Dupla imbatível: Ignorância & Violência
Desde a introdução das primeiras redes sociais, ainda no início da década de 2000, esses espaços e as plataformas que os sustentam se transformaram em legítimo campo de batalha quando o tema se refere as fronteiras da liberdade de expressão. A ONU, por meio da UNESCO realizou em fevereiro de 2023 sua Primeira Conferência Global para abordar as ameaças à integridade da informação e liberdade de expressão nas plataformas de redes sociais. Trata-se de um combate as notícias falsas, aos discursos de ódio e a incitação à violência, o que torna imperiosa a regulação legal e jurídica das plataformas digitais e redes sociais.
A pior
violência é a ignorância. Não há nada mais terrível que a Ignorância ativa”
(Goethe[1],1749-1832). Afinal,
ignorar a dor presente na porta das escolas, dentro do peito das mães, pais e
responsáveis é, na verdade, uma escolha empresarial egoísta e insana.
Constata-se que as empresas de tecnologia estão perdendo a disputa sobre a
regulação legal e jurídica de seus negócios, conforme bem esclareceu Rafael
Mafei em seu recente artigo na Revista Piauí.
E, a
peremptória recusa em adotar políticas mais adequadas e incisivas de moderação quanto
ao conteúdo promove um terror e desclassifica a credibilidade das plataformas.
Afinal,
as empresas milionárias da tecnologia[2] precisam entender que a
liberdade de expressão não proíbe nem impede a moderação de conteúdo
principalmente aquele que promove terror, fake news e outras aleivosias
contemporâneas.
As postagens
contendo ameaças, incitação ao ódio, apologia à violência seja contra
estudantes, professores, profissionais da educação, política e, outros
segmentos, tornou explícito o que veio se formando anteriormente e na surdina.
As
empresas de tecnologia, principalmente as plataformas digitais e virtuais que
oferecem interação social tal como Facebook, Instagram, Twitter, TikTok,
Kwai e, outras congêneres, estão perdendo o espaço por não anuir na
adequada regulação sobre seu modelo de negócio e, assim, tornarão inviáveis sua
sobrevivência na internet normal.
Provavelmente,
mergulharam e se afogaram na Deep Web[3],
que tem sido uma caixa de ressonância para ilícitos de quase todos os gêneros, desde
fraudes bancárias, previdenciárias, de crédito, até insultos, discursos de
ódio, stalking e, até mesmo, estupro virtual[4].
Ficou
evidente na manifestação do Ministro da Justiça, Flávio Dino, até escolas,
educadores, famílias e crianças, que penam para decidir como fazer frente às
mensagens deletérias que circulam, nas redes, com eficiência invencível.
Até o
STF entrou no contexto, com o Ministro Luís Roberto Barroso, um tradicional
aliado da ampla liberdade da circulação de ideias, expressando abertamente a
posição de que “tornou-se inevitável” a regulação das plataformas.
Em
audiência pública, recentemente, realizada no STF a respeito do artigo 19 do
Marco Civil da Internet[5],
que impõe condição para a responsabilização civil de provedor de internet, websites
e gestores de aplicativos de redes sociais por danos decorrentes de atos
ilícitos de terceiros. "(...), o representante da META sugeriu que o meio
para combater os conteúdos capazes de gerar efeitos danosos deveria ser sendo o
de sempre, ou seja, a busca e repressão pelas empresas, numa busca de contínua
(e inútil) melhoria de suas políticas internas, porém, sem a alteração da
regulação legal e jurídica que ora vige (ou melhor, a falta desta), com a
ficciosa ampla liberdade para não se remover conteúdos impróprios, a ser por
ordem judicial, tudo fica mais difícil e, bem mais criminoso.
Ademais,
outra gigante é o Twitter que afirma ter regras de moderação a respeito
do conteúdo relacionado aos ataques violentos e, em reunião vindoura afirmou
que mostrará os limites para continuar fazer a repressão necessária.
Os
discursos são explícitos e sinceros sobre sua plena indisposição de seguir
caminhos adequados e mitigar os danos causados pela divulgação de imagens e
conteúdos impróprios, criminosos e buscar a responsabilização de seus
perpetradores.
Enfim,
a recente decisão da empresa Twitter[6] em responder à imprensa[7] foi manifestada com um emoji
de excremento[8],
o que identifica a má vontade para os questionamentos que lhes são dirigidos
seja pela sociedade, pelos governos que são impactados diariamente, seja em
vidas individuais de seus cidadãos que são vilipendiados constantemente, sem
haver dó nem piedade.
Acredita-se
que a internet nasceu, se desenvolveu e chegou ao atual crescimento sob
o magnânimo valor político das democracias que é a liberdade, porém, há três
direitos específicos atrelados à liberdade, a saber: a liberdade de expressão, já que qualquer um
passou a ser capaz de dizer ao mundo aquilo que bem quiser; a liberdade de informação, pois os canais para
divulgação de fatos, opiniões e denúncias tornaram-se infinitamente maiores,
como também as opções para quem deseja se informar; e, ainda a liberdade de iniciativa econômica,
que permite a exploração de negócios inovadores, baseados em conexões de
bilhões de pessoas em rede[9].
O
tratamento e a aplicação da liberdade de expressão pelo Superior Tribunal de
Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal. Sabe-se que a jurisprudência de um
país reflete a forma de pensar de toda uma nação e pauta a conduta dos seus
cidadãos.
No Brasil,
o Supremo Tribunal Federal é órgão máximo do poder judiciário, é guardião da Constituição
Federal brasileira vigente, e protetor dos direitos e garantias fundamentais
por ela assegurados e o Superior Tribunal de Justiça[10] é guardião da Legislação
Federal cabendo a ele se manifestar sob a aplicação desta. Assim, o tema é de
extrema relevância e pertinência, pois analisa a abordagem constitucional e infraconstitucional
desta garantia nos órgãos de cúpula do Poder Judiciário. Pretende-se, portanto,
demarcar o espaço reservado à liberdade de expressão ou pelo menos tentar
fazê-lo.
Vige
grande dificuldade de sistematização de acórdãos haja vista a grande imprecisão
das decisões que na maioria das vezes trazem os mesmos fundamentos para razões absolutamente
distintas.
É
preciso apesar da dificuldade, delimitar o espaço que a liberdade de expressão ocupa
no Brasil contemporâneo[11], ou pelo menos, aquilo
que restou. Em tempo: usamos o termo “o
que restou” no sentido de que são tantos e tão intensas as restrições a esse
direito que chegamos a acreditar que não há qualquer segurança quanto ao seu
exercício.
Mas, a
organização dessas redes sociais sob a forma de empresas privadas sendo
orientadas somente para a obtenção de lucros, tornou um desses motores sendo o
econômico, predominante sobre os demais[12].
Quando
forçadas a refletir sobre outras oportunidades, as empresas de tecnologia não
tiveram problemas em trocar um “naco” da liberdade que afirmam defender (talvez,
a nossa, no caso) para chegarem a bom termo com os reguladores e garantir o
sucesso de seus modelos econômicos.
A
despeito de venderem a sensação de que estamos em um mundo sem barreiras ou
fronteiras e sem limites, as plataformas de internet tornaram-se, por
sua arquitetura, formas de controle e monitoramento comportamentais altamente
eficientes.
Ao
menos do ponto de vista das redes sociais, seu modelo de negócios baseia-se na
ideia de que a forma de consumo de conteúdos por seus usuários torna-os
suscetíveis a campanhas de convencimento (e viva o algoritmo) manipulando
leitores e participantes ativos das redes sociais (até os famosos influenciadores
digitais) para consumo de produtos, serviços ou ideologias, revelando-se ser
altamente eficazes em comparação com modelos anteriores de comunicação,
publicitária ou política.
Nos
dias 21 a 23 de fevereiro de 2023, a Unesco promoveu uma Conferência Global
para discutir um esboço de diretrizes de regulamentação das plataformas
digitais elaborado por meio de um processo de consulta a representantes de
diversos setores da sociedade civil e dos Estados, que teve início em setembro
de 2022.
Segundo
a Unesco, o objetivo dessas diretrizes:
"é apoiar o desenvolvimento e a
implementação de processos regulatórios que garantam liberdade de expressão[13] e o acesso a informações,
bem assim tratar o conteúdo ilegal e aqueles que poderiam colocar em risco
significativo a democracia e o gozo de direitos humanos" (UNESCO, 2023, p.
4).
Ainda
segundo o documento, as referidas diretrizes constituem uma
"intimação" para que os Estados implementem uma regulação compatível
com normas internacionais que versem sobre direitos humanos e com o artigo 19
do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos[14] (PIDCP)
O
documento contém mais de 30 (trinta) páginas de diretrizes[15], o que sinaliza a
complexidade do tema. Tais diretrizes permeiam todo o processo de regulação de
plataformas digitais pelos Estados nacionais, principiando com o enfoque geral
da regulação, seguido pela descrição das responsabilidades das diferentes partes
interessadas (UNESCO, 2023, p. 6 et seq.).
No
âmbito da Conferência, a UNESCO definiu princípios a serem observados na
regulação das plataformas digitais, quais sejam:
1.
Respeito aos direitos humanos na curadoria e moderação dos conteúdos, com base
em políticas de privacidade, através de algoritmos e atividade humana,
resguardada a adequada proteção e suporte aos moderadores;
2.
Plataformas transparentes, no sentido de políticas, ferramentas, sistemas e
processos de acesso facilitado e universal;
3.
Empoderamento dos usuários sobre o entendimento das decisões a serem tomadas
dentro das plataformas e avaliação da qualidade das informações;
4.
Responsabilização das plataformas em relação a seus usuários, playeres e
sociedade para implementação de seus termos de serviço e políticas de conteúdo,
inclusive direitos de reparação ao usuário contra decisões relacionadas ao
conteúdo;
5.
Devida diligência das plataformas para avaliação de impactos e riscos das suas
políticas e práticas em face dos direitos humanos.
Particularmente,
a extrema oralidade das redes sociais que navegam num mar de LIVES abusivas e
outras informativas, só empobrecem as leituras necessárias e, ainda, alimentam
o séquito de seguidores sem qualquer discernimento.
Em
muitos casos, o produto final, que vem embalado em papéis de presente com belos
slogans tipo: como “conectamos pessoas” e “damos voz a todos”, acaba sendo
desinformativo, manipulador ou coercitivo. Isso é o oposto da liberdade.
O
discurso escolhido pelas big techs para sustentar seus interesses
econômicos, e defender uma regulação mais favorável ao seu modelo de negócios,
mudou.
Era
mais fácil que o discurso libertário “colasse” quando essas empresas, mesmo
quando já eram gigantes econômicas transnacionais e tinham suas imagens
associadas a hippies simpáticos que se tornaram inesperadamente
bilionários por terem criado espaços virtuais que promoveriam aquilo que de
mais intrinsecamente humano temos, como o anseio por sociabilidade, a
criatividade e a liberdade expressiva.
Mas,
na medida em que atores nocivos aprendem a usar essas ferramentas para
perseguir objetivos deletérios tanto a comunidades quanto a indivíduos, o
efeito do discurso de sempre já não mais é o mesmo.
É
inequívoco que inimigos declarados do regime político que mais se associa à
liberdade, que é a democracia, descobriram como usar plataformas para desafiar
e enfraquecer a própria democracia.
Como
também é inequívoco que agentes interessados em promover terror social que,
igualmente, impedem a ação livre porque coagem e intimidam e, realmente, podem
fazê-lo hoje sem precisar armar explosivos pelos lugares.
E,
desde que não façam postagens explícitas e literalmente incitadoras, com ordens
diretas e verbos no imperativo comandando mortes e ataques (e quem faz isso?),
haverá representantes de plataformas defendendo que eles possam fazê-lo.
Mas,
isso ocorre não porque essa defesa seja uma exigência da liberdade, pois não é;
mas porque essa possibilidade ainda interessa aos modelos de negócios das
companhias de tecnologia, a despeito dos custos sociais que esta acarreta.
Ouçam o mantra: “O lucro é o meu pastor e nada me faltará” (perdoem-me a
ironia).
Quando
estudantes temem ir à escola e, simultaneamente, existem professores dão aula
assustados sob a influência daquilo que consomem pelas redes sociais,
conclui-se que a liberdade não está vencendo. Estamos atrelados inexoravelmente
ao mundo digital...
Nesse
contexto, a recusa em adotar políticas mais incisivas (e, provavelmente mais
eficazes) de moderação de conteúdo[16] só piora a credibilidade
do discurso das plataformas.
Ressalve-se
que juridicamente, não existe incompatibilidade entre preservação da liberdade
de expressão[17]
e o uso do poder de moderação[18] de conteúdos em casos
como os reclamados por Ministro Flávio Dino[19].
A
possibilidade de moderar, naturalmente significa, limitar o que é postado e
como certas mensagens podem ser postadas, faz parte da liberdade de iniciativa
das empresas, pois é o que permite que cada uma delas dê às suas plataformas as
características que desejam. É o que ocorre quando certas redes sociais proíbem
pornografia ou até perfis de paródia[20].
É
provável que nem mesmo os representantes políticos da extrema direita, que
cinicamente batem continência solene e ruidosa pela liberdade de expressão
enquanto comemoram perseguição policial aos adversários políticos e, atuam para
intimidar a imprensa, fariam oposição à maior moderação nesses casos. Nem
aqueles que defendem abertamente o armamentismo e o slogan “como bandido
bom é bandido morto”[21].
Assim
como a Idade da Pedra não terminou por escassez de pedras, a era da regulação
legal e jurídica pautada pela moderação das próprias plataformas digitais e
virtuais, não acabará com as redes sociais por falta de conteúdo que se deveria
moderar. E, nem condenará a extinção a liberdade de expressão.
O que não se pode admitir que o mundo digital ameace o mundo real e banalize a vida e vilipendie a dignidade da pessoa humana[22].
Referências
AGÊNCIA
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digitais em operação no Brasil. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/927967-PROJETO-ATRIBUI-A-ANATEL-REGULACAO-DAS-PLATAFORMAS-DIGITAIS-EM-OPERACAO-NO-BRASIL
Acesso em 16.4.2023.
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Manuel. A era da informação: economia, sociedade e cultura. In: A
sociedade em rede. v. 1 São Paulo: Paz e Terra, 2011
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(1823-1832) Tradução de Mário Luiz Frungillo. São Paulo: Unesp, 2016.
JORNAL
DA USP. PACHECO, Denis; É possível combater a desinformação e os discursos
de ódio na internet? Disponível em:
https://jornal.usp.br/atualidades/e-possivel-combater-a-desinformacao-e-os-discursos-de-odio-na-internet/
Acesso em 16.4.2023.
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constitucional. 6ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 297.
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legal. Coluna: Questões de Mídia e Direito. Revista Piauí. Disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/ignorar-dor-na-porta-das-escolas-e-escolha-empresarial-nao-dever-legal/?utm_campaign=a_semana_na_piaui_157&utm_medium=email&utm_source=RD+Station Acesso
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MENDONÇA,
Felipe; QUINTILIANO, Leonardo David. Regulação das plataformas digitais: o
Brasil no caminho do debate global. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-mar-10/mendonca-quintiliano-regulacao-plataformas-digitais
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INTERNET
GOVERNANCE FORUM. Décima Sétima Reunião do Fórum de Governança da Internet.
Relatório resumido. [2022]. Disponível em:
https://mail.intgovforum.org/IGF2022_summaryreport_final.pdf. Acesso em 14 mar.
2023.
Notas:
[1] Johann Wolfgang von Goethe (1749–1832) nasceu em Frankfurt, na Alemanha. Foi poeta, dramaturgo, romancista e ensaísta e é considerado o maior nome da literatura alemã. Escreveu obras mundialmente consagradas como Fausto e Os sofrimentos do jovem Werther.
[2]
As novas tecnologias, outra característica fundamental dos dias atuais, sejam
elas corporais, emocionais ou eletrônicas, estão intimamente relacionadas ao
movimento de superficialização e intensidade imagética. A extensão e o
desenvolvimento dos meios de comunicação de massa, especialmente, introduziram
novos tipos de relacionamentos, representações e identidades sociais mais
complexas e enredadas do que há quarenta ou sessenta anos, por exemplo. A
Internet, e recentemente as redes sociais virtuais (como Facebook, Orkut,
Twitter, MySpace entre outras), e aparelhos que permitem o compartilhamento
de dados e informações, como I-Phones, I-Pods e I-Pads e computadores, notebooks
e celulares com vários dispositivos promovem a circulação de infinitas
informações que vão sendo complementadas e substituídas a todo instante, dando
novos sentidos ao tempo e ao espaço.
[3]
O termo Deep Web é usado para denotar uma classe de conteúdo na Internet
que, por várias razões técnicas, não é indexada pelos mecanismos de pesquisa. Deep
web é o nome dado para uma zona da internet que não pode ser detectada
facilmente pelos tradicionais motores de busca, garantindo privacidade e
anonimato para os seus navegantes. É formada por um conjunto de sites, fóruns e
comunidades que costumam debater temas de caráter ilegal e imoral.
[4]
O estupro virtual e outras situações similares têm impactado nas legislações.
Exemplo disso foram as recentes alterações no Código Penal introduzidas pela
Lei 13.718/2018, que trouxeram seis importantes mudanças nos crimes contra a
dignidade sexual. Antes disso, a partir de uma demanda da própria sociedade da
informação, em 2009 foi sancionada a Lei 12.015, que alterou o crime de estupro
para contemplar também a conduta de constranger alguém, mediante violência ou
grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso.
Assim o artigo 213 da legislação penal estabeleceu que o crime de estupro não
mais consiste exclusivamente na conjunção carnal. A sociedade passou então a
falar em “estupro virtual”.
Esclareça-se que é
diferente da “sextorsão”, em que a pessoa “exige” dinheiro ou outra
contrapartida material, nesse crime a pessoa espera que a vítima tenha com ela
conjunção carnal ou pratique algum ato libidinoso, e é aí que entra a
atualização legislativa como mais um importante marco no combate à violência
sexual, já que o ato libidinoso entrou no tipo que antes restringia-se à
conjunção carnal.
[5]
STF Tema 987 - Discussão sobre a constitucionalidade do art. 19 da Lei n.
12.965/2014 (Marco Civil da Internet) que determina a necessidade de prévia e
específica ordem judicial de exclusão de conteúdo para a responsabilização
civil de provedor de internet, websites e gestores de aplicativos de redes
sociais por danos decorrentes de atos ilícitos praticados por terceiros.
Relator(a): MIN. DIAS TOFFOLI Leading Case: RE 1037396 Descrição:
Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos arts. 5º, incs. II, IV, IX,
XIV e XXXVI, e 220, caput, §§ 1º e 2º, da Constituição da República, a
constitucionalidade do art. 19 da Lei n. 12.965/2014 (Marco Civil da Internet)
que impõe condição para a responsabilização civil de provedor de internet,
websites e gestores de aplicativos de redes sociais por danos decorrentes de
atos ilícitos de terceiros.
[6]
A mudança foi anunciada pelo próprio Musk no Twitter no domingo (19.03.2023),
sem maiores explicações. “press@twitter.com agora responde automaticamente com 💩”,
escreveu o bilionário.
[7]
A liberdade de imprensa decorre do direito de informação. É a possibilidade do
cidadão criar ou ter acesso a diversas fontes de dados, tais como notícias,
livros, jornais, sem interferência do Estado. O artigo 1o da Lei 2.083/1953 a
descreve como liberdade de publicação e circulação de jornais ou meios
similares, dentro do território nacional. A liberdade de expressão está ligada
ao direito de manifestação do pensamento, possibilidade do indivíduo emitir
suas opiniões e ideias ou expressar atividades intelectuais, artísticas,
científicas e de comunicação, sem interferência ou eventual retaliação do
governo. O artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos define esse
direito como a liberdade de emitir opiniões, ter acesso e transmitir
informações e ideias, por qualquer meio de comunicação. Importa ressaltar que o
exercício de ambas as liberdades não é ilimitado. Todo abuso e excesso,
especialmente quando verificada a intenção de injuriar, caluniar ou difamar,
pode ser punido conforme a legislação Civil e Penal.
[8]
O comando do Twitter, Musk vem se chocando com a imprensa. Em dezembro de 2022,
ele suspendeu contas de vários jornalistas, de veículos como The Washington
Post, Business Insider e outros. Eles vinham cobrindo a rede social após a
conta @ElonJet, que seguia o jatinho do executivo usando informações públicas,
ser banida.
[9]
A neutralidade da rede é a isonomia dos pacotes de dados que trafegam na Internet,
ou seja, significa que o provedor de conexão à Internet não pode interferir no
conteúdo que o usuário deseja acessar, seja este conteúdo religioso, político,
de gênero e etc. Isto garante uma Internet democrática e livre, protegendo
principalmente, a liberdade de expressão, a manifestação do pensamento e as
escolhas dos usuários na rede. Sem a neutralidade protegida, poderia haver por
parte dos provedores, a análise e a discriminação do conteúdo acessado pelo
usuário, bem como, a degradação do tráfego de alguns serviços, ou até mesmo, a
restrição e o bloqueio de determinados conteúdos, como ocorre atualmente em
alguns países, tais como, a China.
[10]
O Projeto de Lei 2768/22, do deputado João Maia (PL-RN), atribui à Agência
Nacional de Telecomunicações (Anatel) o poder de regular o funcionamento e a
operação das plataformas digitais que operam no Brasil. O texto cria ainda uma
taxa a ser paga pelas grandes empresas do setor. A proposta tramita na Câmara
dos Deputados. As plataformas digitais incluem ferramentas de busca, redes
sociais, serviços de computação em nuvem e de e-mail, plataformas de
compartilhamento de vídeo, entre outras. Todas elas passam a ser considerados
Serviço de Valor Adicionado (SVA), sob regulamentação, fiscalização e sanção
pela Anatel. Fonte: Agência Câmara de Notícias
[11] As principais características do movimento pós-moderno são a ausência de valores e regras, imprecisão, individualismo, pluralidade, mistura do real e do imaginário (hiper-real), produção em série, espontaneidade e liberdade de expressão. A era contemporânea possui características marcantes, tais como a fluidez identitária, intimamente relacionada ao descentramento do sujeito, isto é, à possibilidade de mudanças e reconfigurações contínuas dos padrões de conduta, modelos de comportamento e estilos a serem seguidos pelo mesmo indivíduo, variando conforme a ocasião, a escolha, ou o constrangimento social; e a ausência de raízes e de fundamentos últimos, tanto para a legitimação de práticas como de valores, registrando-se o declínio das grandes narrativas modernas e das características morais ou éticas que as sustentavam anteriormente.
[12]
As pesquisas igualmente revelaram que o comportamento tribal nas mídias sociais
ampliou o abismo entre os eleitores do Reino Unido sobre a saída da União
Europeia, o Brexit, e durante a pandemia a falta de transparência por trás da
programação de algoritmos das redes que fomentou o avanço de notícias falsas
sobre a Covid-19, ampliando também falsas notícias sobre a vacinação.
[13]
Em 1˚ de junho de 2011, a Organização dos Estados Americanos (OEA) publicou a
Declaração Conjunta sobre Liberdade de Expressão e Internet. O documento dispõe
que a liberdade de expressão se aplica à internet do mesmo modo que a todos os
meios de comunicação. As restrições à liberdade de expressão na internet só são
aceitáveis quando cumprem os padrões internacionais, que dispõem, entre outras
coisas, que elas devem estar previstas pela lei, buscar uma finalidade legítima
reconhecida pelo direito internacional e ser necessárias para alcançar essa
finalidade (o teste "tripartite").
[14]
Artigo 19: §1º. Ninguém poderá ser
molestado por suas opiniões.
§2º. Toda pessoa terá o direito à liberdade de
expressão; esses direitos incluirá a liberdade de procurar, receber e difundir
informações e ideias de qualquer natureza, independentemente de considerações
de fronteiras, verbalmente ou por escrito, de forma impressa ou artística, ou
por qualquer meio de sua escolha.
§3º. O exercício de direito previsto no § 2 do
presente artigo implicará deveres e responsabilidades especiais.
Consequentemente, poderá estar sujeito a certas restrições, que devem,
entretanto, ser expressamente previstas em lei e que se façam necessárias para:
1. assegurar o respeito dos direitos e da reputação
das demais pessoas;
2. proteger a segurança nacional, a ordem, a saúde ou
a moral públicas.
[15]
A diretora-geral da UNESCO apontou a proliferação de iniciativas regulatórias -
pelo menos 55 países estão trabalhando nelas. Mas ela defendeu uma abordagem
coerente e global, baseada nos direitos humanos. “Se essas iniciativas
regulatórias forem desenvolvidas isoladamente, com cada país trabalhando em seu
canto, elas estão fadadas ao fracasso. A interrupção da informação é, por
definição, um problema global, então nossas reflexões devem ocorrer em escala
global”, afirmou a diretora. A diretora-geral encerrou convocando todos os
países a se unirem aos esforços da UNESCO para transformar a Internet em uma
ferramenta verdadeiramente a serviço do público e que ajude a garantir o
direito à liberdade de expressão; um direito que inclui o direito de buscar e
receber informações.
[16] O Marco Civil da Internet tem como princípios essenciais, de acordo com seu artigo 3º: i) a garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação do pensamento; ii) a proteção da privacidade dos usuários e de seus dados pessoais e iii) a garantia da neutralidade da rede. O parágrafo 2º. Do art. 220 da Constituição, também dispõe que “É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”. Paulo Gustavo Gonet Branco leciona que a coibição da censura significa que qualquer ideia ou fato que se pretenda divulgar, não necessita de autorização prévia do Estado, no entanto o indivíduo que abusar do direito de expressão, deverá assumir as consequências cíveis e penais do que expressou. A liberdade de expressão foi reafirmada no Marco Civil da Internet. Além de ser abordada como um princípio no art. 3º, também é considerada como um fundamento, ao mencionar em seu art. 2º que “A disciplina do uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão [...]”.
[17]
Liberdade de Expressão: A Constituição
Federal prevê a liberdade de expressão em seu artigo 5º, IV ao estabelecer que
“é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”, bem como no
inciso XIV do mesmo artigo 5º “é assegurado a todos o acesso à informação e
resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”, e
também no art. 220 que dispõe “A manifestação do pensamento, a criação, a
expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão
qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”.
[18]
Os precedentes Brandenburg v. Ohio (1969), R.A.V. v. City of St. Paul, 505 U.S.
377 (1992), Texas v. Johnson, 491 U.S. 397 [12] (1989) e United States v.
Eichman, 496 U.S. 310 (1990) e Virginia v. Black, 538 U.S. 343 (2003),
registram que a Suprema Corte dos Estados Unidos concede maior força normativa
à liberdade de expressão do que ao combate ao discurso de ódio, ainda que em
casos extremos. Na jurisprudência estadunidense se verifica a permissão de
discursos extremistas, "desde que não incite à violência" ("The
constitutional guarantees of free speech and free press do not permit a state
to forbid or proscribe advocacy of the use of force, or of law violation except
where such advocacy is directed to inciting imminent lawless action and is
likely to incite or produce such action" — Brandenburg v. Ohio —
1969).
[19]
A posição do governo brasileiro vai ao encontro das diretrizes debatidas no
âmbito da Unesco, na Conferência Global "Internet For Trust",
as quais, em sua essência, procuram compatibilizar a salvaguarda da liberdade
de expressão e outros direitos fundamentais, como a propriedade intelectual,
com os valores democráticos e os direitos humanos. A iniciativa da Unesco
também demonstra que o debate sobre a regulação da internet, em especial das
plataformas digitais, não ocorre somente no Brasil e que as respostas
governamentais devem observar uma agenda global e não vieses ideológicos, sob
pena de limitação indevida de direitos fundamentais.
[20]
In: MARZULLO, Luísa. Jornal O Globo. 17.4.2022. Sem legislação para as
redes, uso de músicas e paródias com fins eleitorais põe artistas como centro
de polêmicas. Especialistas em Direito Autoral acreditam que o uso de paródias
e reproduções nas campanhas devem aumentar neste ano. Para o presidente da
Comissão de Direitos Autorais, Direitos Imateriais e Entretenimento da OAB-RJ,
Sidney Sanches, a permissividade das redes sociais contribui para o
descontrole. In: https://oglobo.globo.com/politica/sem-legislacao-para-as-redes-uso-de-musicas-parodias-com-fins-eleitorais-poe-artistas-no-centro-de-polemicas-25477502
Acesso em 14.4.2023.
[21]
A afirmação: bandido bom é bandido morto foi transformada em indagação para
podermos refletir sobre o assunto. Deve-se lembrar que essa frase é um
lugar-comum em diálogos sobre a segurança pública e os limites punitivos
estatais. Quem a utiliza, por óbvio, quer fazer valer o seu conteúdo: não há
que se tratar bandido com a mesma cidadania ou a mesma cautela com que se cuida
do cidadão honesto. Alguns até mesmo a usam no sentido literal: aprovam a pena
de morte e ponto. (...) Portanto, em verdade, não há bandido bom, nem tampouco
é aceitável o bandido morto, salvo por exceção legal. A função da frase aponta
para a direção de se conceder ao autor de crime um tratamento inferiorizado,
humilhante e causador de sofrimento. Se é bandido, não pode ter uma vida
tranquila, mesmo que preso. In: NUCCI, Guilherme. Bandido bom é bandido morto?
Disponível em: https://guilhermenucci.com.br/bandido-bom-e-bandido-morto/ Acesso em 14.4.2023.
[22]
O Governo do Brasil participou, em Paris, nos dias 22 e 23 de fevereiro de
2023, da conferência Internet for Trust, primeiro evento global
da Unesco para discutir agenda focada na proteção de direitos. O combate à
desinformação e ao discurso de ódio na Internet, assim como a defesa da
democracia, são duas bandeiras importantes do Ministério da Justiça e Segurança
Pública (MJSP). Essa foi a primeira conferência global da entidade sobre
desinformação e discurso de ódio na internet e foi agendada após um pedido do
secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, por um esforço de combate
à desinformação nas redes sociais. A
assessora especial de Direitos Digitais do MJSP, Estela Aranha, participou do
evento, juntamente com a comitiva do governo brasileiro. Além da representante
do MJSP, estiveram presentes o secretário de Políticas Digitais da Secretaria
de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República, João Caldeira Brant;
o Procurador-Geral da União, Marcelo Eugenio Feitosa Almeida; o representante
da Assessoria Especial do Presidente da República, Frederico Assis; e o
representante do Ministério das Relações Exteriores (MRE), Alfonso Lages
Besada, além de outros membros do Itamaraty.
De acordo com Estela
Aranha, hoje há um debate global sobre como regulamentar as redes sem ameaçar
liberdades individuais. “Hoje existe uma agenda global sobre processos
regulatórios que possam dar conta de reduzir a circulação de conteúdos ilegais
e que trazem riscos significativos à democracia e aos direitos humanos, mas
que, ao mesmo tempo, garantam a liberdade de expressão e o acesso à informação
confiável", explica Estela.