Estudante tetraplégico vitimado por assalto terá cirurgia paga pelo estado de Pernambuco.

Tetraplégico em razão de um assalto ocorrido em via pública no estado de Pernambuco (PE), Marcos José Silva de Oliveira, estudante universitário de 25 anos, obteve decisão favorável no Supremo Tribunal Federal (STF).

Fonte: STF

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Tetraplégico em razão de um assalto ocorrido em via pública no estado de Pernambuco (PE), Marcos José Silva de Oliveira, estudante universitário de 25 anos, obteve decisão favorável no Supremo Tribunal Federal (STF). Ele conseguiu autorização para ser submetido a uma cirurgia de implante de um Marcapasso Diafragmático Muscular (MDM) a fim de que possa respirar sem depender de aparelho mecânico.

A questão foi debatida durante o julgamento de um recurso [agravo regimental] interposto por Marcos nos autos da Suspensão de Tutela Antecipada (STA) 223. Ele contestava decisão da Presidência do STF que suspendeu execução da decisão do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJ-PE), a qual determinava a liberação de quantia depositada por meio de uma ação de indenização para que a cirurgia fosse realizada.

O TJ-PE determinou a transferência de recursos que foram depositados pelo estado de Pernambuco em conta judicial para uma conta bancária no exterior, pertencente ao médico norte-americano que a família alega que virá ao Brasil para operar Marcos. Segundo os familiares, o Brasil não possui profissional capacitado para realizar tal procedimento, que caso não ocorra até o próximo dia 30 de abril fará com que Marcos corra risco de morte.

Em sede de tutela antecipada, a responsabilização do estado de Pernambuco pelo custo da cirurgia equivale a U$ 150.000 (cento e cinqüenta mil dólares americanos).

O estado de Pernambuco sustenta ocorrência de grave lesão à ordem pública, em razão da iminência de transferência de recursos públicos ao exterior para pessoa não domiciliada no país, sem prévia autorização do Banco Central do Brasil. Alegava ocorrência de grave lesão à economia pública, com base na determinação do pagamento sem o trânsito em julgado da sentença condenatória e sem a obrigatória expedição de precatório, em afronta ao artigo 100 da Constituição Federal.

Relatora

A ministra Ellen Gracie, relatora da matéria, negou provimento ao recurso. ?Não desconheço o sofrimento e a dura realidade vivida pelo agravante com especial deferência por seus familiares que zelosamente empreendem esforços para assegurar e prover o mais rápido possível uma melhor condição ao seu ente querido?, disse.

No entanto, ela considerou que a determinação para que o estado de Pernambuco pague todas as despesas necessárias à realização da cirurgia, com base na forma e com profissional requeridos, ?defronta-se especialmente com o conceito de ordem pública administrativa, a qual exige verificação ao menos da aparente legalidade da postura da administração que a decisão a suspender põe em risco?.

No caso, a ministra entendeu configurada a grave lesão à ordem pública ?na sua acepção jurídico-administrativa?, tendo em vista imposição, ao poder público, do pagamento de cirurgia de alto custo sem qualquer registro de prévio procedimento administrativo.

?Não consta dos autos qualquer avaliação clínica prévia capaz de aferir de maneira segura e adequada a viabilidade técnica ou mesmo a prescrição clínica para que o paciente, ora agravante, se submeta ao procedimento cirúrgico pleiteado?, verificou a ministra. Ellen Gracie afirmou que, conforme relatório de auditoria médica realizado pela Secretaria Estadual de Saúde, há relatos evidenciando que o risco cirúrgico na implantação desse marcapasso em pacientes tetraplégicos é maior, como é o caso de Marcos.

Ainda de acordo com o relatório, ?por se tratar de procedimento incipiente, de custo elevado não oferecendo garantias de sucesso e ainda em fase experimental, o procedimento ainda não consta do rol de procedimentos da ANS, tendo sido inclusive negado pela operadora de saúde da qual o paciente é usuário?. Para Ellen Gracie, ?persistem dúvidas severas quanto à viabilidade técnica do procedimento bem como a sua prescrição clínica?.

Por último, ela ressaltou também estar devidamente demonstrada a ocorrência de grave lesão à ordem pública na sua acepção ?jurídico-constitucional e jurídico-processual, porquanto a tutela antecipada de mérito, ao determinar imediato pagamento de todas as despesas necessárias a realização da cirurgia em comento, na forma e com o profissional requerido pela parte agravante, inclusive com o repasse direto do valor depositado em juízo a conta bancária no exterior de médico escolhido pelos familiares do agravante, descumpriu o que dispõe o artigo 100 da Constituição Federal (pagamentos por precatórios) e artigo 2º, B, da Lei 9494/97 [norma que proíbe a execução provisória de julgados contra o poder público]?.

Maioria divergente

O ministro Celso de Mello entendeu que o recurso deveria ser provido a fim de manter o ato quanto à obrigação de prestar o tratamento. Segundo ele, Pernambuco, assim como outras localidades brasileiras, possuem pontos conhecidos pela prática criminosa.

No caso, o ministro entendeu ter havido omissão por parte dos agentes públicos na adoção de medidas efetivas, ?que o bom senso impõe?. ?Medidas que muitas vezes os responsáveis pela segurança pública nos estados desconhecem ou fazem de conta que não sabem?, disse, analisando que falta serviço adequado em matéria de segurança pública no país.

?O que não tem sentido é que o estado permaneça simplesmente se omitindo no dever constitucional de prover segurança pública ao cidadão e, depois, demitindo-se das conseqüências que resultam do cumprimento desse mesmo dever?, completou, ressaltando que Marcos tem o direito de viver de maneira autônoma, uma vez que atualmente necessita de aparelho mecânico para respirar.

Para o ministro, situações configuradoras de falta de serviço podem induzir a responsabilidade civil objetiva do poder público, considerado o dever de prestação pelo Estado, a necessária existência de causa e efeito [nexo de causalidade], omissão administrativa e o dano sofrido pela vítima.

?A mim me parece que todos os elementos que compõem a estrutura da responsabilidade civil objetiva do poder público estariam presentes nesse caso. A situação de dano gravíssimo, risco inaceitável à vida, ocorre em relação a esse paciente e muito menos em relação ao poder público?, afirmou Celso de Mello.

De acordo com ele, ao se reconhecer o interesse secundário do estado, em matéria de finanças públicas, e o direito fundamental da pessoa, que é o direito à vida, ?não há opção possível para o Judiciário, nessa relação dilemática, senão destacar, senão dar primazia, senão fazer prevalecer o direito à vida?.

?Tenho a impressão que a realidade da vida tão pulsante nesse caso impõe que se dê provimento a este recurso e que se reconheça a essa pessoa o direito de buscar autonomia existencial desvinculando-se de um respirador artificial que a mantém ligada a um leito hospitalar depois de meses de estado comatoso?, concluiu, ressaltando que deve ser reconhecido a todos o direito referente à busca da felicidade, resultado do princípio da dignidade da pessoa humana.

?Quem salva uma vida, salva toda a humanidade?, finalizou o ministro, sendo seguido pela maioria dos votos. Assim, o Plenário da Corte, por maioria, deu provimento ao recurso a fim de garantir o custeio, por parte do estado de Pernambuco, do tratamento médico ao jovem.

Entrevista

Ao final do julgamento, o ministro Celso de Mello concedeu entrevista a jornalistas e comentou a matéria discutida em sessão plenária. Conforme o ministro, ?o que não tem sentido é que haja uma proclamação constitucional meramente retórica. Proclamações constitucionais não podem ser declarações inconseqüentes do poder público?. Para ele, é preciso dar real efetividade ?a essas normas meramente programáticas e reconhecer efetivamente que o direito à saúde e o direito à vida são bens, são valores essenciais que devem ser preservados pela autoridade pública?.

Ele avaliou que o caso concreto foi cautelosamente analisado. ?Essa é uma decisão que vale para essa situação, extremamente singular. Mas nós consideramos aí, sim, os diversos princípios constitucionais envolvidos e os diversos direitos invocados?, afirmou, citando o direito do cidadão à segurança pública, à vida ?e à obtenção por parte do poder público de meios e recursos necessários que tornem efetivo o acesso dessa prerrogativa delicadíssima e essencial, que é o direito à vida?.

Processos relacionados
STA 223

Palavras-chave: cirurgia

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