Comissão de Anistia nega indenização a ex-militar

O ex-militar, Cabo Anselmo, será indenizado em R$ 100 mil reais por ter sido perseguido, preso e exilado político pelo regime ditatorial, durante a década de 1960

Fonte: OAB-RJ

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A Comissão de Anistia do Ministério da Justiça negou ontem o pedido de anistia e indenização feito por J.A.S., conhecido como Cabo Anselmo. Foi a primeira vez que os conselheiros decidiram sobre um caso de agente duplo, pois o pedido foi feito por uma pessoa que alega ter atuado na resistência à ditadura, mas que também trabalhou a favor do regime militar.


Ex-militar da Marinha, Cabo Anselmo pediu uma indenização de R$ 100 mil pelo período em que, segundo ele, foi perseguido, preso e exilado político pelo regime ditatorial, durante a década de 1960.


No início da década de 1970, ele passou a colaborar com os militares, inclusive delatando antigos conhecidos. Há registros de que informações fornecidas por ele contribuíram para a morte de mais de 200 opositores do regime, informou o Ministério da Justiça. Em 2004, Anselmo protocolou pedido de anistia na comissão.


O relator do processo, ex-ministro de Direitos Humanos Nilmário Miranda, disse que a perseguição a Anselmo não foi comprovada e que ele mudou de situação, pois de eventual perseguido passou a ser perseguidor.


Segundo ele, a simples dúvida de que o Anselmo tenha sido infiltrado [na militância] desde sempre impede que sejam concedidas a anistia e a reparação, ou seja, indenização, que é uma despesa pública. Aplaudido, o ex-ministro de Direitos Humanos declarou que negava o pedido de anistia e todos os outros conselheiros acompanharam o voto.


Durante a reunião, a comissão ouviu ainda pessoas que conheceram o delator ou que foram afetadas pelas ações de Anselmo. Nos depoimentos, foi dito que é um absurdo dar indenização a uma pessoa que contribuiu com a barbárie. Anselmo não participou da sessão e foi representado pelo seu advogado, Luciano Blandy.


Ao falar em democracia, Blandy disse que o cabo foi coagido a atuar pró-regime ditatorial. Por mais dicotômico que possa parecer, é exatamente isso que estou buscando fazer aqui hoje. Preservar um regime em que a lei vale para todos sem exceção, disse. Ele está enquadrado no rol de hipóteses que permite ser um anistiado político, completou.


O advogado questionou ainda a informação de que Anselmo causou mais de 200 mortes, ao entregar militantes. O relator do caso, no entanto, rebateu que o próprio Cabo Anselmo confirmou esse número, em documentos coletados no processo. O relator também encontrou indícios de que a prisão de Anselmo teria sido armada para dar suporte à farsa do agente do regime militar.


Ainda cabe recurso da decisão na Comissão de Anistia. Mas o advogado não sabe se vai recorrer, pois, segundo ele, não consegue falar com Anselmo desde novembro. O contato é feito por meio de amigos do ex-marinheiro. Blandy explicou também que, com a anistia, Anselmo seria aceito de volta à Marinha e, assim, conseguiria registros ainda não obtidos, como carteira de identidade.


A comissão concedeu anistia a A.P., pai do atual ministro da Saúde, A.A.P.. Ele receberá uma indenização de R$ 2,4 mil por mês. Como a decisão é retroativa, ele receberá também um acumulado de R$ 229,4 mil.


Protestante da Igreja Metodista, A.P. articulava uma rede internacional de apoio a presos e perseguidos políticos, além de denunciar torturas cometidas pela ditadura militar (1964-1985). O então militante procurava abrigos no exterior a essas pessoas, o que possibilitou, segundo ele, a fuga de centenas de prisioneiros e de perseguidos pelo regime.


Ele foi preso em fevereiro de 1970, após ser delatado por pessoas da igreja. A.P. depôs durante a sessão da comissão. Emocionado, contou que se sentia impotente diante dos torturadores. Passei por um momento em que a única forma que encontrei de evitar colaborar com os torturadores foi cometer o suicídio e, segundo ele, tentou parar de respirar na cela.


Superado esse momento, o homem franzino e fraco, como descreveu a si mesmo, passou a se sentir mais forte que todos os torturadores. Mesmo com os 53 quilos que tinha na época da prisão, A.P. contou que oito torturadores chegaram a se reunir para tirar informação dele. Se precisa de tanta violência e de tanta pessoa para me torturar, é que eu sou mais forte, declarou. Ao sair da prisão, a perseguição continuou e ele teve que se exilar em 1971, pouco tempo antes do nascimento do ministro A.A.P.. Ele só pôde conhecer o filho em 1979.


Após o depoimento, os conselheiros decidiram, por unanimidade, declarar A.P. como anistiado político brasileiro e pedir desculpas formais pela perseguição, exílio, privações e todos os erros cometidos pelo Estado no passado.


A pedido de Padilha, a Comissão de Anistia vai enviar também os nomes dos torturadores à Comissão da Verdade e ao Ministério Público. No fim do julgamento, o anistiado declarou que seria capaz de reconhecer os autores das torturas. Ele defendeu ainda a revisão da Lei de Anistia. Essa lei foi imposta pelos militares. Ela é de autoanistia, disse.

Palavras-chave: Indenização; Danos morais; Ditadura; Militarismo; Perseguição; Exílio; Anistia

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