O vice-presidente da República, José Alencar, conseguiu reunir os governistas e os oposicionistas em torno de uma causa comum na terça-feira. Parlamentares de ambos os lados criticaram a defesa pública de um terceiro mandato para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, hipótese defendida por Alencar numa entrevista. Foi a primeira vez que um integrante do alto escalão do governo defendeu publicamente uma mudança nas regras para reeleger Lula outra vez.

"O Lula tem feito muito, mas ainda falta muito por fazer", disse Alencar em entrevista à Rádio Bandeirantes, de São Paulo. "Eu digo para você, eu sou democrata. Nós não aceitamos outra coisa que não seja democracia. O Lula deseja fazer o seu sucessor. Mas digo para você que, se perguntarem aos brasileiros, o que eles desejam é que o Lula fique mais tempo no poder." Conforme Alencar, a nova reeleição é necessária "porque está bem o Lula, vai bem o Lula".

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não comentou a declaração do vice. Em público, ele descarta a hipótese de mudar a Constituição para permitir outra reeleição. Ainda pediu aos aliados -- como o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), seu amigo e defensor da manobra -- que deixassem de trabalhar pela mudança nas regras. O ministro das Relações Institucionais, José Múcio, minimizou a importância das declarações de Alencar, dizendo que Lula não deve ficar.

"É entusiasmo do vice, tenho certeza que o intuito do presidente é terminar o segundo mandato e se afastar", disse Múcio, conforme reportagem publicada na edição desta quarta-feira do jornal Folha de S. Paulo. O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), também descartou a mudança nas regras. "Foi uma opinião pessoal do vice. Temos que seguir a Constituição." Posição semelhante foi defendida por outros líderes do PT e do governo no Congresso.

"Qualquer defesa ao terceiro mandato não é oportuna", afirmou o deputado José Eduardo Martins Cardozo (SP), secretário-geral do PT. "Nunca é bom mudar as regras do jogo com uma partida em andamento", completou Maurício Rands (PE), líder do PT na Câmara. Devanir Ribeiro, porém, se mostrou animado com a defesa feita por Alencar -- segundo ele, "o povo está assimilando" a idéia do terceiro mandato. "Não estou mais sozinho. Mas agora é ano de eleição."

Na oposição, as declarações de Alencar provocaram duras críticas. Arthur Virgílio, líder do PSDB no Senado, disse que o vice foi "infeliz". "O povo já quis as permanências de Hitler e Mussolini." O líder do DEM, José Agripino, se disse "decepcionado". O líder do PSDB na Câmara, José Aníbal, chamou a proposta de "estapafúrdia" e de "idéia que não tem nenhuma fundação pragmática, conceitual, política". Para ele, defender a mudança significa "defender um golpe".