Uma nova perspectiva acerca da aplicabilidade dos limites remuneratórios nos benefícios cumulados

A Emenda Constitucional n.º 41/03

Fonte: Bruno Sá Freire Martins

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1. Introdução:

A Emenda Constitucional n.º 41/03, por ocasião de sua edição, pois fim as discussões existentes, até então, acerca da aplicabilidade dos limites remuneratórios definidos para os servidores públicos em atividade, bem como para os proventos recebidos pelos aposentados e/ou pensionistas de forma cumulada.

Para tanto, modificou, novamente, o inciso XI do artigo 37 da Constituição Federal, estabelecendo que:

XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos; 

Com o objetivo de garantir a aplicabilidade da nova redação constitucional aos proventos e remunerações que já vinham sendo pagos, por ocasião de sua entrada em vigor, a referida Emenda, invocou em seu artigo 9º a aplicabilidade do artigo 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, in verbis:

Art. 9º Aplica-se o disposto no art. 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias aos vencimentos, remunerações e subsídios dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza.

Não se pode esquecer que, conforme dito anteriormente, a aplicação dos limites remuneratórios no âmbito da Administração Pública se constituía em questão tormentosa desde o advento da Carta Magna.

Isso porque, sob a égide da redação original aplicou-se o entendimento do Supremo Tribunal Federal no sentido de que as verbas de natureza pessoal não estavam inseridas nos limites estabelecidos na redação original do Texto Maior.

As reformas promovidas em 1.998 (Emenda Constitucional n.º 19) ensejaram o entendimento de que o dispositivo passou a constituir-se em norma de eficácia limitada, já que exigiu a edição de lei de iniciativa dos três poderes da União para definir os limites remuneratórios, cujo projeto nunca foi enviado para o Congresso Nacional.

Daí a certeza de que a partir de 2003 o assunto estaria resolvido, principalmente pelo fato de que o Supremo Tribunal Federal, no início de 2004, em sessão administrativa [1], definiu os valores atinentes ao subsídio dos Ministros daquela Corte que posteriormente se tornou Lei, assegurando a eficácia do disposto no artigo 8º da Emenda Constitucional n.º 41/03.

Tanta convicção decorria do fato de que a longa redação do inciso XI contempla todas as hipóteses ensejadoras de recebimento de valores junto à Administração Pública, tanto que o dispositivo prevê expressamente que os mesmos estariam sujeitos aos limites mesmo quando percebidos cumulativamente ou não.

Ocorre que o Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado no sentido de que a aplicação do limite remuneratório nos casos de proventos recebidos cumulativamente deve ser feita observando-os de forma isolada.

Ensejando, assim, a rediscussão do alcance dos limites remuneratórios fixados pela Carta Maior, após as reformas a que foi submetido seu texto, em especial no caso de recebimento de proventos de forma cumulada.


2 – Modalidades Constitucionais de Cumulação:

A Carta Maior é a responsável pela definição das possibilidades de cumulação de proventos, existindo basicamente três possibilidades que podem ser denominadas voluntárias ou facultativas, involuntárias e obrigatórias.

As cumulações voluntárias ou facultativas consistem naquelas onde o recebimento de mais de uma aposentadoria decorre do exercício de mais de um cargo público, pressupondo a manifestação de vontade do servidor público que, por intermédio de concurso público, busca a investidura em dois cargos diferentes.

Tem-se, ainda, a possibilidade de que essa investidura não se dê em cargos públicos ou advenha de investidura precária ou eleitoral, no primeiro caso, temos a situação que envolve os membros da Magistratura e do Ministério Público cuja cumulação constitucionalmente autorizada alcança, também, o exercício de atividades privadas de magistério.

E no segundo quando o servidor, já aposentado, é investido em cargo comissionado ou eleito para o exercício de um mandato.

As cumulações alusivas às investiduras provenientes de concurso público estão elencadas no inciso XVI do artigo 37 da Constituição Federal:

XVI - é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI:     

a) a de dois cargos de professor;       

b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico;        

c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas;

E, também, nos artigos 95, parágrafo único, I e 125, § 5º, II, d, respectivamente, que autorizam os Magistrados e membros do Ministério Público a exercerem, além de seus cargos, um outro de professor.

O artigo 40, § 6º da Constituição Federal, por sua vez, autoriza a cumulação de proventos de aposentadoria em tais casos, situação que se estende ao recebimento voluntário de proventos e remuneração cumulados, conforme se depreende do § 10, do mesmo artigo, senão vejamos:

§ 10. É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.

Não se pode esquecer que, recentemente, a Emenda Constitucional n.º 77/13 autorizou a extensão da cumulação voluntária ou facultativa também aos médicos militares:

Art. 142...

§ 3º Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições: 
...

II – o militar em atividade que tomar posse em cargo ou emprego público civil permanente, ressalvada a hipótese prevista no art. 37, inciso XVI, alínea "c", será transferido para a reserva, nos termos da lei; 

III – o militar da ativa que, de acordo com a lei, tomar posse em cargo, emprego ou função pública civil temporária, não eletiva, ainda que da administração indireta, ressalvada a hipótese prevista no art. 37, inciso XVI, alínea "c", ficará agregado ao respectivo quadro e somente poderá, enquanto permanecer nessa situação, ser promovido por antiguidade, contando-se-lhe o tempo de serviço apenas para aquela promoção e transferência para a reserva, sendo depois de dois anos de afastamento, contínuos ou não, transferido para a reserva, nos termos da lei; 

VIII – aplica-se aos militares o disposto no art. 7º, incisos VIII, XII, XVII, XVIII, XIX e XXV, e no art. 37, incisos XI, XIII, XIV e XV, bem como, na forma da lei e com prevalência da atividade militar, no art. 37, inciso XVI, alínea "c".

Hipótese que também autorizará a aposentadoria nos dois cargos.

De outro lado, permite-se, ainda, a cumulação involuntária assim denominada aquela que se caracteriza pelo recebimento em conjunto de proventos de aposentadoria e de pensão por morte. 

A previdência do servidor público adota como condição para a concessão da pensão por morte a existência de dependência econômica entre o falecido e o pretenso beneficiário.

Essa dependência econômica é sempre presumida, contudo, tal presunção pode ser absoluta ou relativa, no primeiro caso basta comprovar-se que o falecido possuía vinculo de parentesco com o dependente, enquanto que no segundo é preciso demonstrar, além do vínculo de parentesco, que o falecido efetivamente contribuía para o sustento do dependente.

Ou seja, nos casos de presunção absoluta, mesmo que a pessoa possua outra fonte de renda, poderá receber o beneficio de pensão por morte. E essa fonte de renda poderá ser proveniente do recebimento de uma aposentadoria junto ao Regime Próprio.

Daí afirmar-se que tal cumulação é involuntária já que o evento morte, apesar de futuro e certo, não se encontra sob o domínio da vontade do servidor ou mesmo do dependente.

O Texto Maior, traz, ainda, hipóteses em que existe a obrigatoriedade de cumulação de cargos, assim, consideradas aquelas onde não há qualquer possibilidade de escolha por parte do servidor público quanto à ocupação de dois cargos públicos, já que a redação constitucional é cristalina ao impor para o exercício de determinados postos na Administração Pública a investidura prévia em outro cargo.

É possível exemplificar tal hipótese com o exercício obrigatório do cargo de Ministro do Tribunal Superior Eleitoral por Ministros da Suprema Corte e do Superior Tribunal de Justiça.

Também, merece destaque a imposição de que a presidência dos Tribunais seja ocupada por integrantes dos cargos que o compõem (Ministros ou Desembargadores).

Sendo que nesse último caso, existem permissivo legais para a incorporação da remuneração/vencimento recebido pelo exercício do cargo maior do respectivo Tribunal aos proventos de aposentadoria.

3 – Alcance do Limite Constitucional:

A redação do inciso XI evidenciou a obrigatoriedade de observância dos limites remuneratórios também nos casos de proventos recebidos cumulativamente com outros proventos ou ainda com remuneração.

O próprio dispositivo constitucional que autoriza a cumulação de cargos (inciso XVI do artigo 37) estabelece de forma cristalina o dever de observância dos limites remuneratórios nas hipóteses ali elencadas.

Situação que se estende aos casos de cumulação de proventos em razão da aplicação conjugada do disposto nos incisos XI e XVI do artigo 37 com o § 10 do mesmo artigo e o § 6º do artigo 40, conforme impõe o § 11 do artigo em questão, senão vejamos:

§ 11 - Aplica-se o limite fixado no art. 37, XI, à soma total dos proventos de inatividade, inclusive quando decorrentes da acumulação de cargos ou empregos públicos, bem como de outras atividades sujeitas a contribuição para o regime geral de previdência social, e ao montante resultante da adição de proventos de inatividade com remuneração de cargo acumulável na forma desta Constituição, cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração, e de cargo eletivo. 

No que tange às incorporações, a situação não é diferente, já que o inciso XI inclui dentro dos limites por ele fixados as vantagens pessoais e/ou de qualquer natureza.

O que, a princípio, induz o entendimento de que nos casos de cumulação não há, em tese, alternativa para os segurados do Regime Próprio, devendo observar-se os limites constitucionalmente estabelecidos.

Tanto que, por ocasião da edição da Emenda Constitucional n.º 41/03, afirmou-se que:

Com relação ao teto remuneratório, de subsídio, de proventos ou de pensões, a Emenda Constitucional 41/03 remodelou a redação do art. 37, XI da Constituição de 1988, ao estabelecer que a remuneração, os proventos e as pensões, qualquer que seja sua composição, têm como teto máximo o subsídio mensal dos ministros do Supremo Tribunal Federal.[2]

Tendo o Ministério da Previdência, fazendo uso de seu poder orientativo outorgado pela Lei n.º 9.717/98, estabelecido, na Orientação Normativa n.º 01 de 6 de Janeiro de 2004, regras de aplicabilidade dos limites remuneratórios nos casos de cumulação.

Ocorre que desde o advento do texto reformador a submissão dos valores recebidos cumulativamente pelos servidores e aposentados/pensionistas não vinha sendo bem aceita.

Motivo pelo qual parte da doutrina posicionou-se no sentido de que:

O teto não pode, por motivos naturais, ser considerado cumulativamente. Apenas deve ser considerado em cada função exercida. A prevalecer interpretação contrária, a Constituição estará estimulando o ócio, a paralisia profissional.

...

O art. 37, XI, da Carta Magna deve ser interpretado conforme a Constituição de modo a impedir a redução da remuneração de agentes públicos e com o fito de considerar o teto em relação a cada função pública exercida. Fazendo uso das possibilidades abertas pela nova interpretação constitucional, cabe ao Poder Judiciário adequar, por mais uma vez, os dispositivos da EC n.º 41 que foram inseridos com flagrante violação da Constituição da República. [3] 

Na mesma toada:

Neste quadro, evidentemente, a resposta só poderá ser uma: a aplicação da norma que estabelece o teto nos casos de acumulação constitucionalmente assegurada, não só pelo Princípio da Irretroatividade da norma, mas diante do Princípio do Direito Adquirido decorrente de uma leitura sistêmica do texto constitucional, só poderá abarcar aqueles que ainda não se encontram no sistema, exatamente, dando-se sequência ao art. 11 da EC n.º 20.[4] 

A expressão cumulativamente ou não pretende impor que o teto seja observado no somatório dos vários cargos licitamente exercidos. Assim, o Magistrado o Professor, se alcançar o teto com os subsídios do primeiro cargo, teria que trabalhar de graça como Professor (o que é absurdo e vedado) ou deixar o cargo público, em manifesta ofensa a direito seu de exercê-lo e remuneradamente, com observância do preceito da igualdade. Não obstante, não pode deixar de perceber os vencimentos enquanto trabalha e nem de ter que devolvê-los, porque isso importa em enriquecimento sem causa para administração e viola, no nosso modesto ponto de vista, os princípios da dignidade da pessoa humana e da valorização do trabalho.

Ou seja, já se defendia a tese de que os recebimentos decorrentes do exercício de cargos cumuláveis não estariam sujeitos aos limites remuneratórios estabelecidos pela Constituição Federal.

Em sede jurisprudencial o Supremo Tribunal Federal, reconheceu o direito ao recebimento de remuneração incorporada aos proventos, sob o argumento de que se tratava de direito adquirido, além dos limites remuneratórios:

EMENTA: I. Ministros aposentados do Supremo Tribunal Federal: proventos (subsídios): teto remuneratório: pretensão de imunidade à incidência do teto sobre o adicional por tempo de serviço (ATS), no percentual máximo de 35% e sobre o acréscimo de 20% a que se refere o art. 184, III, da Lei 1711/52, combinado com o art. 250 da L. 8.112/90: mandado de segurança deferido, em parte. II. Controle incidente de constitucionalidade e o papel do Supremo Tribunal Federal. Ainda que não seja essencial à decisão da causa ou que a declaração de ilegitimidade constitucional não aproveite à parte suscitante, não pode o Tribunal - dado o seu papel de "guarda da Constituição" - se furtar a enfrentar o problema de constitucionalidade suscitado incidentemente (v.g. SE 5.206-AgR, 8.5.97, Pertence, RTJ 190/908; Inq 1915, 05.08.2004, Pertence, DJ 05.08.2004; RE 102.553, 21.8.86, Rezek, DJ 13.02.87). III. Mandado de segurança: possibilidade jurídica do pedido: viabilidade do controle da constitucionalidade formal ou material das emendas à Constituição. IV. Magistrados. Subsídios, adicional por tempo de serviço e o teto do subsídio ou dos proventos, após a EC 41/2003: argüição de inconstitucionalidade, por alegada irrazoabilidade da consideração do adicional por tempo de serviço quer na apuração do teto (EC 41/03, art. 8º), quer na das remunerações a ele sujeitas (art. 37, XI, CF, cf EC 41/2003): rejeição. 1. Com relação a emendas constitucionais, o parâmetro de aferição de sua constitucionalidade é estreitíssimo, adstrito às limitações materiais, explícitas ou implícitas, que a Constituição imponha induvidosamente ao mais eminente dos poderes instituídos, qual seja o órgão de sua própria reforma. 2. Nem da interpretação mais generosa das chamadas "cláusulas pétreas" poderia resultar que um juízo de eventuais inconveniências se convertesse em declaração de inconstitucionalidade da emenda constitucional que submeta certa vantagem funcional ao teto constitucional de vencimentos. 3. No tocante à magistratura - independentemente de cuidar-se de uma emenda constitucional - a extinção da vantagem, decorrente da instituição do subsídio em "parcela única", a nenhum magistrado pode ter acarretado prejuízo financeiro indevido. 4. Por força do art. 65, VIII, da LOMAN (LC 35/79), desde sua edição, o adicional cogitado estava limitado a 35% calculados sobre o vencimento e a representação mensal (LOMAN, Art. 65, § 1º), sendo que, em razão do teto constitucional primitivo estabelecido para todos os membros do Judiciário, nenhum deles poderia receber, a título de ATS, montante superior ao que percebido por Ministro do Supremo Tribunal Federal, com o mesmo tempo de serviço (cf. voto do Ministro Néri da Silveira, na ADIn 14, RTJ 130/475,483). 5. Se assim é - e dada a determinação do art. 8º da EC 41/03, de que, na apuração do "valor da maior remuneração atribuída por lei (...) a Ministro do Supremo Tribunal Federal", para fixar o teto conforme o novo art. 37, XI, da Constituição, ao vencimento e à representação do cargo, se somasse a "parcela recebida em razão do tempo de serviço" - é patente que, dessa apuração e da sua aplicação como teto dos subsídios ou proventos de todos os magistrados, não pode ter resultado prejuízo indevido no tocante ao adicional questionado. 6. É da jurisprudência do Supremo Tribunal que não pode o agente público opor, à guisa de direito adquirido, a pretensão de manter determinada fórmula de composição de sua remuneração total, se, da alteração, não decorre a redução dela. 7. Se dessa forma se firmou quanto a normas infraconstitucionais, o mesmo se há de entender, no caso, em relação à emenda constitucional, na qual os preceitos impugnados, se efetivamente aboliram o adicional por tempo de serviço na remuneração dos magistrados e servidores pagos mediante subsídio, é que neste - o subsídio - foi absorvido o valor da vantagem. 8. Não procede, quanto ao ATS, a alegada ofensa ao princípio da isonomia, já que, para ser acolhida, a argüição pressuporia que a Constituição mesma tivesse erigido o maior ou menor tempo de serviço em fator compulsório do tratamento remuneratório dos servidores, o que não ocorre, pois o adicional correspondente não resulta da Constituição, que apenas o admite - mas, sim, de preceitos infraconstitucionais. V. Magistrados: acréscimo de 20% sobre os proventos da aposentadoria (Art. 184, III, da L. 1.711/52, c/c o art. 250 da L. 8.112/90) e o teto constitucional após a EC 41/2003: garantia constitucional de irredutibilidade de vencimentos: intangibilidade. 1. Não obstante cuidar-se de vantagem que não substantiva direito adquirido de estatura constitucional, razão por que, após a EC 41/2003, não seria possível assegurar sua percepção indefinida no tempo, fora ou além do teto a todos submetido, aos impetrantes, porque magistrados, a Constituição assegurou diretamente o direito à irredutibilidade de vencimentos - modalidade qualificada de direito adquirido, oponível às emendas constitucionais mesmas. 2. Ainda que, em tese, se considerasse susceptível de sofrer dispensa específica pelo poder de reforma constitucional, haveria de reclamar para tanto norma expressa e inequívoca, a que não se presta o art. 9º da EC 41/03, pois o art. 17 ADCT, a que se reporta, é norma referida ao momento inicial de vigência da Constituição de 1988, no qual incidiu e, neste momento, pelo fato mesmo de incidir, teve extinta a sua eficácia; de qualquer sorte, é mais que duvidosa a sua compatibilidade com a "cláusula pétrea" de indenidade dos direitos e garantias fundamentais outorgados pela Constituição de 1988, recebida como ato constituinte originário. 3. Os impetrantes - sob o pálio da garantia da irredutibilidade de vencimentos -, têm direito a continuar percebendo o acréscimo de 20% sobre os proventos, até que seu montante seja absorvido pelo subsídio fixado em lei para o Ministro do Supremo Tribunal Federal. VI. Mandado de segurança contra ato do Presidente do Supremo Tribunal: questões de ordem decididas no sentido de não incidência, no caso, do disposto no artigo 205, parágrafo único e inciso II, do RISTF, que têm em vista hipótese de impedimento do Presidente do Supremo Tribunal, não ocorrente no caso concreto. 1. O disposto no parágrafo único do art. 205 do RISTF só se aplica ao Ministro-Presidente que tenha praticado o ato impugnado e não ao posterior ocupante da Presidência. 2. De outro lado, o inciso II do parágrafo único do art. 205 do RISTF prevê hipótese excepcional, qual seja, aquela em que, estando impedido o presidente do STF, porque autor do ato impugnado, o Tribunal funciona com número par, não sendo possível solver o empate. [6]

É bem verdade que impôs o dever de congelar os valores atinentes à verba incorporada e sua redução à medida que a remuneração dos Ministros do Supremo fossem sendo alteradas de forma a fazer com que o mesmo desapareça ao longo do tempo e os proventos passem a restringir-se ao teto do Poder Judiciário.

Mas naquele primeiro momento permitiu seu recebimento pode se dizer “além-teto”.

O fato é que as três espécies de cumulação de proventos permitidas pelo ordenamento jurídico devem ser analisadas isoladamente em suas peculiaridades, levando-se em conta, ainda, que se tratam de permissivos constitucionais.

É preciso, então, observar que nos casos de cumulações voluntárias/facultativas ocorre ato de vontade do servidor público para sua concretização, ou seja, compete a ele buscar (concurso ou eleição) ou aceitar (cargo comissionado) o segundo vínculo.

Já as cumulações involuntárias, em que pese a escolha de um conjugue ou companheiro constituir-se em opção pessoal, o fato morte, apesar de previsível, não se encontra na esfera de domínio do servidor e como tal não pode ter sua ocorrência planejada, impedindo assim o reconhecimento de qualquer vontade deste para a sua concretização.

Situação que, pode-se dizer, estende-se ao recebimento cumulado de proventos provenientes da concessão de duas pensões por morte.

Por fim, no caso, das cumulações obrigatórias, a vontade do servidor é indiferente para sua concretização, uma vez que pressupõem imposição constitucional para sua ocorrência.

Consubstanciados nessas premissas e tomando por base o fato de que a Constituição Federal impõe a observância de sua unidade, como método interpretativo de seu texto, já que se exige uma compreensão global dos vários elementos individuais – regras e princípios – da Constituição, no intuito de harmonizar e prevenir contradições (harmonização de tensões). Por isso mesmo, as normas constitucionais não podem, nunca, ser tomadas como elementos isolados, mas sim, como preceitos integrados que formam um sistema interno unitário. Desse modo, uma norma constitucional não pode ser isolada do seu conjunto sistemático no qual ela se integra (desenvolvimento e explicitação da interpretação sistemática). Posto em prática, conduz o jurista a bloquear eventuais conflitos normativos, assim como desqualificar contradições meramente aparentes. [7]

Poder-se-ia, concluir, pela aplicabilidade das regras alusivas ao limite remuneratório nos casos de cumulação voluntária, enquanto que nas demais não seria possível aplicar tais limites por implicar tal interpretação no afastamento da máxima efetividade da norma maior.

A máxima efetividade consiste no reconhecimento de que a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe conceda. [8]

Contudo o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de reconhecer a aplicabilidade de forma isolada dos limites remuneratórios nos casos de recebimento de proventos decorrentes do exercício de cargos cumulados, senão vejamos:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. QUESTÃO DE ORDEM. MATÉRIA
SUBMETIDA AO CRIVO DA PRIMEIRA SEÇÃO DESTE SUPERIOR TRIBUNAL. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. CUMULAÇÃO DE CARGOS PERMITIDA CONSTITUCIONALMENTE. CARGOS CONSIDERADOS, ISOLADAMENTE, PARA APLICAÇÃO DO TETO REMUNERATÓRIO.

1.  "Tratando-se de cumulação legítima de cargos, a remuneração do servidor público não se submete ao teto constitucional, devendo os cargos, para este fim, ser considerados isoladamente".

(Precedentes: AgRg no RMS 33.100/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON, DJe 15/05/2013 e RMS 38.682/ES, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe 05/11/2012).

2. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança provido. [9]

No que vem sendo acompanhado por outros Tribunais Pátrios:

APELAÇÃO CÍVEL. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. CUMULAÇÃO DE CARGOS PERMITIDA CONSTITUCIONALMENTE. CARGOS CONSIDERADOS, ISOLADAMENTE, PARA APLICAÇÃO DO TETO REMUNERATÓRIO. PRECEDENTES DO STJ. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. POSSIBILIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS. SENTENÇA REFORMADA. 

1. A antecipação de tutela é concedida quando, existindo prova inequívoca, se convença o Juiz da verossimilhança da alegação e ocorrer fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou ficar caracterizado abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu (art. 273, I e II, do CPC).

2. Tratando-se de cumulação legítima de cargos, a remuneração do servidor público não se submete ao teto constitucional, devendo os cargos, para este fim, ser considerados isoladamente. (Precedentes: AgRg no RMS 33.100/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON, DJe 15/05/2013 e RMS 38.682/ES, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe 05/11/2012).


3. A finalidade do teto constitucional é evitar abusos e salários descomunais no serviço público. Não se visa impedir que aqueles que de fato cumulam cargos percebam os respectivos vencimentos. Tal raciocínio privaria aquele que efetivamente cumpriu suas funções de sua justa remuneração, ensejando enriquecimento sem causa da Administração. (RMS 33.100/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON).

4. Apelação parcialmente provida. [10]

TETO CONSTITUCIONAL REMUNERATÓRIO ACUMULAÇÃO DE APOSENTADORIA E PENSÃO POR MORTE EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 41/03.

O teto constitucional remuneratório deve incidir isoladamente sobre cada uma das verbas, em face do caráter contributivo do sistema previdenciário Interpretação lógico sistemática da Constituição Federal. Sentença que concedeu parcialmente a ordem mantida.

Remessa necessária e recurso de apelação improvidos.[11]

E esse posicionamento pode ser estendido aos casos de cumulação involuntária, já que o recebimento de uma aposentadoria em conjunto com uma pensão ou de 2 (duas) pensões, nessa hipótese, decorre da existência de dois vínculos laborais e afetivos distintos.

Como é o caso da viúva que já recebe pensão em decorrência do óbito de um servidor e tendo se casado novamente, com outro servidor, este vem a falecer, outorgando-lhe o direito a um novo benefício, ante a ausência de qualquer impedimento na legislação do RPPS local para o recebimento de duas pensões por morte em tais circunstâncias.

O pressuposto da jurisprudência supramencionada, não toma por base a natureza da cumulação, mas sim o fato de que se trata de a mesma é autorizada pelo ordenamento jurídico e como tal, não pode se sujeitar a aplicação literal do disposto no inciso XI do artigo 37 da Constituição Federal.

Daí a possibilidade de extensão de tal interpretação para os casos de cumulação involuntária.

5 – Conclusão:

É fato que a adoção de tal entendimento e sua extensão aos casos de cumulação obrigatória e involuntária poderá ensejar o reconhecimento de ineficácia da aplicação das normas alusivas ao limite remuneratório no caso do recebimento cumulado de proventos com proventos ou com remuneração, já que a ocorrência dessas somente pode existir nos casos constitucionalmente impostos e autorizados.

Motivo pelo qual é necessário considerar a manifestação e interesse do servidor nas hipóteses de cumulação voluntária e a sua inexistência nos casos de cumulações involuntárias e obrigatórias.

E prevalecendo o posicionamento de que a análise do limite remuneratório deve ser feita isoladamente, mesmo quando a cumulação pressupõe a existência de ato de vontade do servidor, torna-se obrigatória a sua extensão às hipóteses de cumulação obrigatória e involuntária, por se tratarem de situações impostas e autorizadas pela Carta Magna. 

Mas, como se trata de conflito aparente de normas constitucionais o tema com certeza será objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal Federal.

Notas:

1 - Decisão tomada nos autos n.º 319269 em 05/02/2004.

2 - Campos, Marcelo Barroso Lima Brito de. REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL DOS SERVIDORES PÚBLICOS. Editora Juruá, 4ª edição, página 323.

3 - Araújo, Valter Shuenquener de in A REFORMA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL - Temas Polêmicos e Aspectos Controvertidos. Coordenado por Marcelo Leonardo Tavares, editora Lumen Juris, páginas 238 e 241.

4 - Dantas, Ivo in DIREITO ADQUIRIDO, EMENDAS CONSTITUCIONAIS E CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE, 3ª edição, editora Renovar, página 120.

5 - Felipe, J. Franklin. REFORMA CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIA - A Nova Previdência dos Servidores Públicos, Editora Forense, página 16.

6 - MS 24875/DF. Tribunal Pleno. Rel. Min. Sepúlveda Pertence. DJ 06/10/2006

7 - Fernandes, Bernardo Gonçalves in CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL. 2ª edição, editora Lumen Juris, página 155.

8 - Moraes, Alexandre de. DIREITO CONSTITUCIONAL. 20ª edição, editora Atlas, página 10.

9 - RMS n.º 33134/DF. 1ª Secção. Rel. Min. Mauro Campbell Marques. DJe 27/08/2013

10 - TRF 1. APC n.º 0033445-77.2010.4.01.3400. 1ª T. Rel. Desa. Ângela Catão. DJe 08/08/2014.


Bruno Sá Freire Martins

Bruno Sá Freire Martins

Servidor Público efetivo do Estado de Mato Grosso; advogado; pós-graduado em Direito Público e em Direito Previdenciário; professor da LacConcursos e de pós-graduação na Universidade Federal de Mato Grosso, no ICAP – Instituto de Capacitação e Pós-graduação (Mato Grosso), no Instituto Infoc - Instituto Nacional de Formação Continuada (São Paulo), no Complexo Educacional Damásio de Jesus - curso de Regime Próprio de Previdência Social (São Paulo); fundador do site Previdência do Servidor (www.previdenciadoservidor.com.br); Presidente da Comissão de Regime Próprio de Previdência Social do Instituto dos Advogados Previdenciários – Conselho Federal (IAPE); membro do Cômite Técnico da Revista SÍNTESE Administração de Pessoal e Previdência do Agente Público, publicação do Grupo IOB; escreve todas as terças-feiras para a Coluna Previdência do Servidor no Jornal Jurid Digital (ISSN 1980-4288) endereço www.jornaljurid.com.br/colunas/previdencia-do-servidor, autor dos livros DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO DO SERVIDOR PÚBLICO, A PENSÃO POR MORTE e REGIME PRÓPRIO – IMPACTOS DA MP n.º 664/14 ASPECTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS, todos da editora LTr e do livro MANUAL PRÁTICO DAS APOSENTADORIAS DO SERVIDOR PÚBLICO da editora Rede Previdência/Clube dos Autores e de diversos artigos nas áreas de Direito Previdenciário e Direito Administrativo.


Palavras-chave: Emenda constitucional Benefícios Servidores públicos Limites remuneratórios

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