Condenado a mais de 33 anos de prisão pela morte do pai e da madrasta, em março de 2004, G.R. se matriculou em Biomedicina na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). Com o direito de responder em liberdade garantido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), G.R., de 29 anos, conquistou a vaga por meio do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e consta na lista do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), divulgada em janeiro.

Em contato com o G1 nesta terça-feira (26), a universidade confirmou a matrícula do aluno, mas disse que não há registro de presença de G.R. nesta segunda-feira (25), primeiro dia do ano letivo. Ele já morou no Rio Grande do Sul em 2008 e chegou a ser preso no mesmo ano por mudar de endereço sem comunicar à Justiça.

A reportagem tentou entrar em contato com os advogados de Rugai, mas eles não foram localizados.

Entenda

G.R. foi condenado a 33 anos e nove meses pelo assassinato do pai, L.C.R. , e da madrasta, A.T., em março de 2004. Como G.R. tem uma liminar do STF que lhe garante liberdade, não tem antecedentes criminais e não pode mais interferir no processo (que já foi encerrado), o juiz permitiu que ele recorra em liberdade. A defesa disse que irá recorrer e tem até sexta-feira (1º) para isso.

O primeiro passo deverá ser pedir a anulação do julgamento ao Tribunal de Justiça de São Paulo. Se ganhar, haverá novo júri popular. Se perder, ainda pode levar o caso ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal. Com isso, deve levar um bom tempo para que o condenado G.R. comece a cumprir a pena.

A sentença é o resultado de cinco dias de julgamento, encerrado na última sexta-feira (22) no Fórum da Barra Funda, em São Paulo. Neste período, foram ouvidas 15 testemunhas (sendo cinco de acusação, sete de defesa e três do juízo), além do réu, que foi interrogado pelo juiz, por seus advogados e pelo promotor.

Na sentença, o juiz Adilson Paukoski Simoni chamou o condenado de dissimulado e "extremamente perigoso". Entretanto, determinou que ele poderá recorrer em liberdade. Segundo o juiz, G.R. pode pedir progressão para o regime semiaberto com o cumprimento de 5 anos, 7 meses e 15 dias de pena. Ele já cumpriu cerca de dois anos.

G.R. negou o crime. "Não fui eu [quem matou]. Agora quem foi eu não sei", disse. As principais provas apresentadas contra o réu foram a pegada de G.R. em uma porta arrombada no local do crime e a localização da arma que matou o casal. Ela pertencia ao jovem.

Tese da acusação

Os jurados acreditaram na tese do promotor do caso de que G.R. matou o casal porque teve medo de que seu pai levasse adiante a ameaça de denunciá-lo à polícia por causa de um desvio de dinheiro ocorrido na produtora da vítima, a Referência Filmes.

O promotor também apontou o que chamou de outras contradições no interrogatório de G.R.. Uma delas é sobre o local onde ocorreu uma discussão entre pai e filho dias antes do assassinato. G.R. disse que não esteve na produtora do pai. Já em interrogatório prestado anteriormente, afirmou que após jantar com L.C.R. em um restaurante, concluiu a conversa na sede da Referência Filmes.

No mesmo processo pelo homicídio, G.R. responde ainda à acusação de ter dado um desfalque de mais de R$ 25 mil, em valores da época, à empresa do pai, razão pela qual havia sido expulso do imóvel cinco dias antes do crime. Ele cuidava da contabilidade da ‘Referência Filmes’.

Tese da defesa

O advogado T.A. disse que a acusação tentou criar a imagem de G.R. como um psicopata. “Construíram um psicopata. O caso Richthofen não é o caso do G.R.”. A afirmação foi feita durante a argumentação da defesa na fase de debates do julgamento.

Durante o debate, os advogados de G.R. apresentaram a linha do tempo que colocaria o réu fora da cena do crime e desqualificaram os depoimentos das testemunhas. “Um analfabeto fala que viu G.R. sair de capa caramelo”, disse T.A. tentando descredenciar o depoimento do vigia que afirmou ter visto G.R. na casa onde ocorreram os crimes.

Durante uma hora e meia, os defensores tentaram plantar dúvidas no júri.  “Temos telefonemas que confirmam que G.R. não estava na cena do crime. Às 21h54, um vizinho ligou para o motorista no dia do crime para relatar ter ouvido disparos. Às 22h12, G.R. no telefone fixo da produtora dele, ligando para ele. Estava a 4 km de distância. Pergunto: G.R. estava na cena do crime?”, afirmou o outro advogado de G.R., M.F..

“E às 22h13, o vizinho liga novamente para o vigia perguntando sobre o barulho. E às 22h14, uma mulher chama a PM. Por que os vizinhos só chamaram a PM 44 minutos depois?”, contou tentando provar que seu cliente não estava presente na casa onde L.C.R. e A.T..

Acusação

Durante sua fala, o promotor R.L.Z. afirmou que o réu “tem dupla personalidade”. “Tangencia entre a normalidade e psicopatia”, disse o representante do Ministério Público (MP). A Promotoria afirmou ainda que G.R. mentiu no júri ao dizer que não sabia que o pai havia trocado as chaves da produtora Referência Filmes. “À Polícia Civil, Gil havia dito no passado que soube dessa troca. Outras testemunhas, funcionários da empresa confirmaram isso”, disse R.L.Z..

A tese do promotor é que a troca ocorreu porque o pai de G.R. descobriu que o filho fraudou a empresa e não queria ele mais trabalhando nela e morando na mesma casa. Para o MP, G.R. matou o casal porque teve medo de seu pai levar adiante a ameaça de denunciá-lo à polícia pelo desvio de dinheiro.

O promotor também questionou os álibis de G.R.. O réu afirma que não estaria na cena do crime. “Se assim fosse, a amiga que o viu no Shopping Frei Caneca e a outra pessoa que falou que consertaria o telefone celular dele teriam sido arroladas como testemunhas, mas não foram”.

Outro depoimento apresentado foi o de um funcionário da Referência Filmes, que disse que G.R. lhe teria afirmado que gostaria de o pai morto. “Uma funcionária ouviu G.R. dizer: ‘eu seria mais feliz se meu pai morresse’”, relatou R.L.Z..“Ele também se referiu ao pai como ‘fedido’”.