Juristas e governos divergem sobre uso da ação civil pública
Projeto em análise da Câmara amplia a possibilidade de julgamento em massa de questões idênticas, mas governo resiste à aplicação dessa sistemática a processos sobre tributos, benefícios previdenciários e FGTS.
Projeto em análise da Câmara amplia a possibilidade de julgamento em massa de questões idênticas, mas governo resiste à aplicação dessa sistemática a processos sobre tributos, benefícios previdenciários e FGTS.
A proposta de novo marco legal para os processos judiciais coletivos (PL 5139/09, do Executivo, que está em discussão na Câmara) reacendeu a polêmica sobre o uso da ação civil pública (ACP) para discutir a legalidade de tributos, o reajuste de benefícios previdenciários e os direitos relativos ao FGTS.
Ao proibir o uso da ACP nessas questões - que provocou condenações bilionárias contra o poder público nos últimos anos -, o projeto promove um retrocesso do ponto de vista social, na avaliação de alguns especialistas.
A restrição não aparecia no anteprojeto elaborado por uma comissão de juristas, mas foi incluída pelo governo no texto do PL 5139/09. O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou que a restrição ao uso de ACP em relação aos tributos é constitucional, mesmo com forte oposição do Ministério Público e de setores do próprio Judiciário.
Uma emenda apresentada ao projeto pelo deputado José Genoíno (PT-SP), a pedido do Ministério Público da União, suprime a proibição.
Substitutivo
A proposta tramita em caráter conclusivo na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ). O relator, deputado Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ), afirmou que vai apresentar um substitutivo ainda neste mês. "Falta concluir apenas alguns detalhes", afirmou.
O deputado evitou, porém, antecipar o seu entendimento. "Já tenho minha posição. No momento oportuno, vou apresentá-la", disse.
Mudança "para pior"
O juiz federal e professor de Direito Processual Civil Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, integrante da comissão de juristas que elaborou a proposta, afirma que, na versão original do projeto, a ACP poderia versar sobre questões relacionadas a tributos, a benefícios previdenciários e ao FGTS.
"O anteprojeto acabou sofrendo algumas modificações feitas às pressas na hora do envio à Câmara. A impressão generalizada é que acabaram não contribuindo com o texto", afirma. De acordo com ele, restringir a ação civil pública é um erro.
O principal objetivo da proposta, segundo Castro Mendes, seria universalizar o acesso à Justiça e desafogar o Judiciário. Porém, na avaliação dele, manter aquelas questões na antiga sistemática de ações individuais significa ir na contramão dessa meta.
Ele argumenta que, nesse aspecto, o projeto ficou pior que a legislação em vigor. Isso porque foi proposta a ampliação das questões que podem ser discutidas por meio de ação civil pública, mas, em compensação, foi retirado um benefício hoje assegurado aos autores da ação coletiva. Quando a ACP é julgada improcedente, são prejudicadas apenas as pessoas que tiverem participado do processo. Porém, o projeto estabelece que o resultado negativo passará a atingir todos os participantes da ação.
"Na atual sistemática, o governo ganha mas não leva em ação civil pública, porque as pessoas podem continuar ajuizando ações individuais. De agora em diante [se o projeto for aprovado], a ação coletiva passará a ser muito interessante para o poder público", alerta.
Se fosse possível debater em ACP uma questão tributária e se a Fazenda Pública vencesse uma demanda, os contribuintes não poderiam continuar debatendo a mesma matéria em juízo, por causa do princípio da coisa julgada.
Íntegra da proposta: PL-5139/2009