Permitida realização de audiências do caso Propinoduto solicitadas por autoridades suíças

Fonte: Notícias do Superior Tribunal de Justiça

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A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu hoje (2) que poderão ser realizadas as audiências solicitadas por autoridades suíças para ouvir testemunhas e tirar cópias de documentos referentes às investigações do caso Propinoduto (como ficou conhecido o esquema de fraude na arrecadação estadual de tributos no Estado do Rio de Janeiro). As audiências, inicialmente marcadas para os dias 28 de fevereiro, 1º, 2, 3 e 4 de março, estavam suspensas por uma decisão da Vice-Presidência do STJ.

Com o argumento de que a Segunda Turma Especializada do TRF da 2ª Região estaria usurpando a competência do STJ quando autorizou a realização dos atos de cumprimento de carta rogatória sem a concessão do necessário exequatur, Reynaldo Menezes da Rocha Pitta apresentou uma reclamação no STJ, que foi deferida pelo vice-presidente, ministro Sálvio de Figueiredo, diante da potencial invasão de competência.

Na reclamação de Pitta constava o ato do TRF-2 que permitia a realização de investigações com a participação direta de autoridades suíças, a fim de instruir procedimento penal instaurado na Suíça, por suposta conexão com processo penal em apuração na Justiça Federal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro. Segundo o reclamante, o TRF "avocou para si a competência para decidir sobre a admissibilidade da carta rogatória e para executá-la", o que passou a ser competência privativa do STJ com a Emenda Constitucional 45 (reforma do Judiciário).

O Ministério Público apresentou um agravo regimental argumentando que "não se trata de dar cumprimento a carta rogatória, mas sim atender um pedido de cooperação internacional, nos moldes estabelecidos pelo Tratado de Cooperação Jurídica em Matéria Penal, firmado pelo Brasil com a Confederação Suíça em 12/05/2004 e que se encontra na Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados para exame da proposição de ratificação".

De acordo com o MP, é desnecessário condicionar ao exequatur atos simples de cooperação internacional, destinada a cumprir dever de reciprocidade e cujos efeitos serão produzidos apenas no exterior. Ainda segundo o MP, o equívoco na tradução para o português do requerimento formulado na Suíça, impropriamente traduzido como carta rogatória, não pode servir para beneficiar o reclamante, nem interferir na natureza do procedimento momentaneamente paralisado.

O MP acrescenta ainda que Reynaldo Menezes da Rocha Pitta e seu sócio, Alexandre Martins, empresários ligados ao mercado de futebol profissional com forte atuação no mercado de câmbio, foram condenados pela 3ª Vara da Justiça Federal Criminal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro por intermediarem a remessa ilegal de divisas para um grupo de pouco mais de uma dezena de fiscais de renda do Estado do Rio de Janeiro e auditores fiscais do tesouro nacional, também condenados.

Todos os fiscais e auditores estaduais condenados por remessa ilegal de divisas, por sonegação de declaração das contas no estrangeiro e por corrupção passiva possuem contas em instituição financeira suíça. O saldo dessas contas, abertas pela representação do banco suíço no Rio de Janeiro e atualmente bloqueadas em razão do processo de incriminação por suspeita de crime de lavagem de dinheiro ? processo que deu origem ao questionado pedido de colaboração ?, gira em torno de US$ 40 milhões. A instauração da ação penal no Brasil foi motivada pelas suspeitas das autoridades suíças. Desta forma, tramitam processos paralelos na jurisdição federal brasileira e suíça.

Ainda em 2003, a Justiça suíça atendeu, sob promessa de reciprocidade, pedido de cooperação formulado pelo Brasil permitindo provar a existência, a titularidade e o saldo das referidas contas bancárias. No segundo semestre de 2004, já firmado o tratado bilateral de cooperação, constatou-se que as autoridades suíças têm interesse em provar a prática de corrupção que configura conduta antecedente típica para demonstração do crime de lavagem de ativos. Isso porque, de acordo com a legislação suíça, os frutos de corrupção estão entre os raros casos em que o repatriamento dos valores está autorizado. Ou seja, isso pode permitir o retorno de US$ 40 milhões aos cofres brasileiros.

De acordo com o voto do relator, ministro Edson Vidigal, não é necessária a expedição de carta rogatória para que sejam atendidos os pedidos da Justiça suíça. Segundo o ministro Vidigal, "o acordo de cooperação jurídica em matéria penal visou à troca de informações para auxílio mútuo no combate à lavagem de dinheiro, uma das modalidades mais freqüentes de crime organizado em todo o mundo, com a importante inovação de permitir o repatriamento do dinheiro de origem ilegal mesmo antes de sentenças definitivas contra os acusados".

O ministro Gilson Dipp esclareceu, durante a votação do processo no plenário da Corte, que o pedido não veio por carta rogatória, mas por outro meio de cooperação legal: o pedido de assistência judiciária direta, prevista em todos os tratados internacionais. Portanto não haveria necessidade de exequatur e não estaria invadida a competência do STJ. Ele acrescentou ainda que o fato de um magistrado estrangeiro praticar atos jurisdicionais no Brasil não traz qualquer malferimento à soberania nacional, já que um desembargador federal brasileiro o está acompanhando".

O ministro Vidigal ressalta que o Ministério Público tem razão quando teme que a suspensão da cooperação solicitada, além do desconforto gerado nas relações entre o Brasil e a Suíça, possa comprometer a credibilidade internacional do Brasil e, principalmente, frustrar a recuperação dos US$ 40 milhões ainda bloqueados no banco suíço. Segundo o presidente do STJ, "esperar que a inquirição de testemunhas e réus e o fornecimento de cópias de documentos sejam conseguidos somente por meio de carta rogatória equivale a desconsiderar o tratado de cooperação, e, ao deixar de calçar a decisão da Justiça suíça e de comprovar a procedência criminosa do dinheiro depositado em nome dos acusados, ficará inviabilizado o seu retorno desses valores ao Brasil".

A Corte, por maioria, deu provimento ao agravo do Ministério Público, prevalecendo o entendimento de que é preciso possibilitar as cooperações informais e desburocratizadas para vencer os crimes transnacionais.

Thaís Borges
(61) 319-8588

Processo:  Rcl 1819

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