Dom Dadeus: 'Judiciário invade jurisdição da Igreja'

Para arcebispo, sentença que o condenou é "inválida". Religioso diz que apontará as "mazelas do Judiciário"

Fonte: Blog Frederico Vasconcelos- Folha/UOL

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A Arquidiocese de Porto Alegre divulgou em seu site nota sobre entrevista coletiva realizada nesta segunda-feira (31/10), em que o arcebispo Dom Dadeus Grings lançou a carta intitulada “Judiciário invade jurisdição da Igreja”. Na carta, o religioso faz críticas ao Judiciário por conta de uma ação de danos morais em que foi condenado, juntamente com Diocese de São João da Boa Vista, a pagar R$ 940 mil.


Segundo a nota, o processo decorre da década de 90, quando Dom Dadeus, atendendo ao pedido da população de Mogi Guaçu (SP), posicionou-se a favor de uma obra da prefeitura local. O entrave era um terreno. A família envolvida ingressou na justiça, sentindo-se prejudicada e pedindo indenização em valor “dez vezes acima do normal”. A aquidiocese informa que a ação já transita em julgado e definiu o valor citado a ser pago por Dom Dadeus e pela Diocese de São João da Boa Vista.


Dom Dadeus classificou a decisão como “agressão”, “arbitrária” e “impraticável”. O Arcebispo de Porto Alegre afirmou não ter recursos para pagar a soma definida pela justiça, ao mesmo tempo em que parafraseou São Gregório VII para definir sua postura diante do ocorrido: “Porque amei a justiça e odiei a corrupção, fui condenado pelo judiciário brasileiro”.


Leia a carta na íntegra :

 
JUDICIÁRIO INVADE JURISDIÇÃO DA IGREJA


Dom Dadeus Grings, Arcebispo de Porto Alegre


Chegou ao fim mais um capítulo da agressão do Judiciário contra a Igreja Católica. Após 16 anos de tramitação, o Tribunal de Justiça de São Paulo condenou-me, juntamente com a Diocese de S. João da Boa Vista, onde fui Bispo de 1991 a 2000, a pagar uma indenização, por danos morais, no montante de R$ 940.000,00, reforçando o que se chama de “indústria das indenizações”, com bases totalmente arbitrárias e impraticáveis. Volta à mente a questão dos precatórios! Que cidadãos recorram ao Judiciário para dirimir suas questões é de direito, mas que o Judiciário não distinga o certo e do errado, a verdade da falsidade, não tenha critérios objetivos para julgar e, principalmente, não reconheça os limites de sua jurisdição nem siga os Acordos internacionais, põe toda a sociedade em risco. O problema da corrupção no Brasil tem sua base exatamente ali, no Judiciário. Todos sabem disso, nas poucos têm coragem de denunciá-lo! Nossa Presidente começou a faxina no Executivo. Quando será a vez do Judiciário, onde o problema é muito mais grave?


Eis o fato: Na década de 90, no Município de Mogi Guaçu, SP, concluiu-se um clamoroso processo judiciário que, por razões que chamei de falta de lisura, demorou mais de 10 anos. Sob ameaça de intervenção, foi decretada uma indenização milionária, dez vezes acima do real. Diante da calamidade pública, alguns cidadãos recorreram a mim, como Bispo da região. – Lembre-se o provérbio que, diante de problemas insolúveis, se manda queixar-se ao Bispo - Trouxeram-me o volumoso processo, que li estarrecido. Escrevi, em consequência, diversos artigos, fazendo ponderações em defesa do Município. Não agi em causa própria. Em reconhecimento o Município outorgou-me, solenemente, o título de Cidadão. A sociedade aplaudiu minha intervenção. A família envolvida, porém, me entregou pessoalmente, na Igreja da Imaculada, uma carta, declarando-se atingida, mesmo que não a tivesse nomeado. Respondi, em carta particular, reconhecendo ser justo reivindicar o que de direito, mas não dez vezes mais. Tinha em mãos o relatório das dificuldades das negociações. Adverti que seus advogados, com suas invectivas, “não me deixavam a impressão de lisura”. Por esta expressão, nesta carta não publicada, sou condenado a pagar R$ 940.000,00, a título de danos morais. É justo?


Era obrigação minha, de pastor, orientar a referida família e chamar a atenção aos desvios. Ela, pelos vistos, passou a carta aos seus advogados que, a partir de então, começaram a me atacar, tanto por jornais como pelo rádio e televisão, culminando num duplo processo. Chegaram a afirmar que eu poderia ser condenado de dois a três anos de prisão, provocando celeuma entre a população, que, em conseqüência, promoveu um ato público de desagravo em meu favor.. Tive, por isso, que esclarecer a opinião pública.


O judiciário, em nenhum momento, examinou a lisura dos advogados, para ver se a impressão que eu tivera era correta. O judiciário nunca procurou investigar acerca dos ataques que os advogados dirigiram contra mim e as calúnias que proferiram. Se sofreram “danos morais”, foi pelas agressões e pelo processo que eles promoveram contra ao Bispo e a Diocese. Desde o início, o Judiciário se mostrou parcial, em defesa de “sua gente”.


O montante da indenização ultrapassa qualquer bom senso. Vê-se que os Juizes estão desligados da realidade. Os ministros da Igreja católica não recebem salários polpudos, como eles, nem amealham fortunas.


O que, porém, leva a dizer um redondo e sonoro não à sentença condenatória e dar um basta aos desmandos do Judiciário é sua invasão no campo da jurisdição da Igreja. O Judiciário não reconhece seus limites. Em primeiro lugar, os juizes bem sabiam que os querelantes buscavam lucro fácil. Alexandre Jobim classifica a indústria da indenização como “artimanha de algumas pessoas para ganhar dinheiro” E por incrível que pareça, obtêm, com facilidade, o aval do Judiciário. Arrolaram a Diocese para garantir o dinheiro, com o objetivo de arrancá-lo do povo católico. Com isto reconheceram, publicamente, que estavam invadindo a missão específica da Igreja e não de um cidadão particular. O Judiciário se joga, pois, diretamente contra a Igreja. Contraria frontalmente sua missão profética de se pronunciar sobre questões de ordem social e moral.. Na verdade o Judiciário quer silenciar a Voz da Igreja frente ao bem comum, como tenta com a imprensa, para acobertar a corrupção no país.


Em segundo lugar, os juizes acintosamente não respeitaram o Acordo entre a Santa Sé e o Brasil, assinado solenemente em Roma, no dia 13 de novembro de 2008, já ratificado pelo Congresso nacional. Trata-se de um acordo internacional, de respeito mútuo das competências. Não pode ser desrespeitado impunemente.


Não posso, por coerência e dever de consciência, acatar esta sentença inválida e desrespeitosa porque contrária aos requisitos do direito nacional e internacional, como intromissão – e não é a primeira – nos assuntos internos e na competência da Igreja. Estou disposto a dar a vida por esta causa.. Se me quiserem prender – conforme o Advogado querelante há 14 anos preconizava, - estou às ordens. Só assim o mundo saberá quanto nosso Judiciário é corrupto e arbitrário.


Diante da gravidade do assunto escreverei nova cartilha para apontar as mazelas do Judiciário e assim colaborar na sua urgente reforma. Ou o Brasil muda o Judiciário ou o Judiciário acaba corrompendo o Brasil. Parafraseando S. Gregório VII, posso dizer: “porque amei a justiça e odiei a corrupção, fui condenado pelo Judiciário brasileiro”. Deus nos proteja e guarde!


Apelo para o Supremo Tribunal de Jesus Cristo, o Justo Juiz!


Dom Dadeus Grings

Palavras-chave: Religião; Justiça; Entrave

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5 Comentários

JOAO GOMES DE LIMA ESTUDANTE DE DIREITO03/11/2011 23:24 Responder

EU PESSOALMENTE, CLASSIFICO ESTAS DECLARAÇÕES COMO SERIAS E GRAVISSIMAS CONTRA A ORDEM JURIDICA DO NOSSO PAIS, E AO PROPRIO JUDICIARIO. TUDO BEM QUE AS VEZES NOS DECEPCIONAMOS COM DECISÕES CONTRARIAS AOS NOSSOS INTERESSES; NO ENTANTO, EXISTEM MEIOS LEGAIS E MORAIS PARA SE DEFENDER, INDEPENDE DE QUEM SEJA, SEJA PESSOA COMUM OU RELIGIOSA, A CONSTITUIÇÃO NÃO FAZ DISTINÇÃO ALGUMA NESSES CASOS.AGORA VEM ESSE SENHOR, POIS, AFRONTAR NOSSO JUDICIARIO, NO INCONFORMISMO DE UMA DECISÃO, AINDA CITANDO UM ACORDO COM A SANTA SÉ, PARA QUE O PAÍS NÃO SE META NOS SEUS ASSUNTOS, ISSO É INACEITAVELHOJE EM DIA. AFINAL, A LEI É PARA TODOS, E O BRASIL É UM PAIS LAICO, NÃO ESTÁ LIGADO AOS CAPRICHOS DE RELIGIOSOS, COM PURA AFRONTA AS LEIS E AO JUDICIARIO BRASILEIRO.CREIO EU, QUE DEPOIS DESSAS DECLARAÇÕES, TOME-SE AS DEVIDAS MEDIDAS CABIVEIS AO CASO, POIS, SE ASSIM NÃO O FIZEREM, ESTAREMOS REFENS DESTE TIPO RELIGIOSO, O QUAL, BUSCA EM TODO SEU TURNO, BURLAR A LEI E SEMPRE AFRONTAR NOSSO JUDICIARIO IMPUNEMENTE.

daniel angelo passaia advogado03/11/2011 23:40 Responder

creio que se deu mal. Não deveria ter se metido nos problemas sociais, a igreja ja nao possui os poderes do \\\"Clero\\\" da Idade Medieval. Hoje, é uma simples pessoa jurídica. Se causar dano a outrem, terá de ressarcir, como uma empresa qualquer. Não entro no merito, se és ou nao culpada a igreja, pois nao conhecço o processo, mas, nao interessa quem seja, causar dano a outro, deve ressarcir. Infelizmente o judiciário ainda nao condena uma gama de políticos que já deveria estar preso e ressarcindo o erário.

valeria medici advogada04/11/2011 1:12 Responder

A Igreja Catolica é uma pessoa juridica, que como qualquer outra deve ressarcir os danos que por ventura venha a causar a qualquer cidadão. O tempo em que a Igreja Catolica mandava e desmandava acabou. Não está mais no poder. O Poder Judiciario é independente das religiões, o Brasil é um pais laico. A inquisição acabou. Que as Igrejas cuidem das almas de seus fieis, isto sim. Espero que o Poder Judiciario tome alguma medida com relação as graves acusações feitas pelo religioso em questão. Ele generalizou e atacou todo o Poder Judiciario, isso é lamentavel e intoleravel.

M.VINICIUS SANTOS ADVOGADO04/11/2011 3:35 Responder

Quase todos os dias tem alguém criticando o Poder Judiciário e isto, ao que parece, não está chamando a atenção dos que deveriam zelar pelo bom nome deste importante Poder. A ministra Calmon falou ,dos bandidos que estão por debaixo da toga; aqui no Tocantins o Desembargador Antônio Félix, ao palestrar para alunos de Direito da Faculdade de Direito Ulbra, afirmou para todos ouvirem que ele, como Desembargador, não acredita na Justiça. Comentários aqui e ali vão nos informando que o Poder Judiciário está desmoralizado e se desmoralizando a cada dia que passa. Quando magistradores ganhavam o suficiente para pagar a padaria, eles laboravam melhor e tínhamos menos problemas. Hoje, com tanta mordomia,a coisa tá feia. Eu, honestamente, acredito que dentro de uns 50 anos, o Judiciário vai estar no fundo do poço, ante a inércia de seus dirigentes de terem a humildade de entender que este poder tem hoje mais vedetes-juízes do que juízes vocacionados para a entrega da tutela jurisdicional. Temos mais atores e menos magistrados. Uma pena....e olhem que este Poder consume bilhões e bilhões de reais do povo sofrido... Bolinhas pretas para o Judiciário. No caso em baila, será que os magistrados não são evangélicos? Vinícius Araguaína(TO). 63-9999-7700.

JOÃO Ananias Machado BB-Aposentado 04/11/2011 21:21

Ora se, são verdadeiras e indisfarsáveis \\\"evas\\\" e \\\"angélicas\\\"!

JOÃO Ananias Machado BB-Aposentado 04/11/2011 21:24

ERRATA de indisfarsáveis para indisfarçáveis.

Valdeci Marques da Silva Aux Adm04/11/2011 10:49 Responder

Que o judiciário tá uma zona, tá mesmo, que não tem credibilidade, isso também é verdade. Que a Igreja a muito está devendo, também não há dúvida. O grande mal da sociedade é exatamente a omissão das igrejas, que não fazem o seu trabalho espiritual corretamente, buscando na maioria das vezes, apenas o lucro. Ficar revoltado com uma decisão judicial desfavorável, é comum, no entanto, vir a público, demosntrar sua irresignação sob a chancela de ser independente e que não responde às leis do país, isso, cheira absurdo. Reclamar de decisão judicial transitada em julgado (teve todas as oportunidades de defesa) e não trazer claramente sua versão, nem a da parte contrária, também demonstra a soberba da igreja católica. Basta, temos que vigiar o judiciário, buscar que seja modificado e que venha a prestar serviços à comunidade de forma digna. Basta, temos que abster de apoiar a igreja, somente porque ela diz representar Deus, ela não é Deus, e no meu ponto de vista, nunca o representou. Deus é amor, é solidariedade, é a harmonia entre os viventes na terra, isso é Deus, a Igreja chega perto disso?

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