Parecer sobre Pejotização das relações de trabalho no Brasil
Por Gisele Leite e Ramiro Luiz Pereira da Cruz.
Preliminarmente,
cabe esclarecer que a pejotização pode ser conceituada como prática pela qual o
trabalhador em típica relação laboral constitui uma pessoa jurídica para
oferecer recibos pelos pagamentos e, para simular haver uma relação de natureza
cível ou comercial.
Desta
forma, o empregador ou tomador de serviços consegue redução de encargos
tributários tais como os trabalhistas e fiscais e, o trabalhador, por vezes, obtém
rendimento mensal superior ao salário que receberia, também sofrendo exclusão
de diversos direitos trabalhistas.
Em
verdade, a pejotização constitui fraude pela Justiça do Trabalho, vez que viola
frontalmente os artigos 2 e 3 da CLT, definidores da relação de emprego, razão
pela qual o contrato que simula a relação cível ou comercial é considerado
nulo, conforme os termos do artigo 9 da CLT e por decorrência da aplicação do
princípio da realidade.
Cumpre
ainda salientar a diferença entre o trabalho subordinado que é característico
da relação de emprego e que se opõe ao trabalho autônomo, cuja definição se
construiu a partir da prestação de serviço por uma pessoa física de forma não
subordinada.
É
verdade que evidente desenvolvimento do Direito Privado, especialmente, de seu
ramo cível fez surgir novas formas de constituição da personalidade jurídica,
até mesmo a constituição de pessoa jurídica com sócio único. E, atualmente,
existe como possibilidades, as figuras como microempreendedor individual (MEI),
empresário individual (EI), empresário individual de responsabilidade limitada (EIRELI)
e ainda, a sociedade limitada unipessoal (LTDA, unipessoal).
E,
tais figuras ampliaram as formas jurídicas pelas quais a pejotização poderia
simular uma relação distinta da de emprego ou laboral. Em que pese, de haver
fraudes trabalhistas mediante a constituição de pessoa jurídica, a simples
prestação de serviços mediante essas figuras não deve ser acompanhada de
automática suposição de fraude.
A nova
legislação trabalhista (Lei 13467/2017) também chamada de Reforma Trabalhista
que apregoa que o profissional como PJ é aquele empregado que presta serviço de
modo contínuo, mas não são considerados funcionários da empresa, podendo ser
chamado de autônomo exclusivo.
Ressalta-se
que estas são institutos jurídicos previstos na legislação e em pleno vigor. E,
nesse sentido cumpre sublinhar a redação do artigo 129 da Lei 11.196/2005 de
constitucionalidade pelo STF na ADC 66.
Nos
termos do dispositivo: “Para fins fiscais e previdenciários, a prestação de
serviços intelectuais, inclusive os de natureza científica, artística ou
cultural, em caráter personalíssimo ou
não, com ou sem a designação de quaisquer obrigações a sócios ou empregados da
sociedade prestadora de serviços, quando por esta realizada, se sujeita tão-somente à legislação aplicável
às pessoas jurídicas, sem prejuízo da observância do disposto no art. 50 da Lei
nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil”.
Portanto,
a prestação de serviço intelectual por sociedade prestadora de serviço está
sujeita, para fins fiscais e previdenciários, somente à legislação aplicável às
pessoas jurídicas.
E, o
STF ao analisar a norma declarou constitucional e, se estendeu pela
possibilidade de o prestador de serviço intelectual, ainda que pessoa física,
constituir pessoa jurídica, com intenção de obter vantagens tributárias, sem
que isso se caracterize como fraude.
A
decisão, portanto, fez reacender o debate sobre a pejotização, com a hipótese
de a decisão da Suprema Corte a teria autorizado. Mas, ledo engano, assim não
procedeu. O que STF confirmou foi a constituição de pessoa jurídica ainda que
de único sócio, para a prestação de serviço de natureza intelectual. Porém, não
afastou a aplicação de artigos 2 e 3 da CLT. E, assim, permanece vigente a
oposição entre o trabalho autônomo e o trabalho mediante o vínculo
empregatício.
Persiste
a tipificação de fraude trabalhista se estiverem presentes os requisitos da
relação de emprego na realidade fática, a prestação de serviço for mascarada
por um contrato entre pessoas jurídicas. Também não haverá a presunção de que a
simples existência da prestação de serviço por pessoa jurídica de sócio único
constitua fraude. Inexistentes os requisitos da relação laboral, a prestação do
serviço por tal forma será válida.
É o parecer, se o trabalho prestado for subordinado e conter os requisitos do vínculo trabalhista tais como Subordinação; Onerosidade; Pessoalidade e Habitualidade, sendo utilizada uma pessoa jurídica para oferecer os recibos para a remuneração recebida, constitui fraude trabalhista, passível das sanções previstas em lei.
*Gisele Leite, Professora universitária há três décadas. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Pesquisadora - Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Presidente da Seccional Rio de Janeiro, ABRADE – Associação Brasileira de Direito Educacional. Vinte e nove obras jurídicas publicadas. Articulistas dos sites JURID, Lex Magister. Portal Investidura, Letras Jurídicas. Membro do ABDPC – Associação Brasileira do Direito Processual Civil. Pedagoga. Conselheira das Revistas de Direito Civil e Processual Civil, Trabalhista e Previdenciária, da Paixão Editores – POA -RS.