A crise do Estado contemporâneo

Estado contemporâneo parece as voltas com crises institucionais, políticas e, essencialmente, coloca em xeque o funcionamento e a legitimação das democracias no mundo.

Fonte: Gisele Leite

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Analisar o Estado brasileiro contemporâneo dentro da acepção de hegemonia fechada com níveis mínimos de liberalização e participação.


Nosso experimento democrático[1] no período de 1946 até 1964 apresentou sérias restrições que se refletiram no controle sobre os sindicatos e a legislação partidária e, ainda, em manifestações populistas.


Percebe-se que tanto os direitos em face do Estado como os direitos de participação no Estado foram severamente restringido nesse referido período.


Na vigência do regime, a legislação criou sistema bipartidário que somado à centralização administrativa e à diminuição de prerrogativas de legisladores das três esferas da federação brasileira.


A verdade é que a escolha dos governantes tornou-se disputa entre elites e, dividia o contexto, pois de um lado havia os defensores do regime e, de outro lado, a oposição apenas consentida.


Se pautarmos nossa observação sobre a teoria democrática do controle de poder presenta na obra de Stuart Mill[2] e extremada por Rousseau[3], podemos concluir que não houve precisamente o controle democrático de políticas governamentais. Evidencia-se ainda que os governos não prestem contas ao eleitorado e, portanto, não tinham responsabilidade perante o voto.


Foi nesse cenário entristecedor que ocorreu o crescimento do Estado brasileiro.


A começar pelo controle feito sobre a propriedade no Brasil não fora resultante de pacto entre setores operários e capitalistas e, sim, da exclusão dos primeiros do jogo político.


E, se pode afirmar que a coalisão entre a tecnoburocracia e empresários que definiu o perfil e as básicas características do controle sobre a propriedade e, que favoreceu os proprietários.


A expansão do âmbito público no Brasil ocorreu o Estado Novo[4] que pode ser considerado marco inicial do Estado contemporâneo. Sendo o referido processo de expansão incrementado durante o período do regime militar e, poder ser verificado nas mais diversas áreas de atuação do Estado propiciando a majoração de capacidade de arrecadar recursos da sociedade inaugurando nova regulamentação, quando se passou a regular amplos setores da economia, além de prover o oferecimento de serviços públicos sociais básicos tais como educação e saúde e, estabelecendo aumento do poder interventivo no âmbito produtivo.


Desta forma, posicionou-se o Estado como fornecedor de bens e insumos a fim de alavancar o progresso através da ampliação de seus gastos e receitas em área que teoricamente é peculiar da iniciativa privada e, onde o Estado não podia e nem queria atuar.


A capacidade arrecadadora do Estado brasileiro foi aumentada principalmente após 1964, a União só inverteu tal tendência somente a partir da segunda metade dos anos 60.


Nos países ocidentais contemporaneamente tem-se presenciado um processo de crescente desencanto e também forte desafeição em relação às tradicionais democracias.


A democracia promovida pelo liberalismo enfrenta cada vez mais as sucessivas crises de legitimidade e, no próprio espaço em que nasceu, aparece cada vez menos triunfante. Há um desencanto do Estado traduzido em melancólica democracia.


Cumpre antes alertar que homens e sociedades estão sempre em krisis, porque são realidades em devir. Mas, a crise é do Estado e não de sua robustez.  Não se deseja induzir a acepção de que o Estado tenha entrado em colapso ou ruína. Não se trata da tese do fim do Estado. Nem se cogita da crise do Estado em si mesmo, nem da crise do poder político, mas da crise do Estado como regime democrático.


E a nossa análise não é feita a partir da teoria das elites[5] que vê com grande suspeição a crescente democratização da sociedade. Mas, cumpre sublinhar algumas transformações em curso que atingem certeiramente a esfera do Estado. Há uma decomposição do tecido social e uma recomposição das relações existentes entre Estado e a sociedade global.


A crise do Estado nessa ótica aparece associada a novos desenvolvimentos da sociedade humana e ambos (Estado e sociedade) são campos em que se manifesta hoje a reconstituição da modernidade.


Há a recusa em assume à designação de pós-modernidade, pelo caráter superficial do conceito, quase sempre identificado com a noção de pós-modernismo, e, este com uma significação mais precisa em alguns domínios, o que acarreta a designação de sociedades atuais como hipermodernas[6], como sociedades de modernidade triunfante ou também da chamada modernidade tardia.


Enquanto que a fase de sua radicalização quando predominou a desintegração e dilaceração, a atual época da modernidade, é animada por um veemente esforço de conciliação de elementos antes separados. Dá-se a complementariedade de paradoxos.


O Estado orientado para aquisição do poder absoluto, com vista na dominação total da natureza e da história, a modernidade dissociou racionalização e subjetivação. Esta foi identificada com a sujeição, conforme pretendia Michel Foucault[7], ou com a resignação, como tendiam a pensar Horkheimer e a Escola de Frankfurt.


Converteu-se, desde então, ora com subjetivismo, derivando em falsa consciência, ora em individualismo, tornando-se o fundamento das democracias formais liberais.


Em seu lugar, entronizou-se uma história teleológica e, por seu meio, introduziu-se um princípio de totalidade a que se associou a ação do Estado. Este se tornou o principal agente da teleologia, encontrando no sendo da história apoio para a sua crescente hipertrofia.


A modernidade tardia pulveriza as grandes teleologias a promove o reencontro da subjetivação e da racionalização, dando à sociedade civil a importância que havia perdido.


A questão da crise no Estado quer na constituição da sociedade, como conjunto de relações e de práticas democráticas, quer a própria estrutura do Estado.


A democracia, tanto na opinião pública, como no pensamento filosófico ou na análise sociológica, constitui um regime político que suscita os mais diversos posicionamentos, desde a sua afirmação como um valor até à sua rejeição como a mais degenerada forma de poder, passando pela sua aceitação como a menos intolerável das modalidades de governo.


Concorrem para isso práticas democráticas que são dadas em experiência nos sucessivos momentos históricos e nos diferentes contextos sociais, e as múltiplas leituras decorrentes de idiossincrasias pessoais, suportando a autoridade, a consideram indispensável, porque simultaneamente buscam a ordem e o seu contrário e que, em função dessas leituras, julgam e valorizam a concreta existencialidade.


Na história, em sua trajetória, a democracia emerge na modernidade e aparece associada a algumas das suas ideias-chave, como sejam a liberdade, a felicidade e abundância. O racionalismo inscrito na modernidade enxerga a liberdade do homem associada à destruição ou desmistificação das crenças, ao triunfo da razão e à libertação dos constrangimentos sociais.


A verdade é que a noção de democracia foi estritamente ligada, no mundo ocidental e durante mais de dois mil anos, à ideia de democracia direta. E, desde Platão, Aristóteles, passando depois por Políbio, Gfcero, São Tomás de Aquino, Maquiavel, Jean Bodin, Thomas Hobbes e Nietzsche que goza de pouca simpatia o regime onde o poder político encontra no povo a sua única fonte.


Quem pensa o regime e perfil democrático tem em mente antes de tudo na pólis grega, nomeadamente ateniense, e rejeita a ideia de entregar o leme do poder para os aristoi, os melhores.


O liberalismo emergente dos séculos XVII e XVIII foi o herdeiro deste preconceito contra a democracia, entendendo apenas de maneira diferente esse afosioi. São disso exemplo as obras, entre outras, de Spinoza, Locke, Montesquieu e Voltaire. O argumento principal do seu discurso é o de que a democracia direta é incompatível com o Estado muito populoso e extenso.


A fórmula representativa foi sustentada pelos arautos do liberalismo como feita para limitar não só o poder absoluto dos reis como o de um povo potencialmente nivelador e perturbador, especialmente da chamada "classe perigosa",


A evolução dos Estados democráticos desde há cerca de oitenta anos tem sido marcada por tendência para a interpretação Estado-sociedade. E, nesta dinâmica funcional é caracterizada a análise habermasiana[8] por uma socialização do Estado que se afirma ao mesmo tempo em que uma estatização progressiva da sociedade. Ao movimento de politização da sociedade pelo Estado corresponde ao movimento inverso em que o Estado é então absorvido pela sociedade.


Observa-se que no desenvolvimento da democracia os sistemas políticos ocidentais são caracterizados por algumas componentes institucionais: a componente liberal, que assegura a autonomia dos indivíduos e da sociedade civil; a componente democrática que funda a legitimidade e a participação dos cidadãos e a componente previdencialista ou de solidariedade que afirma os direitos sociais.


Estas componentes todas parecem ter entrado em firme tensão, dando origem a uma dinâmica contrária à funcional, que conduz quer à procura do Estado mínimo, quer à redescoberta da sociedade civil.


Desta outra dinâmica, resulta o alargamento da democratização ligada ao reforço e extensão dos direitos sociais e do espaço de cidadania democrática e, ao aumento da capacidade organizacional da sociedade civil.


A redescoberta da sociedade civil traz em si mesma uma fonte de crítica à democracia, pois inicialmente lá nos idos dos séculos XVII e XVIII a sociedade aparece tendencialmente como realidade contratual e, por isso, política.


Já no século XIX, vem adquirir um caráter nitidamente econômico. E, em nosso tempo, a noção de sociedade civil muito se associa a redefinição de relações existentes entre o Estado e a sociedade, assumindo uma dimensão política e ética.


A ação coletiva desloca-se crescentemente dos temas econômicos para os assuntos pessoais, morais, profissionais, envolvendo princípios e sentimentos. Tal busca da sociedade civil hoje atua num clima cultural de autonomia e privatização da felicidade (que é quase obrigatória), distante dos constrangimentos sociais e políticos.


A busca da sociedade civil passa pela afirmação não propriamente de política da democracia[9] mas, especialmente de uma política da liberdade, em obediência ao princípio de que a sociedade livre é a que oferece os ensejos de vida e não impõe o modo de os usar.


Evidentemente que a existência e manutenção da liberdade estão sujeita à realização de condições da sociedade civil e não pode existir sem a afirmação eficiente dos direitos da cidadania. A procura da sociedade civil é ipso facto, uma procura de direitos iguais num quadro constitucional que domestique o poder de modo que todos gozem da cidadania como fundamento de seus anseios de vida.


Onde existe a sociedade humana, existe certamente o poder, e onde existem as estruturas de poder, há sempre distribuição desigual de possibilidades de vida. Há de se controlar o poder para que a vida finalmente se realize em liberdade.


Desde a Antiguidade Clássica se cogitava que a existência de suficiência de bens era condição essencial à prática da democracia. A modernidade abrigou a noção de lutar contra a injustiça e a desigualdade como imperativo da razão e o ideal para a perfectibilidade humana.


A abundância de bens cresceria juntamente com a liberdade à medida em que a racionalidade fosse aplicada aos mais diversos domínios da atividade social. Então, o liberalismo em seu processo de democratização, cria uma sociedade que não conseguiu, no entanto, resolver o grave antagonismo resultante da defesa simultânea de princípios da liberdade e da igualdade.


E, como o fenômeno de transferência de poderes, não de sua concentração, a democracia liberal procurou salvaguardar mais a liberdade do que propriamente realizar a igualdade.


Como a igualdade pressupõe obviamente a existência de autonomias, e como estas, são sedes de poder, não promovendo aquela igualdade, a democracia confirma e acentua severamente a concentração de poder política, contra a própria liberdade. É exatamente sobre o ideal de igualdade onde repousam as democracia e cuja existência pressupõe a diminuição progressiva das distâncias sociais e culturais.


Finalmente se entende que a crise do Estado aparece fatalmente como a crise do Estado-nação[10]. Lembremos que as nações possuem sua origem na exigência dos homens se agruparem para viverem e sobreviverem como sociedades humanas. Estas oferecem ao homem, uma identidade de base e as referências fundamentais de vida.


As nações constituem realidades sociais e culturais relativamente homogêneas, implicando, simultaneamente, uma cultura e uma vontade de pertença. Os homens buscam tendencialmente espaços sociais e culturais comuns. É a cultura partilhada que nos permite a autonomia e o acesso aos desenvolvimentos pessoais.


A crise, conforme a linguagem de Anthony Giddens[11], em face dos mecanismos de descontextualização próprios da modernidade, que retiram às relações sociais o seu caráter de imediatidade, há hoje um processo de recontextualização. Um movimento dialético que parece unir duas tendências.


A grande tendência parte do sentido da combinação do particular com o universal. A comunidade local produz um sistema de relações sociais próximas e confiáveis. E, nesta se procuram as marcas da identidade social, enquanto sedimentação de experiências.


Enfim, a modernidade é animada por um movimento de decomposição que atinge a sociedade, a família e a cultura. Nem mesmo o direito, nem a arte, nem a ética resistem ao processo de decomposição.


O poder, de fato, não existe, em si mesmo. É posicional e relacional, sendo posições estratégias que o conferem. As relações de poder tendem a ser expressas, mesmo nas democracias, na correlação em que as perdas de uns correspondem a compensações pelos ganhos de outros.


As sociedades democráticas procederam, por essa razão, a separação progressiva dos direitos do homem e da soberania do povo. É verdade que não vige uma incompatibilidade[12] teórica entre a liberdade e igualdade. Porque não são logicamente excludentes, a incompatibilidade existe somente como realidade histórica. Não pensamos que a resolução desse antagonismo real possa consistir em conceder, de boa vontade, aos outros o livre arbítrio, reservando-se o uso da liberdade.


Este é um fenômeno político e, como tal, tem servido, nas democracias, para contrariar a aspiração à igualdade. Concluímos que liberdade e igualdade só se compatibilizam na realidade mediante o desenvolvimento social.


Referências:


FERNANDES, Antônio Teixeira. A Crise do Estado nas Sociedades Contemporâneas. Porto: Conselho Directivo da F.L.U.P., 1993.


STRECK, Lenio Luiz; DE MORAIS, José Luiz Bolzan. Ciência Política e Teoria Geral do Estado. 4ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.


LIPOVETSKY, Gilles e CHARLES, Sébastien. Os tempos hipermodernos. São Paulo: Barcarolla, 2004.


HOBSBAWM, Eric J. Era dos extremos: o breve século XX: 1914/1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.


__________________Nações e nacionalismos desde 1870. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.


CADEMARTORI, Daniela Mesquita L. de.; MARCIÓ, Cesar. O Itinerário da Democracia Liberal à democracia social e constitucional. Disponível em: http://publicadireito.com.br/artigos/?cod=07a97691a9980143.  Acesso em 01.07.2017.


JÚNIOR, Marcos Braga. Biopolítica e soberania na pós-modernidade: Foucault e a crise do Estado-nação como questão para um diagnóstico do presente. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/sequencia/article/view/2177-7055.2009v30n58p131/13610 Acesso em 01.07.2017.


Notas


[1] A democracia brasileira de 1946 e frustrada em 1964 nasceu tão promissora, graças a uma Constituição avançada para sua época, dotada de garantias políticas e sociais comparáveis às atuais.


A conquista, entretanto, foi fragilizada principalmente pelo contexto internacional de confronto entre duas superpotências que emergiram da Segunda Grande Guerra Mundial, a saber, os EUA e a União Soviética. Foi um período muito instável, quando se registraram cinco tentativas de golpe de Estado pelos militares que são muito conhecidas, entre estas, a tentativa de deposição de Getúlio Vargas e ainda a tentativa de impedir a posse de Kubitscheck.


A fase democrática na história do Brasil, ocorrida entre 1946 e 1964, caracterizou-se por uma maior participação do povo no governo, uma vez que as eleições para os cargos de poderes Executivo e Legislativo voltaram a ser diretas, e a liberdade de expressão foi resgatada após tantos anos de autoritarismo e censura no País.


[2] J.S.Mill é notabilizado por valorar a liberdade política, individual e, mais especificamente, a liberdade econômica. Tal fama não é injustificada. E, o que ele denominava países civilizados que teriam como exemplo mais proeminente a Inglaterra, quando adotou a posição que, como regra geral, seria desejável, por um lado, garantir aos indivíduos o máximo de participação política e liberdade de expressão possíveis e, por outro, restringir ao mínimo a interferência do Estado na vida econômica e social.


[3] Norberto Bobbio sublinhou que o próprio Rousseau apesar de elogiar o modelo de democracia direta, reconhecia também que uma das razões pelas quais uma verdadeira democracia teria dificuldades em estabelecer-se, residia na exigência de um Estado muito pequeno, com facilidade para reunir o povo e, no qual, cada cidadão pudesse facilmente conhecer os outros.  Evidenciam-se como requisitos importantes para o exercício da democracia os conhecimentos e o exercício do poder em público. Nos dias atuais tais exigências permanecem, bem como a dificuldade em atingi-las. (In: BOBBIO, Norberto. A Crise da democracia e a lição dos clássicos. Arquivos do Ministério Público. Fundação Petrônio Portella, Brasília, ano 40, n.170. Dez. 1987).


[4] O Estado Novo ou a Terceira República Brasileira foi regime político fundado por Getúlio Vargas em 10.11.1937, que vigorou até 31.01.1946 e era caracterizado pela centralização do poder, nacionalismo, anticomunismo e por seu autoritarismo. É parte do período da história do Brasil também conhecido como a Era Vargas. Foi através de um golpe de Estado que Vargas instituiu o Estado Novo, em um pronunciamento em rede de rádio, no qual lançou o Manifesto à nação, no qual dizia que o regime tinha como objetivo reajustar o organismo político às necessidades econômicas do país. Após a Constituição Brasileira de 1937, Vargas consolidou seu poder, implementou a censura à imprensa e a propaganda era coordenada pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). Houve também forte repressão ao comunismo, amparada pela Lei de Segurança Nacional que impedira o surgimento de movimentos revolucionários tal como a Intentona Comunista de 1935, durante todo o período.


[5] A teoria das elites surgiu no fim do século XIX tendo com fundador o filósofo e pensador político italiano, Gaetano Mosca, em sua obra Elementi di Scienza Política (1896). O referido autor estabeleceu os pressupostos do elitismo ao salientar que em toda sociedade, seja esta arcaica, antiga ou moderna, existe sempre uma minoria que é detentora de poder em detrimento de uma maioria que deste está privado.


De acordo com esta teoria as sociedades estão divididas entre dois grupos: os governantes e os governados. Os governantes são menos numerosos, monopolizam o poder e impõem sua vontade valendo-se de métodos legítimos ou arbitrários. (In: CANCIAN, Renato. Teoria das Elites: O poder político monopolizado pelos governantes. Disponível em: https://educacao.uol.com.br/disciplinas/sociologia/teoria-das-elites-o-poder-politico-monopolizado-pelos-governantes.htm?cmpid=copiaecola Acesso em 01.07.2017).


[6] O termo "hipermodernidade" como ideia de exacerbação da modernidade surgiu em meadas da década de 1970 e ganhou maior destaque em 2004 devido aos estudos de autores franceses e a obra chamada "Os tempos hipermodernos" de Gilles Lipovetsky com a colaboração Sébastien Charles.


A hipermodernidade não significa a contestação da modernidade, posto que apresente características similares em relação aos seus princípios, como ênfase no progresso técnico científico, na valorização da razão humana e no individualismo.


Como assinala Sebastien Charles: “Hipermodernidade: uma sociedade liberal, caracterizada pelo movimento, pela fluidez, pela flexibilidade; indiferente como nunca antes se foi aos grandes princípios estruturantes da modernidade, que precisaram adaptar-se ao ritmo hipermoderno para não desaparecer”. Por outro lado, também não significa, uma Pós-modernidade ou o seu fim, conceito que surgiu no final dos anos 1970 e início dos anos 1980, para explicar as novas transformações sociais. O termo pós-moderno teve como mérito dar nome as grandes transformações ocorridas nas sociedades ditas como desenvolvidas, acentuando uma mudança de direção e reorganizando o funcionamento social e cultural das sociedades democráticas.


[7] Foucault combatia os processos de objetivação e de subjetivação que nos forçam para definir quem somos. Afora isso, pensar segundo esta redução implica igualmente em pensar em identidades e cenários de modo sucessivo.  A noção de biopolítica levanta dois problemas. O primeiro está ligado a uma contradição no próprio Foucault: nos primeiros textos onde aparece o termo, ele parece estar ligado ao que os alemães chamaram no século XIX de Polizeiwissenschaft, isto é, a manutenção da ordem e da disciplina por meio do crescimento do Estado. Mas, em seguida, a biopolítica parece, ao contrário, assinalar o momento de ultrapassagem da tradicional dicotomia Estado/sociedade, em proveito de uma economia política da vida em geral.


[8] Foi dada a resposta neoliberal à crise do Estado, por conseguinte, consistiu no enfraquecimento do Estado do bem-estar social e na penalização do trabalho em favor das relações de produção. E, nesse sentido, como a esquerda poderia repensar a crise do Estado Social? Ainda pode-se cogitar e defender a contraposição entre esquerda e direita? Giddens propõe a terceira via como alternativa à social-democracia e ao neoliberalismo enquanto que Habermas era defensor da retomada da social-democracia e de seu projeto de Estado de bem-estar social, exatamente como contraposição ao neoliberalismo. Tanto Habermas como Giddens esboçaram a tentativa de retomar o projeto socialdemocrata visando sanar os seus déficits em como consequência, a oferecer uma alternativa ao neoliberalismo.


[9] A social-democracia tem sua raiz marxista situada na horda centro-esquerda enquanto que o liberalismo social, por sua vez, tem matriz liberal clássica e se situa mais ao centro-direita.


Os sociais-democratas e liberais-sociais rejeitam visões individualistas extremadas como se tem notado tanto no libertrianismo quanto no conservadorismo. Os sociais democratas enxergam a sociedade como ente artificialmente dividido em classes sociais ou grupos de base socioeconômica.


Já para os liberais-sociais a sociedade é a soma de indivíduos que participam de diferentes grupos com base em suas origens, costumes, critérios econômicos, interesses entre os quais existe a simbiose e muitas vezes o embate, porém, não propriamente uma luta de classes. A desigualdade entre os indivíduos é vista como natural (sejam diferenças físicas, de sexo, idade, etnia e condição social).


Para os sociais-democratas o Estado tem papel central na promoção de uma sociedade boa, justa e saudável. Pois o Estado seria a encarnação da vontade popular e de seus valores. E, nesta medida o Estado é o principal agente de mudança social.


[10] A palavra nação advém do latim natio que, por sua vez, deriva de nãscor, que significa nascer. Tal vocábulo latino significa nascimento, povo, espécie ou classe entre outras acepções.


Atualmente o conceito de nação inclui duas representações: nação política que se refere ao âmbito jurídico-político e à soberania que constitui um Estado, e a nação cultural que é noção socioideológica mais subjetiva e que faz referência à comunidade humana com determinadas características culturais.


O termo “nação” ganhou repercussão a partir da publicação do livro de Adam Smith chamado “A Riqueza das Nações”, de 1776, que não se preocupou em caracterizar muito bem o termo, apenas o utilizou para designar as várias organizações humanas, sendo que a principal vinculação do termo Nação era com Estado. O termo foi absorvido em dois grandes movimentos históricos, a Revolução Americana e a Revolução Francesa. Em ambos utilizou-se o termo Nação para legitimar o poder do povo.


A partir daí, o termo Nação seria recorrente na história da humanidade, integrando grandes acontecimentos como os que envolveram os estopins para a Primeira e para a Segunda Guerra Mundial. No mesmo século XX, entre as guerras, fundou-se a Liga das Nações, com o intuito de tentar garantir a paz entre os povos, que foi substituída pela Organização das Nações Unidas após o segundo conflito.


[11] Atualmente vivemos em sociedade de risco que pode ser definida pela incontrolabilidade da produção desconhecimento e pela desorientação ou reflexividade que essa falta de controle provoca nas práticas sociais. Giddens, um entendimento do que vem a ser risco na alta modernidade, significa uma consciência de existência de um lado sombrio da modernidade, coisa que os fundadores da sociologia, Marx, Durkheim e Weber deixaram de certa forma de considerar. Nestes três pensadores, para Giddens, as consequências da modernidade em termos de uma preocupação com os limites do uso da racionalidade científica e dos danos ambientais resultados das práticas industriais não foram considerados. Giddens chama a atenção para a globalização do risco, em termos de intensidade do mesmo. O exemplo que oferece é o de uma guerra nuclear, na qual pode por fim a nossa sobrevivência.


E, identifica essa mesma globalização do fenômeno risco com respeito à expansão da quantidade de eventos contingentes que afetam todos.


[12] Interessante é a obra intitulada “Liberdade versus igualdade: o mundo em desordem (1915-1945) de autoria de Demétrio Magnoli e Elaine Senise Barbosa que explicam os momentos mais cruciais da história”.


A Revolução Francesa tinha uma mensagem tripartida: Liberdade, Igualdade, Fraternidade. O estandarte tríplice está na raiz das duas grandes “famílias” políticas contemporâneas. O “partido dos liberais” apoderou-se do princípio da liberdade, traduzindo-o sob forma dos direitos individuais. O “partido dos socialistas” apoderou-se do princípio da igualdade, convertendo-o numa plataforma de direitos coletivos econômicos e sociais. A história política contemporânea pode ser narrada como uma competição entre esses “partidos” para moldar as sociedades segundo um princípio preponderante.


Toda a metade inicial do século XX pode ser interpretada como uma “catástrofe única”. No seu ponto intermediário, emergiram os totalitarismos stanilista e nazista, devotados à consagração de versões diferentes da igualdade absoluta: a igualdade das classes e a igualdade dos nacionais. A “meia-noite” dos totalitarismos estendeu-se até quase a data de sua morte, mas os clarões proporcionados por pensadores geniais, sonhadores, doutrinários e ideólogos nunca deixaram de lançar flashes de luz em meio à escuridão.


Gisele Leite

Gisele Leite

Professora Universitária. Pedagoga e advogada. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Conselheira do INPJ. Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Consultora Jurídica.


Palavras-chave: Estado Democracia Liberalismo Nação Teoria Geral do Estado

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