Segunda Seção começa a decidir legalidade da cobrança de empréstimo por desconto em folha

Fonte: Notícias do Superior Tribunal de Justiça

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Por iniciativa do ministro Aldir Passarinho Junior, da Quarta Turma, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça começou a discutir a legalidade ou não da cláusula contratual que autoriza o desconto em folha de débito relativo a empréstimo bancário. O julgamento do processo foi suspenso por um pedido de vista da presidente da Terceira Turma, ministra Nancy Andrighi, para melhor exame da matéria, quando já havia dois votos ? o do relator e o do ministro Jorge Scartezzini ? pela legalidade da cobrança.

A Segunda Seção do STJ, presidida pelo ministro Carlos Alberto Menezes Direito, é composta pelos dez ministros que integram a Terceira e a Quarta Turmas e é a responsável, no Tribunal, pelo julgamento dos processos que envolvam questões de direito privado. A orientação que for definida pela Seção será seguida pelos ministros que compõem as duas Turmas.

O processo em exame é um recurso especial da Cooperativa de Economia e Crédito Mútuo dos Servidores Públicos Municipais de Porto Alegre, a Cooperpoa, que não se conformou com a decisão da Justiça gaúcha favorável a Paulo Ricardo do Amaral Elias, funcionário da prefeitura de Porto Alegre. Tanto a sentença quanto o acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que a manteve, deram ganho de causa ao servidor, reconhecendo serem ilegais os descontos em folha do empréstimo por ele contraído na cooperativa, em razão de o Código de Processo Civil vedar expressamente a penhora dos vencimentos dos servidores públicos.

A sentença e o acórdão consideraram descabidos os descontos em folha das parcelas relativas ao empréstimo, por entenderem que o salário é verba de natureza eminentemente alimentar, que diz respeito diretamente à dignidade e à própria sobrevivência do indivíduo. Para o TJ/RS, os descontos devem cessar imediatamente a partir do momento em que o titular do salário exerça seu direito de pedir ao seu órgão empregador o cancelamento do desconto do débito em sua folha de pagamento.

O acórdão da 19ª Câmara Cível do TJ/RS ressalta que a situação econômica precária dos cooperativados, a par dos baixos salários pagos pelo setor público, acabam por sujeitar os tomadores dos empréstimos ao sacrifício da própria sobrevivência. No caso concreto desse servidor, o acórdão faz referência ao contrato celebrado entre ele e a Cooperpoa, entendendo que os menos de R$ 700,00 que sobram líquidos de seu vencimento, após os descontos legais e a parcela do empréstimo, são, a toda evidência, insuficientes para garantir sua sobrevivência e a de sua família. O desembargador relator, Jorge Adelar Finatto, argumentou que até pelo número elevado de ações semelhantes que tramitam na Justiça gaúcha, é de ver-se que algo não vai bem nesse tipo de negócio, que sujeita o tomador do empréstimo, quase sempre desprovido de bens e em sérias dificuldades financeiras, a prejudicar até mesmo a própria subsistência para adimplir o contrato celebrado.

Daí o recurso da Cooperpoa para o STJ, alegando que está ocorrendo evidente má-fé por parte de alguns cooperativados, que tomam os empréstimos com juros e encargos muito mais baixos do que os praticados pelo mercado, em razão da garantia do desconto em folha, e depois cancelam a autorização, alegando impossibilidade financeira de cumprir o contratado, e a Justiça lhes dá ganho de causa. A cooperativa argumenta que, ao contrário do entendimento do acórdão, não se trata de penhora de salário, pois, primeiro, há o cuidado de não ultrapassar o limite da margem consignável de 30% sobre o valor dos vencimentos do servidor e, depois, há a concordância expressa deste com a modalidade de pagamento escolhida, até mesmo pelo ganho que aufere, ao obter tarifas diferenciadas, muito mais módicas do que as normalmente cobradas do tomador de empréstimo comum.

O relator do processo, ministro Aldir Passarinho Junior, acolheu integralmente os argumentos da Cooperpoa, entendendo que não se trata efetivamente, no caso concreto, de penhora de vencimentos, até por não se cuidar de processo de execução, de natureza forçada e constritiva. Para o ministro, que fundamentou seu voto em precedente seu e outro da Quinta Turma, da relatoria do ministro José Arnaldo da Fonseca, a autorização para desconto em folha é parte fundamental do contrato e a própria garantia específica de sua execução, mero exercício de livre disposição contratual, procedimento de resto bastante comum em operações dessa natureza, quando em geral são oferecidas taxas inferiores à média praticada pelo mercado financeiro.

O ministro Jorge Scartezzini acompanhou o entendimento do relator, tendo a ministra Nancy Andrighi, presidente da Terceira Turma, pedido vista do processo para examinar mais detidamente a questão. No final de novembro do ano passado, a Terceira Turma, com base em voto do ministro Carlos Alberto Menezes Direito, decidiu, por unanimidade, pela ilegalidade do desconto em folha de empréstimo bancário, por entender que o salário do devedor tem natureza alimentar e, por isso mesmo, é impenhorável e insuscetível de desconto a esse título quando o titular requerer administrativamente o fim do desconto sobre seu vencimento.

Acompanharam o entendimento do ministro Carlos Alberto Menezes Direito, naquela ocasião, a própria ministra Nancy Andrighi e o ministro Castro Filho. Não participaram do julgamento os ministros Antônio de Pádua Ribeiro e Humberto Gomes de Barros, que aguardam, juntamente com os ministros Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha e Fernando Gonçalves, para votar quando a ministra apresentar seu voto-vista.

Viriato Gaspar

Processo:  RESP 728563

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