MPF/SP move ação contra ONG Terra Viva, do ABC, por mau uso de recursos do Ministério do Trabalho

JF determinou o bloqueio de bens dos réus. ONG ambiental daria curso de corte e costura, mas sequer comprou máquinas

Fonte: MPF

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A Procuradoria da República de São Bernardo do Campo ajuizou ação de improbidade administrativa contra a Organização Não Governamental "Terra Viva Movimento de Resistência Ecológica", e seu presidente, Pedro Camelo Filho, em razão de mau uso de dinheiro do Ministério do Trabalho e Emprego.


Além da ONG e de seu presidente, também são réus na ação R.F. e E.J.M.R., auxiliares de P.C., as prestadoras de serviços Instituto de Comércio Exterior do ABC (Icomex ABC) e KMCA Treinamento e Consultoria Ltda, que se beneficiaram do mau uso do dinheiro público, e o diretor de ambas prestadoras, Márcio Henrique Moreira.


No último dia 6, a Justiça Federal decretou o bloqueio de bens dos acusados. Até o momento, o bloqueio já soma R$ 97 mil em contas bancárias dos acusados e quatro automóveis. O objetivo do bloqueio é garantir o ressarcimento dos cofres públicos, caso ocorra a condenação ao final do processo. O MPF aguardou o cumprimento do bloqueio para divulgar a ação e a decisão judicial, que estavam sob sigilo até a semana passada.


No processo, o Ministério Público Federal (MPF) pede o ressarcimento, com juros e correção, de mais de R$ 300 mil que o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), por meio de um convênio, colocou nas mãos da ONG e de Pedro Camelo, nos anos de 2006 e 2007, para que fosse montado um curso de 250 horas-aula de corte e costura e empreendedorismo, destinado a qualificar duzentos jovens para o mercado de trabalho.


Com o dinheiro, a ONG também deveria estruturar uma cooperativa de costura de roupas e acessórios que empregasse pelo menos cem dos alunos formados pelo curso. O curso foi realizado, mas não chegou perto nem de duzentos alunos, nem de 250 horas-aula. A cooperativa, até onde se sabe, existe apenas no papel.


Além do ressarcimento, o MPF também pede a condenação dos réus em danos morais e nas penas da Lei de Improbidade Administrativa, que incluem multas, perda de bens, perda de função pública, suspensão de direitos políticos, proibição de contratar com o Poder Público, e de obter incentivos fiscais e crédito subsidiado.


Entenda o caso - No final de 2006, para implementar a política pública de primeiro emprego, o Ministério do Trabalho financiava projetos, apresentados por ONGs, voltados para a qualificação de jovens para o Ministério do Trabalho. A ONG Terra Viva apresentou ao MTE um projeto que chamou de "Costurando o Futuro", solicitando um financiamento de R$ 331.959,98 do Poder Público. Em contrapartida, a ONG ingressaria com R$ 16.598,00 de recursos próprios.


Com esse dinheiro, a ONG se propunha a gastar, inicialmente, R$ 60.329,98 para adquirir mobiliário e maquinário (20 máquinas de costura, 20 mesas para máquina, 12 sapatas, 4 mesas grandes para corte, 4 máquinas de overlock quatro fios, 8 máquinas de costura reta, e 20 máquinas de costura de uma agulha) para estruturar o espaço onde o curso seria aplicado. Posteriormente, a mesma estrutura física seria usada para montar a cooperativa que absorveria pelo menos metade dos alunos do curso. Montada a estrutura física, a ONG contrataria o serviço de terceiros para aplicar o curso de corte e costura e empreendedorismo de 250 horas-aula a 200 jovens, gastando nisso R$ 128,5 mil. O restante seria gasto em despesas de pessoal e de custeio. Todo o projeto deveria ser executado até outubro de 2007.


O projeto "Costurando o Futuro" foi aprovado pelo MTE, e a ONG assinou um convênio se comprometendo a executá-lo. Além dos R$ 331.959,98 - entregues à conta bancária movimentada pela ONG em duas parcelas, pagas em dezembro de 2006 e em maio de 2007 - o MTE também deixava à disposição R$ 120 mil que poderiam ser usados para pagar bolsas de estudos para manter os jovens durante o curso.

 
Costura sem máquinas - Só que P.C.F. não cumpriu o prometido e não comprou as máquinas de costura prometidas dentro do cronograma.


A ONG comprou apenas equipamento de informática (três computadores e uma impressora) por R$ 6.810,00. Posteriormente, os computadores foram encontrados na empresa KMCA Treinamento e Consultoria Ltda, de propriedade de Márcio Henrique Moreira. Pedro Camelo deixara que Márcio e a KMCA se apropriassem dos equipamentos, tanto que eles haviam recebido até etiqueta de patrimônio da empresa. A impressora não foi localizada na época. Só muito tempo depois, quando o convênio já estava sob intensa fiscalização, a ONG apresentou os equipamentos de informática ao MTE.


Para contratar a prestadora de serviços que daria as aulas de qualificação profissional, a ONG deveria, pelas regras do convênio, realizar uma licitação. Só que Pedro Camelo usou vários expedientes para que a vencedora da licitação fosse o Instituto de Comércio Exterior do ABC - Icomex ABC, dirigido também por Márcio Henrique Moreira.


Primeiro, a comissão de licitação montada por Pedro Camelo era formada por uma recepcionista que recebia menos de dois salários mínimos, e por Rosângela Freitas e Evandro de Jesus Martinelli Ramos. Acontece que Rosângela e Evandro tinham cargos dentro do Icomex. “O conflito de interesses era flagrante. Os dois jamais poderiam fazer parte da comissão de licitação e ter cargos remunerados por um licitante”, afirma o procurador da República Steven Shuniti Zwicker, responsável pelo caso.

 
Licitação fraudada - Além disso, a licitação foi artificialmente dividida em duas de menor valor, para permitir o uso de um processo chamado "convite". No convite, o contratante pode enviar cartas convidando só três empresas a participar da licitação, diminuindo a publicidade e a concorrência. Além do convite à Icomex, a comissão licitante mandou cartas apenas ao Instituto Cistema – Cidadania, Saúde, Trabalho, Educação e Meio Ambiente, que está sediada em Ribeirão Pires, e ao Instituto Vitalis, supostamente sediado em Mauá.


Só que o Instituto Cistema não teve interesse em participar da licitação por não possuir qualificação para ensinar corte e costura. E o Instituto Vitalis, pelo que se conseguiu apurar, não existe, pois não possui CNPJ, não está na lista telefônica, nem na internet, e é desconhecido pelos vizinhos. Obviamente, apenas o Icomex ABC compareceu na licitação, e foi o vencedor. Assinou dois contratos, pelo valor total de R$ 128,5 mil, para dar os cursos de qualificação profissional.


Durante os cursos, várias irregularidades ocorreram. Além de receber pelo ICOMEX ABC, Rosângela e Evandro também receberam pagamentos direto da conta do convênio, sendo pagos duas vezes para fazer o mesmo serviço. Além disso, a KMCA, de Márcio Henrique Moreira, também recebeu um pagamento de R$ 5 mil para fazer trabalho de divulgação, obrigação que era do Icomex ABC e que já estava incluída dentro dos R$ 128,5 mil contratados.


O Icomex ABC e a ONG Terra Viva jamais cumpriram a obrigação de dar 250 horas-aula. Foram formadas seis turmas, que em média receberam apenas 144 horas-aula. Uma das turmas chegou a receber apenas 48 horas-aula. Além disso, o curso jamais teve 200 alunos, como o combinado. Teve apenas 145 inscritos, e, destes, muitos não eram jovens que necessitassem de ajuda do governo para obter qualificação profissional (já estavam na faculdade, ou já trabalhavam com carteira assinada). Além disso, apenas 96 alunos tiveram frequência às aulas superior a 2%.


Nessa situação, o correto seria que a ONG Terra Viva tivesse revisto o contrato de R$ 128,5 mil para baixo, para adequar o valor proporcionalmente ao número de horas-aula e ao número de alunos, já que o Icomex ABC estava gastando menos com professores em razão do menor número de turmas e de horas-aula. Mas não foi isso que aconteceu. O Icomex recebeu, na verdade, R$ 192.979,00, muito acima do valor contratado.

 
Terminado o prazo do convênio, em 31 de outubro de 2007, a ONG Terra Viva tinha 60 dias para prestar contas ao MTE. A prestação de contas não foi feita no prazo. A ONG só se mexeu em fevereiro de 2008, depois de a prestação de contas der sido cobrada por ofício do MTE. Na prestação de contas não havia qualquer justificativa para R$ 21.987,12 gastos no projeto.


A prestação de contas foi rejeitada, e o convênio passou por um procedimento de auditoria chamado de Tomada de Contas Especial, realizado pelo MTE. Além disso, a Corregedoria Geral da União (CGU) também fiscalizou o convênio no começo de 2008. Com base nas auditorias do MTE e da CGU, o MPF entrou com a ação de improbidade administrativa, ajuizada no último dia 9 de janeiro de 2012.


Processo nº  0000031-69.2012.403.6114

Palavras-chave: Bloqueio; Meio ambiente; Máquinas; Costura; Curso

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