Palestra de lançamento do livro Reformar no Código de Processo Civil e implicações no Processo Trabalhista, de autoria de Helio Estellita Herkenhoff Filho

Helio Estellita Herkenhoff Filho é Analista Judiciário do TRT-17ª Região (gab. Juiz) , Ex-Professor da UFES.

Fonte: Helio Estellita Herkenhoff Filho

Comentários: (0)




Helio Estellita Herkenhoff Filho ( * )

Imaginem uma criança fazendo aquelas piscinas na praia. O mar teima em destruir um pouquinho os muros de areia. Enquanto estiver assim, aquela mãozinha que cobre os buracos é o direito constitucional e o mar é a política estatal. Ao mar revolto que destrói a piscina chamo de revolução a ensejar a construção de uma nova piscina em outro lugar, o que comparo à atuação do poder constituinte originário. A mão teria que ser outra, ou atuar de acordo com outras regras e a ele comparo o novo direito constitucional.

Foi isso que aconteceu com a CF/88. Ela rompe com a ditadura que veio até 1985.

Então, passa a existir o movimento de constitucionalização do direito que consiste em ver as regras de menor hierarquia sob o prisma daquelas previstas na Constituição Federal.

Essa Constituição atribuiu poderes ao Judiciário como o de julgar as ações envolvendo interesses coletivos em sentido amplo. Talvez esteja certo, ao menos em parte, o jurista Adroaldo Furtado quando diz que não foi o Judiciário que implantou a ditadura no país, justificando assim a necessidade de se atribuir mais poderes ao juiz.

É preciso insistir com o exemplo da piscina de areia. O Poder estatal é é exercido pelos agentes políticos. Poder é ação em certo sentido. Dizer que há um poder potencial é passar a mão na cabeça de imbecis. É a mesma coisa deu dizer para fulano que ele tem um grande potencial pela frente. pode ser encarado como elogio, mas não tem maior repercussão dizer isso, a não ser servir de incentivo para a ação que modifica. Não se está fazendo política quando se discute determinado tema em um boteco. Repito: quem faz política estatal são os agentes políticos - os que podem decidir que se deve agir assim ou assado.

A reforma do CPC de certa forma é concretização dos dizeres Constitucionais. Então não se pode pensar que o art. 285-A que diz que o autor pode tomar, de cara, uma sentença de improcedência quando o autor estiver litigando sem advogado. Entretanto, não se pode dizer que há violação do princípio do contraditório quando esse autor recebe a sentença de improcedência, pois o réu sai vencedor nesse caso. Acho difícil ele impetrar um mandado de segurança para reclamar dessa situação.

O juiz aplica esse artigo se aceitando os fatos narrados pelo autor ainda assim entender que a lei aplicável não lhe socorre. Mas, há casos e casos. Deve-se verificar se o dispositivo legal tem sentido indeterminado, se a versão narrada na exordial está clara, entre outros fatores.

Outro tema que a reforma do CPC tratou foi a implantação do que atende pelo nome de súmula impeditiva de recurso. é o seguinte: se o juiz tiver aplicado súmula do STJ ou do STF poderá não receber o recurso.

Veja a questão do poder atribuído ao juiz novamente presente. O juiz não está obrigado a agir assim. Isso dependeria de alteração na Constituição. Mas, como não se declara a inconstitucionaliade de uma regra se ela puder ser aproveitada de algum jeito, temos que a súmula impeditiva atribui apenas mais um poder de direção do processo ao juiz. E não se assustem, pois a coluna vertebral do processo é a prova e o juiz pode indeferir provas, desde que impertinentes. Mas, a "bandinha da inconstitucionaliade" já está tocando!

Ambos dispositivos são aplicáveis na Justiça do trabalho. No caso do art. 285-A, porque seria inutilidade marcar a audiência. Evidente que terá que ser feita adaptação administrativa no sentido de que certos feitos sejam levados diretamente ao juiz, antes da notificação da reclamada.

No caso da súmula: é só pensar que o TST está para o STJ assim como o recurso especial para o recurso de revista.

Sobre a decretação de oficio entendo aplicável também na Justiça do Trabalho. Uma das idéias que motivaram a alteração é matar o processo no primeiro grau, em caso de omissão do réu (na verdade de seu advogado) em primeiro grau, pois permite-se que alegue a prescrição originalmente no tribunal. Então evita-se esse percurso até o tribunal, sendo certo que isso é válido ao menos quando todas as verbas pedidas estão prescritas ou quando apenas parte delas, pois nesse caso a instrução é facilitada.

Devo dizer que não sei bem o conteúdo do justo nesse caso da decretação da prescrição de ofício, se houve mais ênfase na questão da eficiência ou se pensou-se também na questão de que o advogado é que se omite em alegar, arcando o empregador com o pagamento ( na verdade, ex-empregador, pois certamente dispensará o empregado, se tiver que pagar certa verba no período de 20 anos, quando, se o advogado alegasse a prescrição pagaria durante os últimos 5 anos. De todo modo, é bom deixar claro que a prescrição nunca foi matéria de ordem pública, pois antes da consumação do prazo de exigibilidade do direito não se permitia a renúncia à prescrição. Ou seja, não era matéria que ficava ao dispor das partes nas suas relações contratuais.

Vou terminar falando um pouco da execução. Um pouco mesmo em respeito à diversidade da platéia.

Primeiro a multa de 10%. Não há em lugar nenhum do CPC que haverá uma intimação específica para o devedor pagar, sob pena de incidir a multa. Tem gente que defende esse entendimento (da intimação específica) dizendo que de outro modo se violaria o direito à ampla defesa. Calma aí. Alto lá. Na execução o devedor no CPC era intimado para pagar ou nomear bens em 24 horas, sob pena de penhora. E na Justiça do Trabalho para recorrer é preciso fazer o depósito recursal, ou seja, a necessidade de contato com o cliente para que arrume o dinheiro a fim de que cumpra a exigência não cola, se o prazo da multa em questão é de 15 dias!.

A multa incide desde que exigível o crédito consignado na decisão, ou seja, desde que ocorra o trânsito em julgado ou em caso de recurso sem efeito suspensivo (no primeiro caso o prazo conta-se depois de expirado o prazo para recorrer, pois não se pode pensar de outro modo se a sentença tem seus efeitos até então suspensos - não há exigibilidade no prazo do recurso).

Opa! No CPC recurso não tem efeito suspensivo, mas, apenas, em casos listados no art. 520 desse diploma legal. Na Justiça do Trabalho, não. Ou seja, a regra é o recurso Ter apenas efeito devolutivo, de modo que a sentença surte efeitos mesmo se houver recurso na seara trabalhista.

Fica assim: desde que exigível o crédito incide a multa, de modo que se o advogado do devedor for intimado da decisão sem efeito suspensivo, passa a ser devido o seu valor.

Observe, assim, que não é preciso dizer que o processo do trabalho é sincrético para aplicar esse meio de coersão, esse meio de se provocar o devedor a cumprir seu dever, ainda sem o uso de meios de subrrogação.

É preciso dizer que não é necessário lei específica para aplicar a multa na Justiça do Trabalho, pois recai sobre bens patrimoniais e não sobre a pessoa do devedor (não incide o princípio da reserva legal com a intensidade pensados por alguns doutos). A incidência automática também afasta a necessidade de uma fase de cumprimento, com intimação específica que impediria a aplicação da multa aqui na Justiça do Trabalho.

A adaptação no processo do trabalho: é direito do devedor ser citado para pagar ou nomear bens a penhora. Tá na CLT. Estão a multa que incidiu automaticamente, lá trás, ficará com efeito suspensivo até expirar o prazo de 48 horas que a CLT dá ao devedor para pagar ou nomear bens. Isso estará sendo feita em carta de sentença, ante o recurso ordinário interposto. Mas, veja, tem gente que diz que o prazo é esse mesmo, mas por fundamento diverso. Aqui eu digo que a multa incide automaticamente, ficando sob efeito suspensivo.

Agora vamos a outra questão. No CPC como há processo sincrético há o incidente de impugnação à execução ou seja, o processo origina-se com a proprositura da demanda em que se faz o acertamento do direito e terminará com a entrega do dinheiro, inclusive em certos casos de execução provisória.

Na CLT continua a existir processo autônomo de execução, pois o devedor deverá ser citado para pagar ou nomear bens. A citação é o ato pelo qual se chama o devedor para essa finalidade, passando a compor novo processo destinado a realizar aquele direito enunciado na sentença condenatória (espécie de executiva lato sensu). O mais comum é ele garantir a execução com bens que não seja o dinheiro em espécie. Se fizer isso, não haverá multa de 10%. O oficial de justiça elabora o documento que comprova a penhora do bem e o devedor terá 5 dias para embargar à execução. Se não nomear bens nem pagar o Oficial faz a penhora por conta própria considerando a multa de 10%.

Esses embargos do devedor poderão não ter efeito suspensivo, da mesma forma que ocorre com a impugnação à execução no CPC. Vejam que não há norma na CLT dizendo que os embargos têm efeito suspensivo. Em se tratando de execução definitiva, os embargos serão processados em apartado, e a execução continuará como no CPC, nos autos principais, entregando-se no final o dinheiro ao devedor, mesmo existindo recurso contra os embargos do devedor - agravo de petição não transforma em provisória a execução novamente (só se pendente R.O é que tem-se execução provisória). Com o julgamento dos embargos ou do agravo de petição contra essa decisão, a carta de sentença (autos apartados) desce, mas a execução não parou por conta dos embargos.

Em se tratando de execução provisória temos que pensar em uma questão, qual seja, está dito na CLT que a execução, nesse caso, só vai até a penhora.

Primeiro é preciso dizer que os embargos no caso de execução provisória serão processados numa Segunda carta de sentença.

Eu diria que é um absurdo dizer que em processo regido pelo CPC onde chegam conflitos entre comerciantes aplica-se essa possibilidade de não suspender a execução, processando a impugnação em apartado, e que isso não se aplica no processo do trabalho em relação aos embargos do devedor. Repito: o que distingue o direito da política é a justiça ou o justo e essa palavra pode ter seu conteúdo preenchido de dois modos: 1- privilegiando a liberdade, o livre mercado, a rapidez desejada pelo mercado, ou seja, vendo apenas a eficiência; 2- ou a partir do princípio da dignidade da pessoa humana.

Mais que isso, repito: a CF/88 rompeu com a ditadura. Deve-se pensar em Estado de direito democrático, de modo que o princípio da isonomia deve nos orientar, sendo certo que a não aplicação analógica conduziria a tratar de modo desigual aqueles que vivem do trabalho em relação aos que vivem de renda, mas para aumentar a desigualdade, ou seja, essa visão leva a tudo que a CF/88 não quer.

Sendo assim, processam-se os embargos do devedor em apartado, sem suspender a execução (definitiva), se houver grande chance desses embargos não prosperarem. No caso do CPC é se houver grande chance da nova impugnação à execução não prosperar.

Em certos casos mesmo em se tratando de execução provisória (que na Justiça do trabalho serão processsados em uma Segunda carta de sentença) pode-se entregar o dinheiro ao devedor, como se houver grande chance do recurso do reclamado (o RO da decisão que disse que o empregado tinha direito a certas verbas) não prosperar e a execução envolver valor de até 60 salários mínimos com prova da necessidade (digamos que reclamante encontra-se desempregado). Outra possibilidade de entrega do dinheiro e nesse caso sem o limite dos 60 salários é se houver agravo contra recurso de revista com grande chance de esse recurso de revista não prosperar.

Claramadrei em passagem de um de suas obras disse que um bibliófilo encontrou num livro velho uma mariposa seca. O mestre italiano, então, inovoca os operadores do direito no sentido de que pensem que nos autos velhos não existe apenas um monte de papel. Ali tem gente. É a visão de justiça preenchida com o princípio da dignidade humana bem casada com o princípio da eficiência, da necessidade de celeridade processual e de um processo efetivo, que preste a tutela entregando ao jurisdicionado o bem da vida que lhe é devido.

Obrigado.


Notas:

* Helio Estellita Herkenhoff Filho é Analista Judiciário do TRT-17ª Região (gab. Juiz), Ex-Professor da UFES. [ Voltar ]

Palavras-chave:

Deixe o seu comentário. Participe!

noticias/palestra-de-lancamento-do-livro-reformar-no-codigo-de-processo-civil-e-implicacoes-no-processo-trabalhista-de-autoria-de-helio-estellita-herkenhoff-filho

0 Comentários

Conheça os produtos da Jurid