Ação de destituição de poder familiar que envolve criança indígena exige participação da Funai

A orientação, baseada no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), foi estabelecida pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao analisar a ação em que uma mulher indígena foi destituída do poder sobre suas duas filhas, após o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul concluir que houve abandono material e psicológico. Segundo o Ministério Público, a mãe é alcoólatra e usuária de drogas, e recusou o apoio da assistência social.

Fonte: STJ

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Reprodução: Pixabay.com

​​​​​Nas ações relacionadas à destituição do poder familiar e à adoção de crianças ou adolescentes indígenas – ou cujos pais são de origem indígena –, é obrigatória a intervenção da Fundação Nacional do Índio (Funai), para assegurar que sejam consideradas e respeitadas a identidade social e cultural do povo indígena, os seus costumes e tradições, bem como para que o menor seja colocado, de forma prioritária, no seio de sua comunidade ou junto de membros da mesma etnia.


A orientação, baseada no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), foi estabelecida pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao analisar a ação em que uma mulher indígena foi destituída do poder sobre suas duas filhas, após o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul concluir que houve abandono material e psicológico. Segundo o Ministério Público, a mãe é alcoólatra e usuária de drogas, e recusou o apoio da assistência social. 


"Por se tratar de órgão especializado, é a Funai que reúne as melhores condições de avaliar a situação do menor de origem indígena, não apenas à luz dos padrões de adequação da sociedade em geral, mas, sobretudo, a partir das especificidades de sua própria cultura, o que influencia, inclusive, na escolha de uma família substituta de tribo que possua maiores afinidades com aquela da qual se origina o menor", afirmou a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso no STJ.


Em recurso especial, a mãe alegou violação dos artigos 28, parágr​afo 6º, e 161, parágrafo 2º, do ECA, sob o fundamento de que, em se tratando de crianças de origem indígena, seriam obrigatórias a intervenção da Funai e a realização de estudo antropológico.


Ordem pública


Nancy Andrighi explicou que, após a interposição do recurso especial, sobreveio a Lei 13.509/2017, que revogou o artigo 161, parágrafo 2º, do ECA e passou a disciplinar a adoção de indígenas no artigo 157, parágrafo 2º. De acordo com o novo texto, nas hipóteses de suspensão do poder familiar – liminar ou incidentalmente –, é obrigatória a participação de representantes do órgão federal responsável pela política indigenista.


Segundo a ministra, embora a redação possa sugerir que a intervenção da Funai somente é obrigatória nos casos de suspensão liminar ou incidental do poder familiar, o ponto central é que a alteração normativa esclarece que a realização de estudo social ou perícia por equipe multidisciplinar, bem como a participação da fundação, deverão ocorrer sempre e logo após o recebimento da petição inicial.


A relatora também destacou que a intervenção obrigatória da Funai nos litígios que envolvam da destituição de poder familiar em povos indígenas tem caráter de ordem pública, na medida em que resguarda valores e objetivos político-sociais caros à sociedade – e, por isso, possui caráter "imperativo e inderrogável".


Além disso, para a ministra, as regras expressas no ECA demonstram a preocupação do legislador em conferir às crianças de origem indígena tratamento realmente diferenciado, com base no fato de pertencerem a uma etnia minoritária, historicamente discriminada e marginalizada no Brasil – tratando-se de dispositivos que concretizam os artigos 227 e 231 da Constituição.


"Além de oferecer proteção efetiva aos menores de origem indígena, reconhecendo-se a existência de uma série de vulnerabilidades dessa parcela populacional, não se pode olvidar que o ECA também pretende adequadamente tutelar a comunidade e a cultura indígena, de modo a minimizar a sua assimilação ou absorção pela cultura dominante", afirmou.


Situação grave


Nancy Andrighi ressaltou que há prova robusta de que a mãe não possui mínimas condições de exercer o poder familiar. Diante da gravidade da situação das menores – acrescentou a relatora –, apesar de não ter havido ainda a participação da Funai, não se justificaria anular integralmente o processo para que ela pudesse intervir desde o princípio.


Mesmo negando provimento ao recurso especial da mãe, a ministra enfatizou que, daqui em diante, é indispensável haver "a efetiva participação da Funai em quaisquer procedimentos ou ações que envolvam as referidas menores, inclusive em eventuais ações de adoção que estejam em curso, assegurando-lhes a possibilidade de resgate ou manutenção da cultura indígena".


O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Palavras-chave: Ação de Destituição Poder Familiar Adoção Criança Indígena Funai ECA CF

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