STF nega quebra de sigilo bancário de empresa pelo Fisco sem ordem judicial

Para o ministro Celso de Mello, o Estado tem poder para investigar e fiscalizar, mas a decretação da quebra de sigilo bancário só pode ser feita mediante ordem emanada do Poder Judiciário

Fonte: STF

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Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) deu provimento a um Recurso Extraordinário em que a empresa GVA Indústria e Comércio S/A questionava o acesso da Receita Federal a informações fiscais da empresa, sem fundamentação e sem autorização judicial. Por cinco votos a quatro, os ministros entenderam que não pode haver acesso a esses dados sem ordem do Poder Judiciário.


O caso


A matéria tem origem em comunicado feito pelo Banco Santander à empresa GVA Indústria e Comércio S/A, informando que a Delegacia da Receita Federal do Brasil – com amparo na Lei Complementar nº 105/01 – havia determinado àquela instituição financeira, em mandado de procedimento fiscal, a entrega de extratos e demais documentos pertinentes à movimentação bancária da empresa relativamente ao período de 1998 a julho de 2001. O Banco Santander cientificou a empresa que, em virtude de tal mandado, iria fornecer os dados bancários em questão.


A empresa ajuizou o RE no Supremo contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que permitiu “o acesso da autoridade fiscal a dados relativos à movimentação financeira dos contribuintes, no bojo do procedimento fiscal regularmente instaurado”. Para a GVA, “o poder de devassa nos registros naturalmente sigilosos, sem a mínima fundamentação, e ainda sem a necessária intervenção judicial, não encontram qualquer fundamento de validade na Constituição Federal”. Afirma que foi obrigada por meio de Mandado de Procedimento Fiscal a apresentar seus extratos bancários referentes ao ano de 1998, sem qualquer autorização judicial, com fundamento apenas nas disposições da Lei nº 10.174/2001, da Lei Complementar 105/2001 e do Decreto 3.724/2001, sem qualquer respaldo constitucional.


Dignidade


O ministro Marco Aurélio (relator) votou pelo provimento do recurso, sendo acompanhado pelos ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso. O princípio da dignidade da pessoa humana foi o fundamento do relator para votar a favor da empresa. De acordo com ele, a vida em sociedade pressupõe segurança e estabilidade, e não a surpresa. E, para garantir isso, é necessário o respeito à inviolabilidade das informações do cidadão.


Ainda de acordo com o ministro, é necessário assegurar a privacidade. A exceção para mitigar esta regra só pode vir por ordem judicial, e para instrução penal, não para outras finalidades. “É preciso resguardar o cidadão de atos extravagantes que possam, de alguma forma, alcançá-lo na dignidade”, salientou o ministro.


Por fim, o ministro disse entender que a quebra do sigilo sem autorização judicial banaliza o que a Constituição Federal tenta proteger, a privacidade do cidadão. Com esses argumentos o relator votou no sentido de considerar que só é possível o afastamento do sigilo bancário de pessoas naturais e jurídicas a partir de ordem emanada do Poder Judiciário.


Já o ministro Gilmar Mendes disse em seu voto que não se trata de se negar acesso às informações, mas de restringir, exigir que haja observância da reserva de jurisdição. Para ele, faz-se presente, no caso, a necessidade de reserva de jurisdição.


Para o ministro Celso de Mello, decano da Corte, o Estado tem poder para investigar e fiscalizar, mas a decretação da quebra de sigilo bancário só pode ser feita mediante ordem emanada do Poder Judiciário.


Em nada compromete a competência para investigar atribuída ao poder público, que sempre que achar necessário, poderá pedir ao Judiciário a quebra do sigilo.


Divergência


Os ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ayres Britto e Ellen Gracie votaram pelo desprovimento do RE. De acordo com o ministro Dias Toffoli, a lei que regulamentou a transferência dos dados sigilosos das instituições financeiras para a Receita Federal respeita as garantias fundamentais presentes na Constituição Federal. Para a ministra Cármen Lúcia, não existe quebra de privacidade do cidadão, mas apenas a transferência para outro órgão dos dados protegidos.


Na semana passada, o Plenário havia negado referendo a uma liminar (Ação Cautelar 33) concedida pelo ministro Marco Aurélio em favor da GVA.

 

Palavras-chave: Quebra de sigilo; Decreto; Fisco; Ordem judicial; Investigação

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2 Comentários

wilson coelho Auditor Fiscal Estadual17/12/2010 11:53 Responder

Discordo do Ministro quando afirma que a quebra do sigilo, sem autorização judicial , ao ser pedida pela Receita Federal, coloca em risco a privacidade do cidadão uma vez que a sua divulgação, por qualquer meio de comunicação, geraria um Processo Administrativo Disciplinar que poderia levar o servidor à demissão. As informações continuariam sob sigilo e somente serviriam para elucidação de casos específicos já com processo administrativo em andamento, sustentado por fortes indícios (praticamente provas) de irregularidade fiscal. O que o Ministro afirma ser banalização do que a Constituição tenta proteger não procede, uma vez que a Carta Magna não foi escrita para proteger usurpadores de dinheiro público, na maléfica prática de sonegação, em explícito enriquecimento sem causa e às custas do erário público. O judiciário, atual e infelizmente, não está sendo considerado instituição com idoneidade suficiente para permitir acesso a essas informações, ainda que seja a bem do serviço público.

James advogado17/12/2010 13:03 Responder

Certíssimo o auditor fiscal Wilson Coelho. Após o descerramento dos bastidores do Poder Judiciário maior, no caso do banqueiro safado, a escuta da PF apenas comprovou o que os esclarecidos já sabiam. A Corte Maior julga de acordo com as suas conveniências financeiras, requerendo, por conta desta parcialidade e promiscuidade, uma reformulação no critério de escolhas dos seus ministros.

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