Fogo destrói memória nacional do cinema brasileiro
Por Gisele Leite.
Queima a cultura nacional no incêndio
poderoso que atingiu, em 29.07.2021, o galpão da Cinemateca Brasileira em São
Paulo que estava sob a responsabilidade do governo federal.
O referido galpão abrigava,
principalmente, os documentos relativos a quase toda administração do cinema
brasileiro, o que incluiu os arquivos da Embrafilme e de outras agências. O
material estava reunido e sendo catalogado para digitalização.
Até o presente momento, não se conhece a
dimensão dos danos e o que fora perdido no fogo. Era uma tragédia anunciada,
pois ainda no ano passado o prédio já apresentava sérios danos oriundos de uma
enchente.
De acordo com os bombeiros, o incêndio
começou durante a manutenção do sistema de ar-condicionado no terceiro andar do
galpão, onde situava o acervo histórico.
Tal como aconteceu com o Museu Nacional,
esse incêndio da Cinemateca foi mais uma tragédia prevista tanto que o
Ministério Público Federal ajuizou em julho de 2020, uma ação civil pública
contra a União[1]
por conta dos impasses na gestão do espaço e da comprovada e acelerada
degradação do acervo do perigo real de incêndio.
Apesar do texto constitucional vigente
garantir a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da
cultura nacional, e apoiar e incentivar a valorização e difusão de
manifestações culturais, o incêndio transformou em cinzas mais esse direito
fundamental da cidadania brasileira.
O incêndio revela o grande desprezo pela
cultura, arte e a memória nacional e, o descaso da gestão federal que nos
arremessa a uma perda inestimável. Um povo sem memória é um povo sem futuro
Nota:
[1]
A audiência aconteceu no dia 20 de julho de 2021, na 1ª Vara Federal Cível de
São Paulo, no âmbito de uma ação civil pública apresentada pelo MPF, em julho
do ano passado, contra o governo federal por abandono da Cinemateca.
Participaram da reunião o juiz federal Marco Aurelio de Mello Castrianni, o
procurador da República Gustavo Torres Soares – que assina a ação contra o
governo –, um advogado da União, o secretário adjunto da Secretaria Especial da
Cultura, a diretora do Departamento de Políticas Audiovisuais e representantes
da Associação de Moradores da Vila Mariana e da Associação Paulista de
Cineastas. O termo de audiência informa que alguns pontos da última reunião,
que aconteceu em maio deste ano, foram cumpridos e outros ainda estão em
andamento. Na audiência, ficou decidido que o governo terá mais dois meses para
continuar a adotar medidas de preservação da Cinemateca. A ação também
destacava a queda no repasse de recursos do governo federal para a Cinemateca
nos últimos anos. De acordo com o MPF, o valor passou de R$ 8 milhões, em 2018,
para R$ 7,2 milhões, em 2019. Em 2020, não houve repasse de recursos para a
Cinemateca. Segundo o MPF, apesar de não ter repassado recursos no ano passado,
o governo federal reconheceu que havia previsão orçamentária de R$ 12,2
milhões. Na ação, o MPF diz que o governo resolveu – de forma arbitrária,
dolosa, voluntariosa e desprovida de motivo juridicamente admissível –
abandonar a Cinemateca.