Aprovação em concurso público (terceira parte) - Direito subjetivo à nomeação em caso de desistência de candidato melhor classificado

Dênerson Dias Rosa, ex-Auditor Fiscal da Secretaria da Fazenda de Goiás, é consultor tributário e Sócio de Dênerson Rosa & Associados Consultoria.

Fonte: Dênerson Dias Rosa

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Dênerson Dias Rosa ( * )

Existem atualmente algumas hipóteses em que se reconhece a existência de Direito Subjetivo à Nomeação por aprovados em concurso público, quais sejam:

1 - Quando ocorrer nomeação de um candidato em detrimento de outro melhor classificado, ou quando ocorrer nomeação, para o mesmo cargo, de pessoa não aprovada em concurso público;

2 - Quando houver candidato aprovado em um concurso público e a Administração Pública promulga edital de novo concurso, para o mesmo cargo efetivo ou emprego público, e realiza nomeação de candidato aprovado no concurso mais recentemente realizado, ignorando o candidato aprovado do concurso anterior que ainda se encontre em seu prazo de validade;

3 - Quando houver concurso público para formação de cadastro de reserva para preenchimento de vagas que eventualmente venham a surgir durante o prazo de validade do concurso, quando efetivamente surgirem tais vagas;

4 - Quando houver candidato aprovado em concurso público e a Administração Pública, ao invés de nomeá-los, contrata ou mantém contratado funcionários terceirizados, contratados temporários ou requisitados exercendo exatamente a mesma função ou cargo para os quais foi realizado aquele certame;

5 - Relativamente ao candidato aprovado e classificado dentro do número de vagas previstas no edital.

Contudo, a nosso ver, existe outra hipótese que deve ser incluída nesta lista de situações que resultam em gerar direito subjetivo à nomeação.

Classicamente, tem-se o posicionamento de que a nomeação se encontra sujeita à análise do mérito administrativo, e que somente pode ocorrer se presentes as seguintes condições:

1 - Necessidade da Administração Pública;
2 - Existência de candidato aprovado em concurso público que esteja ainda em seu prazo de validade;
3 - Existência de recursos orçamentários, haja vista a existência de limites para os gastos com pessoal.

Portanto, em havendo nomeação para cargos públicos, tem-se naturalmente reconhecida a presença de (1) "Necessidade da Administração Pública", posto que, caso contrário, sequer ocorreria a nomeação.

Este mesmo ato de nomeação implica também em reconhecimento de existência (2) "de candidato aprovado em concurso público que esteja ainda em seu prazo de validade" bem como de (3) "recursos orçamentários", caso contrário, se apresentariam nulas estas nomeações, porque contrárias às normas legais.

Todavia, após a nomeação, havendo cargos que não tenham sido providos pela desistência de alguns dos candidatos nomeados, a partir do momento em que houve nomeação para estas vagas, a administração enunciou estarem presentes os requisitos para a da contratação de servidores públicos, inclusive tendo expressado a existência de conveniência e oportunidade administrativa.

Esta situação independentemente de se tratar de vagas oferecidas originalmente no Edital, ou de vagas excedentes àquelas, surgidas durante o prazo de validade do certame, ou ainda de se tratar de concurso para o qual não tenham sido oferecidas vagas, sob formato de formação de cadastro para vagas que venham a surgir posteriormente.

Esta ótica encontra-se fundada no conceito tratado na doutrina como 'Teoria dos Motivos determinantes'. Conforme leciona Celso Antônio Bandeira de Mello(1): "De acordo com esta teoria, os motivos que determinam a vontade do agente, isto é, os fatos que serviram de suporte à sua decisão, integram a validade do ato."

Por sua vez, o saudoso professor Hely Lopes Meirelles(2), ensina que "A teoria dos motivos determinantes funda-se na consideração de que os atos administrativos, quando tiverem sua prática motivada, ficam vinculados aos motivos expostos, para todos os efeitos jurídicos. Tais motivos é que determinam e justificam a realização do ato, e, por isso mesmo, deve haver perfeita correspondência entre eles e a realidade."

Pela teoria dos motivos determinantes, tem-se que quando um ato administrativo discricionário tiver sua prática motivada, torna-se vinculado aos motivos que apresentou, se estes forem inexistentes, será por derivação nulo o ato administrativo nestes motivado.

Em havendo nomeação, a motivação para a mesma será necessariamente a existência de "interesse da Administração Pública", "de candidato aprovado em concurso público que esteja ainda em seu prazo de validade" e, por último, de "recursos orçamentários".

Caso alguns dos nomeados não venham a tomar posse não irá provocar mudança na situação fática, qual seja, a existência do interesse e da necessidade da Administração Pública em contratar candidatos aprovados em concurso público, ainda em seu prazo de validade, tendo recursos orçamentários para tanto disponíveis.

A teoria dos motivos determinantes é por deveras estudada em seus efeitos de anulação de atos quando o motivo alegado se apresenta inexistente, ou se apresenta em contexto diverso do que foi alegado, todavia, esta teoria tem aplicação mais abrangente, como a seguir se demonstra.

Os atos administrativos discricionários não são atos arbitrários, portanto, não pode o agente público praticá-los segundo seus critérios de interesse pessoal. Na verdade, tem-se quanto aos atos discricionários que a lei deixa ao critério do agente público analisar se estão presentes a conveniência e o interesse público.

No caso de nomeação para cargos efetivos, sabe-se que é ato discricionário, mas apenas quanto ao aspecto de conveniência e interesse público, visto que quanto aos demais requisitos, não deixou a lei qualquer margem para análise de discricionariedade. Portanto, ainda que haja interesse e conveniência da Administração Pública em contratar servidores para cargos efetivos, somente esta providência será possível caso haja recursos orçamentários e haja também candidatos aprovados em concurso público com prazo de validade não expirado. Quanto a estes dois requisitos (1º - recursos orçamentários; 2º - existência de candidatos aprovados em concurso público com prazo de validade não expirado), não existe análise discricionária por parte da Administração Pública.

Por outro lado, a mera existência de recursos orçamentários e de candidatos aprovados em concurso público com prazo de validade não expirado não gera o direito à nomeação, posto que necessário também a existência do interesse e conveniência da Administração Pública.

Por outro lado, quando presentes todos estes três requisitos (1º - recursos orçamentários; 2º - candidatos aprovados em concurso público com prazo de validade não expirado; 3º - interesse e conveniência da Administração Pública), a nomeação torna-se procedimento de adoção imperiosa.

Ou seja, este é o outro aspecto menos estudado da teoria dos motivos determinantes. Em havendo dois atos administrativos discricionários, cujos aspectos de interesse, oportunidade e conveniência administrativa sejam EXATAMENTE os mesmos, o reconhecimento da existência destes critérios (interesse, oportunidade e conveniência administrativa) para fundamentar-se a prática de um ato implica na necessidade da prática do outro ato para o qual a lei vinculou ao mesmo motivo.

Ou seja, caso a norma legal estabeleça que, em o agente público considerando presente o elemento motivador "X", deva praticar os atos administrativos "A" e "B", se o administrador público praticar o ato administrativo "A", fundamentando-se na existência do elemento motivador "X", estará o administrador obrigado também à prática do ato administrativo "B".

Portanto, tem-se três elementos motivadores, quais sejam: 1º - recursos orçamentários; 2º - candidatos aprovados em concurso público com prazo de validade não expirado; 3º - interesse e conveniência da Administração Pública, sendo os dois primeiros de análise objetiva, e o último de análise subjetiva.

Estando presentes todos os requisitos, torna-se obrigatório o provimento do cargo público em questão. O fato de haver candidatos aprovados que não tomaram posse não implica em qualquer mudança quanto a qualquer dos três elementos motivadores do ato de nomeação, que continuam existindo.

Tampouco há que se falar em mudança do interesse e conveniência da Administração Pública, porque nomeação não é ato administrativo revogável e sim ato que gera efeitos e conseqüências por duradouro tempo, por vezes por mais tempo do que os 35 (trinta e cinco) anos de tempo de serviço necessário para aposentadoria, se forem considerados os constitucionais direitos de aposentadoria e pensão.

Portanto, se houve nomeação para cargo de provimento efetivo, isto implica dizer que a Administração enunciou a necessidade de servidores para determinado cargo para o momento presente e com efeitos duradouros. Conseqüentemente, não se mostra minimamente cabível defender-se não mais existir o interesse público que motivou nomeação anterior para o mesmo cargo efetivo porque seria o mesmo que assumir que nomeação anterior foi feita como ato da mais pura irresponsabilidade, pois não se faz nomeação para cargos efetivos exceto se presentes duradouros interesse e conveniência administrativa.

Conseqüentemente, o fato de haver nomeação, para cargo efetivo, de candidato aprovado em concurso público, sem que este venha a tomar posse ou, tomando-a, que não entre em exercício no prazo legal, resulta em tornar a Administração Pública vinculada quanto à nomeação do próximo candidato aprovado, independentemente de que a vaga em questão esteja incluída naqueles originalmente oferecidas no edital do respectivo concurso ou tratar-se de vaga surgida posteriormente.

Apreciando recentemente esta questão, o Tribunal de Justiça de Goiás reconheceu e validou o entendimento supramencionado, conforme demonstra Ementa abaixo transcrita.

"ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. CRIAÇAÕ DE NOVAS VAGAS DURANTE O PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. DEMOSNTRAÇÃO DA NECESSIDADE DOS SERVIDORES. DIREITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO.
1. O entendimento de que os aprovados em concurso público possuem mera expectativa de direito é unânime na doutrina e jurisprudência. Entretanto, se dentro do prazo de validade do concurso surgirem novas vagas, e há demonstração inconteste da Administração a respeito da necessidade de provimento dos cargos tais como a reconvocação de candidato desinteressado em ocupar as novas vagas, esta situação, gera para o candidato aprovado, direito subjetivo de preencher tais vagas.
2. Segundo a teoria dos motivos determinantes, o motivo do ato administrativo deve guardar consonância com a situação de fato que originou a manifestação da administração. Persistindo os motivos, afasta-se a discricionariedade do administrador, que fica vinculado a situação de fato que gerou o ato.
3. Havendo desinteresse de alguns aprovados em relação à posse e, estando o impetrante dentro do número de vagas que foram criadas para atender ao interesse da administração, tem direito líquido e certo de ser nomeado.
SEGURANÇA CONCEDIDA."
(MS 15803-2/101. Rel. Des. CARLOS ESCHER. ÓRGÃO ESPECIAL, julgado em 29.04.2008, DOE 26.05.08)


Portanto, a nosso ver, o fato de haver nomeação de candidato aprovado sem que este venha a tomar posse representa situação em que em que, para o próximo candidato da lista de aprovados, a expectativa de direito se converte em direito subjetivo de nomeação para o candidato aprovado em concurso público.

Este posicionamento encontra-se em consonância com a visão jurídica atual sobre o Estado como ente jurídico e sobre a Administração Pública como gestora do interesse coletivo, transportada de um conceito onde a supremacia estatal era claramente acentuada para outro, no qual esta passa a ser vista em confronto com os direitos, garantias e expectativas dos administrados em geral.

No âmbito do concurso público, conforme demonstrado, esta evolução também se percebe, visto que, de um conceito onde este mecanismo era apenas uma forma de seleção utilizada pela Administração Pública para escolher pessoas, as quais poderiam ou não ser contratadas conforme pura e simples conveniência deste ente, caminha-se para contexto essencialmente diverso, onde somente mediante fatos e circunstâncias devidamente justificadas poderá o Administrador Público deixar de prover (nomear) candidatos para os cargos que ofereceu em concurso público.

Esta alteração não se apresenta nem pode ser vista, sob qualquer forma, como subordinação do interesse público ao particular, mas apenas amadurecimento do fato de que a Administração Pública nunca foi, nem tampouco o é, um fim em si mesma, mas sim um conjunto de instituições que existem para servir a uma coletividade, e os interesses daquela não podem ser isoladamente considerados, distanciando-se daqueles inerentes aos seus administrados.

Na verdade, a própria terminologia Administração Pública X Administrados encontra-se desfocada, na medida em que induz a existência de uma relação hierárquica entre estes e aquela, quando na verdade trata-se de relação simbiótica, sem prevalência dos interesses de qualquer das partes, mas sim da convergência dos mesmos para um só objetivo.



Notas:

* Dênerson Dias Rosa, ex-Auditor Fiscal da Secretaria da Fazenda de Goiás, é consultor tributário e Sócio de Dênerson Rosa & Associados Consultoria. [ Voltar ]

1 - BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio, Elementos de Direito Administrativo, 3ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 1992Voltar

2 - MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, 26ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2007Voltar

Palavras-chave: concurso público

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1 Comentários

Humberto Maia Economista27/02/2009 21:04 Responder

Será que dava para o autor fazer um resumo para os simples mortais? Obrigado! Humberto (81) 9292-2209

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