Da penhora do bem de família – empregado doméstico e fiador

O presente artigo discorre sobre penhora do bem de família

Fonte: Josiane Coelho Duarte

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Nos dias de hoje, quando se trata de relações obrigacionais, ao contrário do que ocorria na antiguidade, é o patrimônio do devedor quem responde pelas dívidas contraídas por aquele, inexistindo, assim, débitos pagos com seu próprio corpo ou através de trabalhos forçados, práticas proibidas pela ordem constitucional brasileira.


Em relação ao bem de família a Lei 8.009/90 assim o define:


Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.


Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.


Conforme art. 2º da lei mencionada excluem-se da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos e ainda, aduz o parágrafo único que “No caso de imóvel locado, a impenhorabilidade aplica-se aos bens móveis quitados que guarneçam a residência e que sejam de propriedade do locatário, observado o disposto neste artigo.”


Vale frisar que pessoa solteira, viúvas ou separadas também possuem as garantias da impenhorabilidade do bem de família, com as exceções enumeradas na lei, conforme súmula 364 do E. Superior Tribunal de Justiça in verbis: “O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.”.


Dentre os direitos fundamentais, aqueles imprescindíveis ao ser humano e garantidos pela Constituição Federal de 1988 (CF/88), está o direito à moradia, previsto no art. 6º da CF/88 e a proteção à família trazida no art. 226 da Lei Maior:


Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Grifo meu).


Art. 226. A família , base da sociedade, tem especial proteção do Estado.


A família como base da sociedade deve ser objeto de proteção e cuidado por parte do Estado, de modo que suas necessidades sejam supridas e a fruição de seus direitos possibilitada pelo Poder Público, sendo certo que dentre a proteção almejada se vê a garantia de moradia.


Conforme a redação do art. 3º da Lei da Impenhorabilidade do bem de família:


Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:


I - em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias; (antes da redação determinada pela Lei Complementar nº. 150/2015).


(...)


VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.


Importante ressaltar que a cláusula de impenhorabilidade tem como finalidade proteger o patrimônio do devedor e sua família, à medida que impede a penhora de determinado bem de sua propriedade que seja imprescindível para sua vida digna.


A regra da impenhorabilidade do bem de família possui algumas exceções, contudo focaremos apenas nas dos incisos I e VII do art. 3º da Lei em comento.


O inciso I trazia uma exceção que permitia que o bem de família fosse penhorado em razão de dívidas trabalhistas de empregados domésticos da própria residência, haja vista que trabalhadores domésticos não possuíam igualdade de direitos em relação aos empregados urbanos, por exemplo, o que justificava uma maior garantia na fase de recebimento de seu crédito.


Assim, caso um empregador doméstico não pagasse os débitos trabalhistas e previdenciários daí decorrentes, poderia ter sua residência penhorada a fim de saldar a dívida alimentar.


Após o advento da LC nº. 150/2015, art. 46, referida regra foi revogada, ante a equiparação de direitos trabalhistas entre empregados urbanos e domésticos, tendo este suas peculiaridades.


Dessa forma, hoje a regra da penhora do bem de família para o pagamento de débitos trabalhistas e previdenciários não existe mais, passando, assim, a ser proibida a penhora do único imóvel residencial do empregador doméstico para tal finalidade.


No que pertine às garantias do contrato de locação de imóvel urbano a Lei 8.245/91 assim dispõe:


Art. 37. No contrato de locação, pode o locador exigir do locatário as seguintes modalidades de garantia:


I - caução;


II - fiança;


III - seguro de fiança locatícia.


IV - cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento.


Parágrafo único. É vedada, sob pena de nulidade, mais de uma das modalidades de garantia num mesmo contrato de locação. (Grifo meu).


Ante o teor do artigo percebe-se que pode haver contrato de locação garantido com fiança, que se equipara a uma verdadeira hipoteca do bem imóvel residencial do fiador mesmo que seja o único, sendo, portanto, exceção à regra da impenhorabilidade do bem de família, como já afirmado.


A questão é deveras tormentosa, no entanto o Excelso Supremo Tribunal Federal (STF) já possui jurisprudência firmada no sentido de que o único imóvel (bem de família) de uma pessoa que assume a condição de fiador em contrato de locação pode ser penhorado em caso de inadimplência do inquilino, haja vista a constitucionalidade da norma jurídica que a permite.


Nesse sentido:


PENHORA – BEM DE FAMÍLIA – FIADOR EM CONTRATO DE LOCAÇÃO – CONSTITUCIONALIDADE. O Tribunal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 407.688-8/SP, declarou a constitucionalidade do inciso VII do artigo 3º da Lei nº 8.009/90, que excepcionou da regra de impenhorabilidade do bem de família o imóvel de propriedade de fiador em contrato de locação. (STF - RE: 495105 SP, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 05/11/2013, Primeira Turma, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-234 DIVULG 27-11-2013 PUBLIC 28-11-2013) Fonte: http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/24706899/agreg-no-recurso-extraordinario-re-495105-sp-stf.


Diante do exposto, certo concluir que a regra da impenhorabilidade do bem de família possui exceções descritas na lei, sendo que hoje não mais se permite a penhora de referido bem em caso de inadimplemento de verbas trabalhistas e previdenciárias de empregador doméstico em relação aos empregados da própria residência, posto que a norma foi expressamente revogada pela LC nº. 150/2015 que trata do trabalhador doméstico.


Ademais, embora não livre de críticas por parte da doutrina, o inciso VII do art. 3º da Lei 8.009/90 permanece em vigor e foi ratificado pelo e. STF que declarou sua constitucionalidade, motivo pelo qual se deve ter absoluto cuidado ao ser fiador de terceira pessoa em contrato de locação de imóvel urbano, pois o bem de família do fiador não possui proteção legal face à possibilidade de penhora e futura expropriação para o pagamento de aluguéis do afiançado.


Josiane Coelho Duarte

Josiane Coelho Duarte

Advogada Bacharel em Direito pela Anhanguera Educacional S/A, pós graduada em Direito e Processo do Trabalho pela UNIVAG em convênio com a Amatra XXIII, Servidora Pública Estadual perfil Advogado e Professora do Ensino Superior.


Palavras-chave: Penhora Bem de Família Contrato de Locação Fiador CF

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