Prisão no ordenamento jurídico brasileiro
Cumpre lembrar que a liberdade é a regra e a prisão a exceção. O CPP de 1941 foi promulgado sob a égide do Estado Novo e, cogitava em cumprimento de pena imediatamente com a condenação em primeira instância. E, a prisão já poderia ocorrer na denúncia criminal contra o suspeito. O STF, por diversos caminhos, enfrentou o tema e, em 2018 em julgamento do HC do ex-presidente Lula, confirmou, novamente, a jurisprudência em prol da prisão em segunda instância. Os vários tipos de prisão na sistemática processual penal sempre agitam controvérsias e polêmicas, seja em doutrina ou na jurisprudência.
Há duas modalidades de prisão
em matéria criminal. A primeira se refere ao cumprimento e pena por parte de
condenação, onde foi imposta a pena privativa de liberdade constante em
sentença condenatória.
Por outro lado, há prisão[1] processual decretada
diante de premente necessidade de segregação cautelar do autor do delito
durante as investigações ou no tramitar a ação penal pelas razões elencadas
pela legislação processual penal brasileira.
A prisão cautelar é medida
cautelar pessoal que recai sobre o indiciado (durante o inquérito policial e
antes do processo criminal) ou incidental ao processo, devendo resguardar os
mesmos requisitos de qualquer medida cautelar, a saber: fumus comissi
delicti e periculum libertatis.
Há no CPP duas formas de
prisões processuais, e prisão em flagrante[2] delito e a prisão
preventiva. Antes a Lei 12.403/2011 existia uma bipolaridade de medidas
cautelares de natureza pessoal, quando se impunha a prisão ou liberdade
provisória[3].
A partir da Lei 12.403/2011
extinguiu-se a bipolaridade e o juiz passa a ter várias opções de medidas
cautelares de natureza pessoal, porém, diversas de prisão (artigos 319[4] e 320 do CPP).
Com a Lei 12.403/2011 surgiu
um sistema poliforme e caracterizado por multicautela, pois submete ao imputado
a um terceiro status, que não implica em prisão e, também não importa em
liberdade total. Significa a sujeição de medidas diversas da prisão arroladas
nos artigos 319 e 320 do CPP.
Em síntese, com a reforma
processual penal ditada pela lei indicada acima, o indivíduo submetido a uma
investigação criminal ou que responde ao processo criminal poderá estar sujeito
à três tratamentos distintos, a saber: 1. Medias cautelares diversas de prisão;
2. Aguardar em liberdade; 3. Prisão provisória.
O artigo 319 do CPP elenca
nova medias cautelares alternativas. É o artigo 320 CPP que trata de proibição
de ausentar-se do país, e a prisão preventiva e a prisão domiciliar como forma
de cumprimento de prisão preventiva.
A Lei 12.403/2011 consagrou a
natureza de prisão processual como a de uma medida cautelar já há muito tempo
reconhecido em doutrina e jurisprudência. Os requisitos cautelares criminais são
periculum in mora e fumus boni iuris traduzindo o risco à
efetividade do processo penal causado pela liberdade plena ao réu em face da
ordem pública ou econômica, da conveniência à instrução penal e a aplicação da
lei penal; e o segundo, a existência de indícios suficientes de autoria e a
prova da existência do crime.
Parte a doutrina preferem periculum
in libertatis e fumus commissi delicti. Com relação à prisão
provisória a Lei 12.403/2011 pôs fim à possibilidade de ser alguém mantido
preso em razão de flagrante delito.[5]
O periculum libertatis[6]
é, nas palavras de Aury Lopes Jr: "O perigo que decorre do estado de
liberdade do sujeito passivo, previsto no CPP como o risco para a ordem
pública, ordem econômica,[7] conveniência da instrução
criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal".
O fumus commissi delicti
é um requisito cautelar próprio do processo penal. Não se confunde com o
instituto do processo civil, Fumus Boni iuris, que indica a provável existência
de um direito demandado.
Nas palavras de Aury Lopes Jr
(Direito Processual Penal, Lumen Juris, V. II): “como se pode
afirmar que o delito é a fumaça do bom direito? Ora, o delito é a negação do
direito, sua antítese!”. Para o processo penal, a cautela reside na ocorrência
do delito, já, para o processo civil, o fundamento encontra-se na existência de
um direito. Nota-se que são situações bastante diversas.
Trata-se de um dos requisitos
para a imposição da prisão preventiva e das medidas cautelares alternativas
trazidas com a Lei 12.403/2011. Ausente tal requisito, não é possível aplicar
medidas cautelares alternativas nem a prisão preventiva[8].
Cabe destacar que o fumus commissi
delicti deverá estar acompanhado do periculum libertatis para a
aplicação das medidas cautelares e da prisão preventiva. Este se refere ao
risco que o agente em liberdade possa criar à garantia da ordem pública, da
ordem econômica, da conveniência da instrução criminal e para a aplicação da
lei penal.[9]
Portanto, para que o infrator
permaneça o flagrado sob segregação, deverá o juiz converter a prisão em
flagrante em prisão preventiva desde que presentes os requisitem que autorizem
a medida e que não seja adequada ou suficiente a aplicação das demais medias acautelatórias
não privativas de liberdade conforme os artigos 319 e 320 CPP.
O flagrante[10] prende, mas, não é hábil
para manter o infrator preso, deflui-se que, atual sentença, perdeu a natureza
de prisão cautelar Só havendo apenas duas prisões, a saber: a) a preventiva; b)
temporária.
É certo que, no momento
compreendido entre a voz de prisão[11] que, decorre do flagrante
e, o recebimento, pelo juiz, do respectivo autor de prisão existe uma
segregação e, inegavelmente, esta decorre da prisão em flagrante[12].
Na busca de explicar a
natureza jurídica da prisão em flagrante nesse intervalo, correntes doutrinárias
opostas surgiram. Para alguns, trata-se de cautelar provisória efêmera,
subsistente até o momento em que o juiz receber o auto de prisão em flagrante,
já que nessa ocasião, obriga-se a ele adotar uma das providências rotuladas no
artigo 310 do CPP.
Já para outros doutrinadores,
ao contrário vislumbrando o flagrante, no referido interregno, como forma de
prisão precautelar, com duração limitada no tempo a um acontecimento previsto
em lei, no caso, é o recebimento do respectivo auto de prisão pelo juiz e
subsequente adoção das medidas consagradas no artigo 310 CPP, entre as quais,
se encontra a prisão preventiva (esta sim, com a natureza de prisão cautelar).
É a posição de Norberto Avena.
A Lei 12.403/2011[13] ainda prevê a
excepcionalidade da prisão preventiva frente às outras medidas cautelares que
não impliquem em privação de liberdade. Logo, antes de decretar a prisão
cautelar, deverá o juiz verificar, se porventura, são cabíveis quaisquer
medidas cautelares diversas de prisão arroladas no CPP no artigo 282, §6º.
Estabeleceu que, ressalvados
os casos de urgência ou de ineficiência da medida a ser imposta, será exigida a
observância do contraditório como condição prévia para que o juiz determine
medidas cautelares de natureza pessoal.
Questiona-se, o que vem a ser
a prisão cautelar? Conforme o nomen iuris, é uma cautela. Lato sensu,
possui o objetivo da tutela de persecução criminal (investigação criminal e
inquérito policial). Stricto sensu, é relacionado à finalidade de
sua decretação.
Assim, a prisão temporária,
enquanto prisão cautelar, tem o fim de tutelar as investigações policiais. Já a
prisão preventiva, decreta na fase de inquérito ou do processo criminal, como
provimento cautelar, visa a resguardar a aplicação da pena, efetividade da colheita
de provas e a proteção da sociedade ou da ordem econômica.
Evidentemente, a exigência do
contraditório requer a compatibilidade com a medida, não sendo razoável, por
exemplo, cogitá-lo diante a decretação da prisão preventiva ou temporária
(artigo 282, §3º).
Coibiu o decreto de medidas
cautelares de ofício[14] na fase das
investigações, seja a prisão preventiva[15], seja as demais medias
diversas da prisão. Destarte, apenas na fase do processo judicial é facultado
ao juiz decretar estas medidas por sua própria iniciativa (artigo 282, § 2º e
art. 311 do CPP).
Possibilitou ao assistente de
acusação o requerimento das medias cautelares de natureza pessoal. Tal
faculdade é prevista no artigo 311 do CPP, sendo extensiva também às demais
cautelares diversas da prisão por força do artigo 282, §2º do mesmo diploma
legal.
Quando da alteração do artigo
282, do CPP, promovida pela Lei 13.964/2019, cumpre destacar que a nova redação
desse dispositivo — que se insere no Título IX, Da Prisão, das Medidas
Cautelares e da Liberdade Provisória, e no seu Capítulo I, das Disposições
Gerais —, pela posição topológica que ocupa e, por evidente, pelo conteúdo
mandatário inerente a sua própria característica de dispositivo geral, quanto
mais pelo conteúdo de seu § 2º, que se envolve e se preocupa com a necessidade
de manifestação prévia das partes, ou por representação da autoridade policial
ou requerimento do Ministério Público para a decretação de medidas cautelares
pelo juiz, se alinha total e diretamente com o conceito de sistema acusatório
estruturado, alicerçado nos dispositivos do artigo 129, incisos I e VIII, da
Constituição da República, o que estabelece de forma translúcida a quem cabe a
ação penal pública; e, por conseguinte, os limites de atuação de quem obra como
defesa; da mesma forma, a atuação daquele que presta a jurisdição conforme suas
atribuições funcionais e dentro das balizas do que pede o órgão acusador, bem
como do que pleiteia o elemento defensor. Enfim, cada um deve atuar dentro da
esfera de sua competência.
A interpretação de todo e
qualquer dispositivo do Título IX do CPP em consonância com as disposições do
seu Capítulo I, mormente quando se depare com circunstâncias sujeitas às
disposições do Art. 310 (do Capítulo II, Da Prisão em Flagrante) ou do artigo
312 (do Capítulo III, da Prisão Preventiva), cabendo não só, mas
principalmente, conjugarem-se aqueles conteúdos ao que prevê o artigo 282,
sugere mostrar-se razoável e como a boa técnica de hermenêutica para assegurar,
para buscar a escorreita aplicação do direito processual penal a toda e
qualquer medida cautelar, prevista ou não no âmbito do CPP.
E ao reforço da estrutura
acusatória inaugurada pela CRFB/1988 e convalidada pelas disposições da Lei
13.964/2019, inserem-se as alterações trazidas pelo artigo 3º-A, do CPP, embora
de efeitos suspensos em razão das aventadas dificuldades de ordem prática para
implementação do juiz das garantias[16] ADI 6299, que consagram com firmeza e
objetividade a figura de um processo penal essencialmente democrático, pautado
pelos direitos e garantias fundamentais amalgamados e consolidados em nossa
Constituição Federal vigente, cuja suspensão circunstancial não o podem relegar
ao escaninho da indiferença a ponto de neutralizá-lo, porquanto não se discute
a validade de seu conteúdo.
O processo penal terá
estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a
substituição da atuação probatória do órgão acusador.
Admitir a atuação do juiz
fazendo as vezes de Ministério Público ou mesmo interpretar com leniência
dispositivos legais que o permitiriam obrar de ofício é algo que se estreita
com uma espécie de versão mal adaptada, ampliada e deturpada da ideia por si só
desgastada de in dubio pro societate que permeia alguns posicionamentos,
eventualmente, menos alinhados com o contexto democrático vigente.
Daí que o sistema acusatório
urge seja convalidado como fundamental vetor, orientador maior do processo
penal democrático, garantista, sabido que é tratar-se de um modo imperfeito de
conduzir ao ideal do justo, porque permeado de falhas tão próprias das relações
humanas, mas cujos fundamentos se orientam válidos e como forma de preservar
direitos e garantias como regra, ainda que se tenha que conviver com
sacrifícios excepcionais que possam inclusive perpassar pela órbita da
impunidade de culpados.
Apesar do dispositivo não
mencionar expressamente a legitimidade do assistente, no descumprimento das
obrigações impostas por imposição das cautelares não privativas de liberdade,
pode requerer a sua substituição, cumulação ou decretação da prisão preventiva.
Afinal, sendo lhe assegurada
esta possibilidade, é lógico que também é facultado o pedido de aplicação das
cautelares restritivas diversas da prisão. Mesmo porque não seria razoável que pudesse
ele postular a prisão preventiva e não essas cautelares quando por força do
comando expresso tal prisão apenas pode ser decretada quando não cabíveis as
demais cautelares alternativas (artigo 292, §6º).
A Lei 12.403/2011 modificou,
embora não integralmente, o sistema adotado pelo Código de Processo penal no
tocante as infrações que admitem a prisão preventiva.
Doravante, admite-se esta
forma de segregação: Nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade
máxima superior a quatro anos (artigo 313, I);
Se tiver sido condenado por
outro crime doloso em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no
inciso I, do caput do artigo 64 do Dec.-Lei 2.848/1940 (Código Penal),
artigo 313, II CPP.
Se o crime envolver violência
doméstica e familiar[17] contra a mulher, criança,
adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência para garantir a execução
das medidas protetivas de urgência.
Recentemente, o Ministro do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) João Otávio Noronha revogou em 26.08.2022 revogou
a prisão preventiva de Monique Medeiros[18], acusada pela morte de
seu filho e de Henry Borel, ocorrida em março de 2021.
Ao conceder a ordem de habeas
corpus, o Ministro relator destacou o término da instrução processual e a
ausência de fundamentos idôneos suficientes que justifiquem a manutenção da
prisão preventiva. Não obstante a inequívoca gravidade dos ilícitos imputados,
vez que a paciente cumpria as medidas cautelares impostas, e não representando
risco para a aplicação da lei penal, para a investigação e a instrução criminal
ou ainda para a segurança da sociedade, o que demonstra a desnecessidade da
prisão preventiva.
Após a morte do menino, fora
determinada a prisão de Monique Medeiros bem como de ex-namorado, o médico e ex-vereador,
conhecido como Doutor Jairinho.
Em abril de 2022, o juízo de
primeira instância substituiu a prisão preventiva por medidas cautelares
alternativas, argumentando, entre outros motivos, que não havia mais risco de
Monique Medeiros interferir na instrução do processo criminal.
O Ministro Noronha ressaltou
que, encerrada a fase instrutória, o processo está pronto para julgamento no
tribunal do júri, não havendo motivos que justifiquem a permanência de Monique
Medeiros no regime de prisão preventiva.
"Segundo a jurisprudência
do STJ, não se pode decretar a prisão preventiva baseada apenas na gravidade
genérica do delito, no clamor público, na comoção social, sem a descrição de
circunstâncias concretas que justifiquem a medida", concluiu o ministro.
Da decisão monocrática do
Ministro relator, in litteris:
(...) “Ficou ainda
"vedada à ré MONIQUE, enquanto perdurar a monitoração, qualquer
comunicação com terceiros – com exceção apenas de familiares e integrantes de
sua defesa –, notadamente testemunhas neste processo, seja pessoal, por
telefone ou por qualquer recurso de telemática,
assim também postagens em
redes sociais, quaisquer que sejam elas, sob pena de restabelecimento da ordem
prisional".
Em sua fundamentação,
discorreu acerca das seguintes questões (fls. 58-59): a) delonga do processo
pelo excesso de peticionamentos pela defesa do codenunciado; b) ausência de
imputação de violência extremada, apontada pelo órgão acusatório, e de
indicação concreta de que a paciente tenha visto qualquer dos atos violentos;
c) insubsistência do pressuposto relativo à conveniência da instrução criminal,
pois a primeira fase da instrução se acha quase finda, não havendo
possibilidade de a paciente exercer nenhum tipo de influência sobre as
testemunhas supostamente antes coagidas; d) a despeito da gravidade concreta do
crime, inexistência de ato material a ela imputado, tornando-se um verdadeiro
furor público. Ademais, a paciente sofreu ameaças de morte e agressões dentro
do cárcere, motivo que descaracterizaria a prisão cautelar para garantia da
ordem pública, tendo em vista o risco à integridade física e psicológica da
pessoa presa”.
"(...)Seguindo a mesma
orientação: HC n. 503.916/MG, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta
Turma, julgado em 11/6/2019, DJe de 17/6/2019, HC n. 335.200/RJ, relator
Ministro Gurgel de Faria, Quinta Turma, julgado em 23/2/2016, DJe de 14/3/2016,
dentre outros".
Ainda será admitida a prisão
preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando
esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser
colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra
hipótese recomendar a manutenção da medida (artigo 313, parágrafo único do
CPP).
A prisão preventiva poderá ser
decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por
força de outras medidas cautelares (art. 312, parágrafo único e artigo
282,§4º).
A Lei 12.403/2011 instituiu a
prisão preventiva domiciliar consistente no recolhimento do indiciado ou do
acusado em sua residência como forma de cumprimento de prisão preventiva
(artigo 317 e 318 CPP).´
É cabível quando: o agente for
maior de oitenta anos; extremamente debilitado por motivo de doença grave;
Imprescindíveis cuidados especiais de pessoa menor de seis anos de idade ou com
deficiência; gestante a partir do sétimo mês de prenhez ou sendo gravidez de
alto risco.
Determinou à autoridade
policial a obrigação de comunicar a prisão em flagrante de qualquer pessoa e o
local onde se encontra, não apenas ao juiz e a família do preso ou pessoa por
ele indicada, conforme já se previa em legislação anterior, mas também ao
Ministério Público (artigo 306 CPP).
Estabeleceu a possibilidade de
condicionamento da liberdade provisória de medidas cautelares previstas nos artigos
319 e 321 CPP.
Não obstante a remissão
expressa que faz o artigo 321 ao artigo 319 CPP, é evidente que a medida
cautelar de proibição de afastamento do país prevista no artigo 320 CPP, que
também pode ser imposta como liberdade provisória do artigo 319, IV do CPP que
estabelece a proibição de afastar-se da Comarca.
Afinal, o juiz pode limitar a
capacidade ambulatória do indivíduo à região da Comarca como condição para a
concessão de benesse legal por que não o poderia ao contexto do país? Afinal,
quem pode o mais, poderá igualmente o menos.
Modificou as condições para
definição de afiançabilidade e inafiançabilidade (artigos 322 e 324 CPP). O
parâmetro pena deixou de ser o vetor para a definição de infração penal como
afiançável ou não.
É possível a concessão de
liberdade provisória[19] independente da pena
mínima prevista ao delito. Considera-se aspectos relacionados ao crime, não
será concedida fiança apenas aos crimes de racismo, de tortura, tráfico ilícito
de drogas e afins e terrorismo que são definidos como crimes hediondos e crimes
cometidos por grupos armados, civis ou militares contra a ordem constitucional
e o Estado Democrático de Direito (artigo 323 CPP).
Não há fiança para quem tenha
quebrado a fiança anteriormente concedida sem motivo, rompendo com qualquer
obrigação a que se referem os artigos 327 e 328 CPP; os que se encontrem sob a
prisão civil ou militar e aqueles a que se reconheçam os motivos que autorizem
a decretação da prisão preventiva (artigo 312 CPP).
Possibilitou ao Delegado de
Polícia arbitrar a fiança nas hipóteses em que a pena máxima cominada ao crime
não seja superior a quatro anos (artigo 322 CPP), abandonando com isso, o
critério anterior que, levando em consideração a natureza da pena estabelecida,
facultava à autoridade policial conceder a fiança unicamente em relação às
infrações com detenção ou prisão simples.
Readequou os parâmetros de
fixação de fiança (artigos 325, I e II CPP), com pena máxima cominada não
superior a quatro anos de prisão, valor de fiança deve ser arbitrada em um a
cem salários-mínimos.
Se a pena máxima for superior
a quatro anos, o valor da fiança fica entre dez a duzentos
salários-mínimos. Se a pena máxima for
superior a quatro anos, o valor da fiança fica entre dez a duzentos salários-mínimos.
As circunstâncias atinentes à situação econômica do réu pode conduzir à
dispensa de fiança (artigo 325, §1º, II CPP); redução até dois terços ou
aumento até mil vezes (artigo 325, §1º , III, CPP).
Resumidamente, a lei penal
brasileiro há seis tipos de prisão, a saber: temporária[20], preventiva, em flagrante
delito, para execução de pena, preventiva para fins de extradição e civil para o não pagador de
pensão alimentícia.
A prisão temporária é usada
durante a investigação e, em geral, é decretada assegurar o sucesso de
diligência, sendo imprescindível para as investigações.
De acordo com a Lei 7.960/1989
que regulamenta a prisão temporária, sendo cabível quando: 1. for
imprescindível para as investigações do inquérito policial; 2. quando o indicado
não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento
de sua identidade; 3. quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer
prova admitida na legislação penal, a respeito da autoria ou participação do
indiciado nos seguintes crimes como: homicídio, sequestro, roubo estupro,
tráfico de drogas, crimes contra o sistema financeiro entre outros.
O art. 1º da Lei 7.960/1989
aborda as hipóteses em que se pode ser decretada a prisão temporária em seus
três incisos, havendo entendimento doutrinário de que apenas um dos incisos não
é o bastante para ensejar a prisão temporária, sendo necessário associar os
incisos I ou II ao inciso III. In verbis, o art. 1º relata:
Art. 1° Caberá prisão
temporária: I – quando imprescindível para as investigações do inquérito
policial; II – quando o indicado não tiver residência fixa ou não fornecer
elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade; III – quando houver
fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de
autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes: a) homicídio doloso
(art. 121, caput, e seu § 2°); b) sequestro ou cárcere privado (art.
148, caput, e seus §§ 1° e 2°); c) roubo (art. 157, caput, e seus
§§ 1°, 2° e 3°); d) extorsão (art. 158, caput, e seus §§ 1° e 2°); e)
extorsão mediante sequestro (art. 159, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°); f)
estupro (art. 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput,
e parágrafo único); g) atentado violento ao pudor (art. 214, caput, e
sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); h) rapto
violento (art. 219, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo
único); i) epidemia com resultado de morte (art. 267, § 1°); j) envenenamento
de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte
(art. 270, caput, combinado com art. 285); l) quadrilha ou bando (art.
288), todos do Código Penal; m) genocídio (arts. 1°, 2° e 3° da Lei n° 2.889,
de 1° de outubro de 1956), em qualquer de suas formas típicas; n) tráfico de
drogas (art. 12 da Lei n° 6.368, de 21 de outubro de 1976); o) crimes contra o
sistema financeiro (Lei n° 7.492, de 16 de junho de 1986); p) crimes previstos
na Lei de Terrorismo.
A duração da prisão
temporária, em regra, é de cinco dias. Porém, existem procedimentos que
estipulam prazos maiores.
A prisão preventiva é a
modalidade mais conhecida de prisão, sendo também a mais controvertida do
ordenamento jurídico brasileiro. Pode ser decretada tanto durante as
investigações criminais, quanto no decorrer da ação penal. Em ambos os casos,
devem estar preenchidos os requisitos legais para sua decretação.
O artigo 312 do CPP aponta os
requisitos que podem fundamentá-la, sendo estes: a) garantia da ordem pública
ou ordem econômica, e assim, impedir que o réu continue praticando crimes; b)
conveniência da instrução criminal, para que o réu não atrapalhe o andamento do
processo, seja ameaçando testemunhas, ou ainda, destruindo provas; c) assegurar
a aplicação da lei penal, impossibilitando a fuga do réu.
Lembrando-se que o CFRB/1988
determina que uma pessoa somente poderá ser considerada culpada de um crime,
somente após o fim do processo, isto é, o julgamento de todos os recursos
cabíveis.
A prisão em flagrante delito
tem uma interessante peculiaridade pois é possível ser decretada por qualquer
do povo[21] que presenciar ato
criminoso. As autoridades policiais têm o dever de prender se o suspeito
estiver em flagrante delito.
Ao receber o auto de prisão em
flagrante, de acordo com o art. 310 do CPP, o juiz competente deverá, em até 24
horas após a prisão, promover a audiência de custódia[22] e, nela, decidir de forma
fundamentada se irá: (i) relaxar a prisão, caso ela seja ilegal; ou (ii)
converter a prisão em preventiva, caso existam os requisitos para tal e se
revelarem inadequadas as medidas cautelares diversas; ou (iii) conceder
liberdade provisória com ou sem fiança.
A prisão para execução da pena
é imposta aos condenados por algum crime.
Em 5 de fevereiro de 2009, o
STF entendeu que os condenados só poderão ser presos nesta modalidade de
prisão, se o processo não for mais passível de recurso. Só se aplica aos
condenados que respondem ao processo em liberdade.
E, se houver fundamento, o
juiz poderá determinar a prisão preventiva do condenado sem processo transitado
em julgado.
Essa modalidade de prisão é
regulamentada pela Lei de Execuções Penais, a Lei 7.210/1984 que possibilita o
sistema de progressão do regime e trata dos direitos e deveres dos presos e das
faltas disciplinares.
A prisão preventiva para fins
de extradição é decretada para garantir o processo extradicional[23]. A extradição será só
pode ser pedida depois da prisão do acusado. O país, onde o réu é suspeito de
cometer o crime, deve fazer o pedido de prisão pela via diplomática.
O Ministério das Relações
Exteriores repassa a solicitação ao Ministério da Justiça, que o encaminhará ao
STF. O relator do processo é quem decide se o acusado deve ser preso. Ela serve
para garantir que o Brasil extradite o réu se o Supremo assim decidir.
Após a entrada em vigor da lei
nº 13.964/19, a decretação das prisões preventivas precisam ser provocadas, não
havendo mais a hipótese de decretação de ofício pelo juiz.
O decreto prisional, como
qualquer outra decisão judicial, necessitar ser fundamentada. Nesse caso,
existem alguns requisitos essenciais para a decretação: fumus commissi
delicti e o periculum libertatis.
O primeiro seria a prova da
existência do crime e indício suficiente de autoria, enquanto o segundo seria o
iminente perigo gerado por o agente permanecer em sociedade.
Com relação ao periculum
libertatis, a decisão deve ser motivada para a garantia da ordem pública,
da ordem econômica, para a conveniência da instrução criminal ou para assegurar
a aplicação da lei penal.
Prisão civil do não pagador de
pensão alimentícia é a única modalidade de prisão civil admitida na Justiça
brasileira. Objeto de análise do STF que reconheceu a ilegalidade da prisão
civil de depositário infiel[24].
Em 22 de novembro de 2006, o
Ministro Gilmar Mendes, em sede de recurso extraordinário (RE 466343/SP),
entendeu pela inconstitucionalidade da prisão do devedor em alienação
fiduciária, reacendendo a discussão.
Passamos, assim, a analisar os
principais aspectos da prisão civil no tocante ao depositário infiel, bem como
a inovadora posição do Supremo Tribunal Federal trazida pelo Ministro Gilmar
Mendes. Pacto de San José da Costa Rica
A Convenção Americana de
Direitos Humanos[25]
de 1969, também conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, dispõe em seu
artigo 7º, 7, que: “Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não
limita os mandatos de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de
inadimplemento de obrigação alimentar”. Tem-se, assim, que a Convenção veda
qualquer tipo de prisão civil (prisão por dívidas), excetuando-se, apenas, a
prisão civil do devedor de alimentos.
Esse tratado passou a vigor no
Brasil, a partir de 25 de setembro de 1992, quando foi ratificado pelo
Congresso Nacional, portanto, após o início da vigência da Constituição Federal
(05 de outubro de 1988).
O objetivo dessa prisão é
garantir que inadimplente de pensão alimentícia cumpra sua obrigação de prestar
alimentos ao seu filho. Em alguns casos, ela pode ser aplicada ao filho que não
garante a subsistência de pais necessitados.
A respeito da prisão decorrente
de pronúncia[26],
tem-se: A pronúncia constitui-se uma das possíveis modalidades de decisão que encerra
a primeira etapa do procedimento afeto ao Tribunal do Júri e, que determina,
entre outras providências, a sujeição do acusado ao julgamento popular.
O Tribunal do Júri como órgão
do Poder Judiciário previsto no art. 5º, inciso XXXVIII, da Constituição
Federal/88 e, competente para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida e
aqueles conexos, apresenta procedimento escalonado, isto é, o procedimento
relativo ao Tribunal do Júri constitui-se de duas etapas bem definidas: o judicium
accusationis e o judicium causae.
O STF enfrentou o tema sobre a
prisão, em diversas ocasiões, e confirmou entendimento em prol da prisão em
segunda instância.
Em 2009, no julgamento do habeas
corpus de um réu que havia sido condenado em segunda instância, mas pedia o
direito de recorrer em liberdade, o STF decidiu, por 7 a 4, que a execução da
pena ficou condicionada ao trânsito em julgado (quando não cabe mais recurso).
Ocorre que, em nome do combate
à impunidade, a corte resolveu alterar tal entendimento em fevereiro de 2016, a
corte mudou o entendimento por entender que impedir a execução da pena em segunda
instância favorecia a impunidade.
Foi decisivo para tal
entendimento a chamada “operação lava-jato” que se baseou, no exemplo italiano,
das “mãos limpas”.
Em nome do princípio da
moralidade era necessário, mesmos com os devidos abusos, combater crimes contra
o patrimônio público, expostos na corrupção ativa e passiva e ainda combater a
chamada “lavagem de dinheiro” oriunda desses crimes.
Enfim, essa maioria formada
buscava trazer a concretização dessas ideias. Deu-se o que se denominou de “criminalização
da política”.
Em outubro de 2016, o plenário
confirmou a jurisprudência, dessa vez por 6 a 5, em julgamento de novo habeas
corpus.
Já em novembro de 2016, em
decisão do plenário virtual, ministros votaram novamente pela execução da pena
em 2ª instância. Rosa Weber não votou, e os demais magistrados não mudaram os
votos.
Em abril de 2018, no
julgamento do habeas corpus do ex-presidente Lula, o STF confirmou, mais uma
vez, a jurisprudência em favor da prisão em segunda instância.
Referências
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Processo Penal. 27ª edição. São Paulo: Saraiva Educação, 2020.
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de Processo Penal. Volume Único. 8ª edição. Salvador: Editora JusPodivm,
2020.
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Janeiro: Lumen Juris, 2009.
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Processual Penal. (Esquemas & sistemas)Volume 3.3ª edição. Rio de
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compacto do processo penal conforme a teoria do jogos. Rio de Janeiro: Lumen
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SERRA, Paolla. Caso Henry:
Jairinho pede liberdade no STJ após soltura de Monique. Disponível
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Acesso em 01.09.2022.
SILVA, Afrânio Jardim; AMORIM,
Pierre Souto Maior Coutinho. Direito Processual penal. Salvador:
JusPodivm, 2013.
Notas:
[1] Assim, nesses casos, em até 24 horas, você deve ser encaminhado a uma autoridade competente, que te ouvirá na audiência de custódia. Então, neste momento, o juiz poderá relaxar a prisão ilegal, decretar a prisão preventiva, conceder a liberdade provisória ou tomar outras medidas cautelares.
[2]
A primeira fase, que chamaremos “fase da situação flagrancial”, inicia-se com a
captura da pessoa em situação de flagrante delito pelo agente policial ou por
qualquer do povo, e se encerra com a condução da pessoa à presença da
autoridade policial. Segue uma “fase de documentação do flagrante”, que começa
com a lavratura do APF e termina com a conclusão deste. Há, ainda, uma terceira
fase, que chamaremos “fase administrativa”, que tem início com a decisão da autoridade
policial, determinando a prisão em flagrante do conduzido (art. 304, § 1º, do
CPP) e que perdura até a análise judicial da cópia do APF. Por fim, segundo a
doutrina, há uma última fase, que denominaremos “fase jurisdicional”, que se
inicia com a decisão judicial que ratifica a prisão em flagrante e que termina
com a extinção, por qualquer motivo, dessa modalidade de prisão.
[3]
Liberdade provisória x relaxamento da prisão x revogação da prisão
A liberdade provisória pode
ser concedida, com ou sem fiança, no caso de prisão em flagrante, em que o
procedimento não tiver nenhuma violação das normas previstas em lei, conforme o
artigo 310, inciso III do Código de Processo Penal. Apesar da prisão ser legal,
o magistrado pode entender que não é mais necessária para o procedimento
criminal e, assim, determinar a liberdade provisória.
O relaxamento da prisão
ocorre nas hipóteses de prisão preventiva, que sofreu algum tipo de
ilegalidade, ou não possui os requisitos para sua decretação. A revogação da
prisão cabe tanto para prisão preventiva quanto para a prisão temporária, que
ocorreram dentro da legalidade, mas que não são mais úteis para o processo
criminal.
[4] O artigo 319 do mencionado código descreve expressamente, em seu texto, 9 medidas cautelares diversas da prisão, quais sejam: 1) comparecimento periódico em juízo; 2) proibição de acesso ou de frequentar determinados lugares; 3) proibição de manter contato com determinadas pessoas; 4) proibição de ausentar-se da Comarca, necessária para a investigação ou instrução; 5) recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga; 6) suspensão do exercício da função pública ou de atividade de natureza econômica; 7) internação provisória 8) fiança; 9) monitoração eletrônica (tornozeleira).
[5]
O instituto da prisão em flagrante, abstraindo o caráter retributivo e
antecipatório da culpabilidade que o marcou ao longo de sua evolução histórica,
sempre esteve vinculado a duas funções fundamentais: a) uma função material,
que consiste em interromper a ação do agente, visando a evitar que ela cause
danos ao bem jurídico tutelado ou, caso impossível a interrupção, que pelo
menos sejam minimizados os danos ou as suas consequências; b) uma função
formal, que consiste em acautelar as provas do fato aparentemente delituoso, o
que se conseguiria com a sua quase imediata documentação (lavratura do APF).
São estas as duas funções que parecem justificar a existência do instituto (2).
Diante dessa premissa, é fácil perceber que, naquela fase inicial do
procedimento da prisão em flagrante (“fase da situação flagrancial”), o Estado
consegue atingir a função material dessa espécie de prisão: com a captura e
condução do flagrado se impede ou se reduz os danos ao bem jurídico e/ou as
suas consequências. Com a segunda fase (“fase de documentação do flagrante”), o
Estado atinge a segunda finalidade da prisão em flagrante (função formal do
flagrante): consegue documentar as provas do fato aparentemente delituoso,
quase que imediatamente após a sua ocorrência.
[6]
O periculum libertatis estará configurado também quando a liberdade do
acusado colocar em risco o regular desenvolvimento do processo, seja turbando a
marcha processual, seja destruindo provas, bem como, ameaçando vítima e/ou
testemunhas. Sob o pretexto da “conveniência da instrução criminal” a prisão
preventiva não pode ser imposta a fim de, unicamente, garantir a presença
física do acusado durante o processo, uma vez que ao acusado é assegurado o
direito e não o dever de estar presente durante a realização de todo e qualquer
ato processual, seja pessoalmente, seja representado por seu defensor.
[7] A prisão preventiva com base na “garantia da ordem econômica” também não se apresenta imune de crítica em face do caráter aberto e impreciso de tal expressão, bem como, da total ausência de qualquer finalidade instrumental. De todas as hipóteses que configuram o periculum libertatis e que, concorrendo os demais pressupostos legais, autorizam a decretação da prisão preventiva, a “conveniência da instrução criminal” é aquela onde o caráter instrumental da medida constritiva de liberdade mais se destaca, caracterizando nítida medida cautelar.
[8] Como bem pontuado pelo Ministro Relator Sebastião Reis do STJ, a prisão preventiva não é uma consequência natural da prisão em flagrante, de modo que o pedido deve ser feito independentemente da realização da audiência de custódia ou da participação do membro do Ministério Público em audiência, sendo obrigação do Ministério Público e da Polícia Judiciária se estruturarem para atender os novos deveres que lhes foram impostos. Com efeito, o artigo 310, II, do CPP, ao atribuir ao magistrado a possibilidade de converter a prisão em flagrante em preventiva, de fato, não dispõe expressamente sobre a necessidade de provocação do juiz, o que não foi alterado pela Lei federal 13.964/19. Entretanto, esse fato deve ser analisado sob a ótica da lacuna de formulação, tendo em vista que ocorreu apenas um lapso do legislador em não incluir a exigência de requerimento prévio das partes, que é suprido pelo que determina o artigo 282, § 2º, do CPP.
[9]
A prisão cautelar é uma espécie de prisão excepcional, de caráter provisório e
que ocorre antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória (ou
seja, antes do fim do processo). No Brasil, com exceção da prisão temporária,
não há um prazo máximo para as prisões cautelares. A prisão cautelar divide-se
em três modalidades. São elas: Flagrante; Temporária; Preventiva. O Supremo
Tribunal Federal considera a antecipação de pena inconstitucional, exceto quando
for favorável ao acusado, de acordo com a Súmula 716. Assim, é impossível que
você comece a cumprir a pena antes de ser julgado.
[10]
Além disso, é preciso observar quem pode ser preso em flagrante, uma vez que
algumas pessoas, por conta de seus cargos, possuem alguns direitos. São elas:
Diplomata: não pode ser preso em flagrante;
Cônsul: não pode ser preso em flagrante se ele ocorrer
enquanto estiver no exercício de suas funções e no território do consulado;
Parlamentares (estaduais e federais), magistrados e membros do MP: só podem ser
presos em flagrante por crimes inafiançáveis; Presidente da República, menores
e incapazes: não podem ser presos em flagrante.
[11] Primeiramente, é fato que o próprio Código de Processo Penal em vigor (CPP, Decreto-lei nº 3.689/1941) não descreve o conteúdo da voz de prisão e, se o fizesse, a fórmula exata integraria o procedimento, com o devido registro no auto respectivo, sob pena de nulidade do ato, em razão do caráter excepcional de privação de liberdade a impor o cumprimento das formalidades que lhe são próprias8. Aliás, salvo a hipótese do fato praticado em presença da autoridade, ou contra esta, no exercício de suas funções, não é necessário constar a "voz de prisão" no auto de prisão em flagrante, por consequência da falta de imposição legal para tal registro Em segundo lugar, os direitos do preso em flagrante, de dignidade constitucional, são garantidos apropriadamente durante a lavratura do auto de prisão, por evidente questão de ordem prática, e não no ato da detenção, ressalvada a identificação do responsável por essa prisão-captura e o motivo da privação de liberdade, direitos que podem - e devem - ser garantidos de imediato.
[12] Os tipos de flagrantes: Flagrante próprio, perfeito, real ou verdadeiro; Flagrante impróprio, imperfeito, irreal ou quase flagrante; Flagrante presumido, ficto ou assimilado: ... Flagrante preparado ou provocado, crime de ensaio, delito de experiência ou delito putativo por obra do agente provocador. O artigo 302 do Código de Processo Penal, ao regular a prisão em flagrante, descreve as situações em que a pessoa pode ser considerada como em flagrante delito. O mencionado artigo prevê 3 modalidades: 1) Flagrante Próprio - previsto nos incisos I e II: ocorre quando a pessoa é pega no momento em que pratica a infração penal ou logo após de ter cometido o crime. 2) Flagrante Impróprio - previsto no inciso III: é quando a pessoa é perseguida logo após a ocorrência do crime, em situação na qual aparente ser a autora do delito. 3) Presumido - previsto no inciso IV: nessa hipótese a pessoa é encontrada logo depois do crime, portando instrumentos, armas ou ferramentas que demonstrem ser a possível autora da infração penal.
[13]
Note-se que, desde meados de 2011 vigora no ordenamento jurídico processual penal
a Lei 12.403/11, que trata da prisão preventiva e de outras cautelares penais.
Com a vigência da referida lei o setuagenário Código de Processo Penal
(Decreto-Lei 3.689, de 3 de outubro de 1941) passou a admitir o uso de outras
medidas — proibição de acesso ou frequência a determinados lugares,
proibição de manter contato com pessoa
determinada, prisão domiciliar, suspensão do exercício da função pública ou de
atividade de natureza econômica ou financeira, monitoração eletrônica etc. —
bem menos traumáticas e agressivas que a prisão preventiva.
[14]
Nesse sentido, a decretação da medida cautelar pessoal passou a depender de
requerimento das partes; representação da Autoridade Policial, no curso das
investigações; ou requerimento do Ministério Público. Tal exigência está em
consonância com as diretrizes básicas que regem o moderno processo penal
democrático e seu sistema acusatório (artigo 3ª-A, do CPP), que exigem, de
forma mais rígida, a equidistância por parte do juiz, que deve ter sua atuação
limitada ao controle jurisdicional e à garantia dos direitos
fundamentais.
[15]
Quando a prisão preventiva, irremediavelmente, se torna uma medida amarga,
hostil e extrema se converte em
antecipação da tutela penal, em instrumento de investigação ou em “moeda de
troca” para obtenção de delações, o processo penal deixa de ser democrático, se
distancia do Estado de Direito e se aproxima cada vez mais dos processos
autoritários e de exceção, próprios dos regimes fascistas.
[16]
A figura do juiz das garantias foi aprovada pelo Congresso Nacional durante a
análise do pacote anticrime (transformado na Lei 13.964/19), mas foi suspensa
por liminar do Supremo Tribunal Federal (STF), em janeiro de 2020. O juiz das
garantias é o magistrado que cuida apenas do processo (prisões cautelares,
busca e apreensão, sequestro de bens, escutas telefônicas e outras provas) sem
avaliar se o réu é ou não culpado. Isso é feito em outra fase do processo, por
outro juiz.
[17]
O conceito de violência intrafamiliar não se refere apenas ao espaço físico
onde a violência ocorre, mas também as relações em que se constrói e efetua. A
violência doméstica distingue-se da violência intrafamiliar por incluir outros
membros do grupo, sem função parental, que convivam no espaço doméstico. Os
requisitos da Lei 11.340 que configuram violência doméstica são: Seja cometida
por alguém que possua relação íntima de afeto, seja por laços naturais
(biológicos), por afinidade ou por vontade expressa; A relação íntima de afeto
seja independente de coabitação; As relações pessoais independem de orientação
sexual.
[18]
O Ministério Público do Rio recorreu da decisão que revogou a prisão preventiva
da professora Monique Medeiros. Ela é acusada da morte do menino Henry Borel em
2021, junto com seu ex-marido, Jairo Souza Santos Júnior, o ex-vereador
Jairinho. Monique deixou o presídio nesta segunda-feira, após ter a prisão
revogada pelo ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça
(STJ). A professora deixou a prisão em seguida, segurando um terço vermelho. O
promotor Fábio Vieira pediu a pronúncia de Monique e Jairinho, para que o casal
seja julgado pelos crimes por júri popular. Em seu requerimento, ele afirmou
que, finda a instrução probatória referente à primeira fase procedimental do
rito relativo aos crimes dolosos contra a vida, “restaram demonstrados os
indícios de autoria e a materialidade”.
[19] A liberdade provisória pode ser concedida, com ou sem fiança, no caso de prisão em flagrante, em que o procedimento não tiver nenhuma violação das normas previstas em lei, conforme o artigo 310, inciso III do Código de Processo Penal. Apesar da prisão ser legal, o magistrado pode entender que não é mais necessária para o procedimento criminal e, assim, determinar a liberdade provisória. O relaxamento da prisão ocorre nas hipóteses de prisão preventiva, que sofreu algum tipo de ilegalidade, ou não possui os requisitos para sua decretação. A revogação da prisão cabe tanto para prisão preventiva quanto para a prisão temporária, que ocorreram dentro da legalidade, mas que não são mais úteis para o processo criminal.
[20]
Percebe-se, também, que a validade constitucional da prisão temporária é
bastante questionada, uma vez que esta medida de constrição da liberdade de
locomoção ingressou no ordenamento jurídico através de Medida Provisória,
instrumento típico do Poder Executivo – ainda que posteriormente tenha sido
substituída por Lei –, quando a Carta Política/88 determina que a competência
para legislar sobre Direito Penal e Direito Processual Penal pertence,
exclusivamente, à União. Quanto a este defeito de natureza formal, Clèrmerson
Merlin Clève, citado por Rangel, esclarece, “chama a isto de
inconstitucionalidade orgânica, ou seja, quando a lei é elaborada por órgão
incompetente, pois a inconstitucionalidade decorre de vício de incompetência do
órgão de que promana o ato normativo”.
[21]
Existe diferença entre o poder e o dever: aquele, o poder, é faculdade; este, o
dever, é obrigação. Isso vale para quase todos os segmentos da atividade
humana, se não para todos. No campo de aplicação do Direito Penal e Processual
Penal, no que diz respeito à prisão de quem é apanhado em flagrante delito, não
é diferente. Uns podem prender, mas não são obrigados a fazê-lo; outros devem
prender, ou seja, são obrigados a fazê-lo. Outro aspecto interessante que
muitos não sabem – e por isso é bom que aqui se diga – é que a vítima, o
próprio ofendido, pode efetuar a prisão em flagrante do infrator, sem que haja
qualquer invalidez ou ilegalidade nisso. O ato da prisão será inteiramente
válido e legítimo.
[22]
É verdadeiro instrumento processual, que obriga que o preso em flagrante* seja
apresentado a autoridade judicial, no prazo de 24 horas, para que este decida a
respeito da legalidade da prisão e da necessidade de sua conversão em prisão
preventiva. Encontra-se prevista em tratados internacionais em que o Brasil é
signatário, como o Pacto de San José da Costa Rica e o Pacto sobre Direitos
Civis e Políticos de Nova York. Cumpre salientar que os referidos tratados
possuem status de normas supralegais,
conforme entendimento já consolidado no STF. No âmbito nacional, a Audiência de
Custódia ainda não encontra respaldo legal. Diante da ineficiência legislativa,
o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução Nº 213 de 15/12/2015, que
entrou em vigor no dia 1º de fevereiro de 2016.
Tal documento determinou que todos os Tribunais de Justiça e Federais
realizem a audiência em estudo.
[23] No Brasil, geralmente é o Itamaraty que recebe o pedido de extradição, mas só para encaminhá-lo para o ministro da Justiça, que dará início à etapa inicial da análise do pedido. Nessa primeira fase, o ministro da justiça vai verificar se o país enviou todos os documentos necessários para a aprovação da extradição, como a cópia do processo, cópia da legislação do país, dados da pessoa que está sendo demandada, entre outros. Após passar pelo ministro da justiça, o pedido segue para o STF, que vai atuar com contenciosidade limitada, ou seja, só poderá fazer juízo de delibação (exame de legalidade) do processo e dos documentos. Assim, não será julgado o caso em si nem o mérito do crime. O STF só analisará se o crime cometido também é crime no Brasil. Por exemplo, pedidos de extradição por causa de adultério ou crimes políticos não serão aceitos pelo Brasil por não serem crimes para a legislação Brasileira. Da mesma forma, se a pessoa já está sendo julgada no Brasil pelo mesmo crime que motivou o pedido, ela não será extraditada.
[24]
Súmula vinculante 25: É ilícita a prisão
civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito. Data
de Aprovação Sessão Plenária de 16/12/2009 Fonte de publicação DJe nº 238 de
23/12/2009, p. 1. DOU de 23/12/2009, p. 1.
[25]
Segundo, cumpre esclarecer que as posições doutrinárias sobre o assunto se
apoiam no texto do art. 5º, § 2º, da Constituição Federal, a saber: “Os
direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros
decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados
internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. 1ª tese: Os
tratados internacionais de direitos humanos possuem natureza de norma legal: No
HC 72.131, entendeu o STF (por maioria de votos, sendo divergentes os Ministros:
Sepúlveda Pertence, Marco Aurélio, Carlos Velloso e Francisco Rezek), que os
tratados de direitos humanos não possuiriam estatura constitucional, mas
natureza de norma infraconstitucional, permitindo-se, assim, a prisão civil do
depositário infiel, tendo em vista que a Constituição Federal deve prevalecer
em face do Pacto de San Jose.
Essa é a tese sustentada
pelo Supremo Tribunal Federal há muito tempo, mas que parece estar sendo
revista, especialmente, após o voto do Ministro Gilmar Mendes, que abaixo será
comentado.
2ª tese: Os tratados
internacionais de direitos humanos possuem natureza de norma supralegal: Essa
foi a posição do Ministro Sepúlveda Pertence, em um julgamento do RHC 79785
(29/03/2002). “Na ocasião, o Ministro cogitou que os tratados de direitos
humanos poderiam ser considerados como de caráter supralegal. Embora esta
posição não seja bem fundamentada, o Ministro Pertence afirma que seriam
supralegais os tratados de direitos humanos porque a Constituição consagra uma
grande abertura ao Direito Internacional dos Direitos Humanos. Considerar esses
tratados como de nível legal esvaziaria o conteúdo do art. 5o, § 2o. Não seriam
de caráter constitucional, contudo, pois, baseando-se em Kelsen, afirma que a
prevalência da ordem jurídica internacional é uma questão extrajurídica. O
lugar dos tratados deveria ser buscado na Constituição de cada Estado. E, para
o Ministro Pertence, a Constituição Brasileira não concede primazia aos
tratados sobre ela mesma. Para essa posição, somente os tratados de direitos
humanos seriam supralegais. Os demais gozariam do grau meramente legal".
3ª tese: Os tratados
internacionais de direitos humanos possuem natureza de norma constitucional:
Essa é a posição dos juristas Antônio Augusto Cançado Trindade, Flávia Piovesan
e Ingo Sarlet. Sustentam que, diante da redação do art. 5º, §2º, da
Constituição Federal, existem três espécies de direitos e garantias:
1) os expressos na
Constituição; 2) os implícitos, decorrentes do regime e dos princípios adotados
pela Constituição; 3) os decorrentes de tratados internacionais em que a
República Federativa do Brasil seja parte.