Terceira Seção vai julgar caso de porteiro acusado em 62 processos apenas com base em reconhecimento fotográfico
O porteiro de um prédio, que nunca havia sido preso ou acusado de qualquer crime, começou a ser reconhecido por vítimas de roubo e, hoje, já soma acusações em 62 ações penais.
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu afetar o HC 769.783 para ser julgado na Terceira Seção, na qual os ministros que integram as duas turmas de direito criminal poderão discutir as diversas alegações de nulidade em um caso de reconhecimento de suspeito realizado por meio de álbum de fotos.
O porteiro de um prédio, que nunca havia sido preso ou acusado de qualquer crime, começou a ser reconhecido por vítimas de roubo e, hoje, já soma acusações em 62 ações penais. Na origem de todas as acusações está o seu reconhecimento por meio de fotos, retiradas de redes sociais e incluídas no álbum e no mural de suspeitos da Delegacia de Belford Roxo (RJ), pois sua aparência física era compatível com a descrição apresentada por vítimas de crimes.
Em uma dessas ações penais, à qual se refere o HC 769.783, o juízo de primeiro grau condenou o réu a seis anos e oito meses de reclusão, em regime inicial fechado. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro negou provimento ao recurso da defesa e, atendendo a um pedido do Ministério Público, reconheceu o concurso de agentes e aumentou a pena para oito anos.
Defesa considera inaceitável o comportamento da polícia
Autora do habeas corpus, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro argumenta que a identidade visual do suspeito foi sendo construída no curso da investigação, até resultar na identificação do porteiro, reconhecido apenas por fotografia apresentada às vítimas ao lado de outras que mostravam indivíduos com características físicas diferentes.
O Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), que também atua em favor do réu, alega que todos os 62 casos seguiram o mesmo procedimento policial: o reconhecimento fotográfico e o pronto encerramento das investigações, sem diligência alguma. Afirma ainda que esse episódio expõe uma maneira inaceitável de "investigar", uma não-atuação policial que, diuturna e impunemente, produz injustiças.
Um dos casos mais trágicos de condenação baseada em reconhecimento de suspeito
Devido à grande quantidade de acusações, a defesa do réu impetrou vários pedidos de habeas corpus, que foram distribuídos a diferentes relatores no STJ, componentes da Quinta e da Sexta Turma.
Diante disso, a ministra Laurita Vaz, relatora do HC 769.783, apontou a necessidade de que todos os habeas corpus sejam analisados em conjunto pelos membros da Terceira Seção, para que se tenha uma decisão uniforme sobre eles. Ela informou que levará o caso para julgamento na seção já no dia 10 de maio.
O ministro Rogerio Schietti Cruz, que também compõe a Sexta Turma, reforçou a importância de levar o assunto ao exame da Terceira Seção. "Evidentemente, ainda será necessário um exame mais aprofundado, mas, a um primeiro olhar, pareceu-me ser um dos casos mais trágicos de condenação baseada em reconhecimento de suspeito, em total desacordo com o que determina a lei – e, agora, em desacordo com o que preconizamos em nossa jurisprudência", declarou o ministro.