Município de Curitiba é condenado a indenizar candidato que foi impedido de participar de concurso

A inscrição do candidato foi rejeitada porque ele não conseguiu apresentar a certidão negativa de débito tributário

Fonte: TJPR

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O Município de Curitiba foi condenado a pagar a quantia de R$ 2.025,00, a título de indenização, a um candidato que foi impedido de participar do concurso intitulado “Criação e Produção Literária”, promovido pela Fundação Cultura de Curitiba. A inscrição do candidato foi rejeitada porque ele não conseguiu apresentar a certidão negativa de débito tributário (um dos documentos exigidos pelo edital do certame). Por equivocado ato da Administração Municipal, o nome dele constava, indevidamente, do cadastro de dívida ativa da Prefeitura.

 
Essa decisão da 1.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná reformou, em parte, a sentença do Juízo da 1.ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba. O relator do processo, juiz substituto em 2.º grau Fábio André Santos Muniz, aplicou ao caso a teoria da perda de uma chance. Da ementa do acórdão referente a esse julgado, extrai-se o seguinte dispositivo: “as chances reais de êxito comprovam-se pelos seguintes elementos: a) o objetivo do certame não era propriamente ‘selecionar’ os melhores, mas sim incentivar a produção literária; b) existiam 9 vagas e apenas 11 participantes inscritos; c) o autor era alguém de certo reconhecimento no meio”.

 
O recurso de apelação


Inconformado com a decisão de 1.º grau, L.J.S. interpôs recurso de apelação sustentando, em síntese, que: a) o fundamento do requerimento é a indevida inclusão e manutenção do recorrente em cadastro de dívida ativa; b) o Município reconheceu, administrativamente, o referido erro.

 
O voto do relator


O relator do recurso de apelação, juiz substituto em 2.º grau Fábio André Santos Muniz, registrou inicialmente: “A responsabilidade civil do Estado pode ser definida como o dever de reparar os danos causados a terceiros em virtude de comportamentos comissivos ou omissivos, lícitos ou ilícitos, materiais ou jurídicos, imputáveis aos agentes públicos. O artigo 37, § 6º, da Constituição Federal determina que: ‘As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.’”


Como regra a responsabilidade do Estado é objetiva, exigindo apenas uma relação de causalidade entre a ação administrativa e o resultado danoso sofrido pelo administrado.”

 
“[L.J.S.] foi impedido de participar de certame promovido pela Fundação Cultural de Curitiba por possuir Certidão Positiva de Tributos Municipais. Os débitos tributários derivam do não pagamento de ISS-FIXO que tem como hipótese de incidência o exercício da atividade de corretor de seguros, atividade que, segundo o autor, nunca teria sido exercida”, asseverou o relator.

 
A ação do Município de fato ocorreu, houve a inclusão do nome do autor em dívida ativa. O dano material ou patrimonial, como o próprio nome indica, é a lesão às relações economicamente apreciáveis da vítima, aos bens corpóreos ou incorpóreos integrantes do seu patrimônio. O dano moral é a violação ao princípio da dignidade da pessoa humana, é o sofrimento que não é causado por uma perda pecuniária.”

 
A simples inscrição indevida em dívida ativa não gera qualquer dano indenizável, é necessária a demonstração de prejuízo econômico ou prejuízo à honra.”

 
No caso o dano que pode ser observado é a perda da chance do autor de participar do concurso intitulado "Criação e Produção Literária". Devendo ser aplicado ao caso a Teoria da Perda de Uma Chance, segundo a qual a chance perdida reparável é aquela em que é possível visualizar um resultado favorável, que não seja meramente hipotético, isso porque o autor podia participar do certame e tinha chances reais de ganhar o concurso.”
 
 
As chances reais de êxito comprovam-se pelos seguintes elementos: a) o objetivo do certame não era propriamente "selecionar" os melhores, mas sim incentivar a produção literária; b) existiam 9 vagas e apenas 11 participantes inscritos; c) o autor era alguém de certo reconhecimento no meio.”
 
 
“Se o Município não tivesse inscrito o autor em Dívida Ativa, o autor poderia ter apresentado a Certidão Negativa de Débitos Municipais, conseqüentemente, poderia ter participado do certame e, quem sabe, vencido.”
 
 
Cumpre verificar então as excludentes de responsabilidade civil. O fato exclusivo da vítima ou culpa exclusiva da vítima ocorre quando o resultado danoso decorre, exclusivamente, de ação ou omissão da vítima. A culpa concorrente, por sua vez, revela-se quando o resultado danoso deriva concomitantemente da atuação culposa da vítima e da conduta do agente causador do dano.”
 
 
Em 11 de abril de 1996, requereu [L.J.S.] perante a Prefeitura Municipal de Curitiba autorização para o exercício do ramo de "corretor (vendedor de título)". A Prefeitura Municipal, após analisar os documentos apresentados expediu o Alvará nº 363.747, autorizando o autor a exercer a função de "corretor autônomo de seguros".
 
 
Por um lado, há culpa do Estado que inscreveu o autor na categoria errada (ao invés de inscrevê-lo como corretor autônomo de títulos como solicitado concedeu alvará para o exercício da profissão de corretor autônomo de seguros). Por outro, há culpa do autor, que, após realizar um requerimento administrativo, não acompanhou a resolução do processo administrativo.”
 
 
Se o Estado tivesse tomado os cuidados necessários, teria concedido o alvará para a profissão correta, o que impediria a cobrança do tributo, a inscrição em dívida ativa e permitiria a inscrição no certame (hipótese de não incidência de ISS-FIXO). Se o autor tivesse acompanhado a tramitação do requerimento administrativo teria tido acesso ao alvará e poderia ter requerido o saneamento do vício, evitando a cobrança do tributo, a inscrição em dívida ativa e permitindo a inscrição no certame.”
 
 
À luz da Teoria da Perda de uma Chance, a indenização ‘deve ser pela perda da oportunidade de obter uma vantagem e não pela perda da própria vantagem. Há que se fazer distinção entre o resultado perdido e a possibilidade de consegui-lo. A chance da vitória terá sempre menor valor que a vitória futura, o que refletirá o montante da indenização.’ (FILHO, Serio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2010, p. 78).”
 
 
No caso em análise, o certame oferecia 9 prêmios de R$ 5.400,00. Existiram 11 projetos inscritos, com o autor 12. A chance de o autor ser vitorioso era de 1/12 (um doze avos) para cada prêmio. 1/12 de R$ 5.400,00 é R$ 450,00. Como são 9 prêmios, 9 vezes R$ 450,00 totaliza R$ 4.050,00.”
 
 
Caso a culpa fosse apenas do Município, a indenização deveria ser fixada em R$ 4.050,00. Como houve culpa concorrente do autor, reduzo a indenização para R$ 2.025,00.”
 
 


Há forte controvérsia acerca da natureza jurídica da perda de uma chance, se dano moral, material ou uma terceira categoria. Entendo que o caráter é muito mais moral do que material, porque não atinge exatamente às relações economicamente apreciáveis da vítima.”

 
 
Assim, voto no sentido de dar parcial provimento ao recurso para julgar parcialmente procedente a inicial, fixado a indenização em R$ 2.025,00, com redistribuição do ônus da sucumbência”, concluiu o juiz relator.

 
O julgamento foi presidido pelo desembargador Ruy Cunha Sobrinho (sem voto), e dele participaram os desembargadores Idevan Lopes e Salvatore Antonio Astuti, que acompanharam o voto do relator.
 

Apelação Cível n.º 772540-2

Palavras-chave: Concurso Público; Comprovação; Indenização; Certidão Negativa de Débito Tributário

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