Bancário vítima de assédio moral é indenizado em R$ 500 mil

Metas absurdas e cobranças diárias, além do cumprimento imediato do trabalho, inclusive aos finais de semana, eram cobrados pela empresa, seguidos sempre de ameaças e humilhações

Fonte: TRT 15ª Região

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No início de 1990, quando o reclamante foi admitido por concurso como escriturário no renomado banco estadual, o trabalho lhe parecia satisfatório, até porque o serviço garantia a estabilidade de emprego e a agência em que trabalhava, dentro do Fórum da Comarca de Presidente Prudente, era pequena, do tipo posto de atendimento bancário (PAB). Onze anos depois, o banco foi privatizado e passou a integrar um grupo europeu. O trabalhador teve de ser reavaliado para assumir o cargo de gerente, dentro de um novo plano de carreira. Metas absurdas e cobranças diárias, além do cumprimento imediato do trabalho inclusive nos finais de semana e durante a noite, seguidas sempre de ameaças e humilhações. A vida do bancário mudou muito! Mesmo assim, recusou-se, de início, a aderir ao plano de desligamento voluntário.


Dentre suas novas atribuições no “novo” banco, o trabalhador tinha de vender produtos, como previdência privada. Não era fácil convencer os clientes, lembra o reclamante, em sua maioria juízes e promotores, os quais já possuem estabilidade e aposentadoria integral, a quem tinha de convencer dos benefícios dos produtos. Devido às recusas constantes e aos baixos resultados nas “vendas”, o gerente era humilhado e pressionado pelos superiores, que o chamavam de “batata podre” e “verminho”.


Decidiu então abrir mão da sua própria estabilidade e pedir demissão. Cansou de participar de reuniões em que sempre eram apresentados os cinco melhores e os cinco piores gerentes. Ficava sempre entre os piores e por isso o obrigavam a ficar em pé para receber "aplausos" dos colegas. Argumentar também não adiantava, já que o gerente regional “conversava com todos, menos com o reclamante, pois o gerente afirmava para todos ouvirem que já sabia o que o reclamante iria falar”. Quando se dirigiam a ele, era apenas com gestos de indiferença.


Nos autos que correram na Vara do Trabalho de Presidente Prudente, as testemunhas do bancário confirmaram as suas queixas. E o laudo pericial igualmente confirmou o alterado estado emocional em que se encontra o trabalhador, vítima do assédio moral. “Depressão em nível grave, com ansiedade também em nível grave e cognições de desesperança (pessimismo) em nível leve. Revela sintomas de estresse em fase de resistência. Observou-se, ainda, retraimento nas suas relações afetivas e sociais. Apresenta forte sentimento de inadequação com tendência ao isolamento, evitando assim estímulos desagradáveis”, registra o laudo.


A empresa tentou se defender, indagando à perita se o reclamante teria “noção das cobranças naturais do cargo de gerência pelas quais iria passar, a partir de sua promoção, uma vez que como escriturário já convivia com os gerentes da agência que desenvolviam a captação de clientes”. A resposta foi negativa. Segundo a perita, “os referidos cargos não existiam... tendo o reclamante ocupado o cargo logo na sua implantação”. Quando a empresa voltou a questionar a perita se as cobranças e as metas poderiam ter um caráter “motivador” para o funcionário, ela concordou, desde que “acompanhadas de incentivos”. Os documentos incluídos nos autos comprovam, porém, as cobranças e nenhum incentivo ao reclamante. Ela concluiu: “A partir do momento que as cobranças estabelecem pressões irreais de desempenho, em curto prazo, acaba se tornando em fator organizacional desencadeante de estresse, medo e ansiedade”.


Nos autos da reclamação trabalhista estão registradas algumas formas de cobrança aplicadas pelo banco: “Se não fazemos nossa obrigação de casa, que é nossa meta, algo está errado. Nós somos pagos para entregar, se não entregamos, falhamos”; “crescer ou morrer”; “não queremos justificativas, queremos ações para que a agência e consequentemente a regional cumpram suas metas no produto”; “...REVERTAM ISTO JÁ!!!!”; “...Fica difícil ser feliz”; “ou vocês se conscientizam de que temos que fazer agora ou vamos sofrer novamente”; “façam hoje ou se preparem para amanhã, ninguém mais tem estabilidade”, “mantenham seus celulares ligados neste final de semana pois estarei conversando com todos vocês”.


O autor não suportou. Pediu dispensa em 1º de setembro de 2004. Um pouco antes, em julho, tinha ido ao psiquiatra, o qual constatou “quadro de angústia, associado a sintomas de somatização, como alteração da concentração, cansaço e sensações de que seu organismo não vem funcionando de forma comum”. O médico prescreveu afastamento de suas tarefas e serviços profissionais por quinze dias e, após, início de tratamento especializado.


A perita salientou que “o reclamante foi avaliado nos mais diferentes aspectos, sendo utilizadas, além da entrevista pessoal, aplicação de testes psicométricos e projetivos, que são meios de diagnósticos aprovados pelo Conselho Regional de Psicologia”.


Ficou comprovado nos autos que o assédio tinha o objetivo de forçar o bancário estável a pedir demissão, uma vez que não quis aderir ao plano de desligamento voluntário. Mesmo assim, a sentença do juízo de primeiro grau julgou improcedentes os pedidos do autor.


O acórdão da 3ª Câmara do TRT da 15ª Região entendeu diferente, e seguiu o caminho contrário. O relator da decisão, desembargador Edmundo Fraga Lopes, lembrou que “seria ingênuo acreditarmos que atitudes do tipo descrita pela testemunha, de humilhação e grosseria, cumprimento de metas impossíveis, cobranças feitas pelo viva-voz em reunião com todos os gerentes, expressões do tipo: ‘você está mal na foto’, ‘assim fica difícil manter’; ‘não tem mais estabilidade’... etc., não teriam o condão de desestabilizar o funcionário ou de criar nele os sintomas já salientados, avaliados e discutidos”.


O acórdão considerou que “o assédio foi contundente no ano de 2004, levando empregado estável, até 2007, a pedir a própria dispensa, ficando desempregado desde 2004 até o presente momento”. Para tomar a decisão de condenar a empresa ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 500 mil, acrescido de juros e correção monetária, a decisão colegiada considerou o lucro do banco em 2004, “de 3,61 bilhões de euros, ou seja, R$ 9,50 bilhões”, bem como o efeito pedagógico da punição, “para que o banco repense suas metas em relação aos seres humanos que para ele trabalham”.


O banco embargou a decisão colegiada, com o pretexto de que “não foram enfrentados todos seus argumentos de defesa levantados nas contrarrazões”. A resposta foi sucinta e esclarecedora: “não cabe ao julgador rebater todas as teses apresentadas pelas partes, mas decidir de forma fundamentada cada instituto, o que efetivamente ocorreu”. Por fim, o colegiado concluiu: “por amor ao debate, informo ao embargante que se suas alegações de defesa não tivessem sido consideradas, a condenação que lhe foi imposta teria sido bem maior que os R$500 mil arbitrados”.

 

Palavras-chave: Bancário; Assédio Moral; Ameaças; Humilhação; Indenização

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10 Comentários

josé giovannetti advogado09/12/2010 22:58 Responder

500 mil reais é muito dinheiro e dinheiro não é capim. Há de se perguntar qual a razão do cidadão permanecer no emprego no qual ele é maltratado?

Maura Dorilêo advogada10/12/2010 1:15 Responder

Prezado colega, acredito que você não tenha entendido que o empregado acima não conseguiu permanecer no trabalho e, então pediu demissão. Não vejo razão para o colega ficar tão perplexo pela quantia auferida pelo empregado a titulo de assédio moral, pois tu passas a impressão de que desconhece o direito. Ademais, 500 mil é quase nada frente a dor e a humilhação pela qual o empregado sofreu. Antes de criticar, coloque-se no lugar.

Anônimo bancária, estudante de Direito10/12/2010 1:56 Responder

Concordo plenamente, com a opinião de Maura, pois bem sei como é, trabalho em banco e não tem preço o esforço dispensado para alcançar essas benditas metas, que tanto tira o sono e o sossego dos funcionários.

João Anselmo advogado10/12/2010 2:19 Responder

Concordo plenamente com a opinião da Maura. Porém, caso haja possibilidade de recurso, certamente tal valor será alterado.

CARLOS ROBERTO ADVOGADO E EX BANCARIO10/12/2010 17:03 Responder

Se recorrerem,deve até aumentar o valor da indenização, à uma que a cobrança por meta, é uma verdadeira lavagem cerebral, e em muitos casos quem cobra extrapolam, são mais reais que a realeza, na maioria dos casos são pessoas que foram promovidas por puxasaquismo, e de cultura limitada, à duas, as instituições bancarias a cada ano, apresentam lucros astronômicos em seus balanços, às custas de sua clientela por isso possuem condições para indenizar.

Sebastião de Paiva Neto Professor de Matemática10/12/2010 17:05 Responder

Sr.Dr.José Giovannetti é muito fácil falar que a quantia é exagerada, será que o Dr. não pediria mais, o Dr. deve ser advogado de alguma multinacional. Achei muito pouco, talvez eles agora vão pensar melhor em agir copm seus comandados...

sem nome estudante11/12/2010 3:21 Responder

nobre dr jose giovannetti, diga se tens alguma coisa para alguma multicional; elas tem tirado muito do trabalhador brasileiro: como saude, moral, dignidade, etc; principalmente o lucro que tem deixado o funcionario bancario na pior, parabens ao colegas que defende o trabalhador correto, justo , é isto justiça, o ser humano não é uma maquina, mas utiliza a mesma em benefício da sociedade.......

Cynthia a promotora12/12/2010 4:00 Responder

Pra mim foi pouco. Enquanto as indenizações forem mixarias ou os tribunais (em decorrência dos protelatórios recursos) diminuírem o quantum fixado pelo juiz singular, permaneceremos convivendo com situações análogas. Enquanto não pesar no bolso (e 500 mil é centavos para os trilionários bancos), único órgão importante das instituições financeiras práticas como esta continuarão se repetindo todos os dias.

josé giovannetti advogado14/06/2012 23:06 Responder

A minha opinião não muda, pois 500 mil reais é muito dinheiro para o caso em tela. Para mim que advogo há 34 anos não cheguei a ver semelhante.

josé giovannetti advogado30/06/2012 10:23 Responder

Vendedora que trabalhava fantasiada e sofria cobrança excessiva de metas será indenizada A empregadora deverá indenizar moralmente em R$ 10 mil reais a vendedora que era obrigada a se fantasia para atrair clientes e sofria excessiva pressão para bater metas - Fonte | TRT da 3ª Região - Sexta Feira, 29 de Junho de 2012

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