Recurso sobre lesividade de arma de fogo sem munição será julgada pelo Plenário do STF

Fonte: STF

Comentários: (0)




Os ministros que compõem a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram remeter ao Plenário o Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 89889 que discute a lesividade e ofensividade da arma de fogo desmuniciada. O recurso foi interposto pela Defensoria Pública da União em favor Osman Leandro Ferreira Cardoso, condenado a três anos e três meses de reclusão, em regime aberto, pelo crime de porte ilegal de arma de fogo com numeração, marca ou sinal identificador raspado, suprimido ou adulterado (artigo 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei 10826/03).

Conforme a denúncia, teria sido apreendido com Osman Cardoso um revólver calibre 32 com a numeração de identificação raspada. A arma estaria sem munição e sem que pudesse facilmente ser municiada.

No recurso, a defesa alega que ?não há crime sem lesão ou efetivo perigo de lesão a um bem jurídico protegido?. Segundo a ação, "para a configuração do crime tipificado no artigo 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei 10.826/2003, é de pouca importância a circunstância de encontrar-se a arma municiada ou não, pois resta prescindível a existência de uma situação de perigo real". Sustenta violação aos artigos 59, do Código Penal (CP), e 383, do Código de Processo Penal (CPP), sustentando a atipicidade da conduta, tendo em vista a impossibilidade da arma sem munição lesar o bem jurídico protegido.

De acordo com o relatório lido pela ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, o HC contesta decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que manteve ato do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. O TJDFT entendeu que, para que se caracterize a atipicidade da conduta prevista no artigo 16, da Lei 10826/03, basta tão somente o porte de arma sem a devida autorização da autoridade competente. Para o TJDFT, a circunstância dela se encontrar desmuniciada não exclui por si a tipicidade do delito porque ela oferece potencial poder de lesão.

Voto

?Não há como manter a condenação do paciente pelo crime de porte ilegal de arma tal como previsto?, afirmou a ministra-relatora Cármen Lúcia, no início do voto. Ela destacou que ?as questões trazidas a esse julgamento referem-se à necessidade de comprovação da lesividade da arma de fogo como condição para que haja condenação do acusado pelo crime descrito na Lei 10.826/03?.

A relatora considerou juridicamente plausíveis os fundamentos da defesa, entre eles a atipicidade da conduta e a ausência da lesividade da arma de fogo apreendida. ?Há de ser lembrado de início que um dos princípios basilares do direito penal contemporâneo é o da intervenção mínima?, disse a ministra.

Ela explicou que, conforme este princípio, a norma criminal ?há de ter a sua aplicação restrita aos fatos que, efetivamente, levem em consideração bens jurídicos socialmente relevantes como a vida, a saúde e o patrimônio?, não sendo punidas as condutas que não afetem os bens jurídicos de objetiva importância social.

A ministra ressaltou que a arma apreendida com o condenado encontrava-se sem munição e sem que pudesse ser facilmente municiada. ?Essa informação é de inegável importância, pois conduz a aplicação na espécie de entendimento firmado pela Primeira Turma do Supremo no RHC 81057?, disse Cármen Lúcia. Ela afirmou que nesse julgamento a Turma considerou atipicidade do fato porte de arma de fogo sem munição.

Com base nesse precedente, a relatora afirma ?é atípica a conduta do paciente, pois, à luz dos princípios da lesividade e da ofensividade, a arma sem munição ou sem possibilidade de pronto municiamento é instrumento inidôneo para efetuar disparo, incapaz, portanto de gerar lesão efetiva ou potencial a incolumidade pública?.

Por fim, Cármen Lúcia revelou que ?não importa que arma verdadeira, mas incapaz de disparar, ou a arma de brinquedo possam servir de instrumento de intimidação para a prática de outros crimes, particularmente os comissíveis mediante ameaça, pois é certo que como tal também se podem utilizar outros objetos, da faca à pedra e ao caco de vidro, cujo porte não constitui crime autônomo e cuja utilização não se erigiu em causa de aumento de pena?.

Assim, a relatora votou no sentido de dar provimento ao recurso ordinário para anular o acórdão contestado e, considerando que o fato não constitui infração penal (artigo 386, III, do CPP ), absolver Osman Cardoso da imputação pelo crime de porte ilegal de arma com numeração raspada (artigo 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei 10.826/03).

Divergência

O ministro Ricardo Lewandowski abriu divergência do voto da relatora ao entender que se trata de um crime de mera conduta, de perigo abstrato, e o bem jurídico tutelado é a incolumidade pública. ?Eu acho que uma arma tem um potencial de intimidação extremamente visível, manifesto. A intimidação com a arma de fogo que funciona ou não funciona, de brinquedo ou outra qualquer de imitação é um flagelo com o qual a população convive?, disse o ministro.

Para ele, o legislador quis afastar a circulação de qualquer tipo de arma, carregada ou não. Dessa forma, negou provimento e foi acompanhado pelos ministros Marco Aurélio e Carlos Ayres Britto.

O ministro Marco Aurélio lembrou que a matéria está pendente de julgamento pelo Plenário do STF. Por essa razão, o ministro Sepúlveda Pertence propôs à Turma que o recurso fosse remetido ao Plenário a fim de que os casos sejam votados em conjunto.

Processos relacionados:
RHC-89889

Palavras-chave: arma

Deixe o seu comentário. Participe!

noticias/recurso-sobre-lesividade-de-arma-de-fogo-sem-municao-sera-julgada-pelo-plenario-do-stf

0 Comentários

Conheça os produtos da Jurid