencionado acima, em plenário devem estar presentes o juiz presidente, o Ministério Público, assistente de acusação (caso haja), jurados, acusado e defesa.

Supridas todas as formalidades próprias deste Instituto, dar-se-á início à sessão de julgamento.

Leciona Pinto da Rocha, “as características essenciais do Júri são:

a) julgamento dos cidadãos pela consciência de seus pares;

b) formação do tribunal pelo sorteio;

c) foro comum do povo. Mas se os dois primeiros caracteres indicam o gênero próximo – tribunal popular- sem estatuir a diferença específica que o distingue do escabinado, o último em absoluto é aceitável.

Na Suécia, o Júri só existia para os crimes de imprensa. No Brasil, durante a vigência da Constituição Federal de 1891, a maioria dos Estados só mantinha para os delitos contra a vida. Traço específico do Júri competência funcional exclusiva dos jurados, para decidirem sobre a existência do crime e a responsabilidade do acusado.”

A seu turno, o Supremo Tribunal Federal, proferiu o seguinte acórdão quanto às características do Tribunal do Júri:

"São características do Tribunal do Júri:

I – quanto a composição dos jurados, a) composta de cidadãos qualificados periodicamente por autoridades designadas pela lei, tirados de todas as classes sociais, tendo as qualidades legais previamente estabelecidas para as funções de juiz de fato, com recurso de admissão e inadmissão na respectiva lista, e

b) o conselho de julgamento, composto de certo número de juízes, escolhidos a sorte, de entre o corpo dos jurados, em número tríplice ou quádruplo, com antecedência sorteados para servirem em certa sessão, previamente marcada por quem a tiver de presidir, e depurados pela aceitação ou recusa das partes, limitadas as recusas a um número tal que por elas não seja  esgotada a urna dos jurados convocados para a sessão;

II – Quanto ao funcionamento, a) incomunicabilidade dos jurados com pessoas estranhas ao Conselho, para evitar sugestões alheias, b) alegações e provas da acusação e defesa produzidas publicamente perante ele, c) atribuição de julgarem estes jurados segundo sua consciência, e d) irresponsabilidade do voto emitido contra ou a favor do réu".

O tratamento inovador para o Tribunal do Júri estabeleceu-se algumas alterações para o procedimento do júri com a promulgação da Lei nº. 11.689/2008. Passa-se então a analisar as principais mudanças trazidas por essa lei.

Audiência única esta é uma das principais alterações trazidas pela Lei nº. 11.689/2008. O atual artigo 411, caput do Código de Processo Penal dispõe:

“Na audiência de instrução, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, se possível, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, bem como os esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado e procedendo-se o debate.”

Com a nova lei, passou a concentrar-se os atos em audiência única, obedecendo a ordem estabelecida pelo artigo acima citado, mantendo-se o princípio da oralidade.

A audiência de instrução deve acontecer no prazo máximo de 90 (noventa) dias após o recebimento da denúncia[14] ou queixa, ficando a audiência designada para os 10 (dez) dias posteriores a apresentação da defesa do réu.

Essa nova situação pode não ser efetivamente viável na prática, vez que o Poder Judiciário abarrotado com anda, pode, muitas vezes, não ter disponibilidade para realizar audiência no prazo estabelecido por lei. Inúmeras críticas foram feitas em relação a essa inovação, uma vez que a cruel realidade do Poder Judiciário Brasileiro não permite que se cumpra efetivamente essa norma. pronúncia “é a decisão que admite ter nos autos prova da materialidade e indícios suficientes de autoria. Considera admitida a acusação, submetendo o réu a julgamento pelo Tribunal do Júri.”

Sendo assim considerada, vale ressaltar que a finalidade da fase preparatória de formação de culpa é tentar evitar o erro no Poder Judiciário, evitar a condenação[15] equivocada, até porque, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, LXXV, faz com que o Estado se comprometa a evitar tal erro.

Embora se trate de decisão interlocutória, a estrutura da pronúncia obedece à forma da sentença, devendo conter o relatório, a fundamentação e o dispositivo, ou seja, fazer menção a tudo que se passou no processo, a partir da denúncia até as alegações finais das partes; motivo pelo qual o magistrado entende que é necessário enviar o caso para a devida apreciação do Tribunal Popular e, por fim, referenciar artigos no qual se encontra incurso o acusado.

Neste sentido, prevê o Superior Tribunal de Justiça:

     “É certo que na sentença de pronúncia o magistrado não pode proferir colocações incisivas e considerações pessoais em relação ao réu nem se manifestar de forma conclusiva ao acolher o libelo ou rechaçar tese da defesa a ponto de influenciar na valoração dos Jurados, sob pena de subtrair do Júri o julgamento do litígio. Entretanto, o cometimento desejado não pode ser tamanho a ponto de impedir que o juiz não possa explicar seus convencimentos quanto à existência de prova de materialidade e indícios suficientes de autoria, sob pena inclusive de nulidade da pronúncia[16] por ausência de fundamentação”. (HC 50.270-RS, 5ª T. rel. Napoleão Nunes Maia Filho, 14.06.2007, v.u.)

Observa-se o artigo 408, parágrafo 1º do Código de Processo Penal, antes da aprovação da Lei nº. 11.689/2008:

Art. 408: “Se o juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, pronunciá-lo-á, dando os motivos do seu convencimento.”

1º: “Na sentença de pronúncia o juiz declarará o dispositivo legal em cuja sanção julgar incurso o réu, recomendá-lo-á na prisão em que se achar, ou expedirá as ordens necessárias para sua captura”.

O moderno artigo 413, parágrafo 1º, dispõe o que segue: “a fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena.”

Com a reforma do Código de Processo Penal, incluiu-se o termo “fato” em lugar de “crime”, o que é redação tecnicamente mais coerente. Quanto à autoria, a reforma também trouxe nova textualização ao dispositivo, qual seja: refere-se à “existência de indícios suficientes de autoria e participação”. Agora não basta que haja meros indícios, além de existirem eles devem ser suficientes.

Informa Vicente Greco Filho, em sua obra, diz que “o raciocínio do juiz da pronúncia, então, deve ser o seguinte: segundo minha convicção, se este réu for condenado haverá uma injustiça? Se sim, a decisão deverá ser de impronúncia ou de absolvição sumária”.

Sérgio Marcos de Moraes Pitombo, em sua lição faz menção ao princípio do in dúbio pro societate:

Cabe análise:

“É fácil, na sequência, perceber que a expressão in dúbio pro societate não exibe o menor sentido técnico. Em tema de direito probatório, afirma-se: “na dúvida, em favor da sociedade” consiste em absurdo lógico-jurídico. Veja-se: em face da contingente dúvida, sem remédio, no tocante à prova – ou melhor, imaginada incerteza – decide-se em prol da sociedade.

Dizendo de outro modo: se o acusado não conseguir comprovar o fato, constitutivo do direito afirmado, posto que conflitante despontou a prova; então, se soluciona a seu favor, por absurdo. Ainda, porque não provou ele o alegado, em face do acusado, deve-se decidir-se contra o último. Ao talante, por mercê judicial o vencido vence, a pretexto de que se favorece a sociedade: in dúbio contra reum”. (Pronúncia e o in dúbio pro societate, p.6).

Ainda se tratando de pronúncia, o acusado que ainda permanece solto e que tenha paradeiro incerto poderá ser intimado por edital, o que antes da vigência da Lei 11.689 de agosto de 2008 era inadmissível.

Com a reforma da legislação processual penal, buscou-se a elaboração de uma decisão interlocutória mais concisa, mais bem expressada em seus termos, o que por si só, é de grande valia para um Estado Democrático de Direito, como é o caso do Brasil, principalmente no que se refere à mais democrática instituição jurídica brasileira, o Tribunal Popular.

Absolvição sumária[17], segundo Nucci, “é a decisão de mérito, que coloca fim ao processo, julgando improcedente a pretensão punitiva do Estado.”

 É uma sentença própria que faz coisa julgada material e é vista como um caso especial de julgamento antecipado da lide, pois, como foi dito, põe fim ao processo.

A antiga legislação processual penal brasileira previa a possibilidade de o juiz absolver sumariamente o réu quando se tornasse efetivamente provado, a existência de causa de exclusão de ilicitude ou da culpabilidade.

A Lei nº.11.689/2008, trouxe um aspecto inovador no que tange a esse procedimento, incluindo mais três hipóteses que devem também ser reconhecidas pelo juiz.

A primeira dessas hipóteses acontece quando, havendo certeza e baseado nas provas constantes dos autos, o magistrado poderá reconhecer que o fato imputado ao acusado inexistiu.

O artigo 415, I do novo Código de Processo Penal prevê:

“O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando:”

I – “Provada a inexistência do fato;”

A segunda alteração trazida pela Lei 11.689/2008 referente à absolvição sumária, diz respeito ao erro quanto ao autor do delito. Neste caso, é demonstrado que houve o fato típico, porém o autor do crime não é aquele que esta sendo acusado, devendo, desde logo, ser absolvido sumariamente.

O artigo 415, I do novo Código de Processo Penal prevê:

 “O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando:”

I – “Provada a inexistência do fato;”

A segunda alteração trazida pela Lei 11.689/2008 referente à absolvição sumária, diz respeito ao erro quanto ao autor do delito. Neste caso, é demonstrado que houve o fato típico, porém o autor do crime não é aquele que esta sendo acusado, devendo, desde logo, ser absolvido sumariamente.

Dispõe o artigo supramencionado inciso segundo:

II – “Provado não ser ele o autor ou partícipe do fato;”

Por fim, a terceira hipótese de absolvição sumária cuida-se de fato atípico. O fato pode ter ocorrido e o acusado pode também ter sido mesmo o autor, porém não há legislação que regule aquele fato como sendo criminoso, é o famoso crime impossível.

Veja-se inciso terceiro, do artigo 415, da Lei nº.11.689/2008:

III – “O fato não constituir infração penal;”

Uma outra mudança significativa abarcada pela nova redação do Código de Processo Penal faz menção ao Recurso de ofício previsto no antigo artigo 411 da legislação processual penal brasileira de meados dos anos 40.

Segundo tal dispositivo, “o juiz absolverá desde logo o réu, quando se convencer da existência de circunstância que exclua o crime ou isente de pena o réu (arts. 17,18,19, 22 e 24, § 1º, do Código Penal), recorrendo, de ofício, da sua decisão. Este recurso terá efeito suspensivo e será sempre para o Tribunal de Apelação”.

O dispositivo legal acima citado foi substituído pelo atual artigo 415 da lei 11.689/2008, deixando, assim, de existir o recurso de ofício no procedimento do júri, no âmbito da absolvição sumária. Neste mesmo sentido, prevê o artigo 416 da mesma Lei, “Contra a sentença de impronúncia ou de absolvição sumária, caberá apelação” e não mais recurso em sentido estrito.

Por fim, vale ainda mencionar que a partir da vigência da lei que alterou grande parte da legislação processual penal – Lei 11.689 – em agosto de 2008, adotou-se a possibilidade, quando for de interesse da defesa, que se leve ao procedimento do júri, réu tido como inimputável, não cabendo mais ao juiz a absolvição sumária obrigatória, uma vez que, em plenário, poderá ser absolvido por causa diversa, livrando-se da medida de segurança.

A prisão cautelar no procedimento do júri.

De acordo com o antigo artigo 408, parágrafo 1º, do Código de Processo Penal, previa que, em regra, existindo pronúncia[18], deveria ser decretada a prisão cautelar do acusado. Cabe análise do mencionado artigo:

Art. 408: “Se o juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o autor pronunciá-lo-á, dando motivos do seu convencimento”

Parágrafo 1º: “Na sentença de pronúncia o juiz declarará o dispositivo legal em cuja sanção julgar incurso o réu, recomendá-lo-á na prisão em que se achar, ou expedirá as ordens necessárias para sua captura”

Com a atual redação introduzida pela Lei nº. 11.689/2008 esse procedimento foi alterado de forma a beneficiar o réu. A prisão cautelar deixou de ser obrigatória e não mais depende a liberdade do acusado dos requisitos previstos nos artigos 408, parágrafo 2º do antigo Código de Processo Penal, quais sejam, “primariedade” e “bons antecedentes”.

De acordo com o dispositivo 413, parágrafo 3º desta mesma Lei, “o juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de qualquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código.”

Outrossim, outra alteração trazida pela Lei nº. 11.689/2008, diz respeito ao não comparecimento do réu às audiências. Nesta hipótese, não mais poderá ser decretada a sua prisão cautelar, vez que é direito do réu não comparecer à audiência, mesmo que a intimação tenha sido efetuada com sucesso, bem como, tem o direito de permanecer calado durante a fase do interrogatório criminal.

Em suma, a prisão cautelar não mais é decretada sob os requisitos de “primariedade” e “bons antecedentes”. Esse tipo de prisão foi inserido nos fundamentos da prisão preventiva, ou seja, para que a medida da prisão cautelar seja determinada, é necessário que seja feita análise do disposto no artigo 312 do Código de Processo Penal, tais quais, a “garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.”

Segundo o doutrinador Guilherme de Souza Nucci, “o libelo era a peça acusatória, com conteúdo fixado pela decisão de pronúncia, expondo, na forma de artigos, a matéria que seria submetida a julgamento pelo Tribunal do Júri, limitando a atuação do órgão acusatório e permitindo plena ciência, pela defesa, do que seria alegado em plenário.”

José Carlos Gobbis Pagliuca ensina que “o libelo é a petição que instaura o judicium causae (mérito da causa) e deve ser articulada, isto é, fato por fato, referente ao que foi pronunciado o réu. Serve, ainda, para o juiz se embasar na feitura dos quesitos no que diz respeito à acusação”.

A supressão do libelo e da contrariedade do libelo vem sendo bastante contestada pelos processualistas. Com o fim do libelo buscou-se limitar de forma fundamental, a decisão de pronúncia. Caso o magistrado, baseando-se na pronúncia, não elabore quesitos concentrados, pode a defesa ser prejudicada em plenário, o que acarretaria um sério gravame ao princípio constitucional da plenitude de defesa.

Por relatório do processo entende-se o resumo elaborado pelo magistrado-presidente da sessão, contendo os principais fatos narrados ao longo do processo, mas, todavia, não emitindo qualquer avaliação subjetiva a respeito do caso.

No procedimento anterior à redação da Lei nº. 11.689/2008, essa medida era tomada após o interrogatório do réu em plenário e verbalmente. Esse momento em que era realizado o relatório era visto como inadequado, pois, somente após o interrogatório do acusado era que os jurados adquiriam conhecimentos relevantes do processo que iriam julgar, limitando, portanto, a possibilidade de fazer reperguntas.

Neste mesmo sentido, o relatório feito de forma oral não era memorizado de maneira concisa pelo Conselho de Sentença, que, ao longo das atuações dos órgãos de defesa e acusação em plenário, já não absorveriam todas as informações expressadas verbalmente de forma tão clara.

São partes principais na composição do relatório: resumo do conteúdo da denúncia ou queixa; resumo do conteúdo da defesa prévia (diga-se resposta escrita) com suas alegações preliminares e/ou exceções; elenco das provas colhidas ao longo do inquérito policial; resumo do conteúdo do interrogatório do réu; resumo do conteúdo das alegações finais; resumo do conteúdo da pronúncia; exposição de pontos excepcionais (exemplo: se houve prisão preventiva, prisão em flagrante); se houve aditamento à denúncia e alteração da pronúncia, após a preclusão; quais as provas requeridas e, eventualmente, realizadas na fase de preparação do plenário. Não excluindo as outras que o magistrado considerar importante para o relatório do processo.

Com a alteração da nova lei ao Código de Processo Penal, o relatório ganhou forma escrita e passou a ser incluído na pauta da reunião do Tribunal do Júri, possibilitando o acesso aos jurados antes da instrução em plenário. Para a grande maioria dos processualistas a alteração foi positiva e engrandecerá, ainda mais, a Instituição do Júri.

Com a reforma[19] trazida pela Lei nº. 11.689/2008 restringe-se a leitura cansativa de peças consideradas sem utilidade ou de pouco interesse para que se apure a busca da verdade real.

A leitura dos autos, por um todo, utilizada anteriormente, muitas vezes como instrumento para se ganhar prazo, foi eliminada e a nova redação introduzida ao Código de Processo Penal pela lei supracitada prevê que será admitida somente a leitura de peças que dizem respeito às provas colhidas por carta precatória no juízo deprecado (exemplo: colheita de testemunho), provas cautelares (exemplo: exame necroscópico), provas antecipadas ou próxima a sucumbir (exemplo: oitiva antecipada de testemunha já em idade avançada) e, por fim, as provas não repetíveis.

Entende-se por desaforamento[20] “a situação em que determinado julgamento pelo júri é desaforado, ou seja, transferido da comarca originária para o julgamento do crime a outra (art. 424), causando a derrogação de competência”.

Nucci, por sua vez, entende que desaforamento é “a decisão jurisdicional que altera a competência inicialmente fixada pelos critérios constantes do artigo 69 do Código de Processo Penal, com aplicação estrita no procedimento do Tribunal do Júri, transferindo a apreciação do caso de uma para outra comarca.”

Dispõe o artigo 69 do Código de Processo Penal: “Determinará a competência jurisdicional:

I – o lugar da infração;

II – o domicílio ou residência do réu;

III – a natureza da infração;

IV – a distribuição;

V – a conexão ou continência;

VI – a prevenção;

VII – a prerrogativa de função.”

O juiz que conduz o processo não terá competência para o desaforamento. Essa competência é sempre da Instância Superior. Ao contrário do que muitos dizem, o desaforamento não viola o princípio do juiz natural, tratando-se de medida excepcional, com previsão em dispositivo legal, não tendo, portanto, o que se falar em inconstitucionalidade para tal instituto.

São basicamente quatro as hipóteses legais para que ocorra o desaforamento e estão previstas no artigo 427, caput, da Lei. 11.689/2008.

Cabe análise: “Art. 427: Se o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado, o Tribunal, a requerimento do Ministério Público, do assistente de acusação ou mediante representação do juiz competente, poderá determinar o desaforamento do julgamento para outra comarca da mesma região, onde não existam aqueles motivos, preferindo-se as mais próximas.”

Nas três hipóteses acima mencionadas, o pedido de desaforamento poderá ser feito por requerimento das partes ou de representação do juiz à Presidência da República ou Tribunal Regional Federal, expondo tais motivos para a razão do pedido. Acontece que o artigo 428, caput, também da Lei 11.689/2008, prevê outra hipótese para o desaforamento e, nesta última hipótese, somente as partes poderão requerê-lo, a saber:

“Art. 428: O desaforamento também poderá ser determinado, em razão do comprovado excesso de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte contrária, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da decisão de pronúncia.”

Se o pedido de desaforamento for requerido pelas partes, o magistrado da Comarca é ouvido, pois não há outro indivíduo em posição mais favorável que o juiz para informar a real situação ao Tribunal. Neste mesmo sentido, tem-se que o desaforamento somente é válido para processo cuja decisão de pronúncia já tenha sido transitada em julgado.

A partir da entrada em vigor da Lei nº. 11.689/2008, restou mantido o desaforamento em sua forma original, mas algumas mudanças foram realizadas. O Ministério Público não pode mais proceder em tal pedido, tendo em vista o excesso de prazo para a efetivação do julgamento. Esse prazo acima mencionado, que era de um ano, diminuiu e passa a ser de seis meses a ser contado da decisão de pronúncia transitada em julgado.

Conforme prevê o artigo 427, caput, enfocado acima, o desaforamento pode ser feito para Comarca da mesma região, dando preferência àquelas mais próximas.

Doravante, o relator do pedido de desaforamento, havendo motivos relevantes, terá poderes de determinar a suspensão da sessão em plenário, bem como, restou possível a inclusão, requerida ao Tribunal se seu caso em pauta de julgamento, se não for tumultuar a capacidade de apreciação pelo Tribunal Popular.

Anteriormente à vigência da Lei nº. 11.689/2008, não havia regulação normativa ao direito dos apartes, porém, o artigo 3º do Código de Processo Penal admite que sejam valorados os princípios gerais do direito, entre eles o norteador do Tribunal do Júri, o princípio da oralidade.

Com a aplicação desta lei, passa-se a existir, de forma legal, o aparte “como parte integrante dos debates, atribuindo ao juiz presidente o seu controle.”  O artigo 497, XII da Lei nº 11.689/2008 estabelece:

Art. 497: São atribuições do juiz presidente do Tribunal do Júri, além de outras expressamente referidas neste Código: XII - regulamentar, durante os debates, a intervenção de uma das partes, quando a outra estiver com a palavra, podendo conceder até 3 (três) minutos para cada aparte requerido, que serão acrescidos ao tempo desta última.

Por apartes, leciona Guilherme de Souza Nucci, “constitui este o direito que a parte possui de interromper o discurso da outra, durante sua manifestação, para brevemente, expor algum ponto controverso ou prestar algum esclarecimento, no interesse maior do Conselho de Sentença.”

O direito ao aparte permaneceu no cenário do júri por longos anos e ganhou força através do costume, entretanto, só a partir de agosto de 2008, quando entrou em vigor a lei acima mencionada, é que esse direito ganhou normatividade e passou a fazer parte do corpo legislativo processual penal.

Segundo Nucci, “o quesito é uma indagação objetiva, espelhando uma questão de fato, embora possa conter aspectos jurídicos, destinada aos jurados, durante a votação para atingir o veredicto, a ser respondida de maneira sintética, na forma afirmativa ou negativa.”

Dispõe o artigo 482 da Lei nº 11.689/2008 que, “o Conselho de Sentença será questionado sobre matéria de fato e se o acusado deve ser absolvido”. O parágrafo único do mesmo dispositivo legal complementa, “os quesitos serão redigidos em proposições afirmativas, simples e distintas, de modo que cada um deles possa ser respondido com suficiente clareza e necessária precisão.

Na sua elaboração, o presidente levará em conta os termos da pronúncia[21] ou das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação, do interrogatório e das alegações das partes.”

Os quesitos formulados deverão indagar sobre “a materialidade do fato”, a “autoria ou participação”, “se o acusado deve ser absolvido”, “se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa” e, por fim, “se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação” (Artigo 483, do atual Código de Processo Penal).

Cabe informar que, segundo parágrafo 1º do mesmo artigo acima citado, “a resposta negativa, de mais de 3 (três) jurados, a qualquer dos quesitos[22] referidos nos incisos I e II do caput deste artigo encerra a votação e implica a absolvição do acusado.”

O art. 478 do Código de Processo Penal estabelece restrições ao comportamento das partes durante os debates, vedando referência, sob pena de nulidade:

1. À decisão de pronúncia, às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado.

2. Ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento, em seu prejuízo. A lei também proíbe que se faça menção, em desfavor do réu, à circunstância de ter permanecido em silêncio por ocasião do interrogatório ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento.

Conclusão

Com o advento da Lei nº 11.689/2008 a elaboração dos quesitos passa a ser realizada de acordo com as teses levantadas pelas partes em sessão de júri e pelo conteúdo apresentado na pronúncia, e não mais pelo libelo, atualmente extinto.

Em relação ao julgamento de mais de um acusado, não mais se elabora um questionário exclusivo para cada um deles, agora, o juiz presidente deve inserir cada corréu ao questionário único elaborado por ele.

Deste modo, não mais existe quesitos autônomos para cada tese de defesa, pois todos tinham a finalidade única se conseguir a absolvição do acusado. Para tal situação, passa-se a proceder a seguinte pergunta: “o jurado absolve o acusado?”

Preservação do sigilo das votações por esse princípio constitucional estabelece-se que após supridas todas as dúvidas porventura existentes e informados aos jurados quanto à incomunicabilidade deles, assim como lido e explicado os quesitos, dar-se-á início à votação.

Ressalte-se que será reservada sala especial para a sessão de julgamento dos quesitos. A finalidade para tal é, entre tantas outras, a de garantir a segurança dos jurados que não mais estará diante dos olhares atentos do público e assegurar a sua livre convicção nas decisões.

Do mesmo modo, na ausência de sala especial para tal ato, deverá o juiz presidente, com o auxílio dos serventuários da justiça, solicitar o esvaziamento do plenário para que, enfim, se proceda a votação (Artigo 485, parágrafo 1º, do Código de Processo Penal).

Em se tratando da alteração introduzida ao sigilo nas votações pela lei em destaque, percebe-se que foi uma inovação muito significativa. Diferente do que acontecia antes de sua vigência, atualmente não mais se divulga o número total dos votos.

Alcançada a maioria (quatro dos sete votos emitidos pelos jurados), seja pelo “sim” ou pelo “não”, o magistrado colocará fim à apuração e registrará o voto para a tese da defesa ou para a tese da acusação.

Buscou-se com esta nova redação dada pela Lei nº 11.689/2008, resguardar o sigilo nas votações e dar mais celeridade ao procedimento, vez que não mais se apuram os votos em sua totalidade.

O protesto por novo júri tratava-se de um recurso especial, exclusivo da defesa, que poderia ser interposto, no âmbito do Tribunal do Júri, quando a condenação[23] destinada ao réu fosse igual ou superior a 20 (vinte) anos.

Com a vigência da Lei nº. 11.689/2008, houve a extinção imediata do protesto por novo júri, pois esse tipo de recurso era considerado inviável, uma vez que só levava em conta o quantum da pena e não cogitava a possibilidade de erro do órgão colegiado que proferiu o veredicto.

Explica Borges da Rosa que o protesto por novo júri somente foi consagrado no Código “por não ter o legislador querido se libertar da tradição vinda do Império, do tempo das penas de morte e galés perpétuas, únicas que, por suma gravidade, pareciam justificar tão esquisita espécie de recurso, que atualmente representa uma complicação desnecessária”.

Pelo fim do protesto por novo júri, posicionava-se grande parte da doutrina brasileira. Trata-se de disposição com conteúdo estritamente processual, desse modo, aplica-se de logo.

Lamentavelmente, ainda há inúmeras carências que não foram supridas até o presente momento, sendo importante que o Estado brasileiro repense seu modo de agir e administrar.

A Lei nº. 11.689/2008, visa agilizar procedimentos que anteriormente à sua vigência demandavam tempo abusivo, bem como, eliminar instrumentos que tumultuavam a máquina estatal contribuindo, ainda mais, para a sua lentidão.

Trata-se de inovação legislativa que diante de sua incidência recente passará por análise de eficácia sob o ponto de vista concreto. Em abstrato, explana disposições legais perfeitas, porém, em caso concreto, cede lugar a questionamentos no que tange a sua eficácia e funcionamento.

Os destaques acerca do art. 492, inovação trazida pela Lei Anticrime (Lei 13.964/19): A execução provisória da pena nos moldes do artigo não impede a interposição de recursos;

A questão substancial a que se refere o §3º pode significar, por exemplo: reconhecimento de nulidade do julgamento pelo júri ou julgamento pelo júri contra as provas dos autos - são aspectos que podem reverter a condenação;

A execução provisória fica impedida se os requisitos presentes no §5º forem cumulados; nesse cenário a apelação recebe efeito suspensivo pelo tribunal.

Por ocasião da sentença condenatória o juiz deve também analisar, para fins de manutenção do réu no cárcere ou de decretação de sua prisão, se estão presentes os requisitos da prisão preventiva, manifestando-se fundamentadamente sobre a matéria.

O Júri é instituição secular e seu nome é originário do latim, jurare que significa fazer juramento, em referência ao juramento prestado pelas pessoas que formarão o tribunal popular. São os jurados que decidem sobre a condenação ou absolvição do réu, e o juiz, externa tal decisão, em conformidade com a vontade dos jurados. Assim, é o cidadão, sob juramento, quem decide sobre o crime. Essa decisão do jurado é de acordo com sua consciência e não segundo a lei. Enfim, no tribunal do júri quem decide, em verdade, é a sociedade.

Referências

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Notas:

[1] A instrução em plenário encerra-se com a realização do interrogatório do acusado, se estiver presente: as perguntas serão formuladas ao acusado diretamente pelas partes, após as perguntas do juiz, iniciando-se pelo Ministério Público. Em seguida, o réu poderá ser inquirido, na ordem, pelo assistente, pelo querelante e pelo defensor, e, ainda, pelos jurados que o desejarem, os quais formularão perguntas por intermédio do juiz (art. 474, §§ 1º e 2º, do CPP).

[2] O juiz-presidente também advertirá os jurados de que, uma vez sorteados, não poderão comunicar-se entre si e com outrem, nem manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão e multa de 1 a 10 salários-mínimos (art. 466, § 1º, do CPP). É vedada, portanto, qualquer forma de comunicação, seja oral, escrita ou por meio de gestos.

[3] O prazo para o réu apresentar resposta será contado a partir da data do cumprimento do mandado ou, no caso de citação inválida ou por edital, a partir do comparecimento em juízo do acusado ou de defensor constituído (art. 406, §1º, do CPP). Na resposta, o réu poderá, além de arguir preliminares e de alegar o que entender útil à sua defesa, apresentar documentos e justificações, requerer produção de provas e arrolar até 8 testemunhas (art. 406, §3º, do CPP), número, aliás, idêntico ao que a acusação pode arrolar na denúncia (art. 406, §2º, do CPP). No procedimento ordinário, são 8 testemunhas e, no sumário, são 5. Aqui temos o total de 8 testemunhas novamente, mas devemos tomar muito cuidado vez que estamos analisando apenas a primeira fase do procedimento do júri, sendo certo que, na segunda fase, serão somente 5 testemunhas para cada lado.

[4] Os jurados são considerados funcionários públicos para fins penais (art. 327, caput, do CP), motivo pelo qual são responsáveis, no exercício da função ou a pretexto de exercê-la, nos mesmos termos em que o são os juízes togados (art. 445). Assim, se solicitar dinheiro de uma das partes para proferir decisão a ela favorável, incorre em crime de corrupção passiva. Os 25 Jurados são sorteados a partir da listagem mencionada anteriormente. Dentre estes, serão sorteados os 7 jurados que farão parte do conselho de sentença. Assim, evidente que não é o Tribunal do Júri inteiro que julgará o caso, mas apenas o conselho de sentença.

[5] Temos a seguinte ordem: 1. Ofendido (se possível, dependendo do crime pode estar morto, por exemplo) 2. Testemunhas (acusação primeiro, depois defesa) 3. Peritos, acareações, reconhecimento; 4. Acusado 5. Debates. Os esclarecimentos dos peritos dependerão de prévio requerimento e de deferimento pelo juiz. Em 10 dias, o juiz deverá deliberar sobre as iniciativas probatórias requeridas pelas partes, determinando, se pertinentes e necessárias as providências, a inquirição das testemunhas e a realização de outras provas.

[6] Também conhecido como Quarto Concílio Laterano) foi convocado pelo Papa Inocêncio III por meio da bula Vineam domini Sabaoth, de 19 de abril de 1213, para ser celebrado, em novembro de 1215, na Basílica de São João de Latrão, em Roma. Destaca-se por ter convocado a Quinta Cruzada, definido o papel da Eucaristia na Igreja por meio da declaração do dogma da transubstanciação, da doutrina que “fora da Igreja não há salvação”, da obrigatoriedade da confissão anual e de novas leis sobre a consanguinidade e o casamento. O IV Concílio de Latrão foi a maior realização do Papa Inocêncio III, e teve a maior participação de bispos de toda a Antiguidade, Idade Média e Idade Moderna, sendo o ponto mais alto e importante do papado do século XI-XIII. O Concílio foi inaugurado no dia de São Martinho (segundo o calendário litúrgico então vigente), 11 de novembro de 1215, onde Inocêncio iniciou a primeira sessão do trono da Basílica de São João de Latrão, cátedra do papa e sinal de sua autoridade suprema. Dali emitiu seus dois primeiros sermões de abertura, que explicitaram quais matérias deviam ser deliberadas pelos padres: a nova cruzada e a reforma da Igreja. A partir daí, o Concílio teve três sessões:  no próprio dia 11, e nos dias 20 e 30 de novembro. O primeiro sermão de Inocêncio, na abertura do Concílio, em 11 de novembro de 1215 tornou-se famoso e iniciava-se com as palavras de Cristo:  Desiderio desideravi hoc pascha manducare vobiscum, antequam partiar (“Desejei ardentemente comer esta Páscoa convosco, antes de partir”), e ali Inocêncio define que o Concílio tinha como principal objetivo a libertação da Terra Santa pela cruzada, e a reforma da Igreja.

[7] Entre as correntes políticas e filosóficas mais importantes dos séculos XIX e XX está, sem sombra de dúvidas, o liberalismo. O segmento clássico dessa corrente remonta ao século XVIII e tem nas reflexões sobre a economia de mercado, desenvolvidas nas ilhas britânicas, sua expressão mais nítida. Há outros segmentos, que se espalharam pelo continente europeu a partir do início do século XIX e caracterizaram-se tanto pela ação política quanto pela reflexão teórico-conceitual. Esse é o caso do francês Alexis de Tocqueville.

[8] Da sentença, que deve espelhar o veredicto do Júri, não haverá fundamentação quanto ao mérito da decisão, já que o julgamento dos jurados é feito por íntima convicção. Assim, basta ao juiz fazer menção ao resultado da votação e declarar o réu condenado ou absolvido. Já em relação à aplicação da pena ou da medida de segurança, no entanto, há necessidade de fundamentação, como ocorre em relação às sentenças proferidas pelo juízo singular. Em caso de condenação, incumbirá ao juiz aplicar a pena e decidir pela existência ou inexistência das circunstâncias agravantes ou atenuantes genéricas alegadas nos debates (art. 492, I, b, do CPP), sem que haja necessidade, portanto, de incluí-las no questionário dirigido aos jurados. As agravantes e atenuantes genéricas são aquelas previstas nos arts. 61, 62, 65 e 66 do Código Penal.

[9] Não havendo o quórum necessário, a sessão não será instalada, já que constitui nulidade a realização do julgamento quando não presentes pelo menos 15 jurados (art. 564, III, i, do CPP). Nessa situação, o juiz realizará o sorteio de jurados suplentes e designará nova data para julgamento, intimando os novos jurados. Importante ressaltar que os nomes dos suplentes serão consignados em ata, remetendo-se o expediente da convocação. Isso ocorre para garantir o registro e preservar a segurança jurídica no procedimento do júri.

[10] Crimes dolosos contra a vida são apenas aqueles previstos no capítulo específico do Código Penal (Parte especial, Título I, Capítulo I, do CP): homicídio doloso, infanticídio, auxílio, induzimento ou instigação ao suicídio e aborto, em suas formas consumadas ou tentadas (art. 74, § 1º, do CPP).

[11] O Código de Processo Penal trata das algemas apenas ao regular a instrução e os debates em plenário do júri, prevendo que seu uso será permitido somente em caso de absoluta necessidade à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes (art. 474, § 3º).

[12] É possível que o júri não condene o réu pela prática de crime doloso contra a vida e não o absolva dessa imputação, mas opte pela desclassificação da infração para outra de competência do juízo singular, hipótese em que o juiz-presidente suspenderá a votação e proferirá sentença na mesma sessão (art. 492, § 1º, do CPP). Ex.: desclassificação de tentativa de homicídio para lesão corporal grave.

[13] O art. 479 do CPP estabelece exceção à regra geral de que a prova documental pode ser introduzida nos autos a qualquer tempo, pois proíbe que durante o julgamento seja lido documento ou exibido objeto que não tenha sido juntado aos autos com antecedência mínima de 3 dias, dando-se ciência à outra parte, sendo certo que é vedada a prova surpresa no Tribunal do Júri. Está compreendida nessa proibição a leitura de jornais ou qualquer escrito, cujo conteúdo versar sobre a matéria de fato constante do processo, bem assim a exibição de vídeos, gravações, fotografias, laudos, quadros, croquis, armas ou instrumentos relacionados à infração, vestes da vítima etc.

[14] A lei fixou o prazo máximo de 90 dias para conclusão do procedimento (art. 412 do CPP), mas a consequência prática do descumprimento desse prazo será, apenas, eventual libertação do acusado que esteja preso pelo processo, pois, se, embora decorrido o período em questão, não tiver sido possível concluir a instrução, a solução será aguardar a realização da prova imprescindível. Lembrando que esse prazo de 90 dias se refere à primeira das duas fases do procedimento do júri. 1. Denúncia ou queixa; 2. Defesa em 10 dias; 3. Juiz ouve o MP sobre as preliminares e documentos em 5 dias. 4. Juiz determina a inquirição de testemunhas e realização das diligências em até 10 dias; 5. Audiência de instrução (produção de provas); 6. Decisão do juiz (Pronúncia, Impronúncia, Absolvição Sumária). O juiz pode encerrar a fase de formação da culpa com uma das quatro espécies de decisão listadas a seguir, quais sejam: pronúncia, impronúncia, absolvição sumária e desclassificação.

[15] Em caso de condenação, incumbirá ao juiz aplicar a pena e decidir pela existência ou inexistência das circunstâncias agravantes ou atenuantes genéricas alegadas nos debates (art. 492, I, b, do CPP), sem que haja necessidade, portanto, de incluí-las no questionário dirigido aos jurados. As agravantes e atenuantes genéricas são aquelas previstas nos arts. 61, 62, 65 e 66 do Código Penal.

[16] Intimação da pronúncia A Lei 11.689/08 não faz mais a distinção entre a intimação da pronúncia para o crime afiançável e inafiançável, oferecendo o mesmo tratamento a ambos. O CPP em seu antigo regulamento instituía que "a intimação da sentença de pronúncia, se o crime for inafiançável, será sempre feita ao réu pessoalmente" e que "a intimação da sentença de pronúncia, se o crime for afiançável, será feita ao réu: I - pessoalmente, se estiver preso; II - pessoalmente, ou ao defensor por ele constituído, se tiver prestado fiança antes ou depois da sentença; III - ao defensor por ele constituído se, não tendo prestado fiança, expedido o mandado de prisão, não for encontrado e assim o certificar o oficial de justiça; IV - mediante edital, no caso do no II, se o réu e o defensor não forem encontrados e assim o certificar o oficial de justiça; V - mediante edital, no caso do no III, se o defensor que o réu houver constituído também não for encontrado e assim o certificar o oficial de justiça; VI - mediante edital, sempre que o réu, não tendo constituído defensor, não for encontrado". Já a nova Lei fixa que "a intimação da decisão de pronúncia será feita: I – pessoalmente ao acusado, ao defensor nomeado e ao Ministério Público; II – ao defensor constituído, ao querelante e ao assistente do Ministério Público, na forma do disposto no § 1° do art. 370 deste Código. Parágrafo único.  Será intimado por edital o acusado solto que não for encontrado".

[17] É a sentença definitiva por meio da qual a pretensão punitiva é julgada improcedente. Trata-se, portanto, ao contrário do que ocorre com a impronúncia, de decisão de mérito, que terá lugar quando o juiz entender: 1. provada a inexistência do fato; 2. provado não ser o acusado autor ou partícipe do fato; 3. que o fato não constitui infração penal; 4. demonstrada causa de exclusão do crime ou de isenção de pena, com exceção da inimputabilidade, salvo se esta for a única tese defensiva.

[18] Pronúncia é a decisão por meio da qual o juiz, convencido da existência material do fato criminoso e de haver indícios suficientes de que o acusado foi seu autor ou partícipe, admite que ele seja submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri. Segundo a precisa observação de José Frederico Marques, “a pronúncia tem caráter estritamente processual e não se constitui em decisão de mérito, pois não impõe pena alguma ao réu”. É imprescindível que da pronúncia conste o dispositivo legal em que está incurso o acusado, bem como que se indiquem quais as qualificadoras e causas de aumento de pena existentes (art. 413, § 1º, do CPP). Também é requisito da pronúncia a indicação a respeito de tratar-se de crime tentado ou consumado, mas deve limitar-se a isso, não podendo o juiz discorrer de forma que influencie na convicção prematura do júri.

[19] Maiores alterações Acusação e Instrução Preliminar A Lei 11.689/08 dispõe sobre a acusação e a instrução preliminar, diferente do procedimento relativo aos processos da competência do tribunal do júri, instituído no Código de Processo Penal. Este último, determinava que "terminada a inquirição das testemunhas, mandará o juiz dar vista dos autos, para alegações, ao Ministério Público, pelo prazo de cinco dias, e, em seguida, por igual prazo, e em cartório, ao defensor do réu" (antigo 406 CPP) e também que "decorridos os prazos de que trata o artigo anterior, os autos serão enviados, dentro de quarenta e oito horas, ao presidente do Tribunal do Júri, que poderá ordenar as diligências necessárias para sanar qualquer nulidade ou suprir falta que prejudique o esclarecimento da verdade inclusive inquirição de testemunhas (art. 209), e proferirá sentença, na forma dos artigos seguintes" (antigo 407 CPP).

[20] Com a nova redação, sendo deslocado para o artigo 427 pela Lei 11.689/08, ganhou a seguinte redação: "se o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado, o Tribunal, a requerimento do Ministério Público, do assistente, do querelante ou do acusado ou mediante representação do juiz competente, poderá determinar o desaforamento do julgamento para outra comarca da mesma região, onde não existam aqueles motivos, preferindo-se as mais próximas".

[21] Contra a decisão de pronúncia é interponível recurso em sentido estrito (art. 581, IV, do CPP). Uma vez findo os recursos, o art. 421 do CPP diz: “Preclusa a decisão de pronúncia, os autos serão encaminhados ao juiz presidente do Tribunal do Júri”. Portanto, no procedimento bifásico do Tribunal do Júri, só se procede ao julgamento em plenário após preclusa a decisão de pronúncia, ou seja, quando ela se torna imutável, não cabendo mais recursos. A preclusão da decisão de pronúncia, contudo, não impede a alteração da classificação dada ao delito, desde que se verifique a superveniência de circunstância que modifique a tipificação, como, p. ex., quando, em ação penal por tentativa de homicídio, a vítima falece após a pronúncia em razão dos ferimentos anteriormente causados pelo réu. Nesse caso, o juiz deve remeter os autos ao Ministério Público para a readequação da acusação e, em seguida, proferir nova decisão de pronúncia (art. 421, §§ 1º e 2º, do CPP).

[22] Os quesitos devem ser formulados na ordem adiante exposta (art. 483 do CPP) e indagarão sobre: 1º) Materialidade do Fato. - Exemplo: a) No dia 7 de setembro de 2011, por volta de 10 horas, na Avenida Independência, neste município, foram disparados projéteis de arma de fogo em direção a Mévio, provocando-lhe as lesões corporais descritas no laudo necroscópico, as quais, por sua vez, foram a causa da morte do ofendido? 2º) Autoria ou Participação - esse quesito será formulado se o júri responder afirmativamente ao quesito anterior, pois, na hipótese contrária, o acusado já estará absolvido. Exemplo: Esses disparos foram realizados pelo acusado? 3º) Acusado deve ser absolvido? — trata-se de quesito obrigatório, que só deve ser formulado se os jurados tiverem respondido afirmativamente aos dois quesitos anteriores, hipótese em que sua supressão acarreta a nulidade do julgamento. Esse quesito engloba todas as teses absolutórias. Exemplo: O jurado absolve o acusado?

[23] Em caso de condenação, incumbirá ao juiz aplicar a pena e decidir pela existência ou inexistência das circunstâncias agravantes ou atenuantes genéricas alegadas nos debates (art. 492, I, b, do CPP), sem que haja necessidade, portanto, de incluí-las no questionário dirigido aos jurados. As agravantes e atenuantes genéricas são aquelas previstas nos arts. 61, 62, 65 e 66 do Código Penal.


Gisele Leite

Gisele Leite

Professora Universitária. Pedagoga e advogada. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Conselheira do INPJ. Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Consultora Jurídica.


Palavras-chave: Direito Processual Penal Tribunal de Júri Constituição Federal de 1988 Crimes contra a Vida

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