STJ garante ressarcimento a comprador em caso de imóvel ter área menor do que a contratada

Fonte: STJ

Comentários: (0)




Compradores de imóvel com metragem menor do que a constante no contrato obtêm no Superior Tribunal de Justiça (STJ) o direito de serem ressarcidos pela Paulo Octávio Investimentos Imobiliários Ltda.. A questão foi definida em decisão majoritária na Terceira Turma do tribunal.

A conclusão da Terceira Turma é que não pode ser considerada simplesmente enunciativa a referência à área feita nos contratos de compra e venda de imóvel adquirido ainda na planta, no caso de esses contratos serem regidos pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). E isso deve valer mesmo que a diferença encontrada entre a área mencionada no contrato e a real não exceda um vigésimo (5%) da extensão total anunciada. Em casos assim, a venda deve ser caracterizada sempre como "por medida" (ad mensuram), de modo a possibilitar ao consumidor o complemento da área, o abatimento proporcional do preço ou a rescisão do contrato, pois esse tipo de venda atende melhor os interesses do comprador.

A Turma segue a orientação da ministra Nancy Andrighi, para quem a existência de diferença entre a descrição do imóvel objeto de contrato de compra e venda e o que existe fisicamente sob a titularidade do vendedor provoca instabilidade na relação contratual. A seu ver, o comprador deve ser ressarcido se ficar evidente a desvantagem ocasionada pelo desequilíbrio contratual gerado pelo abuso do poder econômico, pois fica, dessa forma, ferido o princípio da eqüidade contratual.

Para a ministra, "uma disposição legal não pode ser utilizada para eximir de responsabilidade o contratante que age com notória má-fé em detrimento da coletividade, pois a ninguém é permitido valer-se da lei ou de exceção prevista em lei para obtenção de benefício próprio quando este vier em prejuízo de outrem". Esse abuso de poder deve ser reprimido pelo Estado, na coordenação da ordem econômica, visando compatibilizar os objetivos das empresas com a necessidade coletiva.

"Basta, assim, a ameaça do desequilíbrio para ensejar a correção das cláusulas do contrato, devendo sempre vigorar a interpretação mais favorável ao consumidor, que não participou da elaboração do contrato, consideradas a imperatividade e a indisponibilidade das normas do CDC", afirma a ministra.

A discussão judicial

O que se discute no recurso apresentado pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios é se pode ser considerada nula cláusula de contrato de compra e venda de imóvel que impede o adquirente de ter o direito à complementação de área ou ao abatimento de preço pago no caso em que se constate uma diferença inferior a 5% entre o total da área lançada no contrato e a efetiva. Esse item do contrato dispõe que são meramente enunciativas as dimensões no caso de haver qualquer diferença de áreas de até 5%, estabelecendo não caber às partes o direito de abatimento e a complementação de preço resultante desta diferença.

A cláusula discutida se baseia no parágrafo único do artigo 1.136 do Código Civil de 1916, o qual foi reproduzido e aprimorado no novo Código de 2002, no artigo 500. O artigo 1136 descreve o caso em que o preço é estipulado por medida de extensão ou pela área do imóvel determinada no contrato (ad mensuram) ou ad corpus (por corpo certo), situação em que o imóvel é vendido como coisa certa e discriminada, sendo apenas enunciativa a referência às suas dimensões.

Na prática, explica a ministra, a disposição legal prevista no parágrafo único do artigo 1.136 permite concluir que, se a diferença de áreas for de até 5%, é de se considerar, salvo prova em contrário, a venda como ad corpus, ainda que as dimensões do imóvel tenham sido lançadas no contrato de compra e venda, hipótese em que o vendedor não tem qualquer responsabilidade pela diferença, o que é exatamente o teor da cláusula contestada.

Para a relatora, embora redigida nos termos exatos da lei, "a cláusula encontra, induvidosamente, barreiras de ordem pública impostas pelo CDC". O artigo 51, inciso I, desse código afirma serem nulas de pleno direito as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos que impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos ou impliquem renúncia ou disposição de direitos.

Ela ressalta, contudo, que a aplicabilidade do CDC aos contratos de promessa de compra e venda de imóveis firmados pela Paulo Octávio não está em discussão neste processo, porque a relação de consumo foi reconhecida nas instâncias ordinárias. O objetivo é verificar se há abusividade na cláusula capaz de torná-la nula de pleno direito por prever a exoneração da responsabilidade da imobiliária, o que, segundo a ministra, existe.

Nesse processo discute-se exatamente a prática de não-correspondência deliberada das dimensões contidas nos contratos àquelas fisicamente constatadas nos imóveis. Isso porque é substancial a diferença quando constatada inexatidão nas dimensões de um imóvel objeto de relação negocial encetada entre um vendedor e um comprador; e quando a referida inexatidão se repete na venda efetuada "na planta" entre uma incorporadora imobiliária e vários consumidores, tendo como objeto vários imóveis padronizados em contratos igualmente padronizados. A ministra exemplifica que, se em 90 projeções houver diferença de área, a construtora e incorporadora terá um acréscimo mais do que significativo em sua rentabilidade, enquanto os consumidores terão um decréscimo relativo à expectativa de receber um tratamento que envolva fidelidade, lealdade, coerência e cooperação, além do correspondente à metragem suprimida.

Para a ministra, "mostra-se não apenas visível, como também notória a má-fé da recorrida ao socorrer-se da exceção legal prevista no artigo 1.136, parágrafo único, do CC/1916 para, além de eximir-se da responsabilidade advinda da venda por medida quando não correspondente à área constante do contrato com as reais dimensões dos imóveis, fazê-lo de maneira deliberada e rotineira, com o claro intuito de proveito próprio". E continua: é impossível que uma empresa de grande capacidade empreendedora, com profissionais da engenharia qualificados, cometa o mesmo erro em várias unidades e mais, exatamente nos limites que a exoneram de responsabilidade previstos na lei. "A ninguém é permitido valer-se de lei ou de exceção prevista em lei para obtenção de benefício próprio quando este vier em prejuízo de outrem."

A ministra cassou a decisão do tribunal estadual, restabelecendo a sentença, a qual declarou nula essa cláusula dos contratos. A Paulo Octávio fica condenada a indenizar os consumidores lesados pela aplicação indevida das cláusulas declaradas nulas; devendo pagar multa de R$ 2.000,00 para cada inserção em contratos futuros. O total apurado deverá ser revertido ao fundo criado pelo artigo 13 da Lei n.º 7.347/85.

Processo:  Resp 436853

Palavras-chave:

Deixe o seu comentário. Participe!

noticias/stj-garante-ressarcimento-a-comprador-em-caso-de-imovel-ter-area-menor-do-que-a-contratada

0 Comentários

Conheça os produtos da Jurid