Discrepâncias entre "variações" e "ajustes" patrimoniais e imprecisões conceituais entre a Lei e as Normas Internacionais

Antônio Lopes de Sá, Doutor em Ciências Contábeis pela Faculdade Nacional de Ciências Econômicas da Universidade do Brasil, Rio de Janeiro, 1964; Doutor em Letras, H.C., pela Samuel Benjamin Thomas University, de Londres, Inglaterra, 1999. Administrador, Contador e Economista, Consultor, Professor, Cientista e Escritor. Vice Presidente da Academia Nacional de Economia (Brasil), Vice Presidente da Academia Brasileira de Ciências Contábeis, membro de honra do International Reserarch Institute de New Jersey, Prêmio Internacional de Literatura Cientifica, autor de 176 livros e mais de 13.000 artigos editados internacionalmente.

Fonte: Antônio Lopes de Sá

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Antônio Lopes de Sá ( * )

Em terminologia contábil estão ocorrendo problemas de compreensão no que tange a tradução do inglês para o português porque a padronização da qual nosso País se fez cativo deriva-se do domínio anglo-saxão.

Como as palavras representam as idéias e estas são objetos dos estudos sobre a realidade das coisas tem havido deficiência quanto ao entendimento face ao sentido das palavras.

Assim, por exemplo, encontra-se na recente Lei 11.638 de 20b /12/2007 que modificou a legislação societária, no que tange a classificação do patrimônio líquido uma discrepância conceitual face a Norma IAS 21, adotada pela Comissão de Valores Mobiliários.

A questão se situa entre os conceitos de "Variação Cambial" e "Ajuste de Avaliação Patrimonial".

A lei adota uma terminologia e a Norma outra.

Variação é modificação em quantidade, números, intensidade, grau etc. aplicados a alguma coisa, valor ou grau atingido na mudança, segundo o melhor vernáculo.

Logo, contabilmente "Variação Cambial" é a mudança de valor de troca face às moedas que afetam as transações de uma empresa ou instituição.

Ajuste, em idioma nacional, é o "ato de ajustar-se", uma adaptação corretiva, amoldamento, liquidação de contas, acerto ou quitação de dívida.

O "Ajuste Contábil" é, pois, a harmonização de valores de contas com o objetivo de expressar a realidade informativa através de uma correção na discrepância quantitativa de expressões de fatos.

Logo: "Variação" é a mudança e o "Ajuste" é a correção ou adaptação de um valor de conta por efeito da mudança.

Não há ajuste sem variação, mas, há variação sem ajuste o que faz o primeiro fato dependente do segundo, sem que se perca a diferença conceitual qualitativa no evento.

Não existem "Variações" classificadas em patrimônio líquido segundo a letra da lei, mas, sim, "Ajustes de Avaliação", pois assim não está mencionado.

Se no patrimônio líquido só podem existir "Ajustes de Avaliação Patrimonial", se "Variação Cambial" por si só não é ajuste, há inequivocamente impropriedade de terminologia.

O fato, em sua universalidade, perante o pensamento humano é objeto na ciência, mas, a representação verbal para expressar um conceito é algo particular e subordina-se aos efeitos idiomáticos, logo, podendo deixar de ser fiel face a uma deficiente tradução.

A simples tradução de conceitos em inglês constantes de Normas ditas Internacionais, portanto, apresenta o grave risco da imperfeição de expressão de pensamento, podendo deformar julgamentos em outro idioma.

Agrava a questão o fato de que quantitativamente ajustes e variações podem ser iguais em valor, mas, qualitativamente não o são, pois o ajuste não é o próprio bem ajustado, nem a função dele, mas uma medida atribuída, assim como a bondade não é a pessoa bondosa, nem a boa ação, mas apenas o caráter comum a pessoa e a sua prática.

A própria semelhança dos fatos patrimoniais não significa que estes se confundam nem que possam ser considerados idênticos.

A medida, pois, do qualitativo é que representa o que se lhe atribui virtualmente como mensuração defluente de uma relação.

Mesmo sem serem avaliadas as coisas existem de per si, assim como os aspectos de julgamentos entre os meios patrimoniais e suas expressões não se confundem.

O valor monetário é apenas uma medida do fato e não o próprio fato.

O ajuste é quantitativo onde a variação é o qualitativo, esta sendo a causa e aquele o efeito de um fato patrimonial.

O ajuste do preço da moeda é uma decorrência da variação que esta sofre em razão de seu poder de compra face aos níveis gerais de preços havidos em um determinado espaço econômico.

Percebe-se que o pretendido é que a alteração havida no valor de câmbio se demonstre em conta do patrimônio líquido e isto é adequado, mas, inequívoco é o defeito de redação entre os textos, estes responsáveis por conceitos que por sua vez são os que devem gerar os entendimentos.

Fácil é isso perceber pelo simples confronto de palavras:

Norma IASB IAS 21 (CPC 02)

Uma entidade deve divulgar as variações cambiais líquidas, classificadas em conta específica de patrimônio líquido, e a conciliação do montante de tais variações cambiais, no começo e no fim do período e mencionar a partir de que data está aplicando esse procedimento.

Lei 11.638 de 20/12/2007 (quanto a reforma de classificação no Balanço patrimonial)

d) patrimônio líquido, dividido em capital social, reservas de capital, ajustes de avaliação patrimonial, reservas de lucros, ações em tesouraria e prejuízos acumulados.

Fica evidente o desacerto conceitual, pois, a lei determina espaço apenas para "ajustes" e a norma o estabelece sobre "variações".

Na lei, além da impropriedade de terminologia mais uma confusão se criou quanto as Reservas de Reavaliação...

O que se destaca não é um erro de essência da Norma, mas, sim, a ausência de um rigor conceitual que se harmonize.

Como é pela linguagem que se representa o conceito, como o desenvolvimento de um idioma está preso à história de um povo, normas em inglês, expressões que no idioma de origem emitem julgamentos, não podem ser absorvidos sem o filtro idiomático, sem rigor lógico, pois, em assim não sendo, haverá sempre o risco quanto à plenitude de compreensão da idéia.

A verdade nunca deixa de ser verdade mesmo quando não percebida pelo sujeito que emite um julgamento, mas, uma vez entendida, deve ser expressa com propriedade.

Isso porque os julgamentos defluem de conceitos e são estes os que guiam a compreensão.

Há uma notória independência entre o sujeito e o objeto do conhecimento.

Nada de real inexiste porque simplesmente alguém lhe nega a existência ou não tem alcance para perceber ou imaginar.

O essencial prevalece ainda que exista a negação do objeto desconhecido ou refutado.

Como o julgamento é uma variável dependente dos conceitos e estes são os enunciados sobre uma realidade, a compreensão fiel dos fatos depende sempre de tais considerações e quando há imprecisão de afirmação pode ocorrer o mau entendimento.



Notas:

* Antônio Lopes de Sá, Doutor em Ciências Contábeis pela Faculdade Nacional de Ciências Econômicas da Universidade do Brasil, Rio de Janeiro, 1964; Doutor em Letras, H.C., pela Samuel Benjamin Thomas University, de Londres, Inglaterra, 1999. Administrador, Contador e Economista, Consultor, Professor, Cientista e Escritor. Vice Presidente da Academia Nacional de Economia (Brasil), Vice Presidente da Academia Brasileira de Ciências Contábeis, membro de honra do International Reserarch Institute de New Jersey, Prêmio Internacional de Literatura Cientifica, autor de 176 livros e mais de 13.000 artigos editados internacionalmente. [ Voltar ]

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