Especialistas veem presidente Dilma Rousseff obstruindo a Justiça, outros questionam grampos

Parte deles considera haver elementos que configuram um crime de responsabilidade cometido pela presidente da República. Outros questionam a legalidade das gravações e pedem cautela.

Fonte: Folha de S.Paulo

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Especialistas em direito ouvidos pela Folha divergem sobre os efeitos jurídicos da conversa que mostra a presidente Dilma falando da entrega do termo de posse de ministro ao ex-presidente Lula.


Parte deles considera haver elementos que configuram um crime de responsabilidade cometido pela presidente da República. Outros questionam a legalidade das gravações e pedem cautela.


Ao defender que Dilma estaria obstruindo a atuação da Justiça, advogados constitucionalistas afirmam que ela infringiu dois incisos do artigo 85 da Constituição, que classificam como crime de responsabilidade atos da presidente da República contra o livre exercício do Legislativo, do Judiciário, do Ministério Público e dos poderes constitucionais das unidades da Federação; e contra a probidade na administração.


Eles avaliam ainda que a presidente também desrespeitou um dos artigos da lei 1.079, de 1950, que diz ser crime de responsabilidade "opor-se diretamente e por fatos ao livre exercício do Poder Judiciário, ou obstar, por meios violentos, ao efeito dos seus atos, mandados ou sentenças".


Citando a Constituição e a lei de 1950, o professor de direito constitucional Ricardo Glasenapp considera que Dilma "cometeu crime de responsabilidade duas vezes".


"Quando a presidente nomeia Lula no momento em que ele pode se tornar réu em um processo, ela também está cometendo crime de improbidade administrativa."


O jurista Ives Gandra Martins vai na mesma linha. "É um desvio de finalidade fundamental, mostra que você administra o serviço público para os amigos", disse.


Como ministro, Lula teria foro privilegiado, e só poderia ser julgado pelo STF. "No Supremo tudo anda mais lentamente. Ela está dando uma proteção maior", afirmou.


Os investigadores da Lava Jato interpretaram o diálogo como uma tentativa de Dilma de evitar eventual prisão de Lula. Se houvesse um mandado do juiz, de acordo com essa interpretação, o ex-presidente apresentaria o termo de posse como ministro e, em tese, ficaria livre da prisão.


O ex-ministro do Supremo Carlos Velloso disse ver indícios de que "há uma obstrução em curso", embora defenda que a conversa seja analisada "com vagar" pelo Ministério Público. "Por que um termo de posse seria assinado sem a presença do empossado? Está me parecendo muito irregular", disse.


O professor de direito da FGV Rio Joaquim Falcão também diz que a presidente mostrou na gravação estar atuando pela "obstrução de Justiça" e com "falta de decoro".


"A presunção de inocência era a favor de Dilma, ela não teria até então cometido nenhum ato que justificasse o impeachment. Agora, não existe mais. Existem indícios que derrubam essa presunção de inocência. Encontraram o fato", disse Falcão.


PROVA ILÍCITA


Na contramão dos argumentos de crime de responsabilidade, outros especialistas em direito questionam a legalidade das gravações.


"Quem teria determinado esse grampo? Começamos por aí, seria uma prova ilícita?", questionou o ministro do STF Marco Aurélio Mello. "Temos que aguardar primeiro para constatar a veracidade desses áudios e, segundo, as instituições atuarem e percebermos as consequências, se foi um fato verídico."


O constitucionalista Pedro Serrano disse que, a partir do momento em que a interceptação telefônica "pega" a presidente, o juiz Sergio Moro "deveria enviar tudo imediatamente ao STF e nada mais despachar no processo".


"Ele não poderia liberar o sigilo. Quem tinha que decidir isso era o Supremo."


Serrano considera "grave" o fato de as gravações atingirem o advogado de Lula. "Vulnerabilizaram a defesa do Lula, acabaram com qualquer possibilidade de defesa. A acusação ouviu a defesa dele, todas as estratégias. Não dá mais para reconhecer esse processo como legítimo."


O jurista Gilson Dipp não quis se manifestar sobre a gravação. Afirmou, contudo, que "em tese, a interceptação telefônica é obtenção de prova através de um meio altamente invasivo" e enxerga a divulgação da gravação como "preocupante". "Deve ser usada com a cautela devida."


Maurício Vasques, criminalista que atua Lava Jato, classifica o grampo como irregular. "Depois de tudo que fizeram com Lula nos últimos dias, gravar ele agora, me parece muito mais para produzir novas provas do que para ter elementos na investigação."


O QUE DIZEM OS ESPECIALISTAS


A gravação mostra que Dilma cometeu crime?


Sim


> Dilma teria infringido os incisos 2 e 5 do artigo 85 da Constituição, que classificam como crime de responsabilidade:


- atos da presidente da República contra o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;


- a probidade na administração


> Alguns especialistas em direito também afirmam que Dilma teria descumprido o artigo 6º da lei nº 1.079/1950, que classifica como crime de responsabilidade "opor-se diretamente e por fatos ao livre exercício do Poder Judiciário, ou obstar, por meios violentos, ao efeito dos seus atos, mandados ou sentenças"


Não


Outros especialistas afirmam que, como no momento do áudio o convite para Lula ser ministro já havia sido feito e aceito, não há como se falar em fraude


A abertura do sigilo da gravação pode comprometer a investigação?


Sim


> Advogados afirmam que, assim que uma pessoa com foro privilegiado surgiu nas interceptações telefônicas, o juiz Sergio Moro deveria ter encaminhado o material em sigilo ao Supremo


> Profissionais ouvidos pela Folha lembram ainda que um dos advogados de Lula, Roberto Teixeira, também foi grampeado, o que fere o amplo direito à defesa do ex-presidente


> O ministro do STF Marco Aurélio Mello colocou em dúvida a própria existência do grampo: "Quem teria determinado esse grampo? Começamos por aí, seria uma prova ilícita?"


Não


> Outros dizem, porém, que uma coisa é a prova ser obtida por meio ilegal; outra, diferente, é divulgar ilegalmente uma prova obtida de forma legal.

Palavras-chave: Crimes de Responsabilidade CF MP Direito Constitucional Operação Lava Jato

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