Obrigação alimentar e o descabimento de sua atualização pelo IGP-M

Maria Berenice Dias, Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM. Site: www.mariaberenice.com.br

Fonte: Maria Berenice Dias

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Maria Berenice Dias ( * )

Recentes decisões das 7ª e 8ª Câmaras Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, proferidas em ações revisionais de alimentos alteraram, de ofício, o índice de correção da obrigação alimentar. Fixados os alimentos em salários mínimos, e independentemente de solicitação de qualquer das partes, o valor dos alimentos passou a ser estipulado em importância certa em dinheiro e determinada sua atualização anual pelos índices do IGP-M.

A mudança é levada a efeito mesmo sem a comprovação da forma de correção dos ganhos do devedor. Independente da profissão do alimentante e da origem de sua renda, não é sequer questionada a ocorrência de descompasso de seus rendimentos com a valoração do salário mínimo. A intenção é garantir a equalização do valor dos alimentos para o futuro e, com isso, evitar novas demandas. Seja qual for o fundamento da ação, como, por exemplo, o nascimento de outro filho, vem desencadeando a automática mudança do índice de correção.

Talvez o mais inusitado seja o fato de que tal alteração ocorre até quando é o credor quem recorre ao Tribunal. Ou seja, manejado recurso pelo alimentado pleiteando a majoração dos alimentos, o índice de atualização do encargo é alterado, adotando-se outro que lhe é desfavorável. De modo claro trata-se de uma reformatio in pejus, o que é vedado pelo sistema jurídico pátrio.

Um dos fundamentos de tais julgados é que o reajuste do salário mínimo supera os índices da inflação. Porém, não se pode olvidar que durante décadas o salário mínimo perdeu seu poder de compra e sempre foi reajustado bem abaixo da inflação. Somente nos últimos anos a atual política governamental vem buscando assegurar sua valorização. Os dois últimos Presidentes da República, com forte comprometimento de ordem social, procuraram recuperar o seu valor. Ainda assim, não atende à sua finalidade constitucional, de ser capaz de atender às necessidades vitais básicas do trabalhador e de sua família, como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social. (C. F., art. 7º, IV).

Para superar o hipotético descompasso entre o valor dos alimentos fixados em salários mínimos e os rendimentos do alimentante foi eleito como índice de atualização o IGP-M. No entanto, se a intenção é corrigir o encargo pelo índice de inflação, dito indexador é o menos indicado, porquanto não mede a evolução do poder de compra dos itens que compõem a pensão.

O IGP-M é calculado com base em índices que levam em consideração elementos alheios às despesas que custeiam os alimentos. São eles:

- 60% do IPA (Índice de Preços do Atacado), que mede o preço de 431 produtos do atacado, sem relação imediata com o consumidor final.

- 30% do IPC (Índice de Preços ao Consumidor), que consiste na pesquisa de preços de 388 produtos no eixo Rio-São Paulo e apura a inflação diretamente das famílias que ganham de 1 a 33 salários mínimos.

- 10% do INCC (Índice Nacional da Construção Civil), que mensura a variação de preços de materiais de construção e de mão-de-obra, destinando-se primordialmente à atualização dos contratos de construção civil.

Não se pode descartar outro fato. O ajuste de valores por indicador econômico depende de cálculos matemáticos de certa complexidade. Assim, se o alimentante foi condenado, em julho de 2005, a pagar alimentos de R$ 1.000,00, com correção anual pelo IGP-M, para calcular o valor da pensão, deverá ou consultar um contador ou encontrar jornais onde constem os índices de até um ano atrás. Pode ainda acessar a Internet, que o leva ao Manual da FGV, o qual explica - em treze páginas - como efetuar a atualização.(1) Assim, após identificar o índice anual, que foi de 1,20%, precisará fazer o seguinte cálculo:

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