Sul América e Hiperplan condenadas por propaganda enganosa em programa de TV

Sentença Civil. Colaboração: Dr. Luiz Fernando Boller, Juiz de Direito titular da 2ª Vara Cível da comarca de Tubarão (SC).

Fonte: Luiz Fernando Boller

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Processo  - nº 075.04.003556-0

Classe - AÇÃO COM VALOR INFERIOR A 40 SALÁRIOS-MÍNIMOS (cognominada de 'Ação Anulatória de Contrato c/c Reparação de Danos Materiais e Morais')

Autor - REVARDINO OLIBONI

Rés - HIPERPLAN CORRETORA DE SEGUROS LTDA.,

SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A. e

VALOR CAPITALIZAÇÃO S/A.

Vistos etc.

Nos Juizados Especiais Cíveis, o processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade (art. 2º, da Lei nº 9.099, de 26.09.1995), razão pela qual foi o relatório dispensado (parte final do art. 38, da mesma Lei).

Passo, de imediato, à fundamentação.

Cuida-se de AÇÃO COM VALOR INFERIOR A 40 SALÁRIOS-MÍNIMOS cognominada de `Ação Anulatória de Contrato c/c. Reparação de Danos Materiais e Morais´, onde o pedreiro REVARDINO OLIBONI aduz, em síntese, que em novembro de 2002, ao assistir "o programa da Sônia Abrão, pela Rede TV de Televisão" (fl. 03), teria observado "anúncio da empresa Sul América/Hiperplan Carro fácil, o qual frisava, "adquira agora seu veículo zero quilômetro, sem juros, sem burocracia, sem consulta ao SPC", e mais "...não é consórcio, não é financiamento, é um plano especial para a compra de seu carro zero, ligue já, para o número (011) 6844-5000, e adquira seu veículo"" (fl. 03), em razão do que, entusiasmado, teria estabelecido contato "sendo atendido pela pessoa identificada como supervisor de vendas, o qual explicou ao autor que tratava-se de um pacote direto com a montadora, onde estavam vendendo o automóvel Volkswagen Gol zero quilômetro, pelo preço à vista, para pagamento em sessenta meses, com parcelas fixas" (fl. 03), garantindo entrega do bem no prazo máximo de 90 (noventa) dias.

Constatando o interesse do autor, o vendedor garantiu-lhe não se tratar de consórcio, mas de um plano especial de compra, seduzindo-o com a promessa de que "caso fechasse o negócio ainda naquele dia", teria "um ano de seguro grátis", e, ainda, que "tentaria conseguir junto à montadora a documentação inteiramente grátis" (fl. 03), em razão do que, o pedreiro REVARDINO manifestou vontade positiva, formalizando depósito inicial de R$ 100,00 (cem reais), assumindo a responsabilidade pelo pagamento de mais 60 (sessenta) parcelas, iguais, mensais e consecutivas de R$ 184,00 (cento e oitenta e quatro reais).

Inobstante tenha interrompido os pagamentos, após 05 (cinco) meses, teria sido contactado pela VALOR CAPITALIZAÇÃO S/A., que objetivava conferir novo impulso ao contrato havido para com a HIPERPLAN CORRETORA DE SEGUROS LTDA., garantindo-lhe que "havia sido contemplado, sendo necessário para tanto apenas e tão somente o pagamento da quantia de R$ 407,00 (quatrocentos e sete reais) e que os pagamentos sejam retomados com parcelas ainda menores, na importância de R$ 159,00 (cento e cinqüenta e nove reais) cada" (fl. 04), o que motivou o imediato depósito de R$ 407,00 (quatrocentos e sete reais), e, ainda, o pagamento de 02 (duas) parcelas de R$ 159,00 (cento e cinqüenta e nove reais), somente após o que, recebeu em sua residência o respectivo instrumento contratual, constatando que se tratava de um plano de capitalização, e que o veículo seria entregue no prazo de 120 (cento e vinte) dias.

Receoso, novamente telefonou para o número divulgado, recebendo a informação de que o sistema era administrado pela SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A., o que lhe conferiu a segurança necessária para que o contrato fosse devidamente subscrito, fato solidificado pelo recebimento do "certificado de seguro grátis" (fl. 05), ensejando o pagamento de mais R$ 825,00 (oitocentos e vinte e cinco reais), o que não foi suficiente ao anunciado recebimento do veículo objeto, motivo pelo qual, malcontente com a conduta comercial empreendida pelas demandadas, pugna pela concessão da tutela jurisdicional, com a anulação do contrato pactuado, condenando-se as rés HIPERPLAN CORRETORA DE SEGUROS LTDA., SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A. e VALOR CAPITALIZAÇÃO S/A., à restituição do valor de R$ 981,27 (novecentos e oitenta e um reais e vinte e sete centavos), além do pagamento de indenização por alegado dano moral que aduz ter sido vítima, no equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos, ou outro `quantum´ arbitrado pelo Juízo (fls. 02/12).

Na audiência de conciliação, a VALOR CAPITALIZAÇÃO S/A. efetuou proposta de pagamento do valor de R$ 477,00 (quatrocentos e setenta e sete reais), relativo ao crédito representado pelos documentos de fl. 16, objetivando sua exclusão do pólo passivo da demanda, com o que anuiu REVARDINO OLIBONI, sob a tácita anuência da SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A., ensejando a parcial extinção do feito (fls. 42/43).

Contestando o pedido contido na inicial, a SUL AMÉRICA asseverou que "a venda de títulos de capitalização é intermediada por um corretor autônomo, e não por qualquer empregado da ré, tampouco seu preposto, a teor do que dispõe o Decreto nº 56.903, de 24 de setembro de 1965, que regulamenta a atividade do Corretor de Seguros de Vida e Capitalização, até para que se preserve a condição de autonomia e independência perante a empresa de capitalização" (fl. 74), em razão do que, afiançou que não lhe pode ser imputada "qualquer responsabilidade por informações diversas das que estão estipuladas em contrato, que por ventura tenham sido transmitidas ao autor pela corretora, eis que o mesmo, em verdade, é um representante do subscritor perante a empresa de capitalização (e não o contrário)", motivo pelo qual, destacando que não comercializa títulos, mas apenas os emite, pugnou pela imediata extinção do feito na forma do disposto no art. 267, inc. VI, do CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, em decorrência de alegada ilegitimidade passiva `ad causam´, afiançando, no mérito, que "embora o autor alegue ter firmado Proposta de Subscrição de Título de Capitalização, [...] o que lhe viabilizaria adquirir um automóvel de sua escolha, informa esta não ter recebido da corretora/requerida nenhuma proposta, razão pela qual não houve sequer alguma emissão de título de capitalização no nome do autor" (fl. 76), motivo pelo qual, invocando os argumentos sobreditos, refutou a assunção de qualquer responsabilidade indenizatória ou ressarcitória, clamando pelo inacolhimento do pleito contido na inicial, exaltando, de outro vértice, que REVARDINO OLIBONI não logrou êxito em demonstrar o alegado dano moral, rechaçando o respectivo `quantum´ indenizatório, porquanto destinado ao mero enriquecimento do postulante (fls. 73/81).

Manifestando-se, REVARDINO OLIBONI verberou os argumentos manejados pela SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A., pugnando pelo acolhimento do pleito contido na inicial (fls. 111/119), e, ainda - em decorrência do insucesso na citação - pela parcial extinção do feito, desistindo da pretensão com relação à co-ré HIPERPLAN CORRETORA DE SEGUROS LTDA. (fl. 120), o que, nos termos do disposto no art. 264, do CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, foi rechaçado pela SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A. (fls. 125/126).

Formalizado o ato citatório em 06/06/2006 (fl. 168), a HIPERPLAN CORRETORA DE SEGUROS LTDA. apresentou contestação escrita, avultando, em preliminar, a ilegitimidade para figurar no pólo passivo da demanda, asseverando, para tanto, que "jamais celebrou qualquer relação jurídica com o autor", que "nunca comprou produto algum da empresa" (fl. 174), motivo pelo qual pugnou pela aplicação do disposto no art. 267, inc. VI, do CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, salientando, no mérito, que a "VALOR CAPITALIZAÇÃO, era CONCORRENTE da empresa ré HIPERPLAN CORRETORA DE SEGUROS LTDA., sendo esta corretora da Sul América Capitalização, diferentemente daquela que era corretora do extinto BANCO SANTOS" (fl. 176), motivo pelo qual, repisando o argumento prefacial, pugnou pelo inacolhimento da pretensão deduzida por REVARDINO OLIBONI (fls. 174/178).

Passo, num primeiro momento, à análise da prejudicial argüida pela SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A., destacando que os documentos de fls. 17/20 vº, indicam irrefutável existência de vínculo contratual entre si própria e REVARDINO OLIBONI, o que lhe confere legitimidade para figurar no pólo passivo da demanda, lastreada, gize-se, na existência de vício do consentimento, decorrente de `propaganda enganosa´ por ela própria veiculada em rede nacional de televisão.

Eventual apuração de responsabilidades, portanto, demanda perscrutação da `quaestio de meritis´, o que vai de encontro ao disposto no art. 301, do CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

Idêntico argumento, aplica-se à argumentação neste sentido tecida pela HIPERPLAN CORRETORA DE SEGUROS LTDA., visto que os documentos de fls. 18 e 19, revelam a efetiva e insofismável existência de liame contratual com o postulante.

Não havendo outras preliminares argüidas, passo à solução da contenda, destacando que o pleito deduzido por REVARDINO OLIBONI imprescinde da aplicação das disposições contidas no bojo da Lei nº 8.078/90. Isto porque consumidor 'é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final'. Já fornecedor, por outro lado, é 'toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestações de serviços'.

Depreende-se que o objetivo do CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR foi estabelecer uma tutela específica ao consumidor, garantindo-lhe tratamento diferenciado dos demais. A relação de consumo de que trata o mencionado 'codex', portanto, não é aquela onde a coisa é juridicamente consumível quando destinada à alienação 'nummi consumpti'. O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR garante proteção a todo aquele que adquire produto ou serviço como destinatário final, a fim de atender a uma necessidade própria e não para o desenvolvimento de uma outra atividade negocial.

Diante dessas definições, infere-se que o caso sob julgamento clama pela aplicação da legislação consumeirista, devendo ser afastada a aplicação da legislação civil comum.

REVARDINO relata que em novembro de 2002, ao assistir "o programa da Sônia Abrão, pela Rede TV de Televisão" (fl. 03), teria observado "anúncio da empresa Sul América/Hiperplan Carro fácil, o qual frisava, "adquira agora seu veículo zero quilômetro, sem juros, sem burocracia, sem consulta ao SPC", e mais "...não é consórcio, não é financiamento, é um plano especial para a compra de seu carro zero, ligue já, para o número (011) 6844-5000, e adquira seu veículo"" (fl. 03), em razão do que, entusiasmado, teria estabelecido contato "sendo atendido pela pessoa identificada como supervisor de vendas, o qual explicou ao autor que tratava-se de um pacote direto com a montadora, onde estavam vendendo o automóvel Volkswagen Gol zero quilômetro, pelo preço à vista, para pagamento em sessenta meses, com parcelas fixas" (fl. 03), garantindo entrega do bem no prazo máximo de 90 (noventa) dias.

Constatando o interesse do autor, o vendedor garantiu-lhe não se tratar de consórcio, mas de um plano especial de compra, seduzindo-o com a promessa de que "caso fechasse o negócio ainda naquele dia", teria "um ano de seguro grátis", e, ainda, que "tentaria conseguir junto à montadora a documentação inteiramente grátis" (fl. 03), em razão do que, o pedreiro autor manifestou vontade positiva, formalizando depósito inicial de R$ 100,00 (cem reais), assumindo a responsabilidade pelo pagamento de mais 60 (sessenta) parcelas, iguais, mensais e consecutivas de R$ 184,00 (cento e oitenta e quatro reais).

Compulsando detidamente o documento de fl. 18 - timbrado tanto pela SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A., bem como pela HIPERPLAN CORRETORA DE SEGUROS LTDA. - constato que, em momento algum é feita referência à oferta de um plano de capitalização, apenas sugerindo ao leigo autor, que "A ALEGRIA DE POSSUIR SEU CARRO 0KM ESTÁ MUITO PRÓXIMA" (fl. 18), conferindo ao aderente, inclusive, "desconto exclusivo de até 8% na aquisição de seu carro 0km ou seminovo", o que não se revela próprio de um plano de poupança capitalizada ! E mais: as demandadas, além de anunciarem `1 (hum) ano de seguro grátis´, ainda seduziam o consumidor com a "garantia de entrega do veículo a ser adquirido na rede de concessionárias participantes" !

Evidente que empresas concessionárias atuam no ramo de compra e venda de veículos, e, não de planos de capitalização, o que permite concluir que um leigo certamente acreditaria estar contratando um contrato de financiamento.

Tal circunstância, aliada à veiculação de propaganda em programa da televisão aberta, presta-se, com segurança, à configuração da fraude perpetrada com o intuito de obter manifestação de consentimento de sujeitos hipossuficientes, como o requerente, que ao ser inquirido, afirmou ter sido compelido por "ALAN", que "trabalhava na SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A." a "depositar o dinheiro no banco" (fl. 201).

Importante destacar, inclusive, que a matéria foi objeto da Representação nº 245/02, instaurada por consumidores contra a SUL AMÉRICA e sua parceira comercial, tendo o CONAR-CONSELHO NACIONAL DE AUTO-REGULAMENTAÇÃO PUBLICITÁRIA divulgado em seu `site´ que "de acordo com queixa enviada ao Conar por consumidores do Guarujá, Guaratinguetá e Jacareí (SP), infomercial em TV da Sulamérica Capitalização apresentado por João Kleber é enganoso, pois mesmo após o pagamento das parcelas iniciais e transcorrido o prazo de entrega prometido, o carro não é fornecido. A Delta Prime, empresa distribuidora do título de capitalização da Sulamérica, enviou defesa ao Conar explicando o mecanismo da operação e suas bases. O relator considerou o informe comercial falho, ao não deixar claro que se trata de título de capitalização e quais são as implicações para o consumidor. Por isso, propôs alteração, voto aceito por unanimidade" (disponível em http://www. conar.org.br/).

Explicitando a natureza do material de comercialização dos `planos de capitalização´, a FENASEG-Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização, esclarece que o informe respectivo "deve ser bem claro, atendendo ao Código de Defesa do Consumidor. É fundamental o conhecimento do produto para que todos possam prestar quaisquer esclarecimentos aos clientes" (disponível em http://www.fenaseg.org.br/main.asp?View=%7B7269257A-CCC5-46FF-82B0-3D190F0FDEBF%7D#{2DA2803C-983B-4C80-AD92-55CF7325D297}).

Assim, tanto a SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A., bem como a HIPERPLAN CORRETORA DE SEGUROS LTDA., jamais deveriam ter divulgado a `possibilidade de célere aquisição de veículo automotor´ (fls. 18 e 19), mas, sim, que o produto comercializado constituía singelo "processo de aplicação de uma importância a uma determinada taxa de juros e de seu crescimento por força da incorporação desses mesmos juros à quantia inicialmente aplicada" destacando que caberia [...] "ao componente lotérico o papel de poder antecipar, a qualquer tempo, o recebimento da quantia que se pretende economizar ou de um múltiplo dela de conformidade com o plano" (disponível em http://www.fenaseg.org.br/main.asp?View=%7B7269257A-CCC5-46FF-82B0-3D190F0FDEBF%7D#{2DA2803C-983B-4C80-AD92-55CF7325D297}).

Não bastasse a ignorância de tais preceitos, as demandadas não lograram êxito em apresentar ao Juízo documentos indicando a submissão de "seu plano ao órgão fiscalizador do Sistema Nacional de Capitalização-SUSEP" (disponível em http://www.fenaseg.org.br/ main.asp?View=%7B7269257A-CCC5-46FF-82B0-3D190F0FDEBF%7D#{2DA2803C-983B-4C80-AD92-55CF7325D297}).

Depreende-se, portanto, que a atividade desenvolvida em parceria pelas demandadas (fls. 17/20vº), vai de encontro ao disposto no art. 6º, inc. IV, do CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.

Consoante já alhures referido, a Lei nº 8.078/90 introduziu na sociedade brasileira - sempre carente da proteção estatal - a noção de respeito pela parte mais fraca da relação jurídica, 'in casu', o consumidor hipossuficiente, reafirmando, ao menos no seio do consumo, a defesa da cidadania.

Na relação negocial vergastada, a situação dos vendedores do plano de capitalização é de evidente vantagem, pois somente eles têm pleno conhecimento das efetivas e reais condições do ajuste, convencendo o consumidor a efetuar os pagamentos, mediante a promessa de entrega do bem efetivamente almejado - no presente feito, um automóvel zero km - num determinado curto prazo.

Todavia, a situação do consumidor/contratante é de manifesta vulnerabilidade, independentemente de sua situação econômica, visto que confia na informação que lhe é repassada ao talante dos prepostos das empresas que operam no mercado de capitalização, segundo sua conveniência, isto em decorrência da utilização do conhecido nome comercial da SUL AMÉRICA.

EDUARDO FERREIRA COSTA leciona que "a Lei nº 8.078/90, [...] não vincula sua aplicabilidade ao objeto do contrato, mas à qualidade dos sujeitos envolvidos no negócio jurídico" (COSTA, Eduardo Ferreira. Os contratos bancários e o código de defesa do consumidor. Juris Síntese 28, mar/abr 2001).

O magnânimo NELSON NERY JÚNIOR, leciona que o objeto "de regulamentação pelo Código de Defesa do Consumidor é a relação de consumo, assim entendida a relação jurídica existente entre fornecedor e consumidor tendo como objeto a aquisição de produtos ou utilização de serviços pelo consumidor [...]. O Código de Defesa do Consumidor não fala de 'contrato de consumo', 'ato de consumo', 'negócio jurídico de consumo', mas de relação de consumo, termo que tem sentido mais amplo do que aquelas expressões. São elementos da relação de consumo, segundo o Código de Defesa do Consumidor: a) como sujeitos, o fornecedor e o consumidor; b) como objeto, os produtos e serviços; c) como finalidade, caracterizando-se como elemento teleológico das relações de consumo, serem elas celebradas para que o consumidor adquira produto ou se utilize de serviço 'como destinatário final' (art. 2°, caput, última parte, Código de Defesa do Consumidor)". (NERY, Nelson Júnior. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto, Ada Pellegrini Grinover et al. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998. p. 342).

Presentes pois, no caso sob julgamento, os elementos caracterizadores da relação de consumo.

A Lei nº 8.078/90, em seu art. 31, preceitua que 'a oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.'

A própria CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988, incluiu explicitamente a defesa do consumidor no elenco dos direitos fundamentais (art. 5º, XXXII) e, por sua destacada importância, previu que (art. 5º, XIV) 'é assegurado a todos o acesso à informação'.

Sobre a matéria, colhe-se judiciosa lição do escólio de PAULO LUIZ NETTO LÔBO, para quem [...] "o dever de informar, imposto a quem produz, importa ou comercializa coisas ou presta serviços, se justifica em razão de se enfrentarem nessa peculiar relação, um profissional e um profano, e a lei tem um dever tuitivo com este último ('apud' CABANA, Roberto M. Lopez. Información al usuário. Revista Ajuris, edição especial, Porto Alegre, março 1998, p. 256). O dever de informar tem raiz no tradicional princípio da boa fé objetiva, significante da representação que um comportamento provoca no outro, de conduta matrizada na lealdade, na correção, na probidade, na confiança, na ausência de intenção lesiva ou prejudicial. A boa fé objetiva é regra de Conduta dos indivíduos nas relações jurídicas obrigacionais. Interessam as repercussões de certos comportamentos na confiança que as pessoas normalmente neles depositam ('apud' CORDEIRO, Antonio Manoel da Rocha e Menezes. Da boa fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 1997, p 1234). Confia-se no significado comum, usual, objetivo da conduta ou comportamento reconhecível no mundo social. No direito comum dos contratos, esse princípio implícito, sem embargo da omissão proposital da codificação tradicional, como a brasileira, foi recorrente na doutrina mais atenta à evolução do direito contratual. O princípio da boa fé objetiva foi refuncionalizado no direito do consumidor, otimizando-se sua dimensão de cláusula geral, de modo a servir de parâmetro de validade dos contratos de consumo, principalmente nas condições gerais dos contratos. Anteriormente ao advento das legislações específicas, a jurisprudência dos tribunais socorreu-se à larga da boa fé como cláusula geral definidora do limite das condições gerais dos contratos e do efetivo cumprimento do dever de informar." E prossegue o indigitado doutrinador, destacando que [...] "o dever de informar não é apenas a realização do princípio da boa fé. Na evolução do direito do consumidor assumiu feição cada vez mais objetiva, relacionado à atividade lícita de fornecimento de produtos e serviços. A teoria contratual também construiu a doutrina dos deveres anexos, deveres acessórios ou deveres secundários ao da prestação principal, para enquadrar o dever de informar ('apud' MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 2. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1995, p. 241). O desenvolvimento do direito do consumidor foi além, transformando-o no correspectivo do direito à informação, como direito fundamental, e o elevando a condicionante e determinante do conteúdo da prestação principal do fornecedor. Não se trata apenas de dever anexo." (LÔBO, Paulo Luiz Netto. A informação como direito fundamental do consumidor. Jus Navigandi, Teresina, a. 5, n. 51. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=2216).

Gize-se que a CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988, em seu art. 170, preceitua que a atividade econômica deve observar, entre outros, o princípio de defesa do consumidor, sendo tal dispositivo endereçado, também, aos integrantes das relações jurídicas privadas.

De outro vértice, o dever de informar impõe-se a todos os que participam da comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Constato, 'in casu', que a postura e proceder adotados por SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A. e HIPERPLAN CORRETORA DE SEGUROS LTDA., resulta automática incidência da disposição contida no art. 30, do CDC, segundo o qual 'toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado'

Assim, não efetuando a entrega do automóvel no prazo de 90 (noventa) dias, a prática comercial adotada pelas rés, constituiu reprovável expediente, destinado, única e tão somente, a angariar contratos de adesão e respectivo recurso monetário, induzindo em erro consumidores hipossuficientes, o que merece reprimenda estatal.

De destacar, ainda, que os documentos de fls. 18/ 20 vº, sequer foram datados ou adequadamente preenchidos, impossibilitando uma justa compreensão da relação contratual vergastada, o que, face ao disposto no art. 6º, inc. VIII, do CDC, permite o acatamento dos argumentos manejados na inicial, especialmente considerando a ausência de comprovação da autorização de ambas as demandadas para operar no mercado de títulos de capitalização.

Diante de tal circunstância, especialmente considerando o que preceitua o art. 35, inc. III, do CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, o pleito deduzido por REVARDINO OLIBONI merece agasalho jurídico, com a rescisão antecipada do contrato pactuado, e respectiva devolução dos valores confiados às demandadas.

Gize-se que, por ter sido induzido em erro por publicidade enganosa, a dissolução do pacto deve ser ampla, com a integral restituição de todo o valor despendido pelo autor, sem dedução de qualquer percentual de deságio.

Já no que toca ao pleito indenizatório, adequado destacar que o direito à reparação por dano moral é assegurado pelo art. 5º, inc. X, da CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988, bem como, ainda, pelo art. 186, da Lei nº 10.406/02.

Além disso, "indenizar significa reparar o dano causado à vítima, integralmente. Se possível, restaurando o 'statu quo ante', isto é, devolvendo-a ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do ato ilícito." (STOCO, Rui, Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e jurisprudência. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. p. 439).

'In casu', o direito à reparação civil assentar-se-ia no fato de SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A., em conluio com a HIPERPLAN CORRETORA DE SEGUROS LTDA., terem ludibriado o autor, induzindo-o em erro, compelindo-a a efetuar o pagamento de R$ 100,00 (cem reais) em 08/11/2002 (fl. 14), R$ 407,00 (quatrocentos e sete reais) em 20/04/2003 (fl. 15 `in fine´), e, ainda, R$ 159,00 (cento e cinqüenta e nove reais) em 10/06/2003 (fl. 15), mais R$ 159,00 (cento e cinqüenta e nove reais) em 18/08/2003 (fl. 16) - estes 2 (dois) últimos pagamentos, resolvidos em decorrência do ajuste pactuado com a VALOR CAPITALIZAÇÃO S/A. (fls. 42/43) - sob a promessa de entrega do automóvel VW GOL adquirido de forma diferida no tempo, promovendo falsa expectativa.

O magnânimo CARLOS ALBERTO BITTAR ministra que "a teoria da responsabilidade civil relaciona-se à liberdade e à racionalidade humanas, que impõe à pessoa o dever de assumir os ônus correspondentes a fatos a ela referentes. Nesse sentido, a responsabilidade é o corolário da faculdade de escolha e de iniciativa que a pessoa possui no mundo fático, submetendo-a, ou o respectivo patrimônio, aos resultados de suas ações, que, quando contrários à ordem jurídica, geram-lhe no campo civil, a obrigação de ressarcir o dano, ao atingir componentes pessoais, morais ou patrimoniais da esfera jurídica de outrem." (BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil: teoria e prática. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 2).

Quanto à aplicação da teoria subjetiva da responsabilidade civil ao caso sob julgamento, colhe-se dos ensinamentos de MARIA HELENA DINIZ que há necessidade de "a) Existência de uma ação, comissiva ou omissiva, qualificada juridicamente, isto é, que se apresenta como um ato ilícito ou lícito, pois ao lado da culpa, como fundamento da responsabilidade, temos o risco. A regra básica é a que a obrigação de indenizar, pela prática de atos ilícitos, advém da culpa [...] b) Ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado à vítima por ato comissivo ou omissivo do agente ou de terceiro por quem o imputado responde, ou por um, fato de animal ou coisa a ele vinculada. Não pode haver responsabilidade civil sem dano [...] c) Nexo de causalidade entre o dano e a ação (fato gerador da responsabilidade), pois a responsabilidade civil não poderá existir sem o vínculo entre a ação e o dano)" (DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. v. 7. p. 35-36 - grifei).

É sabido e consabido que a indenização por danos materiais ou patrimoniais tem por finalidade recompor as perdas econômicas decorrentes da conduta antijurídica de outrem.

Com muita propriedade, MARIA HELENA DINIZ conceitua que "o dano patrimonial vem a ser a lesão concreta, que afeta um interesse relativo ao patrimônio da vítima, consistente na perda ou deterioração, total ou parcial, dos bens materiais que lhe pertencem, sendo suscetível de avaliação pecuniária e de indenização pelo responsável. Constituem danos patrimoniais a privação do uso da coisa, os estragos nela causados, a incapacitação do lesado para o trabalho, a ofensa a sua reputação, quando tiver repercussão na sua vida profissional ou em seus negócios." (DINIZ, Maria Helena. Op. cit. p. 51).

Já o direito à indenização por dano de ordem moral possui o escopo de minorar os efeitos psicológicos e traumáticos causados pelo ato danoso.

Sobre a matéria, leciona YUSSEF SAID CAHALI que "no estágio atual de nosso direito, com a consagração definitiva, até constitucional, do princípio da reparabilidade do dano moral, não mais se questiona que esses sentimentos feridos pela dor moral comportam ser indenizados; não se trata de ressarcir o prejuízo material representado pela perda de um familiar economicamente proveitoso, mas de reparar a dor com bens de natureza distinta, de caráter compensatório e que, de alguma forma, servem como lenitivo" (Dano moral. p. 111).

O culto RUI STOCO acrescenta que "indenizar significa reparar o dano causado à vítima, integralmente. Se possível, restaurando o 'statu quo ante', isto é, devolvendo-a ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do ato ilícito." (STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e jurisprudência. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995. p. 439).

Por fim, cumpre destacar o escólio de JOSÉ DE AGUIAR DIAS, para quem, "quanto ao dano material deve ser efetivamente provado pela vítima. Além desse, porém, há o dano moral, cuja avaliação deve ser deixada ao Juiz e que há de ser concedido em todos os casos, sem indenização do que tenha sido pago a título de dano material" (Da responsabilidade civil. 6. ed. v. 2. p. 473-474 - grifei).

Na situação versada no caso sob julgamento, revela-se indiscutível a frustração suportada pelo humilde pedreiro REVARDINO OLIBONI, visto que - além de ver espoliada a possibilidade de aquisição do objeto do contrato de aquisição `financiada´ - foi compelido a dispor de quantia essencial à sua própria sobrevivência, honrando, com submissão paciente, a prestação a si imposta.

Quanto à fixação do 'quantum debeatur' pelos danos morais, trata-se de incumbência do magistrado, que deve fundamentar seu arbitramento na eqüidade e em diretrizes estabelecidas pela doutrina e jurisprudência.

Ensina o saudoso PONTES DE MIRANDA que "embora o dano moral seja um sentimento de pesar íntimo da pessoa ofendida, para o qual não se encontra estimação perfeitamente adequada, não é isso razão para que se lhe recuse em absoluto uma compensação qualquer. Essa será estabelecida, como e quando possível, por meio de uma soma, que não importando uma exata reparação, todavia representa a única salvação cabível nos limites das forças humanas. O dinheiro não os extinguirá de todo: não os atenuará mesmo por sua própria natureza, mas pelas vantagens que o seu valor permutativo poderá proporcionar, compensando, indiretamente e parcialmente embora, o suplício moral que os vitimados experimentaram" (RTJ 57/789-90). Complementa WILSON BUSSADA que "Realmente, na reparação do dano moral o juiz deverá apelar para o que lhe parecer eqüitativo ou justo, mas ele agirá sempre com um prudente arbítrio, ouvindo as razões da parte, verificando os elementos probatórios, fixando moderadamente uma indenização. Portanto, ao fixar o quantum da indenização, o juiz não procederá a seu bel-prazer, mas como um homem de responsabilidade, examinando as circunstâncias de cada caso, decidindo com fundamento e moderação. Arbítrio prudente e moderado, assevera ARTUR OSCAR DE OLIVEIRA DEDA, não é mesmo que arbitrariedade. Além, disso, sua decisão será examinada pelas instâncias superiores e esse arbítrio está autorizado por lei (arts. 1549 e 1533, do Código Civil), sendo até mesmo concedido ao juiz, em muitos casos, inclusive nos de danos patrimoniais. Assim sendo, não há que se falar em excessivo poder concedido ao juiz" (Danos e interpretações pelos tribunais).

Gize-se que o 'quantum' fixado não tem por finalidade apagar as marcas deixadas pela frustração, servindo, tão-somente, como lenitivo à dor experimentada, ligando-se à reprovabilidade do ato e à sua conseqüência psíquica frente à vítima, distanciando-se da análise da repercussão material do infortúnio, daí não significando a obtenção de lucro ou qualquer vantagem financeira.

Doutrinando sobre a matéria, JOSÉ RAFFAELLI SANTINI preleciona que "na verdade, inexistindo critérios previstos por lei a indenização deve ser entregue ao livre arbítrio do julgador que, evidentemente, ao apreciar o caso concreto submetido a exame fará a entrega da prestação jurisdicional de forma livre e consciente, à luz das provas que forem produzidas. Verificará as condições das partes, o nível social, o grau de escolaridade, o prejuízo sofrido pela vítima, a intensidade da culpa e os demais fatores concorrentes para a fixação do dano, haja vista que costumeiramente a regra do direito pode se revestir de flexibilidade para dar a cada um o que é seu. [...] Melhor fora, evidentemente, que existisse em nossa legislação um sistema que concedesse ao juiz uma faixa de atuação, onde se pudesse graduar a reparação de acordo com o caso concreto. Entretanto, isso inexiste. O que prepondera, tanto na doutrina, como na jurisprudência, é o entendimento de que a fixação do dano moral deve ficar ao prudente arbítrio do juiz." (Dano moral: doutrina, jurisprudência e prática. Agá Júris, 2000. p. 45).

Importante, ainda, a reprodução do ensinamento de CARLOS ALBERTO BITTAR, para quem, "diante da esquematização atual da teoria em debate, são conferidos amplos poderes ao juiz para definição da forma e da extensão da reparação cabível, em consonância, aliás, com a própria natureza das funções que exerce no processo civil (Código de Processo Civil, arts. 125 e 126). Com efeito, como julgador e dirigente do processo, pode o magistrado ter conhecimento direto das partes, dos fatos e das respectivas circunstâncias, habilitando-as, assim, à luz do direito aplicável, a definir de modo mais adequado, a reparação devida no caso concreto". (BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. RT, 1993. p. 205-206).

Mais adiante, destaca o jurista, em sua obra, que "a indenização por danos morais deve traduzir-se em montante que represente advertência ao lesante e à sociedade de que se não se aceita o comportamento assumido, ou o evento lesivo advindo. Consubstancia-se, portanto, em importância compatível com o vulto dos interesses em conflito, refletindo-se, de modo expresso, no patrimônio do lesante, a fim de que sinta, efetivamente, a resposta da ordem jurídica aos efeitos do resultado lesivo produzido. Deve, pois, ser quantia economicamente significativa, em razão das potencialidades do patrimônio do lesante" (BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. RT, 1993. p. 220).

O longânime HUMBERTO THEODORO JÚNIOR assinala que "resta, para a Justiça, a penosa tarefa de dosar a indenização, porquanto haverá de ser feita em dinheiro, para compensar uma lesão que, por sua própria natureza, não se mede pelos padrões monetários", acrescentando que "o problema haverá de ser solucionado dentro do princípio do prudente arbítrio do julgador, sem parâmetros apriorísticos e à luz das peculiaridades de cada caso, principalmente em função do nível sócio-econômico dos litigantes e da menor ou maior gravidade da lesão" (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Alguns aspectos da nova ordem constitucional sobre o direito civil. RT 662/7-17).

Sobre o tema, não diverge o entendimento jurisprudencial pátrio, de onde retira-se a seguinte indagação "Mas qual deve ser o fundamento da ação ? Pagamento da dor sofrida, reduzindo-se a moeda os sentimentos ? Não. Seria profundamente imoral dizer que aquele que foi atingido em seus sentimentos se consolaria graças à indenização que recebesse. A indenização não compensará, nem fará desaparecer a dor do ofendido; por isso mesmo não se trata de substituir por dinheiro o bem desaparecido; por isso mesmo não se cogita de avaliar a dor em dinheiro. O fundamento da ação é outro. O que, na realidade, se tem em vista não é avaliar a dor, para pagá-la em dinheiro numa equivalência exata, mas tutelar o direito violado. As perdas e danos não têm o caráter de indenização do sofrimento, mas caráter de reparação repressiva. A indenização sob forma econômica é considerada como um bem sucedâneo, como um bem não equivalente a um outro, mas dado em substituição de um outro, como uma satisfação ou uma vantagem pela lesão do direito. Vejam-se nesse sentido as lições de ICÍLIO VANNI ('Lições de filosofia do direito', p. 85), de PLANIOL ET RIPERT (Traité élémentaire de droit civil', vol. II, n.º 868-bis, p. 296). de GIORGI ('Teoria delle obligazioni', vol v, n.º 238), e de LAURENT (Principes de droit civil français', vol. XX, n.º 395). E como não há, nem pode haver, equivalência entre o dano sofrido e a importância a ser paga, o que daí se segue é que necessariamente haverá um poder discricionário, um prudente arbítrio, dos juizes na fixação do quantum da condenação, arbítrio esse que emana da natureza das coisas, pois como fizeram sentir BOISTEL, LAURENT, MONTEL, HUDELOT ET METMAN, e GIORGI e MINOZZI, o fato de não se poder estabelecer a equivalência não pode ser motivo de se deixar o direito sem sanção e sua tutela. Causando o dano moral, fica o responsável sujeito às conseqüências de seu ato, a primeira das quais será essa de pagar uma soma que for arbitrada, conforme a gravidade do dano e a fortuna dele responsável, a critério do poder judiciário, como justa reparação do prejuízo sofrido, e não como fonte de enriquecimento" (Amílcar de Castro, voto proferido na Apelação Cível nº 1.409; RF 93/528).

São critérios de fixação do quantum estabelecidos por WLADIMIR VALLER "a) a importância da lesão, ou da dor sofrida, assim como sua duração e seqüelas que causam a dor; b) a idade e o sexo da vítima; c) ao caráter permanente ou não do menoscabo que ocasionará o sofrimento; d) a relação de parentesco com a vítima quando se tratar do chamado dano por ricochete; e) a situação econômica das partes; f) a intensidade de dolo ou ao grau da culpa." (A reparação do dano moral no direito brasileiro. São Paulo: EV Editora, 1994. p. 301).

Precioso é o ensinamento do Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, para quem "a indenização deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento indevido, considerando que se recomenda que o arbitramento deva operar-se com, proporcionalmente ao grau de culpa, ao porte empresarial das partes, às suas atividades comerciais e, ainda, ao valor do negócio, orientando-se o Juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida, notadamente à situação econômica atual e as peculiaridades de cada caso" ('apud' Apelação cível nº 2001.020466-5, de Tubarão. Terceira Câmara Civil. Rel. Des. Dionizio Jenczak. Diário da Justiça nº 11.236, de 21.07.2003. p. 14).

Destarte, como juiz do processo, conhecedor do meio-ambiente, próximo dos fatos, dispondo de elementos mais seguros à formação de uma convicção em torno da decisão pela procedência ou improcedência do pedido, vige o princípio da confiança no Magistrado presidente da instrução.

Desse modo, considerando a natureza do ilícito e suas peculiaridades, observados, ainda, os critérios supramencionados de fixação do 'quantum', bem como os demais pré-requisitos - tanto de ordem objetiva quanto subjetiva que levo em consideração - além da ausência de contraposição ao pleito, à míngua de critérios legais particulares, tenho por bem arbitrar a indenização pelo dano moral no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), quantia esta que servirá de lenitivo ao abalo sofrido por REVARDINO, mas que impede alcance a culminância do enriquecimento indevido.

O `quantum´ foi assim fixado, a fim de lenir com maior eficiência o dissabor experimentado, bem como de evitar repetições no futuro de casos semelhantes por força do caráter pedagógico da condenação.

Posto isto, considerando, ainda, o mais que dos autos consta - especialmente os princípios gerais de Direito aplicáveis à espécie - com arrimo em o disposto no art. 5º, 'caput' e inc. XXXII, art. 170, inc. V, bem como art. 48, de suas Disposições Constitucionais Transitórias, todos da CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988, arts. 2º, 5º e 6º, da Lei nº 9.099/95, c/c. arts. 130, 131, 302 `caput´ e 333, inc. II, do CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, art. 186 do CÓDIGO CIVIL, e, por fim, arts. 1º, 2º, 3º, 6º, inc. IV, 30 e 31, todos da Lei nº 8.078/90, julgo parcialmente procedente o pedido (1) declarando rescindido o plano de capitalização objeto da `proposta nº 8888.06.445890.13-3124.741´, (2) condenando a SUL AMÉRICA CAPITALIZAÇÃO S/A. e a HIPERPLAN CORRETORA DE SEGUROS LTDA., a solidariamente restituírem a REVARDINO OLIBONI (a) o valor de R$ 507,00 (quinhentos e sete reais), monetariamente corrigido a contar da data dos respectivos dispêndios (fls. 14 e 15 `in fine´), acrescido dos juros de mora a contar da citação (16/06/2006 - fl. 169), bem como, ainda, (b) o valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), a título de indenização pelo dano moral infligido, monetariamente corrigido a contar desta data, acrescido dos juros de mora a contar da citação (16/06/2006 - fl. 169), ordenando o encaminhamento de cópias fotostáticas autênticas integrais dos presentes autos (1) ao DELEGADO REGIONAL DE POLÍCIA, bem como (2) ao MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, para deflagração das medidas legais pertinentes à apuração de conduta delituosa (Título II, Capítulos VI, do Decreto Lei nº 2.848, de 07.12.1940, c/c. a Lei nº 7.209, de 11.07.1984), (3) ao DELEGADO DE POLÍCIA FEDERAL, bem como (4) ao MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL para impulso das medidas legais pertinentes à apuração de conduta delituosa estatuída nos dispositivos da Lei nº 1.521/ 51 (Crimes contra a Economia Popular), e, por fim, (5) ao CONAR-CONSELHO NACIONAL DE AUTO-REGULAMENTAÇÃO PUBLICITÁRIA, noticiando o censurável procedimento publicitário veiculado pelas demandadas em programa transmitido por rede aberta de televisão.

Relevo o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios (art. 55, da Lei nº 9.099/95).

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Tubarão, 30 de abril de 2007.

Luiz Fernando Boller
JUIZ DE DIREITO



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3 Comentários

Fabio Pellegrino Juiz de Direito10/05/2008 5:50 Responder

Faltou aplicar à ré CORRETORA a pena de litigância de má-fé, por ter falseado a verdade dos fatos (art. 17, II, CPC), ao alegar falta de relação jurídica, quando havia documentos nos autos comprovando. De se ressaltar, ainda, que a corretora pode ser considerada a "longa manus" da seguradora em relação ao consumidor, na forma do art. 34, do Código de Defesa do Consumidor, o que implica responsabilidade tanto da seguradora quanto da corretora, quanto ao produto ou serviço intermediado: "Art. 34. O fornecedor do produto ou serviço é solidariamente responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos." A condenação foi exemplar. Infelizmente a publicidade enganosa continuará vitimando os consumidores e só através da ação efetiva destes e das reclamações administrativas e judiciais será possível coibir a prática lesiva. Parabéns !

Fabio Pellegrino Juiz de Direito10/05/2008 5:53 Responder

Faltou aplicar à ré CORRETORA a pena de litigância de má-fé, por ter falseado a verdade dos fatos (art. 17, II, CPC), ao alegar falta de relação jurídica, quando havia documentos nos autos comprovando. De se ressaltar, ainda, que a corretora pode ser considerada a "longa manus" da seguradora em relação ao consumidor, na forma do art. 34, do Código de Defesa do Consumidor, o que implica responsabilidade tanto da seguradora quanto da corretora, quanto ao produto ou serviço intermediado: "Art. 34. O fornecedor do produto ou serviço é solidariamente responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos." A condenação foi exemplar. Infelizmente a publicidade enganosa continuará vitimando os consumidores e só através da ação efetiva destes e das reclamações administrativas e judiciais será possível coibir a prática lesiva. Parabéns !

Huander Vieira vidraçeiro03/12/2013 12:04 Responder

bom dia a todos fiz um plano desse mas paguei umas parcelas e parei tem como eu receber o q eu paguei e como faço isso deste já agradeço dota ajuda possível....

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