Crime de uso de documento falso. Tentativa. Impossibilidade.

Crime formal.

Fonte: Tribunal de Justiça do Distrito Federal - TJDF.

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Tribunal de Justiça do Distrito Federal - TJDF.


Órgão: PRIMEIRA TURMA CRIMINAL


APR - APELAÇÃO CRIMINAL nº 2001 01 1 055796-5


Apelantes: J.C.S. E S.S.A.


Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS


Relator Des.: EDSON ALFREDO SMANIOTTO


Revisor Des.: LECIR MANOEL DA LUZ


EMENTA


CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO. TENTATIVA. IMPOSSIBILIDADE.


1 - O crime de uso de documento falso se consuma com o uso, consubstanciado na apresentação daquele perante a pessoa a que busca iludir. Trata-se de crime formal, porquanto o delito já se consuma com o primeiro ato de uso, não se admitindo a tentativa.


2 - A desclassificação da conduta de uso de documento falso para o crime de falsa identidade ou para o crime de estelionato, também não é cabível, se restar demonstrado que os agentes atribuíram a si, falsa identidade, com vistas a ludibriar os servidores do Cartório e, dessa maneira, constituir sociedade empresarial. A conduta dos agentes se tipifica tanto no artigo 307, typus generalis, quanto no artigo 304, typus specialis, resolvendo-se o conflito de normas em favor da norma que contém o plus especializante.


ACÓRDÃO


Acordam os Senhores Desembargadores da PRIMEIRA TURMA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, EDSON ALFREDO SMANIOTTO - Relator, LECIR MANOEL DA LUZ - Revisor, GEORGE LOPES LEITE - Vogal, sob a presidência do Desembargador EDSON ALFREDO SMANIOTTO, em DESPROVER OS RECURSOS, À UNANIMIDADE, de acordo com a ata do julgamento e as notas taquigráficas.


Brasília-DF, 11 de junho de 2.007.


Des. EDSON ALFREDO SMANIOTTO


Presidente/Relator


EXPOSIÇÃO


J.C.S. E S.S.A., qualificados nos autos, foram condenados por incursão no artigo 304, do Código Penal, a 02 (dois) anos de reclusão, além do pagamento de 10 (dez) dias-multa. Presentes as hipóteses do artigo 44 do Código Penal, as penas privativas de liberdade foram substituídas por duas restritivas de direitos, ambas na modalidade de prestação de serviços à comunidade, a serem fixadas e fiscalizadas pelo MM Juiz da CEPEMA.


Apelação às fls. 124/125 e 129/137. Postulam a absolvição, segundo o que dispõe o artigo 386, inciso III do CPP, ou, pelo inciso VI, ou pelo inciso V. Alternativamente, pugna a desclassificação do crime para sua forma tentada, ou que seja o crime desclassificado para o crime tipificado no artigo 307 do Código Penal, ou ainda, pelo crime previsto no artigo 171, c/c artigo 14, II do mesmo diploma legal. Por fim, ainda pede que seja reduzida a pena pecuniária para o seu mínimo legal, e que seja reconhecida a circunstância atenuante da confissão espontânea com a sua aplicação para fixar a pena abaixo do mínimo legal.


Contra-razões, fls. 139/146, em que se pleiteia pelo improvimento do recurso.


Parecer da il. Procuradoria de Justiça, fls. 147/163, oficiando pelo conhecimento e improvimento do recurso.


É o que consta.


VOTOS


O Senhor Desembargador - EDSON ALFREDO SMANIOTTO - Relator.


Senhor Presidente,


Conheço do recurso, presentes os pressupostos de admissibilidade.


Como visto, os réus J.C.S. E S.S.A. foram condenados por incursão no artigo 304, do Código Penal, a 02 (dois) anos de reclusão, além do pagamento de 10 (dez) dias-multa. Presentes as hipóteses do artigo 44 do Código Penal, as penas privativas de liberdade foram substituídas por duas restritivas de direitos, ambas na modalidade de prestação de serviços à comunidade, a serem fixadas e fiscalizadas pelo MM Juiz da CEPEMA.


Irresignados, postulam a absolvição, segundo o que dispõe o artigo 386, inciso III do CPP, ou, pelo inciso VI, ou pelo inciso V do mesmo artigo. Alternativamente, pugna a desclassificação do crime para sua forma tentada, ou que seja desclassificado para o crime tipificado no artigo 307 do Código Penal, ou ainda, pelo crime previsto no artigo 171, c/c artigo 14, II do mesmo diploma legal. Por fim, ainda pede que seja reduzida a pena pecuniária para o seu mínimo legal, e que seja reconhecida a circunstância atenuante da confissão espontânea com a sua aplicação para fixar a pena abaixo do mínimo legal.


Consta da denúncia que os apelantes, com vontades livres e conscientes, fizeram uso de Carteiras de Identidade Civil falsificadas, visando abrirem firmas no Cartório do 1º Ofício de Notas.


Em que pesem as doutas alegações recursais, razão não assiste aos apelantes.


Quanto à alegação de crime impossível pela absoluta ineficácia do meio, não prospera, uma vez que se observa dos autos, às fls. 141, que o servidor do Cartório, o qual atendera os apelantes e que fizera curso de documentoscopia na Coordenação de Polícia Especializada, não teve a pronta certeza da inautenticidade dos documentos apresentados. Somente desconfiou que as identidades apresentadas eram falsas. Ou seja, o servidor que era especializado em documentoscopia não teve certeza, à primeira vista, que se tratava de adulteração, tamanha sua perfeição. Aliado a isso, constata-se que o apelante J.C.S. ficou muito nervoso, embaralhando os nomes, por isso também que os servidores do Cartório desconfiaram da inautenticidade dos documentos.


Logo, não há que se falar em crime impossível pela absoluta ineficácia do meio, uma vez que este se revela eficaz e apto para ludibriar aquele que não tenha conhecimentos técnicos que lhe permitam auferir sua falsidade. Restou comprovado, nos autos, que os apelantes, de fato, exibiram as cédulas de identidade falsas.


No que diz respeito à causa exculpante supra legal de inexigibilidade de conduta diversa, dessume-se que o apelante J.C.S. apresentou contracheques, que demonstram perceber um salário aproximadamente de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e sua companheira, também apelante S.S.A., percebe R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de salário mensal (fls. 24,33 e 35). Com tais salários, não há que se falar na exculpante alegada, pois é incompatível com o salário percebido pelos apelantes. Ao pretenderem constituir atividade empresarial, é bastante aceitável que iriam cometer outros ilícitos em prejuízo de terceiros de boa-fé que porventura viessem a contratar com eles.


Afastada está, pois, a alegada excludente da antijuridicidade.


No que diz respeito à desclassificação da conduta para sua modalidade tentada, é pacífico o entendimento de que o crime de uso de documento falso se consuma com o uso, consubstanciado na apresentação daquele perante a pessoa a que se quer iludir. Trata-se de crime formal. O delito já se consuma com o primeiro ato de uso. Não se admite tentativa. (Nesse sentido: Resp 335072/RJ, rel. Min. Felix Fischer, 5ª Turma.)


Quanto à pretendida desclassificação da conduta para o crime de falsa identidade ou para o crime de estelionato, também não prospera. Restou demonstrado nos autos que os recorrentes atribuíram a si, falsa identidade, com vistas a ludibriar os servidores do Cartório e, dessa maneira, constituir sociedade empresarial. Logo, afasta-se a capitulação do artigo 307, pretendida pela Defesa, por conta do mesmo dispositivo legal que dispõe acerca da possibilidade de a conduta constituir crime mais grave, o que de fato ocorreu, com o uso de documento público falso. Assim, impõe-se a tipificação da conduta no artigo 304 do Código Penal. Segundo bem dispôs a i. representante do douto Parquet, "a conduta dos Recorrentes se enquadra tanto no artigo 307, typus generalis, quanto no artigo 304, typus specialis, preferindo este àquele".


Da mesma forma, não há que se falar em crime de estelionato, disposto no artigo 171 do Código Penal, em sua forma tentada. A descrição presente no tipo descrito no artigo 307 contém mais elementos, presentes no caso, do que aquela do artigo 171 do mesmo diploma legal.


No tocante à redução da pena-base aquém do mínimo legal, também não procede, na medida em que segundo a súmula 231 do STJ, reinante em nossos Tribunais, não há que se aplicar pena abaixo do mínimo legal.


Quanto à fixação da pena de multa, em atenção à capacidade econômica dos apelados, o MM Juiz monocrático fixou-a, levando-se em conta os contracheques do apelante J.C.S., constantes das fls. 24 e da situação declarada pela apelante S.S.A., fls. 77, de ser estudante.


Escorreita se apresenta a fixação da pena de multa.


Diante do exposto, nego provimento ao recurso, para manter intacta a r. sentença hostilizada.


É o voto.


O Senhor Desembargador LECIR MANOEL DA LUZ - Revisor.


Cuida, a hipótese, de apelações criminais.


J.C.S. e S.S.A. foram condenados como incursos nas penas do artigo 304, do Código Penal, a 02 (dois) anos de reclusão, em regime aberto, e multa, tendo sido substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade.


Pretendem os apelantes a absolvição, com apoio no artigo 386, incisos III, V e VI, e subsidiariamente, requerem o reconhecimento do crime impossível, sustentando a falsificação grosseira. Alegam os recorrentes, o reconhecimento da exculpante supra legal de inexigibilidade de conduta diversa. Pleiteiam, ainda, a desclassificação do delito imputado para a sua forma tentada, ou ainda, para os crimes preconizados no artigo 307 ou artigo 171, ambos do Código Penal. Por fim, requerem os réus a reforma da r.sentença no tocante à sanção pecuniária e o reconhecimento da atenuante de confissão espontânea, a fim de reduzir-se a pena aquém do mínimo legal.


O Ministério Público, em contra-razões, pugna pelo improvimento do recurso.


No mesmo sentido, é a manifestação da douta Procuradoria de Justiça oficiante.


Primeiramente, cumpre destacar, que sobejamente evidenciado por todo acervo probatório, o delito pelo qual restaram condenados os apelantes, conforme narrado na exordial acusatória, carecendo de respaldo, os pedidos absolutórios.


Em outra vertente, é de se notar que os documentos utilizados pelos apelantes não podem ser considerados falsificações grosseiras, tendo em vista que o próprio servidor do cartório titubeou quanto a autenticidade dos mesmos, não havendo como prosperar, destarte, a alegação de ocorrência de crime impossível.


Por outro lado, convém esclarecer, que o argumento dos recorrentes, de terem agido sob a causa supra legal de inexigibilidade de conduta diversa, não se coaduna com os contracheques por eles apresentados.


Registre-se, ainda, que não há que se falar em crime tentado, uma vez que o delito em questão consumou-se no momento em que os réus apresentaram os documentos falsos.


Melhor sorte não assiste aos recorrentes, quando pleiteiam a desclassificação do delito em comento para o preconizado no artigo 307, do Código Penal.


Com efeito, conforme bem salientou o ilustre Procurador de Justiça oficiante "afasta-se a capitulação no artigo 307, pretendida pela Defesa, por força do mesmo dispositivo legal que, no preceito sancionador, ressalva a possibilidade de a conduta constituir crime mais grave, o que, de fato, se deu com o uso de documento público falso. Impõe-se, dessa maneira, a tipificação da conduta no artigo 304 do Código Penal."


Da mesma forma, igualmente infundado, o pleito desclassificatório do delito em questão para o preconizado no artigo 171, do Código Penal.


Em relação as reprimendas aplicadas, registro que a sentença combatida mostrou-se incensurável, tendo sido proferida conforme os preceitos legais, tendo a MM Juíza a quo obedecido aos ditames previstos nos artigos 59 e 68, do Código Penal, seguindo à risca o sistema trifásico na fixação das penas.


Finalmente, cumpre enfatizar, a impossibilidade da diminuição da pena abaixo do mínimo legal, ainda que haja incidência de atenuantes, em razão da Súmula 231 do STJ.


"S.231/STJ- A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal."


Frente às razões supra, nego provimento aos recursos de J.C.S. e S.S.A..


É o voto.


O Senhor Desembargador GEORGE LOPES LEITE - Vogal.


Com a Turma.


DECISÃO

Palavras-chave: Documento falso; Crime

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