Ação de indenização por danos materiais, morais e psicológicos. Filho assassinado em baile de Reveillon.

Fonte: Senteça Civil

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COMARCA: ALEGRETE

ESPÉCIE: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, MORAIS E PSICOLÓGICOS

REQUERENTES: JOSÉ ANTÔNIO SEVERO TOLEDO e ADELAIDE NONTADO TOLEDO

REQUERIDO: CLUBE CAIXEIRAL DE ALEGRETE

DATA DA PROLAÇÃO: 09.07.07

JUÍZA PROLATORA: FERNANDA PINHEIRO TRACTENBERG

Vistos etc.

JOSÉ ANTÔNIO SEVERO TOLEDO e ADELAIDE NONTADO TOLEDO, qualificados na inicial, ajuizaram AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, MORAIS E PSICOLÓGICOS em face do CLUBE CAIXEIRAL DE ALEGRETE, igualmente qualificado, alegando que, no dia 1° de janeiro de 2004, por volta das 05h, seu o filho Jéferson Luis Montado Toledo, com 23 anos de idade, que se encontrava no baile de Reveillon do clube requerido, foi assassinado por Samuel Martins de Abreu e Cristian Ricardo Rodrigues Pedroso, os quais o esfaquearam no salão do clube, diante de várias pessoas. Referem que Jéferson era peão campeiro e domador, percebia em torno de R$ 800,00 e sempre morou com a família, a quem prestava auxílio material. Aduzem que houve falha na segurança do clube, viabilizando o ingresso de pessoas armadas, gerando o dever de indenizar pelos danos materiais, morais e psicológicos. Requerem a condenação do requerido ao pagamento de indenização por danos materiais, no valor de 100 a 1000 vezes a renda mensal de seu filho, danos morais no valor de 100 a 1000 vezes o salário mínimo, além de pensão vitalícia no valor de R$ 800,00. Postularam a concessão do benefício da Assistência Judiciária Gratuita, que lhes foi deferido. Juntaram documentos.

Citado, o demandado contestou o pedido, alegando ausência de culpa, uma vez que seus seguranças revistaram todas as pessoas que ingressaram na festa, mas é difícil detectar-se na revista o porte de uma arma branca pequena, a fim de preservar a intimidade dos convidados. Aduz ausência de nexo causal, o que afasta o dever de indenizar, sendo que a verdadeira causa do evento foi a desavença existente entre Jéferson e Samuel Martins de Abreu, o que evidencia que a vítima não foi escolhida aleatoriamente ou, subsidiariamente, afirma haver culpa concorrente. Refere que houve falta de especificação do pedido de danos materiais, bem como que os autores não provaram que dependiam economicamente de seu filho, tampouco os rendimentos deste. Por fim, denuncia à lide os autores do fato, Samuel Martins Abreu e Cristian Ricardo Rodrigues Pedroso. Requer a improcedência da ação ou, a redução dos pedidos indenizatórios, bem como sejam condenados os litisdenunciados a lhes pagar o que tiverem que pagar aos autores, no caso de improcedência da demanda. Juntou documentos.

Em audiência, o pedido de denunciação da lide foi afastado em despacho saneador (fl. 96).

Ainda, durante a instrução, tanto os autores, como o Presidente do clube demandado prestaram depoimento pessoal.

Apenas o demandado apresentou memoriais, sendo que transcorreu in albis o prazo para os autores.

É o relatório.

Decido.

Buscam os autores a condenação do demandado em indenização por danos materiais, morais e pensionamento, em razão do assassinato de seu filho, nas dependências do clube demandado, durante uma festividade de final de ano, ocasião em que um dos convidados, desferiu-lhe golpes de arma branca, ocasionando-lhe a morte. Alegam, para tanto, negligência do réu no serviço de segurança.

Inicialmente, importa referir que é fato incontroverso que o filho dos autores foi alvejado a facadas no salão do baile de Reveillon do clube demandado, vindo a falecer posteriormente, em razão desse fato.

Faz-se mister a análise da prova a cerca das circunstâncias em que ocorreu o fato, a fim de perquirir a culpa da demandada.

A mãe de Jéferson, Sra. Adelaide Montado Toledo, em depoimento pessoal (fl. 101), afirmou que não participou da festa de Reveillon no Clube, mas soube do ocorrido através de comentários de sua irmã (Ana Cristina Macedo Montado) e da sobrinha (Carina Macedo Montado), que estavam com seu filho. Estas relataram que Jéferson caiu nos pés de Ana e os seguranças não prestaram socorro porque não foram localizados, sendo que o mesmo foi por elas retirado de dentro do Clube, com o auxílio de terceiros. Ato contínuo, encaminharam Jéferson ao hospital, lá chegando sem vida. Informou que seu filho trabalhava como autônomo, treinando cavalos e ainda morava com os pais. Disse, ainda, que soube que o autor do crime foi o sujeito de alcunha "Mel", o qual tinha uma rixa com Jéferson.

No mesmo sentido foi o depoimento pessoal do pai de Jéferson, Sr. José Antônio Severo Toledo, à fl. 102, o qual também não estava presente na ocasião, mas ficou sabendo do fato por comentários de vários indivíduos. Enfatizou que seu filho não foi socorrido, sendo que, inclusive, soube que pessoas passaram por cima do corpo de Jéferson e o baile continuou sem, ao menos, o clube abaixar o som. Informou que, cerca de 15 min. após o crime, um segurança e um terceiro levaram seu filho até o calçadão e lá o deixaram. Soube que havia seguranças no local, sendo que o chefe da segurança naquela noite era o Sargento Abel, bem como tomou ciência de que o autor do fato era identificado por "Mel", o qual possuía desavença com seu filho. Disse, ainda, que seu filho participava de gineteada em todo o Estado, mas não soube informar o quanto ganhava. Por fim, esclareceu que Jéferson morava na casa dos pais.

O Presidente do Clube demandado, Sr. Roseleu Miranda Alichala, em depoimento pessoal à fl. 103, relatou que não estava no baile na noite do fato, mas o diretor de mês Geovane Borges, o qual estava presente, o informou sobre o ocorrido. Disse que a segurança é prestada por uma empresa particular, a qual é contratada pelo clube, sendo que naquela noite, foi contratado o serviço do Sgt Abel, sendo que os seguranças são, em sua maioria, brigadianos. Referiu que no evento havia cerca de vinte seguranças, além da presença de porteiros e dos diretores de mês. Informou que os seguranças e o diretor de mês levaram Jéferson de táxi para o hospital. Aduziu que no baile havia detector de metais e disse que Jéferson caiu perto da copa. Por fim, esclareceu que a festa foi cancelada depois do fato e foi chamada a polícia.

A prova oral carreada no bojo dos autos dá conta que havia cerca de vinte seguranças no baile.

Ora, resta demonstrado o total despreparo dos seguranças que, inobstante em número expressivo, não foram capazes de detectar a presença de pessoa armada no local, já que, como dito pelo Presidente do Clube, havia detector de metais; tampouco impediram a ocorrência do delito, o qual aconteceu no meio do salão, na presença dos convidados, o que demonstra a ineficiência do serviço. Ademais, segundo relatos dos autores, Jéferson não foi prontamente socorrido e a festa continuou ocorrendo.

A alegação do requerido de que a causa imediata do crime foi a rixa havida entre Jéferson e seu agressor não afasta a sua responsabilidade na omissão do dever de vigilância e segurança que é legitimamente esperado pelos convidados da festa. Ora, trata-se de baile de grande porte, noite de Reveillon, ocasião em que as pessoas se excedem na bebida, podendo ocasionar brigas. Desta forma, o serviço de segurança deve ser irretocável, pois quem ingressa nas dependências de um clube, para participar de uma festa, tem em mente que lá irá se divertir, estando imune a agressões à sua integridade física pois, do contrário, participaria de festa de rua, onde não se pode esperar a mesma proteção.

Nesse compasso, é certo que o crime poderia ter ocorrido em qualquer lugar, mas, nas dependências do clube e numa festa fechada, a vítima, certamente, não se sentia ameaçada, pois confiante na segurança prestada no local. O fato foi grave e o dano de proporções irreversíveis, já que o jovem Jéferson acabou morto.

Assim, não há como afastar a responsabilidade do demandado, tampouco excluí-lo do nexo causal, uma vez que a deficiência no serviço de segurança se não foi determinante para a eclosão do evento, foi determinante para a sua não contenção. Mesmo agindo culposamente, isto é, verificada a negligência dos seguranças do local, o clube deve ser responsabilizado porque a incompetência nas revistas - ao permitir o ingresso de convidado armado -, ou na vigilância, certamente, foram decisivas para a ocorrência do incidente nefasto, sem contar o descaso na imediata prestação de socorro à vítima.

Verificada a conduta, o nexo causal e a culpa do demandado, resta quantificar o dano, sendo que o pedido dos autores não se limita ao dano moral, indo além, batem-se pelo recebimento de indenização por danos materiais, além de pensionamento vitalício.

O pedido de dano material não restou plenamente explicitado na inicial, tampouco em sua emenda. Ao que tudo indica, os autores confundiram dano material com pensionamento (lucros cessantes), eis que vincularam o dano material ao valor supostamente auferido mensalmente pela vítima. De outra sorte, não requereram indenização pelas despesas com funeral, hospitalização ou médico, de forma que, nada há a indenizar a título de dano material.

No concernente ao pensionamento, vai afastado, uma vez que os autores apenas afirmaram que as atividades laborativas de Jéferson serviam para colaborar na manutenção da família, sem comprovar em que se constituía o seu labor, - apenas alegando que o mesmo era peão campeiro e domador -, tampouco quanto ganhava. Sendo assim, não lograram comprovar a relação de dependência econômica para com seu filho, ônus que lhes incumbia, na forma do disposto no art. 333, I, do CPC. Nesse sentido, colaciono o seguinte aresto:

RESPONSABILIDADE CIVIL EM ACIDENTE DE TRÂNSITO. AÇÃO AJUIZADA PELOS PAIS DA VÍTIMA. PENSÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. AUSENTE O DIREITO AO PENSIONAMENTO. Não havendo comprovação da dependência econômica dos pais em relação ao falecido filho, descabe a fixação de pensão mensal. Precedentes do TJRGS e STJ. DANO MORAL. QUANTUM. REDUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. INDENIZAÇÃO DE ACORDO COM A POSIÇÃO DA CÂMARA. Descabe a redução da verba indenizatória a título de dano moral em favor dos pais da vítima, uma vez que o valor de 100 salários mínimos está de acordo com a posição da Câmara em casos análogos, considerando-se a repercussão do dano. Precedentes do TJRGS. Apelação parcialmente provida. (Apelação Cível Nº 70003320579, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Zietlow Duro, Julgado em 04/03/2004)

Por derradeiro, quanto ao dano moral, entendo que o mesmo restou verificado, uma vez que a morte de um filho acarreta um profundo sentimento de tristeza aos pais, já que se reverte a ordem natural da vida, na qual os pais tendem a falecer primeiro. Ademais, considerando-se a maneira brutal em que a vida de Jéferson foi violentamente ceifada, a dor moral se intensifica.

Nesse diapasão, para fixar o dano moral é necessário verificar as circunstâncias, conseqüências e repercussão do fato, as condições sócio-econômicas das partes envolvidas, além do caráter punitivo e compensatório do ressarcimento.

Nesse contexto, considerando que se trata de família de parcas condições econômicas e, por outro lado, de clube de renome na comunidade, reputo razoável o valor de indenização, a título de dano moral, no montante de R$ 70.000,00, a fim de compensar o abalo sofrido pelos autores, sem haver um enriquecimento indevido, bem como coibir o réu da prática de novas condutas ilícitas.

Isso posto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado por JOSÉ ANTÔNIO SEVERO TOLEDO e ADELAIDE NONTADO TOLEDO, nos autos da ação de indenização por danos materiais, morais e psicológicos, que moveram contra o CLUBE CAIXEIRAL DE ALEGRETE, a fim de:

1 - condenar o demandado a pagar indenização aos autores, a título de danos morais, no valor de R$ 70.000,00, corrigido monetariamente pelo IGPM desde a data da sentença, acrescido de juros de mora de 1% ao mês, forte no art. 406, CC, c/c art. 161, § 1°, do CTN, desde a data do fato (01.01.04), nos termos da Súmula n.° 54 do STJ.

2 - face à sucumbência recíproca, tendo os autores decaído de considerável parte do seu pedido, arcarão com 50% do valor das custas processuais e honorários advocatícios em prol do patrono do demandado, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, forte no art. 20, § 3°, do CPC, cuja exigibilidade fica suspensa, em razão de litigarem sob o pálio da justiça gratuita.

4 - arcará o requerido com 50% das custas processuais e honorários advocatícios em prol do patrono dos autores, que fixo em 15% sobre o valor da condenação, forte no art. 20, § 3°, do CPC.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Porto Alegre, 09 de julho de 2007.

FERNANDA PINHEIRO TRACTENBERG
Juíza de Direito Substituta em Regime de Exceção

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