Responsabilidade Civil da escola no ordenamento jurídico brasileiro
A evolução notável da tese de responsabilidade subjetiva para a tese de responsabilidade objetiva, baseada na teoria do risco alargaram as possibilidades de indenização das vítimas e, aumentaram os investimentos na estrutura escolar na prevenção de danos materiais e extrapatrimoniais.
A
temática sobre a responsabilidade civil dos estabelecimentos escolares e de
ensino, aborda tanto aqueles que albergam os discentes quanto os que não
albergam. Importante salientar que a hipótese é de responsabilidade civil
objetiva prevista e estabelecida nos termos do artigo 932, inciso IV do Código
Civil Brasileiro. Conforme o sistema previsto no artigo 37, §6º da Constituição
Federal do Brasil de 1988 os danos perpetrados no interior de escolas públicas,
admitindo-se a indenização segundo o regramento da responsabilidade objetiva do
Estado.
Para
as escolas privadas a indenização encontra-se no Código de Proteção e Defesa do
Consumidor e, quanto aos danos indenizáveis há especial atenção quanto aos
danos extrapatrimoniais e estético, principalmente, no que repercute no direito
à imagem, conforme vem consagrando a jurisprudência.
Há de
se registrar a relevância e fundamentalidade do acesso ao direito à educação,
como única forma de propiciar ao país ao país a superação de ser terceiro
mundo, para finalmente, passar a ser o país do presente e, não mais o eterno
país do futuro, o que há de se basear em princípios e normas constitucionais
que tanto funcionam como marcos delimitadores e paradigmáticos dos anseios mais
fortes da sociedade[1].
Segundo
as lições de J.J. Gomes Canotilho, há a necessidade de uma Teoria da
Constituição dirigente[2], do contrário, não
existirá o normativismo constitucional revolucionário, capaz de por si só,
operar transformações emancipatórias, daí a curial responsabilidade
do
intérprete e do aplicador do direito na concretização e efetivação dos direitos
e princípios constitucionais.
Devemos
compreender que interpretar, conforme aludiu Karl Larenz, é uma atividade de
mediação, pela qual o intérprete traz à compreensão e o sentido de um texto que
se lhe torna problemático e, para tanto, o saber jurídico ocupa papel de
relevo, pois não se restringe a um conjunto de códigos, mas tem de ser
concebido como um processo de diálogo, de troca entre o ser e o mundo.
É
importante distinguir entre o conceito de justiça e as diversas concepções de
justiça. E, nesse sentido John Rawls nos informou que as regras jurídicas
afirmam, tanto podem conter preceitos bem precisos, que não requerem nenhuma interpretação
especial, posto que o seu significado é sempre o mesmo, as chamadas concepções,
que o legislador quis que perdurassem como decisões globais de sistema, como
podem incorporar ainda temas vagos, referências a padrões ou condutas, cuja
concretização depende essencialmente das ideias do momento, os chamados
“conceitos”, que reclamam dos juízes e dos tribunais uma complementação ou
concretização posteriores.
Em
nosso país, há expressivo número de meninos de rua e jovens colocados à deriva
que são o resultado da pobreza em que vivem suas mães, da ausência de pais ou
responsáveis, da violência dentro e fora da casa e do total abandono do Estado a
quem desta precisa. É urgente e necessário reforçar o acolhimento de crianças e
jovens pela sociedade, principalmente, pelo Estado, para que não existam
adultos que deverão ser punidos e privados de liberdade.
Segundo
o Ministro Luiz Edson Fachin, em todo campo do saber (daí a pertinência quiçá
especial com a instância jurídica), há o desafio de conhecer para transformar,
pois a educação que tão-só reproduz não liberta. Sendo pertinente invocar ainda
os ensinamentos de Paulo Freire para quem a educação é um ato de amor, por
isso, um ato de coragem. Não pode temer o debate. A análise da realidade. Não
pode fugir à discussão criadora, sob pena de ser uma farsa.
O
princípio da preservação da dignidade humana deve estar presente no âmbito de
tutela jurídica e, Ingo Wolfgang Sarlet remonta à fórmula de Günter Dürig[3], nos termos da
Constituição Alemã, para quem a dignidade da pessoa humana poderia ser
considerada atingida sempre que a pessoa concreta (o indivíduo) fosse rebaixada
a objeto, a mero instrumento, tratada como uma coisa; em outras palavras, na descaracterização
da pessoa humana como sujeito de direitos.
Pode-se
ratificar que a dignidade da pessoa humana corresponde à compreensão do ser
humano na sua integridade física e psíquica, como autodeterminação consciente,
garantia moral e juridicamente, ou, nas palavras de Alexandre de Moraes.
A
dignidade da pessoa humana é um valor espiritual inerente à pessoa, que se
manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria
vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se
em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo
que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos
direitos fundamentais, mas, sempre sem menosprezar a necessária estima que
merecem todas as pessoas enquanto seres humanos de forma que a violação a
qualquer prerrogativa que possa ser considerada como integrante do núcleo dos
direitos fundamentais da pessoa humana resultará na configuração de hipótese de
responsabilidade civil indenizatória.
Desde
o início da civilização, o dano já gerava na vítima uma ideia de vingança para
com o agressor, isto é, a justiça feita pelas próprias mãos. Limitava-se,
portanto, a retribuição do mal pelo mal, conforme pregava a antiga pena de
talião, olho por olho, dente por dente. E, que já em sua época significava um
progresso, pois a punição não extrapolar o sujeito do agressor. Já trazia
ínsito um certo princípio de proporcionalidade.
Posteriormente,
surgiu a composição da indenização a critério da vítima e, ainda o debate sobre
a culpa[4] do agente causador de
dano. Num estágio mais progressista, o Estado assume o comando e proíbe que a
vítima promova a justiça pelas próprias mãos, estabelecendo a obrigatoriedade
da composição, a partir de indenização pecuniária. E, criou-se uma tabela que
estabeleceu o quantum equivalente a um membro amputado, à morte, à ofensa moral
e, etc.
Em 572
a.C. um tributo do povo romano, chamado Lúcio Aquílio, propôs e aprovou a lei
de ordem penal, que ficou conhecida como Lex Aquilia[5],
que possuía dois objetivos, a saber: a) assegurar o castigo à pessoa causadora
do dano a outrem, obrigando-a ao ressarcimento dos prejuízos deste decorrentes;
b) punir o escravo que causasse algum dano ao cidadão, ou ao gado de outrem,
fazendo-o reparar nos outros povos, tais como: 1. direito à reparação, sempre
que existisse culpa[6],
ainda que leve, separando-se a responsabilidade civil (perante a vítima) da
responsabilidade penal (perante o Estado); 2. a existência de culpa contratual (a
das pessoas que descumprem as obrigações) e, que não se liga nem a crime e nem
a delito, mas se origina de imperícia, negligência ou imprudência[7].
Na
negligência, alguém deixa de tomar uma atitude ou de apresentar uma conduta que
era esperada para a situação. Age com descuido, indiferença ou desatenção, não
adotando as devidas precauções. Um pai de família que deixa uma arma carregada
em local inseguro ou de fácil acesso a crianças, por exemplo, pode causar a
morte de alguém por essa atitude negligente.
A
imprudência, por sua vez, pressupõe uma ação precipitada e sem cautela. A
pessoa não deixa de fazer algo, não é uma conduta omissiva como a negligência.
Na imprudência, ela age, mas toma uma atitude diversa da esperada. Um motorista
que dirige em velocidade acima da permitida e não consegue parar no sinal
vermelho, invadindo a faixa de pedestres e atropelando alguém, por exemplo, age
com imprudência.
Para
que seja configurada a imperícia, é necessário constatar a inaptidão,
ignorância, falta de qualificação técnica, teórica ou prática ou ausência de
conhecimentos elementares e básicos para a ação realizada. Um médico que
realize uma cirurgia plástica em alguém e cause deformidade pode ser acusado de
imperícia.
Importante
citar a Lex Poetelia Papiria (ano 326 a.C.) quando a dívida passou a ser
um vínculo jurídico, ou seja, imaterial, respondendo, então, pelo débito, não
mais com o corpo do devedor, mas com seu patrimônio. A obrigação, ipso facto,
deixa de vincular o corpo do devedor ao credor. E, a partir de então, não mais
deveria haver a impossibilidade de transmissão de crédito ou débito.
Quando
surgiu o Código de Napoleão[8], deu-se a distinção entre
a culpa delitual e a culpa contratual. A partir de então, a definição de que a
responsabilidade civil se funda na culpa, propagou-se nas legislações de todo o
mundo.
Raymond
Saleilles foi propulsor da teoria objetivista fundada no risco ao interpretar,
no ano de 1897, os artigos 1.382 e 1.384 do Código Civil Francês. Foi
reconhecido por toda doutrina à época, posteriormente, o grande reconhecido por
toda a doutrina à época, devido ao grande esforço realizado para tentar
vislumbrar na legislação francesa a regra objetiva.
Observa-se
que a conclusão de Saleilles é absolutamente oposta a toda a doutrina que
enxergava na expressão faute o elemento subjetivo anímico[9] (culpa), fundamento que
era a base da teoria da responsabilidade civil subjetiva.
A
maioria dos doutrinadores franceses da época sustentava ferrenhamente a
interpretação literal do Código Civil Francês de 1804 que possuía a regra geral
de responsabilidade subjetiva e, em razão disso, rechaçava por completo a
adoção da teoria objetiva. Posteriormente, a própria jurisprudência francesa
passou a interpretar as regras do Código Civil de forma extensiva, conferindo
eficácia à teoria da responsabilidade objetiva fundada no risco. Mas, não
excluía a responsabilidade subjetiva.
O
alargamento feito pela jurisprudência francesa, que acolheu a interpretação extensiva
do preconizado no artigo 1.384, nº I, do Código Civil, não ensejou o abandono da
teoria subjetiva, mas sim o nascimento de um novo princípio objetivista que acompanhava
a evolução da sociedade, principalmente no campo tecnológico e industrial, por
intermédio da teoria do risco
Apesar
de não abandonada a Teoria da Culpa, atualmente, vivenciamos o avanço da
chamada teoria do risco, que se baseia na noção de que o exercício de uma
atividade perigosa é fundamento da responsabilidade civil, conforme prevê o
artigo 927, parágrafo único do Código Civil brasileiro. Significando que a
execução de atividade que ofereça perigo possui um risco, o qual deve ser
assumido pelo agente ressarcindo os danos causados por terceiros pelo exercício
da atividade[10]
perigosa.
Afirma
Maria Helena Diniz que a responsabilidade civil é a aplicação de medidas que
obriguem uma pessoa a reparar o dano moral ou patrimonial causado a terceiros,
em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por
alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.
Configura-se
a existência de requisitos essenciais para a apuração da responsabilidade
civil, como a ação ou omissão, a culpa[11] ou dolo do agente
causador do dano e o nexo de causalidade existente entre ato praticado e o
prejuízo dele decorrente, não sendo desnecessário afirmar que, a despeito de
estar se avolumando o campo de aplicação da responsabilidade civil objetiva, o
Código Civil ainda prevê como regra a responsabilidade subjetiva, sujeita,
portanto, à verificação de um comportamento censurável, questionável,
criticável por parte do agente a quem se imputa a obrigação indenizatória.
Como
categoria jurídica, a responsabilidade civil tem como finalidade a análise da
obrigação de alguém reparar o dano que causou a outrem, com fundamento em
normas de Direito Civil. E, os alicerces embasadores, para efeito de determinar
a reparação do dano injustamente causado, são derivados da velha máxima romana
neminem laedere (não lesar a ninguém).
O
Código Civil Brasileiro vigente adotou a doutrina da culpa como princípio da
responsabilidade civil no artigo 927[12] verificando-se a
existência de quatro requisitos essenciais para a apuração da responsabilidade
civil subjetiva quais sejam: a) a ação ou omissão; b) culpa ou dolo do agente;
c) o nexo de causalidade; d) o dano sofrido pela vítima.
Há
dispositivo legal que bem retrata os casos de responsabilidade aquiliana, ou
seja, que assegura o castigo à pessoa que causa danos a outrem, obrigando-a a
ressarcir os prejuízos deste decorrentes. Em detalhada análise, de cada um dos
requisitos essenciais supramencionados. O artigo 927 do CC cogita em ato
ilícito, refere-se a qualquer pessoa, isto é ato próprio ou ato de terceiro que
esteia sob a guarda do agente, bem como os danos causados por animais ou coisas
que lhe pertençam.
Analisando
o artigo 186 CC que trata do dolo quando se refere à ação ou omissão
voluntária, para, em seguida, referir-se à culpa, cogita em negligência ou
imprudência, que deve ser provada pela vítima. O dispositivo legal também
cogita em nexo de causalidade, que corresponde à relação de causa e efeito
entre a ação e omissão do agente e o dano sofrido pela vítima, pois sem esta,
não há que se cogitar em obrigação de indenizar.
A
teoria adotada pelo vigente Código Civil brasileiro tem como fundamento da
responsabilidade a culpa, sendo denominada de responsabilidade subjetiva ou
teoria da culpa[13].
E, Caio Mário da Silva Pereira já demonstrava a falta de sintonia existente
entre a Teoria Subjetiva e o desenvolvimento da sociedade, tendo em vista, que
em vários casos, a adoção da teoria da culpa mostrava-se inadequada para
englobar todas as situações de reparação.
E, tal
inadequação era verificada nos casos em que, a aferição de provas constantes
nos autos, não eram convincentes da existência da culpa, apesar que se
admitisse que a vítima foi realmente lesada e, que existia a supremacia
econômica e organizacional dos agentes causadores do dano. Portanto, diante da
exigência da prova do erro de conduta de agente, imposta à vítima, deixava-se
sem a devida reparação em inúmeros casos.
Diante do movimento de extensão da
responsabilidade civil, não oferecia réplica satisfatória à solução de inúmeras
demandas. E, então surgiu a Teoria da Responsabilidade Objetiva ou teoria do
risco, na qual não há que se fazer prova da culpa, mas apenas do nexo de
causalidade e do dano, quando a lei impõe, entretanto, a certas pessoas, em
determinadas situações, a reparação de um dano cometido sem culpa.
Quando
isto acontece, diz-se a responsabilidade é legal ou objetiva, porque prescinde
da culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade. Esta teoria tem
como postulado que todo o dano é indenizável e deve ser reparado, por quem a
este se liga por meio do nexo de causalidade, inerentemente de culpa.
Rui
Stocco sublinhou o pioneirismo de Alvino Lima[14], na defesa da Teoria da
Responsabilidade Objetiva no direito pátrio, em sua tese apresentada em tese
apresentada na Faculdade de Direito da USP em 1938, intitulada “Da Culpa ao
Risco”, na qual além de defender a Teoria Objetiva, responde aos argumentos
adversários.
Caio
Mário da Silva Pereira, um dos preciosos doutrinadores civis brasileiros, nos
deu um excelente conceito para risco[15] e que foi citado na obra
de Rui Stocco: “é o que se fixa no fato de que, se alguém põe em funcionamento
uma qualquer atividade, responde pelos eventos danosos que esta atividade gera
para os indivíduos independente de determinar se em cada caso, isoladamente, o
dano é devido à imprudência, à negligência, a um erro de conduta e assim se
configura a teoria do risco criado[16]”.
Na responsabilidade civil das escolas e instituições de ensino veio a jurisprudência pátria[17] remoçar a lei e, despertou a justiça do imobilismo e, trouxe a festejada utilidade de sentenças que examinaram o conceito de obrigação, na dinâmica frenética conforme consignou Orlando Gomes orienta-se modernamente o Direito das Obrigações no sentido de realizar melhor equilíbrio social, imbuídos seus preceitos, não somente da preocupação moral de impedir a exploração do fraco pelo forte, senão, também, de sobrepor o interesse coletivo, em que se inclui a harmonia social, aos interesses individuais, de cunho meramente egoístico.
Ainda
analisando a repercussão da jurisprudência pátria deu-se a novidade
revolucionária da certeza do direito.
E, a
publicidade dos julgados outorgou a certeza para que exista consciência das
consequências que se expõem fazendo ou não algo. E, isso já se dá no cotidiano,
vivenciado por discentes, principalmente, crianças, do ensino fundamental,
provando que as indenizações por dano moral mudam a relação à escola
(professor) e alunos, alunas, provando que as indenizações por dano moral mudam
a relação colégio (professor) e alunos, impedindo que traumas infantis ou de
adolescência se repitam, evitando-se prejuízo, desvio ou retardo na formação de
personalidade. Atitudes sábias guiam uma vida e convém conscientizar disso os
educadores-empresários, embora com condenações pecuniárias motivadoras.
O TJAC
(Ap. 97.001619-0, in: RT 754/335) é exemplo ilustrativo: uma escola foi
condenada a pagar danos morais porque impediu que uma aluna saísse da sala para
cumprir necessidades fisiológicas, proibição que terminou fazendo com que a adolescente
urinasse nas próprias vestes e assim permaneceu durante o período de aula, fato
presenciado por colegas, levado ao conhecimento de toda a comunidade escolar e publicado
em jornal local.
Em
outro caso julgado, um tradicional colégio paulistano fora condenado a
indenizar por danos morais para aluno que fora agredido por um outo dentro do
pátio de recreação do colégio. O pagamento foi um acerto pela humilhação
causada pelo recebimento por lesões leves derivadas da briga que deveria ter
sido contida por severa vigilância aos discentes que abusaram da violência e do
uso de força física para constranger os colegas pacíficos ou os dotados de
melhor índole social (Vide Ap. 25.150-4, in JTJ, Editora Lex, 207/112).
Outro
caso, é do Rio de Janeiro. Uma aluna, menor impúbere, foi vítima de violência
pelos próprios colegas, que, desconfiados de ter sido a responsável pelo desaparecimento
de R$ 1,00 de uma aluna, fizeram-lhe uma revista pessoal vexatória, com invasão
de suas intimidades, sem que a professora, que a tudo assistiu, interviesse
para coibir o abuso. O TJ-RJ considerou que o Colégio procedeu com culpa no
dever de vigilância e disciplina na sala de aula, perdendo o controle para os
próprios alunos e aplicou indenização correspondente a 100 salários mínimos
(Ap. 1.476/00, Des. CARLOS RAYMUNDO CARDOSO, in RT 783/402).
Não
podemos banalizar os episódios violentes. E também não se pode admitir que
crianças e jovens sejam estigmatizados e, que pode redundar até em evasão
escolar. Portanto, são com sucessivas sentenças condenatórias que os
estabelecimentos de ensino estão sendo forçados a aprimorar a qualidade dos
serviços prestados, sejam com maior qualidade para os discentes, e zelando por
sua qualificação para o futuro.
É
sabido, portanto, a responsabilização civil do estabelecimento privado de
educação, depois da vigência do Código de Defesa do Consumidor brasileiro, não
mais se apresentando como mera responsabilidade indireta do educando, mas sim, como
responsabilidade objetiva direta, com amparo no artigo 14 do CDC.
Assim,
o dever do prestador de serviço, a escola, de prestar serviços seguros aos seus
consumidores (discentes), funda-se no fato do serviço e, não no fato do
preposto ou de outrem, como outrora era entendido.
Para
se aferir a responsabilidade pelos danos sofridos, faz-se premente apenas a
verificação da existência da conduta, seja esta comissiva ou omissiva, do nexo
de causalidade e do dano alegado, sem perquirir sobre qualquer elemento subjetivo.
O
notável Desembargador e doutrinador Sérgio Cavalieri Filho ainda aduz in
litteris:
“O
serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode
esperar, levando-se em conta as circunstâncias relevantes, tais como o modo do
seu funcionamento, o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam e
a época em que foi fornecido (art. 14, §1º, do CDC). Como se vê, a responsabilidade
do fornecedor de serviços tem também por fundamento o dever de segurança (...).
Mais do que possa parecer numa primeira visão, o campo de aplicação do Código,
neste ponto, é muito vasto, abarcando, na área privada, um grande número de
atividades, tais como os serviços prestados pelos estabelecimentos de ensino
(...)”.
Saliente-se
que durante o período em que o aluno se encontra sob os cuidados e auspícios da
escola e dos educadores ocorre hiato no efetivo exercício de guarda por parte
de pais ou responsáveis, até porque, durante esse período, o acesso dos pais ao
interior da escola não é permitido. Portanto, os atos praticados pelos
discentes dos quais venha a resultar em danos a outrem ou, até mesmo, a outros
discentes, resulta na responsabilidade indenizatória da própria escola.
E, a
jurisprudência pátria[18] não se afasta desse
entendimento, como pode ser evidenciado, in litteris: A jurisprudência
não se afasta deste entendimento, conforme pode ser visto, in verbis:
“(...)
o aluno fica sob a guarda e vigilância do estabelecimento de ensino, público ou
privado, com direito de ser resguardo em sua incolumidade física enquanto
estiver nas dependências da escola, respondendo os responsáveis pela empresa
privada ou o Poder Público, nos casos de escola pública, por qualquer lesão que
o aluno venha a sofrer, seja qual for a sua natureza, ainda que causada por
terceiro. Fora das dependências da escola, em horário incompatível, inexiste
qualquer possibilidade de se manter essa obrigação de resguardo”. (TJ de SP.
Apelação Cível 41.419-5 – Fernandópolis. Terceira Câmara de Direito Público. Des.
RUI STOCO, Julgado em 05.10.99).
Conclui-se
a falha do serviço prestado pela escola, em face de sua omissão em não valorar
os efeitos danosos de banais brincadeiras, consistentes em agressões leves ou
não, entre os discentes e, ainda, por não agir positivamente no sentido de
instruir seus funcionários em como proceder em tais situações.
Ao não
minorar o problema de violência ou brincadeiras violentas entre os discentes, a
escola acaba por ser permissiva, negligente e que o ato ilícito seja perpetrado
em suas dependências, caracterizado não apenas pela agressão física e moral,
como também pela violação de honra, intimidade e, de outros direitos inerentes
à própria dignidade do discente e dos próprios funcionários e de professores
que, da mesma forma, devem ser resguardadas suas prerrogativas. Não é
desconhecida de qualquer pai ou mãe, ou ainda responsável que o instinto
malicioso existente em razoável número de crianças e adolescentes, que até, naturalmente,
exercem a discriminação e preconceito com pessoas menos dotadas de aptidões
físicas, para o esporte, ou ainda as aquinhoadas com mediana inteligência ou
quando não se enquadrem nos vigentes padrões estéticos de beleza.
Ainda
argumentando a responsabilidade contratual objetiva, vem o CDC elencar entre os
direitos básicos do consumidor, o discente, o direito à inversão do ônus da
prova, segundo o artigo 6º, VIII, do CDC. Por conseguinte, caberá a escola em
eventual ação indenizatória, provar cabalmente que, de fato, não contribuiu
para a produção do incidente lesivo.
Cumpre
ainda notar que repressão a condutas impróprias no âmbito escolar, pela
entidade de ensino deverá ser feita de forma adequada e proporcional, bem como
apurado devidamente para o exame de cada caso concreto.
Ao
cominar suspensão aos discentes agressores, simplesmente, se livrando do
problema, pode estar se desvirtuando de seu fim institucional e ignorando que a
missão de uma instituição de ensino não se restringe aos limites da instrução
intelectual, mas abrange, sobretudo, a transmissão dos valores de respeito e
solidariedade aos discentes, para que com a apreensão do exemplo concretizado
no microcosmos escolar, atuem de forma condigna em sociedade.
Vide a
jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro sobre a responsabilidade
da escola para com os seus alunos:
“Responsabilidade
Civil – Agressão a aluno por outro no horário da recreação escolar – ação de
reparação de danos – procedência parcial – Apelação. Responde objetivamente o estabelecimento
escolar, seja à luz do artigo 1521, IV, do Código Civil, seja à luz do Código
de Defesa do Consumidor, artigo 14, pelo dano que o aluno causar a outro em se tratando
de responsabilidade contratual, os juros incidem a contar da data da citação. Recurso
provido em parte”. (Apelação Cível 1999.001.21287. Quinta Câmara Cível. Des. CARLOS
FERRARI. Julgado em 13/06/2000).
“Responsabilidade
Civil. Estabelecimento de ensino. Pessoa jurídica de direito privado.
Aluno
ferido por outro, com estilete, dentro da sala de aula. Responde o educandário objetivamente,
pelo dano causado, pela falha na prestação do serviço. Art. 14, da Lei n.º 8078/90
(CDC). A instituição de ensino tem dever de exercer permanente vigilância sobre
seus alunos, principalmente quando se trate de adolescentes, menores de idade,
vedado o ingresso no estabelecimento de qualquer instrumento que possa colocar
em risco a integridade física das pessoas. Dano moral configurado. Apelação
provida”. (Apelação Cível. 2003.001.24377. Sétima Câmara Cível. Des. CARLOS C.
LAVIGNE DE LEMOS. Julgado em 04/05/2004).
Referente à responsabilidade do discente que venha praticar o ato lesivo e ilícito, por se tratar de responsabilidade subjetiva aquiliana, mostra-se premente a verificação, em paralelo, do inserido no bojo dos artigos 927 e 186[19] do Código Civil brasileiro.
O
primeiro, disciplina que: “Aquele que por ato ilícito, causar dano a outrem
fica obrigado a repará-lo”. Por sua vez, dispõe o artigo 186, do Código Civil:
“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar
direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito”. Por isso, para se demonstrar a responsabilidade civil subjetiva, é
preciso a constatação do elemento subjetivo, qual seja, culpa ou dolo, não
sendo bastante a configuração dos elementos objetivos.
Das agressões
perpetradas no interior da escola podem resultar lesões de diversas ordens, de
natureza material, moral e estética. Quanto à primeira, não há maiores dúvidas
de que devem ser indenizados os danos emergentes e os lucros cessantes.
No que
tange a questão da responsabilidade civil subjetiva dista em muito de ser
pacífica. Houve até um caso que foi alvo de matéria jornalística por ter
ocorrido no interior de uma famosa Universidade da cidade do Rio de Janeiro e
que resultou na aluna ficando tetraplégica. Nesse caso concreto, o TJRJ
entendeu que se cuidava mesmo de responsabilidade civil objetiva.
In
litteris:
Responsabilidade
civil de Estabelecimento de Ensino. Disparo de arma de fogo. Acidente com aluno
nas dependências de Faculdade. Descumprimento do dever de vigilância.
Responsabilidade
objetiva. Obrigação de indenizar. Processual Civil. Ação de reparação de danos
materiais, estéticos e morais. Aluna baleada em campus da Universidade. Dever
de vigilância negligenciado. Responsabilidade objetiva quer em razão da
prestação de serviços, daí sua responsabilidade sob a égide do Código de Defesa
do Consumidor, quer pela condição de delegatária do poder público – art. 37
par. 6º, da Constituição Federal....; IV – Ao receber o estudante em seu
“campus” assume a universidade o grave compromisso de velar pela preservação de
sua integridade física, devendo empregar todos os meios necessários ao integral
desempenho desse encargo jurídico, sob pena de incidir em responsabilidade
civil pelos eventos lesivos ocasionados ao aluno. Tal como em época anterior em
que a UESA suspendeu as aulas diante de ameaças de marginais, deveria fazê-lo
naquela manhã. A manutenção da unidade em funcionamento, apesar de aviso
recebido, caracterizou negligência, devendo responder pela indenização, mesmo
porque a responsabilidade do estabelecimento de ensino é objetiva, quer por se
tratar de uma prestadora de serviços, daí sua vinculação às normas do Código de
Defesa do Consumidor, quer porque se trata de uma pessoa jurídica de direito
privado no exercício de delegação do Poder Público, cuja responsabilidade é disciplinada
pelo art. 37, par. 6º, da Constituição Federal; V – As disposições do art. 950,
do Código Civil, se aplicam àquelas hipóteses em que da ofensa resulte defeito
pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe
diminua o valor do trabalho. ... VI – A pensão, na hipótese de sobrevivente,
tem como termo final a morte. Do contrário sobrevivendo ao período fixado na
sentença estaria ao desamparo; VII – Em que pese se constituir em uma das
maiores universidades brasileiras, a instabilidade econômica que marca o nosso
País, as crises que já nos sacudiram no passado, cujo futuro não nos garante
estabilidade permanente porque baseada em dinheiro emprestado, impõem a
constituição de capital garantidor para o pagamento das prestações vincendas.
Ademais,
o Egrégio Superior Tribunal de Justiça pacificou a questão através da Súmula nº
313: Em ação de indenização, procedente o pedido, é necessária a constituição
de capital ou caução fidejussória para a garantia de pagamento da pensão,
independentemente da situação financeira do demandado. VIII – Embora ventilado
na inicial o parágrafo único do art. 950 do Código Civil, o pedido se entremostra
contraditório, devendo ser interpretado em favor da Ré, eis que também se
pretendeu que o pagamento se fizesse em forma de “pensões mensais, vencidas
(...)” e “pensões vincendas, calculadas nos mesmos moldes das vencidas”. O
acolhimento do recurso para determinar, desde logo, o pagamento da indenização,
importaria em violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa; IX –
O Juiz fixou os juros a partir da citação e o fez corretamente, uma vez que
estamos diante de culpa contratual. Quanto à correção, o valor condenatório já representa
o valor atualizado à época da sentença, não havendo que se falar em correção a
partir do evento danoso; X – Se do exame das circunstâncias, do laudo pericial
e demais provas existentes nos autos emerge a necessidade de imóvel adaptado
que vem ao encontro do bem-estar da vítima e progresso no seu tratamento
médico, sendo importante a saída do estabelecimento hospitalar, há que se
ratificar a tutela antecipada deferida no sentido de providenciar a Ré imóvel que,
mediante adaptação, possibilite o tratamento da vítima na modalidade home
care, de forma vitalícia; XI – O valor da indenização por dano moral, sabe-se,
deve atender aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, não podendo se
afastar do aspecto pedagógico de que se reveste a condenação, devida a
cumulação com o dano estético. (Apelação Cível 2004.001.23704, Des. Ademir
Pimentel, 13ª Câmara Cível, 22/06/2005).
O dano
auferido e verificado em escola pública, que em tese, força a aplicação da tese
da responsabilidade civil objetiva, conforme julgado do STJ, culminando na
fixação de responsabilidade subjetiva, em hipótese em que a escola liberou
inadvertidamente discente antes do horário normal, vindo esta a sofrer estupro
ainda que fora do ambiente escolar. In litteris: Administrativo e
direito público. Escola. Saída de aluno. Estupro de menor em regular horário
escolar. Liberação. Responsabilidade civil subjetiva do Estado
I –
Mesmo diante das novas disposições do Novo Código Civil, persiste o
entendimento no sentido de que, “Omissão. Dever de vigilância. Negligência.
Caracterização. Artigos 186 e 927 do novo Código Civil. Dano moral.
No
campo da responsabilidade civil do Estado, se o prejuízo adveio de uma omissão
do Estado, invoca-se a teoria da responsabilidade subjetiva” (REsp nº 549.812/CE,
Rel. Min. FRANCIULLI NETTO, DJ de 31/05/2004). II – “...o Poder Público, ao
receber o menor estudante em qualquer dos estabelecimentos da rede oficial de
ensino, assume o grave compromisso de velar pela preservação de sua integridade
física...” (RE nº 109.615-2/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ de 02/08/96). III
– A escola não pode se eximir dessa responsabilidade ao liberar os alunos, pelo
simples fato de ter havido bilhete na agenda dos menores no sentido da
inexistência de aulas nos dois últimos períodos de determinado dia. Liberada a
recorrente naquele horário, que seria de aula regular, e dirigindo-se para
casa, sem os responsáveis, culminou por ser molestada sexualmente em terreno vizinho
à escola, que se sabia ser extremamente perigoso. Presentes os pressupostos da
responsabilidade civil (conduta culposa, nexo causal e dano).
Sob os
auspícios doutrinários do notável Sérgio Cavalieri Filho que a responsabilidade
objetiva do Estado, fulcrada no risco administrativo, já se encontra
constitucionalizada desde 1946. A Constituição Federal do Brasil de 1988 não
apenas manteve essa responsabilidade objetiva no seu artigo 37, §6º, nos mesmíssimos
moldes das Constituições anteriores, mas foi ainda além. E, ainda acolhendo
reclamos de parte da doutrina, estendeu a responsabilidade objetiva do Estado
às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos.
E, tal
extensão funda-se em uma questão de lógica incontestável. Se o Estado, quando
presta serviços diretamente, responde objetivamente pelos danos causados a
terceiros, por que o particular, ao prestar esses mesmos serviços, responderia
subjetivamente? Não se podem socializar os riscos[20] e privatizar os lucros;
quem tem os bônus deve ter os ônus. Assim, as mesmas razões que justificam a
responsabilidade objetiva do Estado justificam também idêntica responsabilidade
para os prestadores de serviços públicos. De fato, sustenta que a partir da
Constituição de 1988, portanto, a empresa pública, a economia mista e os
concessionários, permissionários e autorizatários de serviços públicos, tal
como as pessoas jurídicas de direito público, estão sujeitos ao mesmo regime da
Administração Pública no que respeita à responsabilidade civil.
Deve, entretanto,
ser ressaltada neste ponto a distinção estabelecida na própria Constituição entre
empresas que executam atividade econômica e empresas prestadoras de serviços públicos.
As primeiras – Petrobrás, Banco do Brasil, etc. -, estão sujeitas ao regime jurídico
das empresas privadas, só sendo permitido ao Estado explorá-las quando necessárias
aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo (Constituição,
art. 173 e § 1º). As segundas, empresas prestadoras de serviços públicos – Metrô,
Rede Ferroviária Federal, Transportes Aéreos, Telefonia etc. -, estão sujeitas
ao regime do direito público, incidindo então o art. 175 da Constituição. É que
o serviço público, embora prestado por entidade privada, preserva a sua
natureza estatal; a titularidade continua sendo da entidade pública – União,
Estado ou Município – que recebeu da Constituição competência para explorá-lo
(arts. 21, XI e XII; 25, § 2º; 30, V).
Pode-se
então concluir, à luz desses princípios, que apenas as empresas prestadoras de serviços
públicos estão sujeitas à responsabilidade objetiva prevista no art.37, § 6º,
da Constituição Federal. As demais – empresas que executam atividade econômica
– respondem subjetivamente; podem responder objetivamente, não com base na Constituição,
mas sim no Código do Consumidor (arts. 12 ou 14), se forem fornecedoras de
produtos ou serviços e estiver em jogo relação de consumo.
Existe
a possibilidade jurídica de cumulação de danos morais e danos estéticos, pois a
indenização deve ser a mais completa que possível, isto é, de forma a
neutralizar com efetividade máxima os efeitos nefastos e danosos do ilícito sofrido
é pacífico, atualmente, a plena possibilidade de cumulação de verbas
correspondentes à indenização de diversos danos verificados, quer sejam
materiais (lucros cessantes e danos emergentes), quer sejam morais, inclusive
em suas diversas modalidades (como ofensa à honra objetiva, à honra subjetiva, danos
à imagem e dano estético).
Ressalte-se que o entendimento jurisprudencial
do TJRJ é no sentido da possibilidade de cumulação de danos morais e danos
estéticos, in litteris:
“(...)
O dano estético pode ser cumulado com o dano moral, conforme precedentes no STJ
e deste Tribunal. Fixação do dano moral, observando o limite do razoável e a
justa medida da compensação pela dor e sofrimentos, além da prevenção, esta de
caráter pedagógico.
Na
condenação em danos materiais e morais o arbitramento já contempla as consequências
do evento danoso, inclusive a reparação de sequelas em surgindo avanço na área
da medicina. O depósito em caderneta de poupança da indenização de vida a título
de dano moral a menor impúbere, ainda é medida aceita pelo padrão de
procedimento judicial, embora possa não ser a perfeita. Os juros são simples e
correm do evento (Súmula 54 do STJ) e não compostos, estes têm caráter de
punição e só devem ser aplicados a criminosos reconhecidos em sentença judicial
(Sumula 186 do STJ). Desprovimento de ambos os recursos”. (Apelação Cível
2003.001.21834. Segunda Câmara Cível. Des. SÉRGIO CAVALIERI FILHO. Julgado em
15/10/2003).
“Responsabilidade
Civil Constitucional. Instituição de ensino CDPC, acidente com menor.
Cuida-se
de responsabilidade civil objetiva com fulcro no art. 37, § 6º, da CRFB/88, a
qual impõe o dever de indenizar às pessoas jurídicas de direito privado
prestadoras de serviços públicos, considerando que a apelante desenvolve
atividade de ensino. Vislumbra-se, ainda, a hipótese de acidente de consumo
prevista no art 14 do CPDC, tendo em vista que o evento danoso ocorreu dentro
das dependências da instituição apelante, no momento em que o primeiro apelado
se encontrava sob sua guarda e responsabilidade.
Demais,
no presente caso, configura patente a conduta negligente da apelante ao deixar
de adotar as providências necessárias para salvaguardar a integridade física e
moral dos alunos que estão sob os seus cuidados durante o período escolar.
Por
outro lado, não merece reparo o decreto monocrático com relação ao arbitramento
da indenização por danos morais e estéticos, considerando como parâmetros: a
situação anterior (status quo ante) o dano sofrido pelo menor consistente
em duas cirurgias de emergência, bem conta o afastamento compulsório de suas
atividades habituais e a reestruturação da rotina familiar entorno do acidente,
o poder financeiro e econômico das pessoas envolvidas, as circunstâncias do caso
e a gravidade da falta cometida pelo lesante.
Em
tais circunstâncias, a sanção dos danos morais, decretada no valor de R$
15.000,00 e danos estéticos em R$ 10.000,00, guarda ampla compatibilidade com
os princípios clássicos da razoabilidade, equidade, Justiça e de vedação do
enriquecimento sem causa. DESPROVIMENTO DO RECURSO”. (Apelação Cível
2002.001.27620. Terceira Câmara Cível. Des. ROBERTO DE ABREU E SILVA. Julgado
em 11/03/2003).
O
paradigma de convivência da responsabilidade civil demonstra o caráter ético da
pessoa. Há a séria intenção de se buscar caminhos que conduzam à efetiva
concretude dos direitos fundamentais da pessoa humana, seja no interior do
sistema jurídico vigente, apenas que, observado com a libertadoras visões da
democracia, sem o compromisso em reservar aquilo que afronta o reconhecimento
da pessoa humana e a busca da realização individual e coletiva.
A tese
da responsabilidade civil pressuposta foi tese de livre docência da Professora
Giselda Hironaka. Parte-se de dois pressupostos, a saber: insuficiência da
culpa para fundamentação do dever de indenizar em casos particulares em casos
particulares e situações de injustiça a necessidade de se aguardar que o
legislador preveja todas as situações fáticas de conformação da
responsabilidade objetiva. Giselda Hironaka busca a consolidação de um critério
suficiente[21]
para garantir a reparação efetiva e adequada dos danos concretizados em razão
das especificidades do modo contemporâneo de atuação humana. Busca um critério
de imputação da responsabilidade elevado à categoria de uma regra com valores
aptos a serem legislados, importância de critérios para ressarcimento da
vítima.
Não se
tem a ilusão ou utopia de evitar todo perigo, mas sim, promover a diminuição do
dano pela adoção de medidas preventivas ou pela certeza de que o sujeito
responderá pelos danos que causar por força de uma responsabilidade pressuposta,
fundada em um padrão de imputação.
A
frequente judicialização das relações escolares é fato incontestável e ocorre
muito porque os atores educacionais envolvidos não foram formados para lidar
com a nova demanda e não foram informados sobre as novas obrigações decorrentes
destes instrumentos legais que tanto explicitam os deveres como garante
direitos.
O
conhecimento sobre a LDB, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação[22] com forte viés ideológico
e pouca aplicabilidade cotidiana. O que redunda em gestores que não consideram adequadamente
os riscos da atividade prestada.
A
relevância do tema é tanta que na Argentina existe literatura específica sobre
a responsabilidade civil dos professores, gestores[23] e dos estabelecimentos de
ensino, bem como em França, o que já atesta que é tempo para o Brasil vir a
sistematizar a matéria.
Enfim, concluímos que não somente o aspecto de decisão das demandas, mas, principalmente como força definitiva para a solução de conflitos interpessoais, não seja legitimado pela força, mas pela argumentação, pelo diálogo, e trazendo à baila o primado enunciado por Hannah Arendt, para quem o julgamento é uma, se não a mais relevante atividade em que ocorre esse compartilhar-o-mundo.
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Notas:
[1]
O Código Civil de 1916, editado sob a influência do Código Civil e Napoleônico
de 1804, inspirado nos ideais de responsabilidade civil subjetiva, estipulou no
artigo 159 uma regra geral fundada na culpa, não prevendo nenhum tipo de
normatização das espécies da responsabilidade objetiva. Assim sendo, as
hipóteses da responsabilidade objetiva eram somente aquelas preconizadas
expressamente em lei e, no caso brasileiro, notadamente nas legislações
esparsas.
[2]
A vigente Constituição é dirigente, pois define, por meio das chamadas normas
constitucionais programáticas, fins e programas de ação futura no sentido de
melhoria das condições sociais e econômicas da população. E, na mesma linha das
Constituições brasileiras anteriores de 1934 e 1946, a Redentora construiu um
Estado Social, ao englobar entre as suas disposições as que garante a função
social da propriedade, os direitos trabalhistas e previdenciários, além de uma
ordem econômica fundada na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, tendo por objetivo assegurar a todos a existência digna, conforme
os ditames da justiça social.
[3]
Günter Dürig (1920-1996) foi professor de direito constitucional alemão na
Universidade de Türbingen que, com seu comentário sobre a Lei Básica. Teve
influência formativa no direito constitucional da República Federal da
Alemanha. Foi um dos fundadores do novo começo da República Federal Alemã após
1945. Particularmente, da doutrina dos direitos fundamentais, e a doutrina da
dignidade humana. O seu comentário sobre a Lei Fundamental principalmente do
seu primeiro artigo, parágrafo primeiro. A nova responsabilidade humana versão
inviolável é alterada por uma responsabilidade.
[4]
A conotação psicológica da culpa consagra, portanto, a noção de que não existe
responsabilidade sem culpa, atribuindo-se à culpa uma preponderância na
etiologia do ato ilícito. Por esta razão, impinge-se à vítima a prova diabólica
da culpa do agente, o que levou, posteriormente, à constatação de que o lesado,
por força da dificuldade probatória, restava, muitas vezes, sem indenização
pelos danos sofridos.
[5]
Posteriormente a matéria foi regulada pela lex Aquilia, que se afirma ter sido
um plebiscito, conforme notícia contida em um texto de Ulpiano, jurista do III
séc. d.C (18 ad ed., D. 9, 2, 1, 1). Alguns autores opinam que teria sido
votada por volta do ano de 286 a.C., por ocasião da última rebelião da plebe.
Esses autores propõem que seu fim imediato teria sido o de assegurar aos
plebeus o pagamento dos danos causados a seus bens pelos patrícios. A lei
prescrevia, a cargo do autor do dano, o pagamento de uma sanção pecuniária a
favor da vítima. Assim, da realização do ato danoso surgia, entre o autor do
mesmo e o que teria sofrido o dano, uma obligatio em virtude da qual o primeiro
estava obrigado a pagar ao segundo, que por sua vez tinha a faculdade de exigir
uma soma em dinheiro, a título de pena. Esta obligatio estava tutelada por uma
actio iuris civilis chamada actio damni iniuria ou ex lege Aquilia, que
continha três capítulos, dos quais somente o primeiro e o terceiro têm
interesse.
O título 2 do livro 9 do
Digesto cuida da sofisticada casuística tratada pela lex Aquilia, e um
fragmento de Gaio (7 ad ed. Prov., D. 9, 2, 2, pr.) comenta o disposto no
capítulo primeiro dessa lei:
Lege Aquilia capite primo
cavetur ut qui servum servamve alienum alienamve qudrupedemve pecudem iniura
occiderit, quanti id in eo anno plurimi fuit, tantum aes dare domino damnas
esto.
(No primeiro capítulo da
lei Aquilia se prevê que quem matar injustamente um escravo ou escrava alheios
ou um quadrúpede ou res, seja condenado a dar ao dono o valor do máximo que
alcançou naquele ano).
[6]
O conceito de culpa objetiva ou normativa foi criado pelos irmãos Mazeaud e,
consiste em erro de conduta que não seria cometida por uma pessoa avisada,
quando colocada em mesmas circunstâncias externas do autor do dano. Portanto, para
se verificar se o agente incorreu em culpa, deve-se analisar não o seu lado
psicológico, aí incluídas as suas particularidades psíquicas ou morais (culpa in
concreto), porque tais circunstâncias lhe são internas, mas antes, impõe-se
a comparação entre a conduta e a um tipo abstrato -o bonus pater familias
- tomado como modelo geral de comportamento, que deve ser colocado nas mesmas
circunstâncias externas ao autor do dano (culpa in abstracto). Desta
forma, caso o tipo abstrato, hipoteticamente considerada nas mesmas
circunstâncias externas do agente, não violasse a regra de conduta, o agente
terá agido com culpa.
[7] Assim, na imperícia e na imprudência o agente tem uma atitude comissiva, ou seja, de ação. Ele faz alguma coisa. Na imperícia, faz sem ter a habilidade necessária, enquanto que na imprudência faz sem o cuidado devido. Já na negligência a atitude é omissiva, posto que o agente deixa de fazer algo que seguramente deveria fazer. As diferenças entre os três institutos resultam em graus diferentes de responsabilizações, sejam na esfera cível ou penal. Apesar de pequenas, que facilmente geram confusões, é essencial ao aplicador do Direito saber quando cada uma ocorre, para que a devida responsabilidade, após ser averiguada ao caso concreto, possa ser aplicada.
[8] O Código veio a eliminar os privilégios dos nobres, garantiu a todos os cidadãos masculinos a igualdade perante a lei, separou a Igreja e o Estado, legalizou o divórcio, além de dividir o direito civil em duas categorias: o da propriedade e o da família e, vindo codificar diversos ramos do direito ainda organizados em documentos esparsos. Seu conteúdo fora organizado em quatro seções, a saber: Título Preliminar: Da publicação, dos efeitos e da aplicação das leis em geral (artigos 1 a 6); Livro Primeiro: Das pessoas (artigos 7 a 515); Livro Segundo: Dos bens e das diferentes modificações da propriedade (artigos 516 a 710); Livro Terceiro: Dos diferentes modos de adquirir a propriedade (artigo 711 a 2302).
[9]
A culpa pode ser grave, leve e levíssima. A culpa será grave quando,
dolosamente, houver negligência extrema do agente, não prevendo aquele fato que
é previsível ao comum dos homens. Será leve, quando a lesão de direito puder
ser evitada com atenção ordinária, ou adoção de diligências próprias de um bonus
pater familias, consoante o art. 1267 do CC; e será levíssima se a falta for
evitável por uma atenção extraordinária, ou especial habilidade e conhecimento
singular, conforme os arts. 874 a 877 do CC. Vale ressaltar que, para a grande
maioria dos juristas, a gravidade da culpa não exerce qualquer influência na
reparação do dano.
[10]
Há também um fator quantitativo referente à atividade, que se subdivide em
probabilidade elevada – caráter inevitável do risco de ocorrência – e
intensidade elevada – verificada segundo o índice elevado de ocorrências
danosas oriundas da atividade.
[11]
A culpa pode ser: in committendo ou in faciendo, in omittendo,
in eligendo, in vlilando e in custodiendo. Tem-se a culpa in
committendo ou in faciendo quando o agente pratica um ato positivo,
isto é, com imprudência. Mas se ele cometer uma abstenção, ou seja, for
negligente, a culpa será in omittendo, como p. ex.: um professor de
natação que, por estar distraído, não socorre o aluno, deixando-o morrer afogado.
Contudo, a omissão só poderá ser considerada causa jurídica do dano se houver
existência do dever de praticar o ato não cumprido e certeza ou grande
probabilidade do fato omitido ter impedido a produção do evento danoso. Já a
culpa in eligendo advém da má escolha daquele em quem se confia à prática de um
ato ou o adimplemento da obrigação, como p. ex.: admitir ou manter a seu
serviço empregado não habilitado legalmente ou sem aptidões requeridas. Esta
modalidade está prevista no art. 1521, inc. III do CC e na Súmula 341 do STF. A
culpa in vigilando é aquela que decorre da falta de atenção com o procedimento
de outrem, cujo ato ilícito o responsável deve pagar, como p. ex.: a ausência
de fiscalização do patrão, quer relativamente aos seus empregados, quer à
coisa. É a hipótese de empresa de transportes que permite a saída de ônibus sem
freios, o qual origina acidentes. É o que se observa no art. 1521, incs. I e II
do CC.
[12]
Faz-se necessário, inicialmente, salientar que o parágrafo único do artigo 927
tem dois regramentos distintos. Na primeira parte do dispositivo, refere-se à
possibilidade de o legislador elencar outras hipóteses de responsabilidade
objetiva, como ocorre no nº 2 do artigo 483 do Código Civil Português; na
segunda, traz a aludida inovação. O legislador criou verdadeira cláusula geral
da responsabilidade objetiva, adotando a teoria do risco.
[13]
Essa teoria também é conhecida como
Teoria Civilista da Culpa, no qual o Estado se equipara ao particular, sendo
obrigado a indenizar somente pelos danos causados aos particulares nas mesmas
hipóteses em que tal obrigação existe para os indivíduos. Dentro da concepção
tradicional a responsabilidade do agente causador do dano só se materializa se
agiu culposa ou dolosamente. Assim, a prova da culpa do agente causador do dano
é indispensável para que surja o dever de indenizar. Neste caso, a
responsabilidade é subjetiva, pois depende do comportamento do sujeito.
[14]Ingressou
na vida política local, tendo sido eleito prefeito municipal, de 1922 a 1923, e
posteriormente ocupado o cargo de presidente da Câmara Municipal. Em 1925,
transferiu-se para esta capital fazendo seu primeiro concurso de Direito Civil
na Faculdade de Direito de São Paulo no ano de 1936, quando recebeu o título de
doutor em Direito e foi nomeado livre-docente da cadeira, da qual veio a
tornar-se professor catedrático em 1939. Por vários anos exerceu a
vice-diretoria da FDUSP, tendo desempenhado também as funções de membro do
Conselho Técnico-Administrativo. Em setembro de 1956, foi nomeado diretor,
cargo que exerceu até sua aposentadoria compulsória, em agosto de 1958. Em
agosto de 1966, foi-lhe conferido o título de professor emérito.
Faleceu em 03 de agosto de
1975.
[15]
A formulação da teoria do risco remonta à França do século XIX e significou uma
verdadeira revolução nos conceitos de responsabilização civil, tendo sido
Saleilles o responsável por propor, nos idos de 1897, uma nova teoria para
tratar dos problemas decorrentes dos acidentes do trabalho.
[16]
A teoria do risco é o embasamento jurídico que os juristas elaboraram ao final
do século XIX para justificar a responsabilidade objetiva. Risco nessa acepção
jurídica significa perigo, potencialidade de dano, previsibilidade de perda ou
de responsabilidade pelo dano, compreendidos os eventos incertos e futuros
inesperados, mas, temidos ou receados que possa trazer perdas ou danos. Se
vincularmos a expressão atividade à finalidade econômica, consagraríamos a
teoria do risco-proveito, impondo à vítima o ônus de produzir a prova de que a
conduta do agente foi realizada com o intento de obtenção de lucro.
Restringiríamos, pois, o que a lei pretendeu ampliar. Nos posicionamos pelo
entendimento de que o parágrafo único do art. 927, adotou a teoria do
risco-criado, sem restrições quanto à modalidade de atividade exercida pelo
gerador do dano. Assim, toda atividade desenvolvida profissionalmente ou não,
economicamente ou não, seja recreativa, desportiva ou mero lazer, desde que por
sua natureza gere riscos para outrem, enseje responsabilidade objetiva.
[17]
Turma condena escola por série de agressões sofridas por estudante menor. TJDF
Segundo Desembargadores, a escola é revestida do dever de guarda e preservação
da integridade física do aluno. É a conclusão da segunda turma cível do TJDF,
que condenou o colégio particular de Ceilândia a pagar indenização de três mil
reais à família de um discente que apanhava frequentemente dos colegas. O menor
tinha apenas sete anos e estava na segunda série. Ele ficou com medo de voltar
à escola e teve deficiência de aprendizado, em consequência das agressões. A
decisão foi unânime. No entendimento jurisprudencial, o caso demonstra que
houve, no mínimo, descuido por parte dos funcionários do colégio. Segundo os
Desembargadores, "receber estudante menor, confiado ao estabelecimento de
ensino da rede oficial ou particular, a escola é revestida do dever de guarda e
preservação da integridade física do aluno." Não se trata, portanto, de
uma faculdade.
[18]
I Jornada de Direito Civil – Enunciado 46: A possibilidade de redução do montante
da indenização em face do grau de culpa do agente, estabelecida no parágrafo
único do art. 944 do novo Código Civil, deve ser interpretada restritivamente,
por representar uma exceção ao princípio da reparação integral do dano.
(Alterado pelo Enunciado 380 – IV Jornada)
IV Jornada de Direito Civil
– Enunciado 379: O art. 944, caput, do Código Civil não afasta a possibilidade
de se reconhecer a função punitiva ou pedagógica da responsabilidade civil.
V Jornada de Direito Civil
– Enunciado 456: A expressão “dano” no art. 944 abrange não só os danos
individuais, materiais ou imateriais, mas também os danos sociais, difusos,
coletivos e individuais homogêneos a serem reclamados pelos legitimados para
propor ações coletivas.
V Jornada de Direito Civil
– Enunciado 457: A redução equitativa da indenização tem caráter excepcional e
somente será realizada quando a amplitude do dano extrapolar os efeitos
razoavelmente imputáveis à conduta do agente.
V Jornada de Direito Civil
– Enunciado 458: O grau de culpa do ofensor, ou a sua eventual conduta
intencional, deve ser levado em conta pelo juiz para a quantificação do dano
moral.
[19]
O Código Civil de 2002, em seu art. 186 (art. 159 do Código Civil de 1916),
manteve a culpa como fundamento da responsabilidade subjetiva. A palavra culpa
está sendo aqui empregada em sentido amplo, Iara sensu, para indicar não só a
culpa stricto sensu, como também o dolo. Por essa concepção clássica,
todavia, a vítima só obterá a reparação do dano se provar a culpa do agente, o
que nem sempre é possível na sociedade moderna. O desenvolvimento industrial,
proporcionado pelo advento do maquinismo e outros inventos tecnológicos, bem
como o crescimento populacional geraram novas situações que não podiam ser
amparadas pelo conceito tradicional de culpa. […]. (CAVALIERI FILHO, Sergio.
Programa de responsabilidade civil. 10. ed. São Paulo: Altas, 2012. p. 17 e
18).
[20]
Historicamente, a primeira teoria formulada foi a teoria do risco integral ou
responsabilidade objetiva pura. Segundo os partidários dessa teoria, basta a
existência de um dano para que exista o dever de reparar, sendo irrelevante o
modo e a causa da sua ocorrência, mesmo quando há caso fortuito, força maior,
fato de terceiro ou culpa exclusiva da vítima. Um exemplo são as atividades
nucleares. A segunda teoria é a do risco-proveito. Segundo os irmãos Mazeaud, o
dever de reparar o dano é imposto a quem aufere benefício com a existência do
risco. A ideia do risco-proveito foi fundamental para desenvolver a teoria da
responsabilidade civil objetiva. Não obstante, hoje sofre diversas críticas,
porque dentro da normalidade do negócio jurídico bilateral todas as partes o
aproveitam. Além disso, há uma indefinição conceitual de proveito, o qual, no
sentido vago, pode abranger qualquer ato natural do agir humano e, no sentido
estrito e econômico, restringe a responsabilidade às atividades empresariais. A
próxima teoria é chamada de risco excepcional, anormal, exacerbado ou grave.
Para aferição do que é excepcional é preciso ter como parâmetro o tipo médio da
sociedade, havendo um retorno disfarçado à noção de culpa, por avalia a conduta
em face de um padrão de diligência ideal. A última teoria é a do risco criado,
que atribui a responsabilidade a quem cria ou aumenta o risco. A responsabilidade
nascida do risco criado é aquela que obriga a reparar os danos produzidos,
mesmo sem culpa, por uma atividade que se exerce em seu interesse e sob sua
autoridade. Basta que a vítima demonstre que teve sua esfera de direitos
atingida. Essa última teoria é adotada
pelo CC/2002, conforme maioria da doutrina, além de ser a defendida por Caio
Mário, Beatriz T. da Silva, Menezes Direito e Sérgio Cavallieri.
[21]
Importante citar SCHREIBER, Anderson: “Não apenas as desigualdades sociais,
como também a crescente complexidade da vida contemporânea, a especialização
dos setores econômicos e o avanço desconcertante das novas tecnologias resultam
em que, muitas vezes, o juiz se vê diante de situações às que não se pode
transportar. Como poderia o julgador, individualmente, no isolamento de seu
gabinete, por exemplo, estabelecer o cuidado médio que deve ser adotado na
elaboração das demonstrações financeiras de uma grande empresa, na reparação de
uma aeronave, na atuação policial em confronto com o crime organizado, na
manipulação de material genético? Tais hipóteses revelam talvez a mais notável
deficiência do modelo abstrato de comportamento: a sua unicidade” (Novos paradigmas
da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos
danos, cit. p. 39-40).
[22]
Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I -
igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II - liberdade de
aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o
saber; III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas; IV - respeito à
liberdade e apreço à tolerância; V - coexistência de instituições públicas e
privadas de ensino; VI - gratuidade do ensino público em estabelecimentos
oficiais; VII - valorização do profissional da educação escolar; VIII - gestão
democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas
de ensino; IX - garantia de padrão de qualidade; X - valorização da experiência
extraescolar; XI – vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as
práticas sociais. XII - consideração com a diversidade étnico-racial. (Incluído
pela Lei nº 12.796, de 2013) XIII - garantia do direito à educação e à
aprendizagem ao longo da vida. (Incluído pela Lei nº 13.632, de 2018). LDB.
[23]
O tema da gestão democrática da escola é vasto e complexo. No essencial, no
entanto, como está na LDB, ele se resume a dois pontos básicos: A participação
dos profissionais da educação (professores, especialistas e funcionários da
escola) na elaboração do projeto pedagógico, de modo a que todos na comunidade
escolar sintam-se coautores da iniciativa e se comprometam e se empenhem em sua
construção. A escola deve estruturar-se como um educador coletivo, prefiro
dizer uma comunidade de sentido alinhada conceitual, estratégica e operacionalmente
na realização de um projeto superior e comum a todos os seus membros. Os
conselhos escolares ou equivalente constituem os órgãos de gestão colegiada das
escolas. Eles devem ser abertos à participação de todos os segmentos da
comunidade escolar: professores, técnicos em educação, direção, funcionários,
pais, alunos a partir de uma idade determinada, assim como voluntários e
lideranças comunitárias. Trata-se de assegurar a democracia transparente e
participativa no microcosmo da comunidade escolar.