Os efeitos do indeferimento ou cassação de registro de candidatura de candidato eleito via ação de impugnação de registro de candidatura

Jorge Umbelino da Silva, Acadêmico de Direito do 8º período do curso de Direito.

Fonte: Jorge Umbelino da Silva

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Jorge Umbelino da Silva ( * )

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como objetivo, analisar os efeitos produzidos pelo indeferimento ou a cassação do registro de candidato via Ação de Impugnação de Registro de Candidatura, após a eleição de candidato impugnado, abordando temas polêmicos do ponto de vista legal, doutrinário e jurisprudencial, e confrontando opiniões das mais diversas sobre o assunto.

DESENVOLVIMENTO

Há pouco mais de um mês, o Brasil passou por mais uma de suas conquistas quanto aos seus ideais de Estado Democrático de Direito. Em 5 (cinco) de outubro de 2008, o povo foi mais uma vez às urnas para escolher seus representantes através do voto direto e secreto, compreendido assim pelo "sufrágio", que no dizer do Alexandre de Morais "é um direito publico subjetivo de natureza política, que tem o cidadão de eleger, ser eleito e de participar da organização e da atividade do poder estatal". O Pleito eleitoral neste ano de 2008 restringiu-se, na esfera municipal, à escolha dos prefeitos municipais e seus vices, bem como de vereadores, poder executivo e legislativo respectivamente.

No processo eleitoral brasileiro, não muito de diferente de outros países em que impera o regime democrático, os candidatos passam por uma espécie de processo que os habilita a serem regularmente votados. É o processo de Registro de Candidatura. Os cidadãos que desejam pleitear um cargo público eletivo, devem preencher requisitos dispostos na Constituição Federal e na lei eleitoral brasileira, para assim poderem concorrer e serem eleitos. Para o grande jurista Joel José Cândido "O registro de candidato se constitui em etapa jurisdicional dentro da fase preparatório do processo eleitoral."

Como dito acima, as condições para elegibilidade (capacidade eleitoral passiva de ser votado e eleito para algum cargo publico, sob determinados requisitos) estão expressas no art. 14, mais precisamente no §3º da Carta Política de 1988. Todavia, existem comandos constitucionais que impedem o acesso do cidadão à participação nos órgãos do governo, mediante impedimentos às suas candidaturas. Esses comandos constitucionais são chamados de inelegibilidades, que consistem na ausência de capacidade eleitoral de ser votado, ou seja, um obstáculo à candidatura.

A Constituição Federal estabelece diversos casos de inelegibilidade em seu artigo 14, §§ 4º à 7º, e permite que lei complementar discorra também sobre o assunto, que é o caso da Lei Complementar 64/90, chamada de lei das inelegibilidades. Os impedimentos podem ser absolutos, que restringem a capacidade eleitoral para qualquer cargo, ou relativos, que se relacionam às características pessoais do que pretende concorrer ao cargo publico.

A lei também disponibiliza instrumentos processuais de restrição à candidatura do cidadão que não atenda aos requisitos exigidos pela legislação. Podem ser encontrados no Código Eleitoral Brasileiro, e na Lei das Inelegibilidades.

Nesta eleição de 2008, o Tribunal Superior Eleitoral publicou a Resolução nº 22.717, que dispõe sobre escolha e registros de candidatura. A partir do artigo 20, a resolução começa a tratar especificamente dos registros de candidato e também discorre sobre todo o processamento do pedido de registro.

Agora imaginemos que determinado cidadão não atende aos requisitos da lei para concorrer ao pleito eleitoral e pede seu registro de candidatura? O instrumento processual criado pela Lei Complementar 64/90 em seu artigo 3º, caput, chamado de AIRC - Ação de Impugnação de Registro de Candidatura, encontra-se também previsto na Resolução 22.717, em seu artigo 39, "Caberá a qualquer candidato, a partido político, a coligação ou ao Ministério Público, no prazo de 5 dias, contados da publicação do edital relativo ao pedido de registro, impugná-lo em petição fundamentada.

O Artigo 39 da Resolução, legitima qualquer candidato, partido político, coligação ou o Ministério Publico Eleitoral à ingressar com a AIRC, visando assim impugnar a candidatura do indivíduo inapto. Cabe esclarecer a forma como deve ser interpretada a letra da lei, quanto à possibilidade de qualquer partido político poder impugnar a candidatura do individuo. O partido político coligado, de acordo com o jurista Djalma Pinto, não pode isoladamente intentar AIRC. "Pacificou-se, na jurisprudência, o entendimento de que o partido político integrante de coligação não pode isoladamente impugnar registro de candidatura. A legitimidade passa a ser da coligação (Lei n.º9.504/97, art. 6º, § 1º, e Resolução TSE n.º 21.608/2004, art. 4º,§ 2º)." (Pinto, Djalma. Direito Eleitoral. Editora Atlas. Página 178)"

A jurisprudência é uníssona nesse caso;

"REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO. IMPUGNAÇÃO. PARTIDO COLIGADO. IMPOSSIBILIDADE. (...) INELEGIBILIDADE AFASTADA. REGISTRO MANTIDO. RECURSO IMPROVIDO. (...)

O partido político coligado não tem legitimidade para atuar isoladamente perante a Justiça Eleitoral (...).

Recurso conhecido porém improvido." (TSE, RRC 11082, Relator FELIX FISCHER, DJ 13.06.2008).

Entretanto, o enfoque a ser dado no presente, são os efeitos da declaração de inelegibilidade via Ação de Impugnação de Registro de Candidatura. Como o próprio nome da ação já nos faz imaginar, a declaração de inelegibilidade provocada pela AIRC é o indeferimento ou a cassação do registro, se já obtido, do candidato impugnado, impedindo que ele concorra às eleições, hipótese em que a coligação ou o partido político poderá substituir o indivíduo que teve sua candidatura negada.

Cabe ressaltar que a legislação eleitoral que trata da matéria, abre precedente para que o indivíduo que tenha sua candidatura impugnada recorra e continue concorrendo por sua conta em risco, conforme artigo 43.da resolução 22717 do TSE "O candidato que tiver seu registro indeferido poderá recorrer da decisão por sua conta e risco e, enquanto estiver sub judice, prosseguir em sua campanha e ter seu nome mantido na urna eletrônica, ficando a validade de seus votos condicionada ao deferimento de seu registro por instância superior.

Como podemos observar, o objetivo do interessado que propõe a AIRC, é de ver o pretenso candidato com seu registro impugnado, não concorrendo assim às eleições. "A impugnação do Registro de Candidatura como o próprio nome já indica, visa à evidencia, impedir que o impugnado obtenha o registro de sua candidatura que requereu à Justiça Eleitoral." (CANDIDO, Joel José. D.Eleitoral Brasileiro. 11º Edição. Pág. 135. 2005. Ed. Edipro.)

O trâmite da AIRC é muito célere, porém pode ocorrer que haja demora no julgamento da ação e o candidato inapto concorra ao pleito e seja eleito, mesmo não preenchendo os requisitos legais de elegibilidade. Surge então a grande discussão. Se o objetivo da AIRC é impugnar o registro do candidato para que ele seja impedido de concorrer às eleições, o que fazer com o candidato que atravessou o pleito eleitoral, foi eleito e posteriormente teve seu registro indeferido ou cassado?

O artigo 43 da Resolução 22.717 do TSE, diz que a validade dos votos fica condicionada ao deferimento do registro por instância superior. A melhor interpretação deste artigo nos faz pensar que os votos obtidos pelo candidato sem registro, sejam nulos, e é exatamente isso! Porém, uma hermenêutica mais aprofundada nos levaria a crer que tais votos, poderiam ser considerados como inexistentes uma vez que atribuídos à candidato também inexistente no mundo jurídico, pois só é efetivamente candidato, quem possui o registro de candidatura, caso contrario, seria contraditório considerar um cidadão sem registro como candidato, uma vez que a legislação estipula um detalhado trâmite processual para o seu deferimento.

Novamente o festejado mestre Joel J. Cândido nos ensina que "Registrados, os candidatos assumem uma condição em caráter oficial, terminando aqui o que politicamente se convencionou chamar de 'candidato a candidato.'"

Sustentamos assim a inexistência de candidatura do indivíduo sem registro, porém, ao mesmo tempo descartamos a tese de inexistência dos votos obtidos por ele, pois não se trata de via de conseqüência. Os votos existiram, pois emanaram de indivíduos com capacidade eleitoral ativa, foram dados por eleitores regularmente alistados e em pleno gozo de seus direitos políticos.

O Art. 150 da Resolução 22.712 do TSE, determina que;

"Art. 150. Serão nulos para todos os efeitos os votos dados a candidatos inelegíveis ou não registrados, assim considerados aqueles que, no dia da votação, não possuírem registro, ainda que haja recurso pendente de julgamento, hipótese em que a validade do voto ficará condicionada à obtenção do registro."

Em uma interpretação teleológica, entendemos que o artigo supracitado, considera nulos de pleno direito, os votos dados à candidatos inelegíveis ou não registrados. Significa dizer que tais votos, são nulos independentes da forma como fora obtidos, ou seja, os votos dados à pessoas impedidas ou sem registro são votos sem valor algum, pois atribuídos a um "ninguém" no mundo jurídico eleitoral. "A condição de candidato oficial só se adquire com o registro" (CANDIDO, Joel José. D.Eleitoral Brasileiro. 11º Edição. pág. 97. 2005. Ed. Edipro.)

Mas qual a conseqüência de tal entendimento? Ora, se os votos são nulos de pleno direito, não poderiam assim serem computados como votos válidos no resultado do pleito. Destacamos que com o transito em julgados da decisão que impugnou a candidatura do individuo, é claro. O efeito prático que muitos tribunais estão aplicando, é a declaração de nulidade dos votos atribuídos ao candidato inexistente. Prática que acreditamos ser totalmente descabida de fundamento jurídico, pois os votos, de acordo com o artigo 150 da Resolução 22712 do TSE, já são nulos de pleno direito, não podendo assim a Justiça Eleitoral, anular o que já nulo.

Imaginemos que determinado individuo sem registro, disputou o cargo de prefeito e foi eleito com uma porcentagem de mais de 50% dos votos "válidos", de acordo com o entendimento dos tribunais, seria aplicado o artigo 224 do Código Eleitoral,
" Art. 224. Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos no País nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias."

O tribunal anularia os votos do indivíduo e marcaria dia para nova eleição. Todavia, tal procedimento, acreditamos ser errôneo, pois o artigo 224 do Código Eleitoral, só poderia ser aplicado nos casos em que os votos foram obtidos por meio das práticas ilícitas, como o caso do artigo 41-A da lei 9504/97, abuso de poder e captação ilícita de sufrágio. Nesse caso, o tribunal deve efetivamente anular os votos obtidos pelo candidato, pois os votos que foram atribuídos à ele, foram válidos, porém maculados pela prática de abuso de poder ou captação de sufrágio, e recaem na interpretação desejada pelo legislador.

O artigo 224 do CE, não se aplica ao presente caso, pois trata-se exatamente da nulidade absoluta da votação, e não dos votos nulos apurados, atribuídos a determinado candidato, diga-se de passagem, votos inválidos desde a sua nascença, levando-se em consideração que o pleito realizado tenha sido regular, válido, tendo sidos apurados validamente todas as urnas apuradoras não cabe a anulação da eleição e consequentemente a realização de uma nova.

Sustentamos assim a que aplicação do artigo 175 §3º do CE "Serão nulos, para todos os efeitos, os votos dados a candidatos inelegíveis ou não registrados.", não importa em anulação da votação, mas apenas dos votos dados a candidatos sem registro. Assim "indeferido o registro do candidato, fica ele impedido de valer-se do resultado das eleições, sem prejuízo do processo eleitoral como um todo."(Acórdão 3.005 Ag.Rel. Min. Sepúlveda Pertence.)

O brilhante advogado Dr. Silvio Abreu, participante da comissão elaboradora da lei nº 9504/97 - Lei das Eleições, em estupenda atuação junto ao TRE/MG no RE nº282/2005, sustentou o seguinte: "O legislador, como disse, se tivesse a antevissão ou a premonição, teria estatuído de forma bem clara que dispositivo do art. 175, que é o mote da questão ora em debate, representa ou destina-se efetivamente àqueles candidatos inelegíveis ou àqueles candidatos sem registro que realmente macularam o processo de votação em termos meramente procedimentais. Por que, sem registro ou inelegíveis, evidentemente estariam sem a menor chance de algum dia serem guinados ao cargo postulado."

Desta forma, a nulidade dos votos não pode ser plena, não pode atingir toda a eleição. No caso em tela, somente o candidato não registrado, ou com o registro cassado foi quem deu causa à nulidade de seus votos. Há corrente doutrinária que acredita ser a perda do registro uma punição, o que na verdade é! Sendo então uma punição, esta não pode ter seus efeitos destinados à votação, ao processo eleitoral em si, aos demais candidatos que concorreram de forma lídima e honesta, nem muito menos aos eleitores que compareceram às urnas, deve ser destinada somente ao infrator.

No caso do indivíduo, que inexistente como candidato no mundo jurídico, concorreu e foi eleito como prefeito, por exemplo, tem seus votos nulos de pleno direito, não podendo a Justiça Eleitoral anula-los, pois só se podem anular votos válidos. Neste caso, os votos já nasceram nulos. O próprio artigo 150, dispõe que a validade dos votos ficam condicionados à obtenção do registro, ou seja, como os votos nasceram inválidos, caso seja o registro negado, continuam inválidos como já surgiram, impossibilitando assim a aplicação do artigo 224 do CE.

CONCLUSÃO

Tendo em vista o que foi amplamente abordado e levando em consideração o caso acima exemplificado, resta-nos concluir que ao caso concreto, a conduta correta a ser tomada seria a aplicação do disposto no artigo 3º da Lei nº 9504/97, diplomando-se aquele que tenha obtido o maior numero de votos depois do candidato cassado, ou seja, o segundo colocado, na medida em que a sanção da lei ao candidato que concorreu sem registro implica em uma reprovação unicamente pessoal, independentemente de sua votação.

Chaval/CE, 10 de novembro de 2008.

BIBLIOGRAFIA:

CANDIDO, Joel José. D.Eleitoral Brasileiro. 11º Edição. 2005. Ed. Edipro.

PINTO, Djalma. Direito Eleitoral. Editora Atlas.

MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 19º Ed. São Paulo. Atlas, 2006.

Recurso Eleitoral Nº 282/2005 - Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Minas Gerais.

Resolução nº 22.717 do Superior Tribunal Eleitoral - Brasília.

Resolução nº 22.712 do Superior Tribunal Eleitoral - Brasília.


Notas:

* Jorge Umbelino da Silva, Acadêmico de Direito do 8º período do curso de Direito. [ Voltar ]

Palavras-chave: cassação

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