Agora, sim, Justiça do Trabalho

Quando foi criada a Justiça do Trabalho como órgão do Poder Judiciário, a realidade do mundo do trabalho era bem distinta da atual, asseguradora da regência da CLT para expressivo número de trabalhadores.

Fonte: Folha Online

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GRIJALBO F. COUTINHO

Quando foi criada a Justiça do Trabalho como órgão do Poder Judiciário, a realidade do mundo do trabalho era bem distinta da atual, asseguradora da regência da CLT para expressivo número de trabalhadores. Hoje, no entanto, conforme dados do IBGE, cerca de 50% da mão-de-obra -ou seja, 40 milhões de brasileiros- trabalham sem nenhum vínculo formal de emprego.

A insensatez do novo modo de produção capitalista pune duplamente o cidadão brasileiro antes destacado. Por um lado, deixa-o cada vez mais distante dos direitos sociais conferidos aos empregados, e, por outro, não o permite que procure o Judiciário especializado em causas do trabalho para resolver os litígios enfrentados com o seu tomador de serviços, mesmo que apenas queira dirimir questões vinculadas a um contrato autônomo e não esteja a reclamar nenhum direito exclusivo de empregado.

Num cenário menos selvagem, deveriam estar garantidos a todos os trabalhadores os direitos sociais humanos, previstos no artigo 7º da Constituição Federal, bem como o acesso ao ramo do Judiciário que tem como especialidade a conciliação e o julgamento dos conflitos entre o capital e o trabalho.

Havendo relação de trabalho, seja de emprego ou não, os seus contornos serão apreciados pelo juiz do trabalho

É de grande relevância a fixação da competência da Justiça do Trabalho, seja qual for o regime contratual a que esteja submetido o trabalhador, ampliada para analisar todas as controvérsias oriundas da força de trabalho humana, pela sua natural vocação social e pela própria especialização na matéria. A divisão de competências entre Justiças para julgar o valor do trabalho, além da notória irracionalidade, consagra a fragmentação obreira verificada na fábrica da nova ordem econômica, reduzindo milhões de pessoas ao patamar dos que não têm acesso ao Judiciário que julga as causas dos trabalhadores. Logo, "os sem-direitos-trabalhistas" também podem ser chamados de "os sem-justiça".

Com o término do processo de reforma do Poder Judiciário, ainda que o Parlamento não tenha atribuído à Justiça do Trabalho todas as competências necessárias para o seu melhor aproveitamento, há alterações significativas, de modo a propiciar aos trabalhadores brasileiros não empregados e aos respectivos tomadores de serviços a via da Justiça do Trabalho para a solução dos seus conflitos. Em vez da restrição do original do artigo 114 da CF, que disciplinava a relação "entre trabalhadores e empregadores", agora o texto novo manda julgar "as ações oriundas da relação de trabalho", sem delimitar os atores desse processo.

Havendo relação de trabalho, seja de emprego ou não, os seus contornos serão apreciados pelo juiz do trabalho. Para esses casos, evidentemente, aplicará a Constituição e a legislação civil comum, considerando que as normas da CLT regulamentam o pacto entre o empregado e o empregador. Como conseqüência, a Justiça do Trabalho passa a ser o segmento do Poder Judiciário responsável pela análise de todos os conflitos decorrentes da relação de trabalho em sentido amplo.

Os trabalhadores autônomos de um modo geral, bem como os respectivos tomadores de serviço, terão as suas controvérsias conciliadas e julgadas pela Justiça do Trabalho. Corretores, representantes comerciais, representantes de laboratórios, mestres-de-obras, médicos, publicitários, estagiários, contratados do poder público por tempo certo ou por tarefa, consultores, contadores, economistas, arquitetos, engenheiros, dentre tantos outros profissionais liberais, ainda que não empregados, assim como também as pessoas que locaram a respectiva mão-de-obra (contratantes), quando do descumprimento do contrato firmado para a prestação de serviços podem procurar a Justiça do Trabalho para solucionar os conflitos que tenham origem em tal ajuste, escrito ou verbal. Discussões em torno dos valores combinados e pagos, bem como a execução ou não dos serviços e a sua perfeição, além dos direitos de tais trabalhadores, estarão presentes nas atividades do magistrado do trabalho.

Também estão compreendidas como novas competências da Justiça do Trabalho as que tratam dos litígios sindicais, dos atos decorrentes da greve,do habeas corpus, do habeas data, da ação de indenização por dano moral ou patrimonial, das multas administrativas aplicadas pelos órgãos administrativos e dos litígios que tenham origem no cumprimento de seus próprios atos e sentenças.

A razão maior do deslocamento da competência deve ser a garantia de maior rapidez no julgamento dos processos, uma das características da Justiça do Trabalho em todo o país, que agora, mais do que nunca, está a merecer o nome que ostenta.

Grijalbo Fernandes Coutinho, 39, juiz do trabalho em Brasília, é o presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho).

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