Estado de sítio e, outros estados de exceção: abordagem comparativa e explicativa
O texto pretendeu situar historicamente e constitucionalmente o estado de sítio, estado de defesa e estado de calamidade pública. Elucidando não só o ritual procedimental, mas esmiuçando as causas autorizativas que são taxativas. Também abordou a atual crise sanitária produzida pela pandemia de Covid-19 que impôs medidas restritivas e, até lockdown, mas, não se confundem com o estado de sítio nem o estado de defesa.
Introdução
Os estados de exceção e concentração de poderes eram conhecidos dos hebreus, cartagineses, gauleses e gregos. Havendo o precedente do Direito Romano com a ditadura consular e o iustititum (suspensão do Direito) proclamado quando o Senado editava um senatus consultum ultimum, em situação de emergência, em Roma, provocada por guerra externa, insurreição ou guerra civil ou tumultus.
Em 1714, no Reino Unido, o Riot Act[1]
incriminava a participação em tumultos com desobediência às ordens de
dissolução por parte de autoridades e eram isentas de responsabilidade as
autoridades encarregadas de restabelecer a ordem.
Já em 1791, em França, decreto de
Assembleia Constituinte previu a possibilidade de suspensão temporária e
localizada de determinados direitos em circunstâncias de crise grave[2]. Porém, a previsão em sede
constitucional ocorreu com a Constituição Francesa de 1799, que estabelecia a
possibilidade de suspensão da Constituição, por meio de lei, em caso de revolta
armada ou de agitações que ameaçasse a segurança do Estado e com a Carta de
1814[3], onde aliás, apareceu pela
primeira vez a expressão "estado de sítio".
Já,
em nosso país, excetuando todas as vezes em que se anulou o próprio
Estado de Direito, houve várias decretações formais de estado de exceção, tais
como a de 25.9.1893 (quando foi decretado estado de sítio em quatro Estados e
no Distrito Federal), em 1914 (Hermes da Fonseca, que solicitou o estado de
sítio para o Rio de Janeiro). Noutra ocasião, ocorreu previsão em 1967[4], mas nenhuma decretação
desde 1988.
Progressivamente, a causa do estado de
sítio (dos estados de exceção, em geral) ultrapassou e descolou-se das situações
de guerra e conflitos armados, para abranger inclusive as crises econômicas.
O estado de sítio, o estado de
emergência e o estado de calamidade pública[5] são espécies do gênero
estado de exceção que de acordo com doutrina é conceituado como medida
extraordinária e excepcional à legalidade, sendo autorizado pelo ordenamento
constitucional mediante as situações emergenciais.
Todavia, sua utilização, segundo as
Constituições modernas, pelo poder constituído tem demonstrado funcionar
propriamente mais como regra do que exceção.
O estado de sítio é instrumento que pode
ser utilizado pelo Presidente da República em casos de: comoção grave de
repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia da
medida tomada durante o estado de defesa; declaração de estado de guerra, ou
ainda, resposta à agressão armada estrangeira.
A decretação do estado de sítio é
solicitada pelo Presidente da República ao Congresso Nacional, ouvidos o
Conselho da República[6] e o Conselho de Defesa
Nacional[7]. Vide artigos 137 a 139 da
Constituição Federal de 1988.
Com a pandemia de COVID-19 ou
coronavírus, deu-se a decretação do estado de calamidade pública por parte do
Governo Federal. Desde de 18 de março de 2020, foi aprovada a lei pela Câmara
dos Deputados. Não é inédito o estado de calamidade pública.
Anteriormente, em 2016, em junho no Rio
de Janeiro foi feito idêntico decreto pelas dificuldades de realizar os Jogos
Olímpicos. O mesmo já ocorreu no Rio
Grande do Sul que em novembro daquele mesmo ano, tomou a medida para conter o déficit
nas contas públicas estaduais. Tais decretos permitem que secretários e
dirigentes da Administração Pública estadual adotem medidas excepcionais
necessárias à racionalização de todos os serviços públicos. Entre tais medidas
está o home office ou teletrabalho[8].
O estado de calamidade pública[9] é uma situação anormal, em
que a capacidade de ação do Poder Público municipal ou estadual fica seriamente
comprometida. Essa situação é fruto de um desastre e não importa se causado
pela natureza ou por outros motivos econômicos, sociais e, etc. E, nessas
situações, o Governo Federal deve intervir para auxiliar o ente a superar a
referida situação.
O estado de calamidade pública é
decretado por governantes em situações reconhecidamente anormais, decorrentes
de desastres (naturais ou provocados) e que causam danos graves à comunidade,
inclusive ameaçando a vida dessa população. É preciso haver pelo menos dois
entre três tipos de danos para se caracterizar a calamidade: danos humanos,
materiais ou ambientais.
Atualmente, quem exatamente pode
decretar esse estado? No Brasil, essa é uma prerrogativa reservada para as
esferas estadual e municipal. Ou seja, governadores e prefeitos podem decretar
uma calamidade pública. Questiona-se o
porquê o presidente, não tem esse instrumento à disposição? É porque na esfera
federal, podem ser decretados apenas os chamados estados de exceção. De dois
tipos: o estado de defesa e o estado de sítio – que é o mais grave.
Além do estado de calamidade pública, também
é comum ouvirmos que algum município brasileiro decretou estado de emergência.
De fato, esse é outro estado de exceção que pode ser decretado por governadores
e prefeitos – e o nomen usado na lei é situação de emergência.
Mas, qual seria a diferença entre
emergência e calamidade? Segundo a lei, trata-se de uma questão de intensidade,
pois a calamidade pública é decretada apenas nos casos mais graves, quando a
capacidade do poder público agir resta seriamente comprometida.
Ou seja, o Estado ou município não
conseguem resolver o problema por conta própria e precisam da ajuda do governo
federal. É o estado que requer mais atenção e cuidado.
Já, a situação de emergência refere-se aos
danos menores, que comprometem parcialmente a capacidade de resposta do poder
público, ou seja, menos graves que aqueles de uma calamidade pública. Nessa
situação, eles também dependem de ajuda do Governo Federal, mas em um grau
menor. Evidentemente, não é fácil definir essa diferença de intensidade, e isso
acaba dependendo da visão do governante a respeito de cada caso.
A Câmara Legislativa (CLDF) aprovou, em
sessão extraordinária remota nesta terça (15.12.2020), a prorrogação do estado
de calamidade pública no Distrito Federal até 30 de junho de 2021. O pedido foi
feito pelo governador Ibaneis Rocha ao poder legislativo em decorrência da
pandemia do novo coronavírus no DF.
O texto prolonga os efeitos do Decreto
Legislativo nº 2.284, de 2020, que reconhecia o estado de calamidade pública[10] até o próximo dia 31. Com
isso, o Executivo fica desobrigado de cumprir metas da Lei de Responsabilidade
Fiscal (LRF), podendo orientar recursos e investimentos para o combate à
pandemia, além de poder solicitar recursos a nível federal, como o Fundo
Nacional para Calamidades Públicas[11], Proteção e Defesa Civil.
Estado de sítio, enfim, é o instrumento
utilizado pelo Chefe de Estado em que se suspende temporariamente os direitos e
as garantias dos cidadãos e os Poderes Legislativo e Judiciário ficam
submetidos ao Executivo, tendo em vista a defesa da ordem pública.
No Brasil, para decretar o estado de sítio,
o chefe de Estado, após o devido respaldo do Conselho da República e o Conselho
de Defesa Nacional que oferecerão parecer não vinculativo, onde solicita uma
autorização do Congresso Nacional para efetivar o decreto.
A práxis cotidiana do estado de
exceção, em face de fatos históricos serve para assinalar o como se deu o
estado de exceção no país desde a Primeira República até os presentes dias.
Logo após a Proclamação da República, o
enfermo Marechal Deodoro da Fonseca[12], em 1889, vivíamos sob o
prenúncio da instauração de novo regime político, pois deixaríamos de ser
autocrático para se tornar democrático. Porém, o regime era orquestrado por uma
elite econômica rural e, com o apoio de grande parte da oficialidade do
Exército e, sem a participação do povo.
E, assim, se institui o governo
provisório com os objetivos de consolidar o novo regime e institucionalizá-lo
com a aprovação de uma Constituição e criar as formas administrativas do Estado
que se faziam necessárias.
Em 1891 quando, finalmente, a
Constituição republicana fora promulgada, trazendo já os modernos direitos
fundamentais e, logo em seguida, os institutos jurídicos de exceção. Já se
observava que a tendência de estado de sítio era introduzida nos ordenamentos
jurídicos espanhol e francês.
Nessa época, o texto constitucional já
conferia à competência ao Congresso Nacional para sua declaração, exceto na
hipótese de as câmaras não estarem reunidas e na iminência de perigo à pátria
(quando poderia ser exercido pelo Executivo federal).
O estado de sítio prevê sua aplicação
somente em casos de agressão estrangeira ou ameaça interna ou insurreição por
tempo determinado.
As medidas de exceção[13] consentidas impunham
restrições às liberdades e garantais individuais tal como na tradição europeia.
O estado de sítio, portanto, não previa a restrição à liberdade de imprensa ou
à inviolabilidade de domicílio, como na França, mas sim, apenas a aplicação
pelo Executivo de medidas repressivas de detenção e desterros de pessoas.
Tais medidas extraordinárias de
restrição à liberdade não poderiam ser confundidas com penas, pois a sua
legitimidade cessava naturalmente com a restauração das garantias. Porém, como
regra, os governos da Primeira República brasileira enfrentaram as contestações
sociais por meio exatamente do estado de sítio, o que denotou abuso no manejo
do instituto.
A pesquisa no Senado brasileiro aponta
que na República Velha (1889-1930) governou-se por 2.365 dias em estado de
sítio, que assinala certa tendência cultural e política ao estado de exceção.
O cômputo total de dias de estado de
sítio, na república brasileira, a saber: no governo de Floriano Peixoto houve o estado
de sítio que vigorou por 295 dias, no de Prudente de Morais, por 104 dias; no
de Rodrigues Alves por 121 dias; no Hermes da Fonseca[14] por 268 dias, no de
Wenceslau Braz por 71 dias, no de Epitácio Pessoa por 132 dias, no de
Washington Luís por 87 dias e no de Arthur Bernardes[15] por 1.287 dias e,
governou em estado de normalidade por apenas menos de dois meses, dentro de mandato
presidencial de quatro anos.
O estado de sítio, num panorama
histórico-jurídico, se apresenta como forma de regulamentação constitucional de
estado de exceção. Para alguns doutrinadores, o estado de exceção vem se
transformando em paradigma permanente no governo do Estado moderno.
E, reconstruindo a origem dos institutos
normativos que regulamentam a exceção constitucionalmente, para inserir o
debate no contexto de cada tradição constitucional vigente.
A Constituição brasileira de 1891
representa o momento inaugural do estado de sítio, decretando o começo da
regulação do estado de exceção em nosso país.
A Constituição Imperial, por sua vez,
apesar de abrir provisões emergenciais, mas não delimitou de forma precisa os
procedimentos[16],
conforme o fez a primeira Constituição republicana com o estado de sítio, de
forma que esta pode ser considerada do ponto de partida da regulamentação
constitucional da exceção.
Observando a jurisprudência do STF e a
prática normativa do estado de sítio no período entre 1891 a 1930,
delimitando-se pela promulgação da primeira Constituição republicana e, o fim
pela ascensão do governo provisório de Getúlio Vargas, com a Revolução de 1930,
que revogou a Constituição de 1891 por meio da criação da Constituição de 1934,
que inaugurou nova etapa histórica, com reverberação jurídica-constitucional.
Como é sabido, repriso, o estado de
sítio corresponde a uma das espécies de regulamentação de estado de exceção,
igualmente considerado como forma de ditadura constitucional.
Enfim, a função do estado de exceção é
permitir meios excepcionais para se afastarem determinados perigos sérios à
ordem pública, segurança ou existência do Estado que não possam ser afastados
pelos trâmites normais previstos pela Constituição.
Portanto, o estado de sítio é uma forma
pela qual uma Constituição regulamenta o exercício de poderes excepcionais em
meio a uma emergência para proteger o Estado, a ordem ou a segurança pública.
A forma do estado de sítio difere de
outras formas de exceção, posto que possa ser declarada explicitação pelo
Legislativo, ou outro dos poderes do governo e, principalmente pretende a
suspensão temporária de certas garantias ou direitos fundamentais
especificamente estabelecidos.
A expressão "estado de sítio" advém da literal tradução do instituto francês etat de siége[17], criado por decreto na Assembleia Nacional em 1791, para situações de ameaça militar, mas que logo se expandiu ao longo do tempo para fora do contexto bélico, para ser usado como medida extraordinária de polícia diante as desordens internas, transformando-se, de efetivo ou militar em fictício ou político.
Surgiu no Brasil, pela primeira vez,
através da Constituição da República de 1891 e, onde se estabeleceu claro
regramento de competência. Incialmente, era privativo do Congresso Nacional.
Porém, previa-se a excepcional hipótese de ser decretado o estado de sítio pelo
Poder Executivo, apenas quando na ausência do Congresso Nacional, relatar e
motivar as medidas de exceção tomadas pelo Executivo. As autoridades que
ordenavam tais medidas podiam ser devidamente responsabilizadas por abusos
cometidos nessas medidas.
A situação que ensejava o sítio era a
emergente agressão por forças estrangeiras ou de comoção interna, assim ficava
a cargo do órgão declarante, ou seja, o Congresso Nacional ou, subsidiariamente
o Executivo.
No entanto, a interpretação da expressão
"comoção interna" é vaga. E, tal brecha semântica está alinhada com o
fito de regulamentar a exceção. Sendo muito difícil prever com exatidão, qual
tipo de emergência seria capaz de desafiar os meios constitucionalmente
previstos para a defesa da própria Constituição.
Deste modo, a agressão estrangeira e
comoção interna se configuram com situações fáticas capazes de ensejar o efeito
da declaração do estado de sítio, com seus respectivos efeitos jurídicos.
São os efeitos da declaração de estado
de sítio segundo a Constituição brasileira de 1891, a saber: Competência do
Congresso Nacional para determinar a suspensão de quaisquer garantias por tempo
determinado, a competência excepcional do Executivo para impor detenção em
lugar não destinado aos réus de crimes comuns e, para impor desterro a outros
sítios do território nacional.
Mais tarde, a Emenda Constituição nº3 de
1926 adicionou mais um efeito, pela inclusão de um parágrafo ao artigo 60 da
Constituição brasileira de 1891, qual seja, a proibição colocada ao Judiciário
de conhecer de ações motivadas pelos atos praticados pelo Legislativo e
Executivo em face do estado de sítio.
As demais constituições brasileiras
mantiveram alguma regulamentação sob a forma e o nomen de estado de
sítio, exceto a Constituição brasileira de 1937, que previa os institutos do
estado de emergência e do estado de guerra, diferenciados do de sítio ,sobretudo,
pela competência exclusiva do Presidente da República, independente de
autorização do Legislativo e, não podendo o Congresso suspender o estado de
emergência.
Nas Constituições de 1934 e a de 1946, a
previsão de regulamentação do estado de sítio manteve-se muito parecida com
àquela da primeira Constituição republicana.
Convém adendar que o STF jamais chegou a
decidir a respeito do estado de emergência sob a égide da Constituição
brasileira de 1937. E, este texto constitucional previa a impossibilidade aos
juízes e tribunais de conhecerem de atos praticados em virtude do estado de
emergência enquanto este estivesse em vigor (artigo 170, Constituição de 1937).
Provavelmente, houve apenas um ano entre
o fim da emergência e a nova Constituição e, nenhuma demanda envolvendo o
dispositivo da emergência chegou ao STF.
Deste viés, ao longo das Constituições
que disciplinavam o estado de sítio, coube ao Supremo Tribunal dirimir as
questões jurídicas que envolviam o estado de sítio.
Nota-se que a primeira Constituição
republicana brasileira teve efeitos significativos na tradição constitucional,
dentro da temática do estado de sítio, o que afetou sensivelmente as
Constituições seguintes.
Em 1892, a regulamentação do estado de
sítio fora colocada em debate pela primeira vez. Na época, o Executivo estava
sob o comando do então vice-presidente Marechal Floriano Peixoto, o famoso
Marechal de Ferro, que havia declarado o Distrito Federal em estado de sítio,
através do Decreto 791, de 10 de abril de 1892, como uma resposta à Revolta
Armada[18], rebelião causada por
motins militares da Marinha que tomaram os navios de guerra e, ainda, exigiam a
saída de Floriano Peixoto da presidência, com a consequente convocação de novas
eleições (vez que Hermes da Fonseca havia renunciado ao cargo de Presidente, e
então, Floriano assumiu como vice, sem convocar novas eleições).
A controvérsia havia sido agravada pelo
Manifesto dos Treze Generais[19], documento assinado por
oficiais militares de diversas partes do país, que contestavam a continuidade
de Floriano na Presidência, entendo que cabiam novas eleições, haja visto o
art. 42 da Constituição de 1891, o qual
estabelece: “Se no caso de vaga, por qualquer causa, da Presidência ou
Vice-Presidência, não houverem ainda decorrido dois anos do período
presidencial, proceder-se-á a nova eleição”.
Restou configurada a situação de comoção
interna já prevista no bojo do texto constitucional vigente da época. E, assim,
o Marechal Floriano editou o decreto, in litteris: Declara em estado de
sitio o Distrito Federal e suspende as garantias por 72 horas.
O Vice-Presidente da Republica dos
Estados Unidos do Brazil, considerando: que foi commettido o crime de sedição,
sahindo cidadãos a depor o Chefe do Governo
Federal; que intentou-se revoltar contra as instituições nacionaes a
força armada mantida para a defesa e garantia dessas mesmas instituições; que
entre os autores e promotores da sedição se acham membros do Congresso
Nacional, que gosam de immunidades por
lei prescriptas; que o crime commettido produziu grave commoção intestina (art.
48 n. 15 e art. 80 § 1º da Constituição Federal); que é principal dever do
Poder Executivo assegurar a ordem e a manutenção das instituições nacionaes; Resolve, usando das
attribuições conferidas pelos citados artigos,
Decreta:
Artigo unico. É declarado em estado do [sic]
sitio o Districto Federal e suspensas as garantias constitucionaes, por 72
horas. O Ministro de Estado dos Negocios do Interior o faça executar.
Assim, com tal declaração de sítio,
Floriano Peixoto determinou a detenção e desterro de várias pessoas, tidas como
envolvidas na Revolta e mantendo os detidos presos em fortalezas.
Na ocasião, o advogado Ruy Barbosa[20] assumiu a defesa de
vários entre os afetados pelas medidas, ingressando com várias petições de Habeas
Corpus perante o STF, tendo os detidos como pacientes.
Convém destacar os HC números 300, 406,
410 e 415 quando Ruy Barbosa questionou juridicamente as medidas tomadas pelo
Executivo, provocando o Judiciário a decidir a respeito da interpretação das
normas constitucionais vigentes que disciplinavam o estado de sítio.
Sobre a mesma
matéria, a Suprema Corte se manifestou no HC 1073, colocado por outros
impetrantes, mas também em defesa de pacientes que estavam envolvidos no HC
1063.
Com
o trâmite dos processos, Ruy Barbosa veio a patrocinar ações civis em favor dos
reformados e demitidos pelo governo e contra o Decreto de 12 de abril de 1892, editado
em meio ao estado de sítio e reconhecido como retaliação governamental contra
quem julgava serem os envolvidos na Revolta[21].
O
primeiro Habeas Corpus, de nº 300, foi julgado em 30 de abril de 1892.
No acórdão, o relator toma posição sobre uma série de questões que se colocavam
à interpretação pelo tribunal. De início, deve notar-se que, nesse acórdão, o
Supremo Tribunal Federal decidiu qual era a natureza das medidas que podiam ser
tomadas pelo Presidente durante o estado de sítio (detenção em local distinto
dos réus de crimes comuns e desterro):
“Considerando que durante o estado de sítio
é autorizado o Presidente da República a impor, como medida de repressão, a
detenção em lugar não destinado aos réus de crimes comuns e o desterro para
outros sítios do território nacional;
Considerando que estas medidas não
revestem o caráter de pena, que o Presidente da República em caso algum poderá impor, visto não lhe ter sido
conferida a atribuição de julgar, mas são medidas de segurança, de natureza transitória, enquanto os acusados não
são submetidos aos seus juízes naturais nos termos do art. 72, § 15º da Constituição”.
Desta
forma, enquadrou-se a detenção prevista no estado de sítio como medida de
segurança, uma vez que a imposição de pena requeria formalidades e garantias
legais que não eram concedidas na situação de estado de sítio.
O
que deu azo a maior polêmica na jurisprudência do STF seria a chamada Doutrina
da Questão Política. Pois, interpretava as faculdades conferidas ao Presidente
da República durante do estado de sítio, e o relator do acórdão considerou-as
como sendo discricionárias do Presidente da República que se torna responsável
nesta declaração e também pelos eventuais abusos cometidos durante o estado de
sítio.
Quanto
à discricionariedade, é fato que jamais se questionou constitucionalmente o
instituto e, foi necessário, certo grau de discricionariedade à atribuição de
qualquer funcionário público, em face do que este atue sempre dentro do quadro
normativo, criando e aplicando normas.
No
entanto, o STF decidiu que essa discricionariedade implicava que as questões
surgidas do uso das faculdades do Executivo no estado de sítio não podiam ser
resolvidas pelo Judiciário, posto que dependiam sempre de um juízo político
prévio.
Desta
forma, o HC 300 considerava a avaliação das medidas de sítio do Executivo pelo
Congresso Nacional, como juízo político que impedia um juízo jurídico[22].
Tendo
em mira que o exercício de tal extraordinária faculdade, a Constituição confiou
ao critério e prudente discrição do Presidente da República, sendo responsável
por ela, pelas medidas de exceção que tomar, e, principalmente, pelos abusos
que foram cometidos.
Em
tempo, previa o artigo 80, parágrafo terceiro combinado com o artigo 43,
parágrafo 21º da Constituição da época, ao Congresso compete privativamente
aprovar ou reprovar o estado de sítio declarado pelo Presidente da República,
bem como realizar o exame das medidas excepcionais, que ele houver tomado, as
quais para esse fim lhe serão relatadas
com especificação dos motivos em que se fundam;
Considerando,
portanto, que, antes do juízo político do Congresso, não pode o Poder Judicial
apreciar o uso que fez o Presidente da República daquela atribuição
constitucional, e que, também, não é da índole do Supremo Tribunal Federal
envolver-se nas funções políticas do Poder Executivo ou Legislativo;
Considerando
que, ainda quando na situação criada pelo estado de sítio, estejam ou possam
estar envolvidos alguns direitos
individuais, esta circunstância não habilita o Poder Judicial a intervir para
nulificar as medidas de segurança
decretadas pelo Presidente da República, visto ser impossível isolar esses
direitos da questão política, que os
envolve e compreende, salvo se unicamente tratar-se de punir os abusos dos
agentes subalternos na execução das
mesmas medidas, porque a esses agentes não se estende a necessidade do voto político do Congresso.
Nesse
sentido, o Supremo Tribunal Federal buscava excluir as decisões jurídicas sobre
o estado de sítio de sua competência, por tratar-se de uma suposta questão
política. Tal jurisprudência encontraria um forte contraponto na arguição que
Ruy Barbosa faria nas ações civis dos reformados e demitidos pelos decretos de
7 e 12 de abril de 1892.
Sobre
o tema, Ruy Barbosa deixa claro que a previsão de um juízo político não impede
que ocorra também um juízo jurídico-constitucional. Explicando a questão
política, o autor apresenta duas acepções para a expressão “questão política”:
uma acepção ampla, que acabaria abrangendo toda a soberania constitucional, e
uma acepção restrita, em que a questão política o é “pela natureza do assunto,
pela forma que a controvérsia assumir, pelos termos em que a resolverem”.
Muito
brevemente, questões políticas no sentido estrito, esclarece Barbosa, é a que
versa sobre a conveniência[23]
ou oportunidade de exercitar os poderes que a constituição confere a um
determinado cargo.
Entretanto,
quando a questão é se o ato praticado pelo detentor de um cargo público estava
dentro das competências e faculdades que a lei prescreve ao cargo, a questão
será jurídica, pois não diz respeito a conveniência ou oportunidade (onde a
autoridade tem seu poder discricionário),
mas diz respeito justamente à ausência de um tal poder discricionário à
autoridade.
Percebe-se que surge a fundamentação do Habeas Corpus 300 pela “Doutrina da Questão Política”[24], na medida em que exige o juízo político do Congresso como condição para realizar juízos jurídicos sobre a competência e alcance constitucional de medidas do Executivo, apresenta grave falha. Confunde os dois tipos de juízo, pois o Congresso não pode aprovar o uso feito pelo Presidente de uma determinada competência, se o Presidente não a tem.
Não
se trata de uma mesma avaliação, que caiba ao Judiciário ou ao Legislativo, mas
de duas avaliações distintas. O juízo político coloca a pergunta: O Presidente
usou de maneira oportuna e conveniente os poderes de sítio a ele conferidos? O juízo
jurídico (constitucional, no caso) coloca a pergunta: “As medidas que o
Presidente ordenou estão incluídas nos poderes de sítio a ele conferidos”?
O
juízo jurídico, portanto, é técnico, dependendo da interpretação adequada do
texto constitucional. Essa interpretação jurídica demanda um saber técnico, que
só é adquirido às custas do estudo dedicado do Direito.
Deste
modo, diferem fundamentalmente os juízos político e jurídico. O juízo político
pode ser exercido por qualquer representante, independente do conhecimento deste
acerca do Direito, porque é um juízo de conveniência. O juízo jurídico,
diferentemente, só pode ser exercido por um juiz competente, que tenha o
conhecimento do Direito para poder delimitar, por meio da interpretação constitucional,
o quadro normativo das medidas permitidas, de maneira clara e fundamentada.
Assim,
inaugurou-se nesse acórdão do HC 300 uma restrição indevida do acesso ao
tribunal, por meio da afirmação dessa doutrina da questão política, que acabou por impedir o
pleno exercício da jurisdição constitucional sobre os abusos cometidos no estado de sítio, ao submeter o
exercício desta a uma decisão do Congresso que não era jurídica, mas sim política. Na prática, a jurisprudência do
STF deixava o direito individual dos cidadãos na dependência de uma decisão de
conveniência do Congresso, que nada tinha de técnico-jurídica.
Desta
forma, inaugurou-se nesse acórdão do HC 300 uma restrição indevida do acesso ao
tribunal, por meio da afirmação dessa doutrina da questão política, que acabou por impedir o
pleno exercício da jurisdição constitucional sobre os abusos cometidos no estado de sítio, ao submeter o
exercício desta a uma decisão do Congresso que não era jurídica, mas sim política.
Na
prática, a jurisprudência do STF deixava o direito individual dos cidadãos na
dependência de uma decisão de conveniência do Congresso, que nada tinha de
técnico-jurídica.
A
outra questão que se distingue no acórdão do HC300 é acerca da duração das
medidas tomadas durante o estado de sítio. O tribunal decidiu que as medidas
tomadas na duração do estado de sítio não devem cessar automaticamente com o
fim do estado de sítio, mas que se prolongam além desta cessação, pelo menos
até o acusado ser submetido ao tribunal competente.
A
questão voltaria a ser confrontada na jurisprudência futura do tribunal, visto
que tal interpretação tem dificuldades muito mais profundas de fundamentação.
Em
primeiro lugar, há um problema de coerência entre dois pontos da decisão: por
um lado, o STF reconhece que a detenção determinada pelo Presidente da
República não tem o caráter de uma pena
criminal, enquanto por outro lado, implica que essa medida, sem caráter penal,
se torne uma prisão preventiva, como se
o detido necessariamente devesse tornar-se réu de ação penal (o que o tribunal dá a entender ao usar o termo
“acusado” para referir-se ao paciente).
Se soma a isso a doutrina da questão política, impedindo o Habeas Corpus ao STF, o que resulta na interpretação da medida de detenção no sítio em um sentido tal que cria um instituto jurídico em que o detido tem sua liberdade de locomoção restrita, mas sem que isto implique o caráter de pena, aguardando um julgamento, sendo que foi detido não por um crime propriamente dito, mas por decisão discricionária do Presidente da República, e que depende de uma decisão política do Congresso para poder ser julgado e ter acesso a garantia fundamental do Habeas Corpus.
Desenvolvimento
E,
essa situação já com a ordem constitucional restaurada à normalidade, vez que
cessada a situação que levou a repressão. Tal interpretação deixou o direito
individual fundamental do detido no sítio totalmente dependente de juízos
políticos.
Ou
seja, se o Presidente da República julgasse conveniente, mandava deter (o que
implica, por conseguinte, em uma acusação criminal, a julgar pela terminologia
adotada pelo STF) e, se o Congresso não se manifestasse, continuaria detido
indefinidamente, ainda que sem pena alguma, até o Congresso decidir a conveniência dos atos do Presidente durante o
sítio.
Ponto
de fundamentação mais breve, mas que veio a causar grande efeito nas discussões
seguintes do STF sobre estado de sítio, dizia respeito à duração das medidas
tomadas dentro do estado de sítio.
No
acórdão do HC 300, o voto vencedor afirmava que as medidas tomadas no estado de
sítio não se encerravam automaticamente com a cessação do estado de sítio. Tal
decisão carrega em si uma fundamentação simples, mas que acabou se tornando a
solução para uma controvérsia complexa. A duração das medidas tomadas no estado
de exceção não era explicitamente colocada na Constituição de 1891.
Deste
modo, confrontados com detenções, determinadas no decreto que declarava o
sítio, que ainda perduravam após o fim da situação de sítio, os ministros do
STF tiveram que dar resposta a seguinte pergunta:
a detenção deve cessar imediatamente com o fim do estado de sítio ou a detenção
pode se prolongar, mesmo depois de
restaurada a normalidade constitucional?
A
resposta de tal pergunta, obviamente, é central à decisão do caso, uma vez que,
no caso de a detenção cessar junto com o estado de sítio, a detenção perderia
seus fundamentos e deveriam ser soltos os detidos.
Entretanto,
o STF decidiu que as medidas tomadas no estado de sítio se prolongam além da
cessação do estado de sítio, até os detidos serem submetidos aos tribunais competentes.
Aqui, novamente, a detenção aparece como preventiva, sem revestir o caráter de
penalidade, mas atrelada a um possível processo criminal.
Ao
que tudo indica, portanto, o sentido da detenção no estado de sítio que está presente nesse acórdão é a ideia de
que a detenção configura uma medida política e discricionária do Presidente da
República, decretada em um estado de sítio, pelo qual o detido é privado da
liberdade de locomoção sem as garantias
do devido processo legal, para ser futuramente submetido a um processo criminal
e decidida, apenas ao fim deste, a
transformação da detenção em pena ou o livramento do detido.
Para
chegar ao livramento, portanto, é
necessário que ocorram todos os seguintes fatos: (1) o fim da comoção intestina
e a cessação do estado de sítio, (2) o
juízo político do Congresso, antes do qual o Judiciário não poderia decidir e
(3) a apresentação do detido a um
tribunal competente.
Os
tribunais competentes para a decisão sobre a detenção não são explicitados na
Constituição, nem tampouco nesse acórdão. Entretanto, o Habeas Corpus
415, ao decidir questões de competência e de indivisibilidade de juízo, deixa
entrever que as regras de competência seriam as da legislação penal vigente,
sendo a detenção tratada como uma medida temporária anterior à uma decisão de
caráter verdadeiramente penal. O único voto divergente na decisão do HC 300 foi
o voto do ministro Piza e Almeida.
Ele
interpretou o regimento interno do STF, no seu art. 65, § 3º: “O tribunal se
declarará incompetente para conceder a ordem [...] se a coação proceder de autoridade militar, no
exercício privativo de suas atribuições contra outro militar ou cidadão sujeito no regímen militar (Dec. n.
848 de 11 de outubro de 1890, art. 47), ou se tratar-se de medida de repressão autorizada pelo art. 80 da
Constituição de 1891, enquanto perdurar o estado de sítio”.
E,
Piza e Almeida interpreta, a contrario sensu, que se o regimento
determina que o tribunal é incompetente enquanto perdurar o estado de sítio,
isso implica que, uma vez cessado o sítio, ele seria competente para conceder a
ordem.
Além
desse fundamento, baseado em uma interpretação textual, divergiu no sentido de
conceder a ordem baseando em um fundamento histórico. Uma vez que não havia lei
regulamentando o art. 80 da Constituição brasileira de 1891, voltou-se à
tradição sob a Constituição anterior para buscar antecedentes que guiassem a interpretação.
O ministro Piza e Almeida referiu ao art. 179, XXXV da Constituição Imperial de
1824, que previa:
Nos casos de rebelião, ou invasão de
inimigos, pedindo a segurança do Estado, que se dispensem por tempo determinado
algumas das formalidades, que garantem a liberdade (sic) individual, poder-se-á
fazer por acto especial do Poder Legislativo.
Não
se achando, porém, a esse tempo reunida a Assembleia, e correndo a Pátria perigo iminente, poderá o Governo exercer esta
mesma providencia, como medida provisória indispensável, suspendendo-a imediatamente que cesse a
necessidade urgente, que a motivou; devendo num, e outro caso remeter à Assembleia, logo que reunida for,
uma relação motivada das prisões, e d'outras medidas de prevenção tomadas; e quaisquer Autoridades, que tiverem
mandado proceder a elas, serão responsáveis pelos abusos, que tiverem praticado a esse respeito.
Colocando
esse dispositivo como antecessor, na tradição constitucional brasileira, do
art. 80 da Constituição da República de 1891, Piza e Almeida fundamentou seu
voto em uma ampla base de legislação imperial
que aplicava o dispositivo do art. 179, XXXV, para demonstrar que, sob a
Constituição Imperial, a detenção sem
processo só era mantida durante a situação de rebelião ou invasão. Nas palavras
do próprio, sobre as Leis e decretos imperiais:
As
leis e decretos citados, dando ao preceito constitucional sua verdadeira
inteligência, terminantemente declaram que a faculdade, que tem o Governo, para
mandar prender e conservar em prisão um cidadão sem ser sujeito a processo, é somente durante o tempo
da suspensão de garantias, que deve necessariamente ser fixo e determinado.
Entendendo
que “não se pode admitir que a Constituição Republicana seja interpretada e executada de modo menos liberal, e menos
garantidor dos direitos e liberdades individuais, do que o foi a do império
pelas leis e decretos citados” interpretou o art. 80 da Constituição de 1891 como impedindo a manutenção da detenção no
estado de sítio. A conclusão desse voto divergente, portanto, foi a seguinte:
Durante
o estado de sítio tem o Governo a faculdade de efetuar as prisões que a
segurança do Estado exigir. Mas se levantado o estado de sítio, os cidadãos
continuam presos ou desterrados, sem serem sujeitos a processo, havendo assim
para eles uma suspensão de garantias por tempo indeterminado, contra a expressa
disposição do art. 80 da Constituição, a lei os provê de remédio para
resguardarem-se de semelhante violência, e esse remédio é o habeas corpus.
Em
1893, o STF voltou a julgar Habeas Corpus de detidos em estado de sítio,
mas desta vez com uma discussão razoavelmente diferente ao fundo. Uma vez
colocado o entendimento do HC 300 de que as medidas não revestem caráter penal,
mas que a detenção se estende após cessado o sítio até submeter o detido ao
foro criminal competente, o tribunal foi
chamado a decidir sobre detidos que alegavam não se enquadrarem na competência criminal da justiça militar.
Foram
três Habeas Corpus, impetrados por Ruy Barbosa em favor de diferentes
pacientes, todos capturados a bordo do navio “Júpiter”, embarcação de guerra
rebelada contra o governo no episódio da Revolta da Armada.
O
primeiro destes a ser julgado foi o HC 406. Apresentados os pacientes ao STF,
que eram em número de 48 no caso, concederam por maioria a soltura com um único
argumento como fundamentação. O argumento dizia respeito à incompetência do
Foro Militar para julgá-los diante dos fatos que eram imputados:
Vistos, expostos e discutidos os presentes autos de habeas corpus, em que são pacientes David Ben Obill[25] e outros, resolve o Supremo Tribunal Federal conceder a referida ordem de soltura em favor dos detidos, visto ser ilegal a conservação da prisão em que se acham, desde que se verifica pelos autos e pelas informações prestadas, que os fatos que lhes são imputados, não constituem crimes que os sujeitem ao foro militar.
Os
votos divergentes também são igualmente sucintos e pouco argumentados. O
ministro Bento Lisboa, cujo voto divergente se resume a uma frase, decidiu pela
manutenção dos pacientes na prisão, visto que estes teriam cometido crimes inafiançáveis e sido
detidos em flagrante delito, mas que deveriam ser conduzidos a um juízo competente, não militar, para serem
processados por tais delitos.
A
outra divergência, do ministro Sobral, indica
uma pequena ampliação nos fundamentos dessa postura, referindo ao fato do STF
não reconhecer como vigorantes certos
Códigos Penais da Marinha, promulgados em 1890 e 1891, e referindo a legalidade
da prisão dos pacientes como sendo
fundada no art. 1º, §§ 2º e 5º da Lei 631 de 1851 e art. 60, letra I, da
Constituição de 1891.
Diante
da ausência de estruturas argumentativas mais elaboradas, essas referências à
legislação, pelo ministro Sobral, são a única coisa que permite entrever o
debate enfrentado pelo STF quando dessa decisão. O art. 60, letra I, da Constituição de 1891 fazia
referência à competência dos Tribunais Federais para julgar crimes políticos.
Com isso, entrevê-se que o que pretendia Sobral era a readequação da competência em relação aos pacientes, devendo-se retirá-la da Justiça Militar e passando à Justiça Federal, por se tratarem de crimes políticos[26].
No
entanto, as normas da Lei 631/1851 diziam respeito aos crimes de deserção,
espionagem, sedução de militares para desertarem ou se levantarem contra o
governo e atacar sentinelas.
Mais
especificamente, previam ritos distintos de processamento: quando estes crimes
eram cometidos por militares, seriam processados nos termos daquela lei e de
acordo com o Direito Penal Militar, ao passo que quando cometidos por paisanos,
seriam processados nos termos da lei civil.
O
que se conclui da leitura sistemática da legislação citada e da breve argumentação
é que o voto do Ministro Sobral considerava a Lei 631/1850 como norma válida
para o processamento dos militares
envolvidos, mas, que o cometimento dos mesmos crimes por civis configurava
crime político, sendo julgado pela
Justiça Federal, a partir da Constituição Republicana.
Assim,
reproduz-se nessa decisão a lógica do HC 300 de que a detenção no estado de
sítio é pré-penal, quer dizer, é prévia a um processo penal, mas sem o caráter
de pena. Mais ainda, a decisão da maioria é de que, no caso de não serem
levados os detidos ao foro competente, a detenção torna-se ilegal e cessa após
o Estado de Sítio cessar.
De
outro lado, também se observa o reconhecimento do aspecto de crime político aos
fatos delituosos cometidos por civis e que resultem na detenção excepcional.
No
Habeas Corpus 410, julgado pelo STF na semana seguinte ao julgamento do
HC 406, tratou-se de um imediato do
navio Júpiter, que fora detido e mantido incomunicável, e que por isso foi
defendido em Habeas Corpus em
separado, após o julgamento dos demais, mas que estava inserido, no tocante aos
fatos e as características subjetivas, no
mesmo grupo do Habeas anterior.
Mesmo
assim, a corte não se limitou a estender ao imediato a decisão do HC 300, mas o
fez com uma fundamentação aumentada, mas ainda consideravelmente breve, para
conceder a soltura. Sobre essa fundamentação, é importante destacar o seguinte
trecho:
Que
incumbe aos Tribunais de Justiça verificar a validade das normas que têm de
aplicar aos casos ocorrentes e negar efeitos jurídicos àquelas que forem
incompatíveis com a Constituição, por ser esta a lei suprema e fundamental do
país;
Que
este dever não só decorre da índole e natureza do Poder Judiciário, cuja missão
cifra-se em declarar o direito vigente,
aplicável aos casos ocorrentes regularmente sujeitos à sua decisão, se não
também é reconhecido no art. 60, letra
“a”, da Constituição que inclui na competência da Justiça Federal o processo e
julgamento das causas em que alguma das
partes fundar a ação ou a defesa em disposição Constitucional (BRASIL, STF, HC
410, p.2);
Nesse
trecho, o STF reconhece a existência do controle difuso de constitucionalidade
no sistema jurídico brasileiro. Tal questão, referente ao controle de
constitucionalidade no Brasil, sob a Constituição de 1891, voltaria a ser
detalhadamente discutida em outro momento, nas ações dos reformados pelos atos
do Marechal Floriano Peixoto no contexto da Revolta da Armada, que foi proposta
por Ruy Barbosa[27].
Mas
já nesse Habeas Corpus, o STF reconhecia tal mecanismo e colocava-o nas
bases de sua decisão. É uma das primeiras menções ao controle de
constitucionalidade na jurisprudência nacional. Que tenha ocorrido em uma
decisão sobre o Estado de Sítio pode representar um indicativo da importância
de um controle de constitucionalidade adequado nas situações limite da
Constituição, especialmente em relação ao estado de exceção.
Portanto,
é, justamente, no ponto em que o quadro da Constituição está em risco de
romper-se que o controle de constitucionalidade demonstra sua essencialidade.
Além
disso, na decisão no caso, a Corte resolveu um ponto essencial ao controle de
constitucionalidade, que é a distinção
entre a não aplicação e a revogação, explicando que a consequência da
inconstitucionalidade é a não aplicação,
e que esta não se confunde com a revogação da norma (a qual compete apenas ao
legislador, no sistema de controle de
constitucionalidade difuso do Brasil à época).
Outro
ponto refere-se às competências na exceção. Logo após a proclamação da
República, dentro do contexto do governo ditatorial e provisório, foi concedida
ao Ministério da Marinha (órgão do Executivo, portanto) a competência de
reformar o Código da Armada. No entanto, o Ministério da Marinha apenas fez uso
dessa competência após a Constituição de 1891 entrar em vigor, ou seja, já fora
do período de exceção do governo provisório.
O
STF entendeu, então, que este uso da competência era inconstitucional, porque a
Constituição marcava um retorno à normalidade e que com isso caducava a
competência excepcional, pois a Constituição reservara ao Legislativo o poder
de legislar.
Constata-se,
ora a inconstitucionalidade de uma medida de exceção tomada fora do prazo dado
sendo declarada pelo STF, a partir da qual observamos um controle judicial
sobre o quadro normativo de exceção, a partir do retorno à normalidade
constitucional.
A
consequência disso, no caso, foi que a competência para processar o detido
seria determinada a partir do Código Penal e da legislação militar do período
do Império.
Com
isso, a Lei 631/1851, citada pelo Ministro Bento Lisboa no HC 406, foi invocada
no HC 410, justamente para comprovar que o crime de sedução à deserção ou ao
levante contra o governo era de competência da Justiça comum, quando cometido
por civis.
Com
isso, ausente a jurisdição militar, a decisão entendia que a prisão militar
sendo incompetente o foro militar configurava constrangimento ilegal,
suficiente para deferir o Habeas Corpus.
O
único voto divergente nesta decisão, do Ministro Ferreira de Resende, negava a
soltura alegando que não haviam sido apresentados o paciente nem as informações
necessárias, motivo pelo qual se considerava inabilitado para julgar a causa,
sem desenvolver quanto ao mérito[28].
O
Estado de defesa, o estado de sítio e a intervenção federal[29]
representam medidas extraordinárias previstas pela Constituição Federal
vigente, que objetiva a restabelecer ou garantir a continuidade da normalidade
constitucional ameaçada.
Trata-se
de instrumentos que são estados de exceção e somente devem ocorrer quando
estritamente necessários e por prazo determinado, sob risco de dar vez e voz
aos impulsos autoritários e regimes totalitários.
O
estado de defesa e de sítio tipificam regimes jurídicos para crise grave, seja
decorrente de guerra, golpe de Estado, calamidades que afetam o Estado e as
instituições democráticas.
Ao
prever uma disciplina jurídica para tais momentos excepcionais, a Constituição
institui mecanismos de autopreservação, a fim de evitar, seja a falta de regulação
jurídica (que abriria espaço para arbitrária utilização do poder jurídico ou
mesmo da força bruta, sem limites jurídicos predefinidos), seja o afastamento
ou suspensão indiscriminado e episódico da Constituição ou de importantes
normas suas, seja a quebra ou ruptura definitiva da Constituição.
Por
prover tratamento diferenciado previsto no bojo da própria Constituição para
situações excepcionais, pois assim o texto constitucional consegue atravessar
as crises graves sem ser abandonada ou esquecida e, prevê medidas extremas de
salvação pública, que é a prova de sua estabilidade. Regula não apenas a
normalidade, mas também as exceções.
As
expressões utilizadas para a disciplina normativa de situações de crise grave
revelam muito de seu sentido estado ou direito de necessidade constitucional,
sistema constitucional de crises, direito de crise, legalidade constitucional
extraordinária ou excepcional, estado de exceção, estado de salvaguarda, Estado
de Direito Democrático excepcional, sistemas de emergência, Constituição de
emergência, direito de síncope.
O
poder de decretar o estado de exceção é dos mais fortes, a ponto de se ter
afirmado que soberano é “aquele que decide sobre o estado de exceção” (Carl
Schmitt)[30].
A
preocupação autocentrada da Constituição com sua estabilidade tem base na
experiência: crises graves serviram e servem de pretexto para o rompimento da
ordem constitucional, o abandono da Constituição, a instalação da ditadura e do
arbítrio.
É
preciso, contudo, saber reconhecer quando uma ordem constitucional legítima
está em perigo e requer a decretação de medidas drásticas de salvação,
diferentemente de quando uma ordem constitucional não é – ou não é mais –
legítima e requer-se a manifestação autêntica do poder constituinte para o
estabelecimento de uma nova Constituição.
Nesta
hipótese, que também é de quebra (abandono) definitiva da ordem constitucional
vigente, a utilização espúria de medidas como o estado de defesa ou de sítio
representa um obstáculo reacionário indevido à manifestação legítima do poder
constituinte.
Em
menor escala, o recurso a estados de exceção não deve servir de pretexto para
ameaçar ou tolher o direito de crítica e de oposição, imprescindível a uma
democracia, em que as divergências devem ser livres e protegidas. Feita a
advertência, supõe-se que a disciplina constitucional das situações de crise
grave garanta a vigência de uma ordem constitucional legítima.
Se
os estados de defesa e de sítio estão vocacionados a proteger a Constituição de
modo geral, têm eles o objetivo de defender diretamente o Estado e as
instituições democráticas.
Daí
aludir-se ao Estado como titular de um direito de existência, de
autopreservação, de soberania.
Contudo,
não se deve confundir a defesa do Estado
(preocupação permanente objetivada pela disciplina das situações constitucionais de crise) com a
defesa de determinado Governo (preocupação
política conjuntural, a ser adequadamente resolvida com o funcionamento normal das instituições), embora
seja essa uma distinção muito relativa; não
se sustenta constitucionalmente o emprego do estado de defesa ou de sítio com base numa espúria “doutrina de segurança
nacional”, cara a regimes de força (especialmente de matriz militar). Contudo,
todas as pessoas são titulares do direito de preservação da Constituição, do
Estado e das instituições democráticas.
Somente
a agressão (potencial ou efetiva) à ordem constitucional, e de modo grave, ou
seja, com fortíssima intensidade, é que autoriza a decretação dos estados de
defesa ou de sítio. Violações pontuais e de gravidade relativa devem encontrar
resposta adequada nos mecanismos ordinários de proteção da Constituição, do
Estado e das instituições democráticas (controle de constitucionalidade,
intervenção, emprego das forças armadas ou dos órgãos de segurança pública
etc.).
Há
uma nota de subsidiariedade: os estados de exceção somente podem ser sacados
quando os meios coercitivos normais não derem conta da situação.
O
avanço do Direito Internacional faz com que a regulação jurídica das situações
de crise grave ultrapasse as fronteiras dos Estados e de suas Constituições, e
tenha em perspectiva a salvaguarda da ordem jurídica internacional.
Nesse
sentido, o Pacto Internacional de
Direitos Civis e Políticos[31]
(ONU, 1966), que permite aos Estados partes adotar medidas que suspendam as
obrigações decorrentes do Pacto, se oficialmente
proclamadas e na estrita medida em que o exigir uma situação excepcional que ameace a existência da nação, desde que
tais medidas não sejam incompatíveis com
as demais obrigações que sejam impostas aos Estados pelo Direito Internacional
e não acarretem discriminação alguma
apenas por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião ou origem social” (art. 4º, 1).
Observemos
a definição normativa dada pelo texto da
Constituição brasileira de 1988 ao estado de defesa, in litteris: “para
preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a
ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade
institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza”
(art. 136, caput)[32].
O
estado de sítio cabe, nos termos do art. 137, I e II da Constituição vigente,
nos casos de “comoção grave de
repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de
medida tomada durante o estado de
defesa” (estado de sítio simples), bem como nos de “declaração de estado de guerra ou resposta a
agressão armada estrangeira” (estado de sítio
qualificado).
As
hipóteses previstas no art. 137, I, são de “sítio fictício” ou “sítio
atenuado”, pois não há, de fato, “sítio” (no sentido de efeito de cerco, de
assédio), mas sim, situação de crise grave equiparada.
Realmente,
nenhuma diferença essencial existe entre os estados de defesa e de sítio, tendo
em vista que se trata de espécies de mesmo gênero, que diferem, basicamente,
quanto à intensidade da crise, pelo que as medidas adotadas no estado de sítio
podem ser mais amplas e severas, em verdade, afirma-se que o estado de defesa
seriam um "estado de sítio mitigado".
Não
existe, necessariamente, subsidiariedade do estado de sítio em relação ao de
defesa, ou seja, cada qual atende a seus próprios pressupostos e podem,
inclusive, ser decretados simultaneamente, hipótese pouco provável, por
exemplo, uma calamidade enorme provocada por chuvas torrenciais, que enseja a
decretação de esteado de defesa ao mesmo tempo de uma agressão armada
estrangeira, que enseja a decretação de estado de sítio, embora o estado de
sítio tenda a absorver o estado de defesa.
A
independência entre estes é excetuada em relação ao estado de sítio decretado
justamente com base na ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida
tomada durante o estado de defesa. Que
pressupõe a decretação anterior de estado de defesa e, pelo menos quanto à
causa específica substitui-o caso a situação que gerou o estado d defesa não
debelado persista.
É
possível, portanto, decretar estado de sítio diretamente, sem prévia decretação
de estado de defesa, pois há hipóteses que são exclusivas do estado de sítio
(como a guerra). Também é possível convolar o estado de sítio em estado de
defesa, quando se verificar que a situação específica é de menor gravidade e
extensão.
Mesmo
a localização da causa (interior ou exterior) talvez já não seja critério seguro para distinguir o estado de defesa do
de sítio: dizia-se que o estado de defesa destinava-se a proteger o Estado de crise
interna, enquanto o estado de sítio destinava se tanto a proteger o Estado de
crise interna não debelada pelo estado de defesa, quanto de crise externa.
Todavia,
se é certo que o estado de sítio esteja previsto para os conflitos bélicos internacionais, também pode
ser utilizado para debelar desordens internas,
como visto, e o estado de defesa pode prevenir ou combater instabilidades institucionais decorrentes de fatores internos
ou externos (por exemplo, vicissitudes do mercado internacional), bem como calamidades
naturais ocorridas no Brasil ou no exterior[33].
Quanto
ao momento, os estados de defesa e de sítio podem ser classificados em
preventivos (quando pretendem evitar a crise) ou repressivos (quando pretendem
debelar a crise já deflagrada), sempre tendo em conta a restauração da
normalidade abalada.
Embora
o estado de sítio, mais grave, seja mais provável na modalidade repressiva, tendo em mira uma crise atual
(tanto que a Constituição alude a “preservar ou prontamente restabelecer... a
ordem pública ou a paz social ameaçadas” apenas quando trata do estado de defesa – no art.
136, caput, limitando-se a dizer “nos casos de.”, quando trata do estado de sítio – art.
137, caput), não está excluída a possibilidade
de decretação preventiva, inclusive porque pode ter a mesma causa do estado de
defesa (art. 137, I); em outra hipótese, para ilustrar, a declaração de estado
de guerra pode ainda não estar acompanhada de atos efetivos (art. 137, II).
Conclusão
Cumpre
alertar para a taxatividade das causas autorizadoras de decretação de estado de
defesa e de sítio, ou pressupostos materiais que devem estar previstas com
clareza no texto constitucional e, não podem ser outras, senão apenas aquelas
taxativamente enumeradas.
Cumpre
que são expressos os termos, apesar de não ser possível uma definição minuciosa
de hipóteses cuja configuração fática não é rigorosamente determinável. Uma vez
acertado que a causa aconteceu, para o que pesa a interpretação feita pelas
autoridades a quem a Constituição atribuiu participação, a saber: o Presidente
da República, os Conselhos da República e de Defesa Nacional e o Congresso
Nacional, a decretação é cabível.
Se,
porém, a causa não se verifica, não apenas os pressupostos materiais, mas
igualmente os pressupostos formais (forma de instauração por decreto;
procedimento: necessidade oitiva dos Conselhos da República e de Defesa
Nacional, aprovação ou autorização do Congresso Nacional, fundamentação do
decreto, conteúdo básico do decreto e, etc.
A
propósito, tais exigências formais refletem a tendência existente à
procedimentalização na formação de principais atos de poder público.
E,
a aludida taxatividade não caracteriza somente os pressupostos materiais e
formais, informando-se também quanto as restrições aos direitos, sendo cabíveis
somente aquelas expressamente previstas no texto constitucional vigente.
Cumpre,
por derradeiro, que tanto os estados de defesa e de sítio, que são por sua
essência, limitados no tempo, porque carregam em seu bojo o sentido avesso ou
contrário à normalidade constitucional (esta sim, vocacionada à longevidade).
A
propósito, o prazo máximo de duração do estado de defesa é de trinta dias,
sendo possível apenas uma única prorrogação, por igual período, o que totaliza
sessenta dias. A fixação da duração é elemento imprescindível do decreto, sem o
qual, este se revela inválido. A duração não fica, ao inteiro alvedrio do Presidente
da República, pois precisa fundamentar-se na exata duração das razões que tanto
justificaram a decretação.
No
caso do prazo previsto se escoar sem que o motivo desapareça, é necessária a
prorrogação, se findo o prazo desta, persistir o mesmo motivo, não se poderá
decretar novamente, nem prorrogar, o estado de defesa, ainda que o prazo total
das medidas anteriores não tenha ultrapassado os sessenta dias.
Tecnicamente,
a rigor, não se trata de prorrogação propriamente dita e, sim, de nova
decretação o que requer a edição de novo decreto, que deverá atender às
exigências do primeiro, inclusive com prévia oitiva dos Conselhos da República
e da Defesa Nacional.
A
cessação do estado de defesa pode ocorrer pelo término do prazo estipulado,
pelo desaparecimento do motivo ensejador e ainda pela rejeição do Congresso
Nacional. Se o Congresso Nacional houver rejeitado o decreto, não será possível
prorrogar o estado de defesa que não mais subsiste, por ter cessado
imediatamente (ex nunc) com a rejeição do Congresso.
Há
também a pouco provável hipótese de que o Presidente decretar estado de defesa
com a duração inferior a dez dias ou quinze, se o Congresso estiver em recesso.
E, enquanto o Congresso delibera, o Presidente, cessado aquele prazo, prorrogar
a decretação, o que seria sem aprovação, mas também sem rejeição do decreto
original, prorrogação que deverá ser apreciada juntamente com este pelo
Congresso Nacional.
Já
o estado de sítio terá um máximo de trinta dias, no caso de comoção grave de
repercussão nacional, ou então, a ocorrência de fatos que comprovem a
ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa, hipótese em que,
diferentemente do estado de defesa, admitem-se sucessivas prorrogações sem a
limitação de número, mas, à semelhança do estado de defesa, admitem-se
sucessivas prorrogações sem a limitação de número, mas à semelhança do estado
de defesa, nunca por mais de trinta dias, de cada vez, isto é, a prorrogação é
limitada no prazo, porém, não em número de vezes e, também à semelhança do
estado de defesa, as prorrogações devem ser sempre pautadas pela duração da
causa que justificou a decretação.
Já
o estado de sítio no caso de declaração de estado de guerra ou resposta a
agressão armada estrangeira, não tem duração máxima predefinida no texto constitucional,
mas também, nesse caso, o decreto deverá fixar uma duração, pois não se admite
a decretação de estado de crise grave por tempo indeterminado.
Portanto,
poderá ser prorrogado por tantas vezes que se fizer necessárias. Cada
prorrogação corresponde a nova decretação sucessiva e, deverá ciosamente
atender às exigências constitucionais.
O
penúltimo estado de sítio no Brasil foi feito em 24 de dezembro de 1935, quando
foi prorrogado por noventa dias, tendo obtido autorização do Congresso Nacional
para equipará-lo, no que fosse necessário e conforme previa a Emenda nº1, ao
estado de guerra. A justificativa de Getúlio era de que “não obstante as
medidas preventivas e coercitivas empregadas pelas autoridades civis e
militares, permitidas pelo estado de sítio, força é confessar ainda não
desistiram os extremistas de seu propósito”.
No
dia 23 de novembro de 1955, a instauração do estado de sítio foi aprovada pela
Câmara dos Deputados por 178 votos contra 91, e no dia seguinte, pelo Senado
Federal foi aprovado por 35 votos contra
16. No dia de 25 de novembro de 1955, o Decreto 2.654 instaurou o estado
de sítio no Brasil por trinta dias, determinando que fosse ainda nomeado
executor para zelar por sua vigência e expedida uma regulamentação a respeito.
No
dia 28 de novembro de 1955, General Henrique Teixeira Lott[34]
dirigiu nota circular aos comandantes das zonas e regiões militares, informando
que as forças armadas estavam “unidas e coesas, isentas de partidarismos e
atentas em seus deveres, impedindo que a nação caminhe para a anarquia ou para
a ditadura”.
Nessa
ocasião, foi nomeado executor do estado de sítio, sem prejuízo de suas funções
de comandante da 1ª Região Militar, o general-de-divisão Antônio José de Lima
Câmara. Outro estado de sítio que foi prorrogado sucessivamente pelo Decreto nº
38.402, de 23 de dezembro de 1955, pela Lei nº 2.706, de 10 de janeiro de 1956,
e pela Lei nº 2.713, de 21 de janeiro de 1956. Em 9 de fevereiro de 1956, já
com Juscelino na presidência da república, o estado de sítio foi suspenso,
entrando em vigor a medida de suspensão no dia 15 daquele mês.
O
estado de guerra foi, finalmente, instaurado pelo Decreto nº 702, de 21 de
março de 1936, quando expirava a vigência do estado de sítio. Este conferia ao
chefe de Estado poderes extraordinários, só concedidos em tempo de guerra, e
que normalmente seriam prerrogativas do Legislativo.
Apesar
de haver restrição aos direitos de ir e vir, de reunião, o bloqueio total de
atividades, também chamado de lockdown poderá ser implementado sem que
se decrete o estado de defesa ou necessidade. E, a crise aguda causada pelo Covid-19,
o Estado possui mecanismos e instrumentos adequados para enfrentar a pandemia
sem ter que aderir aos regimes de exceção.
Em
regra, o lockdown[35]
as pessoas só podem ir até à rua para realizar compras em supermercados e
farmácias ou trabalhar em atividades essenciais.
Torna-se
legítima a evidente limitação de alguns direitos fundamentais. Particularmente,
os direitos de ir e vir e de reunião, apesar de existir alguns a questionar a
constitucionalidade.
A
Constituição brasileira prevista e em vigência permite a restrição desses
direitos fundamentais dos estados de defesa ou de sítio, aliás, o Brasil não
decretou nenhum destes, e sim, o estado de calamidade pública. Apesar de que o
estado de defesa pode ser instituído com o fito de preservar ou restabelecer a
ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade
institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.
Destaca-se
o momento de legalidade extraordinária em face da pandemia, o que caracteriza
um estado de exceção. A legalidade extraordinária é forma admitida mesmo no
Estado Democrático de Direito reage diante de situação emergencial[36].
Não ocorre a anomia, que é a ausência ou suspensão de leis e direitos, como no
estado de exceção.
Na
legalidade extraordinária, o Estado prossegue submisso à legislação e dever
criar o mínimo possível de novas leis. Pois, o objetivo é solucionar os
problemas com base no ordenamento jurídico vigente.
A
imposição de lockdown sem a decretação de estado de defesa ou estado de
sítio não é inconstitucional porque estabelece medidas menos agressivas aos
direitos fundamentais do que as que ocorreriam nestes regimes. À medida que
forem menos gravosas, tais medidas são preferíveis do ponto de vista da
proporcionalidade, por serem menos limitadores de direitos fundamentais.
Ressalte-se,
ainda, que em 15.4.2020 o Supremo Tribunal Federal reconheceu, através de
videoconferência, o Plenário, por unanimidade referendou medida cautelar
deferida em março daquele ano, pelo Ministro Marco Aurelio.
Assim,
o plenário do STF, por unanimidade, confirmou entendimento de que as medidas
adotadas pelo Governo Federal da Medida Provisória 926/2020 para enfrentamento
do novo coronavírus não afastam a competência concorrente nem tomada de
providências normativas e administrativas pelos Estados, pelo Distrito Federal
e pelos municípios.
A
decisão foi prolatada em face da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)
6341 (Disponível a íntegra da decisão no Link: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI6341.pdf
).
Por
outro lado, a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional, declarada
pelo Ministério da Saúde, em fevereiro de 2020, não tem prazo definido para
acabar e depende de ato do próprio ministério, mas não será maior que o tempo
de emergência declarado pela Organização Mundial da Saúde (OMS[37]).
Essa declaração fundamenta todas as ações urgentes de prevenção, controle de
riscos e danos à saúde pública. In: Agência Brasil. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2020-12/covid-19-decreto-de-calamidade-publica-vale-ate-meia-noite-de-hoje
Acesso em 13.3.2021.
O
estado de calamidade pública autoriza o governo federal a descumprir regras da
Lei de Responsabilidade Fiscal. Ficam suspensos prazos para ajuste das despesas
de pessoal e dos limites do endividamento; para cumprimento das metas fiscais;
e para adoção dos limites de empenho (contingenciamento) das despesas.
O
Ministro Lewandowski estendeu em 30.12.2021 a vigência de medidas sanitárias
contra Covid-19, a fim de assegurar a continuidade de medidas profiláticas e
terapêuticas necessárias ao enfrentamento da pandemia.
O
Ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), estendeu a
vigência de dispositivos da Lei 13.979/2020 que estabelecem medidas sanitárias
para combater à pandemia da Covid-19. A decisão do ministro, proferida na Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6625, ajuizada pela Rede
Sustentabilidade, leva em conta o término do prazo de vigência da lei, que
ocorrerá em 31.12.2020.
A medida cautelar será submetida a referendo do Plenário da Corte. Vide a íntegra da decisão, no link: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI6.625MC4.pdf Acesso em 13.3.2021.
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Acesso em 13.3.2021.
Notas:
[1]
Foi um ato do Parlamento do Reino Unido que autorizou as autoridades locais a
declarar que qualquer grupo de doze ou mais pessoas se reunisse ilegalmente e
se dispersasse ou enfrentasse ação punitiva. Dotado de longo título do ato era
"um ato para prevenir tumultos e assembleias tumultuadas e para punir os
desordeiros de maneira mais rápida e eficaz e entrou em vigor em 1 de agosto de
1715. Foi revogado na Inglaterra e no País de Gales pela Seção 10 e Parte III
do Anexo 3 da Lei de Direito Penal de 1967. Atos semelhantes ao Riot Act
passaram para as leis das colônias britânicas na Austrália, Canadá e América,
alguma das quais permanecem até hoje. A frase "leia o Riot Act"
passou a ser usada como severa reprimenda ou advertência das consequências.
[2]
Importado pela Carta Magna Imperial de 1.824, embora sem a denominação
hodierna, dispunha no art. 179, § 35: nos casos de rebelião ou invasão de
inimigos pedindo a segurança do Estado se dispensassem por tempo determinado,
algumas formalidades que garantem a liberdade individual.
[3]
Foi a Constituição francesa emitida por Rei Luís XVIII, quando ocorreu a
restauração de Bourbon. A carta que foi revisada em 1830 e, permaneceu em vigor
até 1848, preservou muitas liberdades conquistadas pela Revolução Francesa.
Estabelecera a monarquia constitucional com um parlamento bicameral, e garantiu
as liberdades civis, proclamou a tolerância religiosa e reconheceu o catolicismo
como religião oficial. O fundamento
sobre o poder político que nesta se estabeleceu não é a soberania, mas sim, a
autoridade real, concretizada nos direitos e prerrogativas tradicionais da
Coroa, limitados pelo Soberano. Em virtude desta limitação, certos direitos e
garantias são atribuídos aos cidadãos, resultado de um ato gracioso de poder
real. Deu-se o reconhecimento de certos direitos particulares que o estado se
compromete a assegurar.
[4]Houve
dispositivo na Constituição brasileira de 1967 que disciplina a suspensão de
direitos políticos por seu uso abusivo, que não há similar em nenhuma outra
legislação pesquisada. In litteris:
Art.151- Aquele que abusar dos direitos individuais previstos nos §§ 8º,
23, 27 e 28 do artigo anterior e dos direitos políticos, para atentar contra a ordem democrática ou praticar a corrupção, incorrerá
na suspensão destes últimos direitos
pelo prazo de dois a dez anos, declarada pelo Supremo Tribunal Federal,
mediante representação do Procurador-Geral da República, sem prejuízo da ação
civil ou penal cabível, assegurada ao paciente a mais ampla defesa. Parágrafo único:
Quando se tratar de titular de mandato eletivo federal, o processo dependerá de
licença da respectiva Câmara, nos termos do art. 34, § 3º. (BRASIL,1967).
[5]
O estado de calamidade pública é um termo definido por um decreto de 2010,
editado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo o texto, é
caracterizado por "uma situação anormal, provocada por desastres, causando
danos e prejuízos que impliquem o comprometimento substancial da capacidade de
resposta do poder público do ente atingido". Ele pode ser decretado por
prefeituras, Estados e União. Em geral, a calamidade é decretada quando, em
razão da magnitude dos danos, o estado requer auxílio direto e imediato para
arcar com os custos do atendimento. É o nível mais grave de atenção possível.
In: NOVO, Benigno Núnez. Estado de calamidade pública. Disponível em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/3072/estado-de-calamidade-pblica
Acesso em 13.3.2021.
[6]
Dirigido pelo presidente da República, esse Conselho é composto pelo
vice-presidente da República, os presidentes da Câmara e do Senado, os líderes
da maioria e da minoria na Câmara e no Senado, o ministro da Justiça e seis
cidadãos brasileiros maiores de 35 anos de idade. Foi criado pela Lei 8.041/90.
Dos atuais membros, dois são ligados ao Poder Executivo Federal: o presidente
da República Jair Bolsonaro e o Ministro da Justiça André Mendonça. Ligados ao
Poder Legislativo Federal há outros seis membros: os deputados Arthur Lira,
Presidente da Câmara, líder da maioria na Câmara Aguinaldo Ribeiro e líder na
minoria na Câmara José Guimarães, respectivamente; além dos senadores,
Presidente do Senado Federal do Brasil. Rodrigo Pacheco, o líder da maioria no
Senado Renan Calheiros e líder na minoria no Senado Jean-Paul Prates,
respectivamente. A primeira convocação efetiva do Conselho foi em fevereiro de
2018 -- em sessão conjunta com o Conselho de Defesa Nacional -- para uma
consulta a posteriori sobre a intervenção federal na segurança pública do
estado do Rio de Janeiro.
[7]
Atualmente a organização e o funcionamento do Conselho de Defesa Nacional são
regulados pela Lei n° 8.183, de 11 de abril de 1991, alterada pela Medida
Provisória nº 2216-37, de 2001. Estrutura do Conselho de Defesa Nacional
(Atual): Presidente Jair Messias Bolsonaro (Presidente do Brasil); Secretário
Executivo: General Augusto Heleno (Ministro de Segurança Institucional);
Estatutários: Hamilton Mourão (Vice-presidente do Brasil); Arthur Lira
(Presidente da Câmara dos Deputados do Brasil); Rodrigo Pacheco (Presidente do
Senado do Brasil); Fernando Azevedo e Silva (Ministro da Defesa); André Luiz de
Almeida Mendonça (Ministro da Justiça e Segurança Pública ); Ernesto Araújo
(Ministro das Relações Exteriores); Paulo Guedes (Ministro da Economia);
Assessores Militares; Ten.-Brig.-do-Ar Raul Botelho (Comandante do Estado Maior
das Forças Armadas); Alte.Esq. Ilques Barbosa Junior (Comandante da Marinha);
Gen.Ex. Edson Leal Pujol (Comandante do Exército); Ten.-Brig.-do-Ar Antônio
Carlos Moretti Bermudez (Comandante da Força Aérea); Participantes adicionais O Presidente da República pode
nomear novos participantes, quando apropriado.
[8]
No direito do trabalho brasileiro, o teletrabalho era regido, por analogia,
pelo art.6°, caput, da CLT, cuja redação não tratava do trabalho a distância,
mas do executado em domicilio, como visto. A instituição legislativa do teletrabalho
no ordenamento jurídico trabalhista brasileiro se deu por meio da lei 12.551,
de 15 de dezembro de 2011, que alterou a redação do caput do art.6° da CLT,
prevendo o trabalho a distância, e inseriu o parágrafo único, que equipara a
submissão aos meios telemáticos e informatizados de controle do trabalho aos
meios pessoais e diretos, para fins de subordinação jurídica, ou seja, para a
caracterização de um contrato de trabalho.
[9]
A Lei 13.979, de 6 de fevereiro de 2020 dispõe sobre as medidas para enfrentamento
da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente de surto
pandêmico iniciado no ano de 2019. Posteriormente, a pandemia provocou, através
do Decreto Legislativo 6, de 20 de março de 2020, o reconhecimento oficial do
estado de calamidade pública no brasil. Além de flexibilizar os limites
orçamentários e permitir a destinação excepcional de mais recursos à saúde sem
cometimento de crime de responsabilidade fiscal, a medida também legitima a
instauração de regimes jurídicos urgentes e provisórios, com a finalidade de
conter os impactos da situação calamitosa. A Resolução 313 do CNJ determinou,
ainda, a suspensão dos prazos processuais até 30 de abril de 2020 (art. 5º),
não obstando a prática de ato processual necessário à preservação de direitos e
de natureza urgente (parágrafo único). Os tribunais podem, evidentemente,
estender o período de suspensão, a depender das condições locais ou regionais
da propagação do vírus. A Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj)
aprovou hoje (24), em discussão única, a prorrogação do estado de calamidade
pública para prevenção e enfrentamento à pandemia do novo coronavírus no estado
e em dez municípios fluminenses. No caso da calamidade estadual, a prorrogação
se estenderá até o dia 1º de julho. Já com relação aos municípios, os prazos
iniciais e finais estabelecidos em cada norma municipal devem respeitar como
limite final a data de 31 de dezembro de 2021. Em 30.12.2021, Ministro Ricardo
Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), prorrogou estado de calamidade
pública por causa da pandemia de coronavírus.
[10]
A Câmara Legislativa (CLDF) aprovou, em sessão extraordinária remota nesta
terça (15.12.2021), a prorrogação do estado de calamidade pública no Distrito
Federal até 30 de junho de 2021. O pedido foi feito pelo governador Ibaneis
Rocha ao poder legislativo em decorrência da pandemia do novo coronavírus no
DF. O texto prolonga os efeitos do Decreto Legislativo nº 2.284, de 2020, que
reconhecia o estado de calamidade pública até o próximo dia 31. Com isso, o
Executivo fica desobrigado de cumprir metas da Lei de Responsabilidade Fiscal
(LRF), podendo orientar recursos e investimentos para o combate à pandemia,
além de poder solicitar recursos a nível federal, como o Fundo Nacional para Calamidades
Públicas, Proteção e Defesa Civil.
[11]
Decreto-Lei 950, de 13 de outubro de 1969 que foi revogado pela Lei 12.340/2010
e MP 494/2010. Art. 4º São obrigatórias
as transferências da União aos órgãos e entidades dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios para a execução de ações de prevenção em áreas de
risco de desastres e de resposta e de recuperação em áreas atingidas ou com o
risco de serem atingidas por desastres, observados os requisitos e
procedimentos estabelecidos pela legislação aplicável. (Redação dada pela Lei nº 12.983, de
2014).
§ 1º A liberação de
recursos para as ações previstas no caput poderá ser efetivada por meio de
depósito em conta específica a ser mantida pelos órgãos e entidades dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em instituição financeira oficial
federal, observado o disposto em regulamento. (Redação dada pela Lei nº 12.983, de
2014).
§ 2º Para as ações
previstas no caput, caberá ao órgão responsável pela transferência de recursos
definir o montante de recursos a ser transferido de acordo com sua
disponibilidade orçamentária e financeira e desde que seja observado o previsto
no art. 1o-A. (Redação dada pela
Lei nº 12.983, de 2014).
[12]
O primeiro presidente da república do Brasil, Deodoro da Fonseca é lembrado
sempre em diversos símbolos. Conheça alguns deles e aspectos da vida do militar
que não foram mencionados: Fazia parte da Maçonaria e foi Grão-Mestre; sua vida
foi material para uma minissérie, República. Ela foi produzida por Paulo Cesar
Ferreira e exibida na Rede Globo em 1989; Hermes Rodrigues da Fonseca, seu
sobrinho, foi presidente da República em 1910; Na moeda atual de 25 centavos,
há a inscrição da imagem de Deodoro da Fonseca; Sua doença tinha relação com
questões respiratórias; No Rio de Janeiro, existe a Casa Histórica de Deodoro,
um lugar em que foi habitado por ele e se tornou um memorial; Em Alagoas, há o
Museu Marechal Deodoro da Fonseca.
[13]
São possíveis durante o Estado de Sítio: A obrigação de permanência em
localidade determinada; A detenção em edifício não destinado a acusados ou
condenados por crimes comuns; Restrições relativas à inviolabilidade da
correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à
liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei; A suspensão
da liberdade de reunião; A busca e apreensão em domicílio; A intervenção nas
empresas de serviços públicos; A requisição de bens.
[14]
Hermes Rodrigues da Fonseca era oriundo de família tradicional militar, sendo
sobrinho do fundador da República o Marechal Deodoro da Fonseca. Marechal
Hermes da Fonseca destacou-se no meio militar por conta da modernização das
forças armadas. Assim, tornou-se o candidato dos militares para a sucessão
presidencial da República. A candidatura militar aglutinou a maioria das
oligarquias estaduais e o governo federal. Em oposição, o jurista Rui Barbosa
lançou-se candidato e promoveu a “campanha civilista”, divergindo da
possibilidade de ascensão de militares à presidência nacional. Hermes da Fonseca
obteve maioria dos votos. Ambos os candidatos acusaram o opositor de fraude no
pleito eleitoral.
[15]
Arthur da Silva Bernardes (1875-1955) foi advogado e político brasileiro,
presidente de Minas Gerais de 1918 a 1922 e presidente do Brasil entre 15 de
novembro de 1922 a 15 de novembro de 1926. Além da oposição por parte da baixa
oficialidade militar, ele ainda confrontou uma guerra civil no Rio Grande do
Sul, onde Borges de Medeiros se elegeu presidente do estado pela quinta vez
consecutiva, e também o movimento operário que se fortalecia novamente. Em 1923
e 1924 ocorreram novas ações tenentistas no Rio Grande do Sul e em São Paulo,
onde ocorreu a Revolta Paulista de 1924, que levou Bernardes a bombardear a
cidade de São Paulo. Tudo isso levou Bernardes a decretar o estado de sítio,
que perdurou durante quase todo seu governo.
Foi o pioneiro da siderurgia em Minas Gerais e sempre
se bateu pela ideologia nacionalista e de defesa dos recursos naturais do
Brasil. Bernardes promoveu a única reforma da Constituição de 1891, reforma que
foi promulgada em setembro de 1926 e que alterava principalmente as condições
para se estabelecer o estado de sítio no Brasil. Após deixar o governo, foi
eleito senador em 1929.
[16]
Atualmente, uma vez emitido o Decreto Presidencial, o Presidente deve enviar o
ato, juntamente com suas justificativas, ao Congresso Nacional, no prazo de 24
horas. Caso o Congresso esteja em recesso, será convocado em um prazo de 05
dias, tendo um prazo de 10 dias para analisar a decisão presidencial. Dessa
forma, restam duas possibilidades: se o Congresso rejeitar a decisão, o Estado
de Defesa será imediatamente interrompido; caso aprove, por maioria absoluta,
deverá permanecer em funcionamento até que se encerre o Estado de Exceção.
[17]
Na França, o estado de sítio é um mecanismo legislativo e constitucional que
permite a transferência de poderes de polícia da autoridade civil para a
autoridade militar, a criação de tribunais militares e a extensão dos poderes
de polícia. Este tipo de padrão legal é até certo ponto comparável à lei
marcial. A Constituição Francesa de 1958 enquadrou esta disposição em seu
artigo 36. Só pode ser implementado em parte do território, após deliberação em
Conselho de Ministros e com assinatura presidencial, quando houver perigo iminente
de insurreição armada ou de guerra. Durante o estado de sítio, há transferência
de poderes das autoridades civis para as autoridades militares. A prorrogação
do estado de sítio para além de 12 dias está sujeita à autorização do
Parlamento.
[18]
A Revolta Armada (1891-1894), ocorrida no Rio de Janeiro, foi uma rebelião
realizada pela Marinha, que na época era denominada “Armada” e daí o nome deste
movimento. A rebelião tem início com o fechamento do Congresso pelo presidente
Deodoro da Fonseca, em 3 de novembro de 1891, e termina no governo de Floriano
Peixoto, em abril de 1894. Por isso, o conflito é dividido em dois: Primeira
Revolta da Armada, no governo de Deodoro da Fonseca, e Segunda Revolta da
Armada, sob a presidência de Floriano Peixoto. A Marinha estava insatisfeita
com os rumos que a república estava tomando. Afinal, os dois primeiros governos
foram exercidos por dois representantes do Exército: Deodoro da Fonseca e
Floriano Peixoto. Não por acaso este período é conhecido como “República da Espada”
(1889-1894). Tradicionalmente, a Marinha era uma arma ligada à monarquia e não
havia participado nem apoiado o golpe da República em 15 de novembro de 1889.
Por isso, ansiavam pela saída de Floriano e a entrada do Almirante Custódio de
Melo (1840-1902), que pretendia se candidatar a presidente.
[19]
O Manifesto dos Treze Generais foi um documento assinado por treze autoridades
militares do Brasil, datado de 31 de março de 1892 e publicado em 6 de abril,
logo no início do governo de Floriano Peixoto, que assumiu após a renúncia de
Deodoro da Fonseca. O manifesto contestava a legitimidade do governo e
condenava as atitudes de Floriano Peixoto contra rebeliões nos estados e
solicitava convocação de nova eleição para a presidência da república. Eram os
signatários: Marechal José de Almeida Barreto,
Vice-almirante Eduardo Wandenkolk,
General de divisão José C. de Queirós, General de divisão Antônio Maria
Coelho, Barão de Amambaí, General de divisão Cândido José da Costa,
Contra-almirante José Marques Guimarães, comandante da 1a divisão de
cruzadores, General de brigada João Nepomuceno de Medeiros Mallet,
Contra-almirante Dionísio Manhães Barreto, membro efetivo do conselho naval.
General de brigada João Severiano da Fonseca, 2º
vice-presidente do IHGB, Contra-almirante Manuel Ricardo de Cunha Couto,
inspetor do arsenal da Marinha da capital federal, General de brigada João José
de Bruce, General de brigada José Cerqueira de Aguiar Lima, General de brigada
João Luís de Andrade Vasconcelos.
[20]
BARBOSA, Ruy, Discurso e Escriptos. O Estado de Sítio. Sua natureza. Seus
efeitos, seus limites. Capital Federal: Companhia Impressora, 1892.
Conteúdo : Petição de habeas-corpus requerido ao Supremo Tribunal Federal a favor das vítimas dos decretos de 10 e 12 de abril -- Oração de Ruy Barbosa em defesa do habeas-corpus ante o Supremo Tribunal Federal na sessão de 23 de abril de 1892 -- O acordão de 27 de abril : escriptos publicados na imprensa contra a denegação do habeas-corpus -- Appendice I: d'o paiz. -- Appendice II: acordão do Supremo Tribunal Federal, em 27 de abril de 1892 na petição de habeas-corpus n. 300 -- Appendice III: opiniões na imprensa. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/227378 Acesso em 12.3.2021.
[21]
Enquanto ocorria a Revolta da Armada no Rio de Janeiro, o sul do país passava
pela Revolução Federalista (1893-1895). Também chamada de Revolta Federalista
foi uma guerra civil que ocorreu no estado do Rio Grande do Sul e se espalhou por
Santa Catarina e Paraná. Este movimento foi caracterizado pela disputa entre os
federalistas (maragatos) e o exército republicano (pica-paus). Na verdade, era
um conflito entre dois modelos de república: descentralizado (federalista) e
centralizado (positivista). Em 1894, o Almirante Custódio de Melo conduz o
navio "Aquidabã" em direção ao sul para apoiar os federalistas contra
Floriano Peixoto. No entanto, a embarcação é a torpedeada na ilha de Desterro
(SC), marcando o fim do conflito.
[22]
Quando se passa a cogitar a coerência do Direito como uma grande mecânica que
reúne regras e princípios, a razoabilidade do Direito deixa de depender
simplesmente da lógica intrassistêmica das regras entre si (o que foi decretado
pelo legislador) e passar a depender da lógica intersistêmica (o que as
instituições reconhecem como práticas legítimas socialmente) em face da
recorribilidade à história e à práxis em torno da justiça.
[23]
O poder discricionário permite ao executor um juízo de oportunidade e
conveniência, também conhecido como mérito do ato. Esclarece Gasparini: Há
conveniência sempre que o ato interessa, convém ou satisfaz ao interesse
público. Há oportunidade quando o ato é praticado no momento adequado à
satisfação do interesse público. São juízos subjetivos do agente competente
sobre certos fatos e que levam essa autoridade a decidir de um ou outro modo. O
ato administrativo discricionário, portanto, além de conveniente, deve ser
oportuno. A oportunidade diz respeito com o momento da prática do ato. […] A
conveniência refere-se à utilidade do ato. […] Este juízo de conveniência e
oportunidade deve sempre ser pautado no princípio do interesse público sobre o
privado, jamais atendendo os interesses particulares do administrador. Além
disso, o Poder Discricionário não possui liberdade absoluta, mas sim relativa,
pois está circunscrito por diversos limites, como as exigências do bem comum e
os princípios norteadores do regime jurídico administrativo, em especial os
princípios da Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência.
In: GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 14ª Ed. São Paulo: Saraiva,
2009.
[24]
A evolução da doutrina no Tribunal implicou no reconhecimento de que a violação
de direito individual não se justifica pela ação política dos Poderes do
Estado, e que ela se submete ao princípio da supremacia da Constituição. No
passado, a doutrina transitou por temas como estado de sítio, intervenção
federal, verificação de poderes, dualidade de governos e assembleias
legislativas, rejeição de veto ao projeto de lei, convocação extraordinária do
Congresso Nacional e declaração de impedimento do Presidente da República (caso
Café Filho). Atualmente, ela tem sido suscitada em questões envolvendo matéria
interna corporis das Casas do Congresso Nacional, processo legislativo,
expulsão de estrangeiros, condução da política econômica do governo, anistia,
processos de impeachment do Presidente da República e político-punitivo de
parlamentar, além dos pressupostos das medidas provisórias. Diversamente dos
demais temas, no caso das medidas provisórias, a matriz norte-americana da
doutrina foi substituída pela sua variante italiana. Vide: TEIXEIRA, José
Elares Marques. A doutrina das questões
políticas no Supremo Tribunal Federal - STF. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/87028
Acesso em 13.3.2021.
[25]
Presos por crime militar inafiançável, juntamente com todos os ocupantes do
navio, ficam retidos ilegalmente, conforme alegação do advogado, nas Fortalezas
de Santa Cruz e Lage, no Rio de Janeiro, sem nota de culpa e à disposição da
Justiça Militar, incompetente para julgá-los. Relator: Ministro Barros Pimentel. Data do Julgamento: 2.8.1893 e 9.8.1893. Decisão: Concedida a ordem de soltura em favor
dos detidos, por maioria. Publicação do acórdão BARBOSA,
Rui, Obras Completas de Rui Barbosa, RJ, v. XX, 1893, t. V, MEC, 1958, p.
291. Revista O Direito, v. 62/86-88.
[26]
A CF/1946 não definiu o que seriam os crimes políticos, ou mesmo distinguiu
esta categoria em face dos crimes contra a segurança externa do País. No que
diz com estes últimos, a questão assumia contornos de singeleza, pois a
primeira parte do Livro II do Código Penal Militar vigente à época (Decreto Lei
6.227/44) previa, no rol do Título I, os crimes contra a segurança externa do
País (arts. 118 a 129). A questão nodal, portanto, residia em definir o que
seriam os crimes políticos, o que não ocorreu expressamente em sede
constitucional ou mesmo infraconstitucional. Neste quadrante, a doutrina passou
a subdividir os crimes políticos em puros e relativos. O crime político puro é
aquele que “ofende ou expõe a perigo de ofensa, exclusivamente, a ordem
política em sentido amplo ou a ordem político social (compreensiva não apenas
das condições existenciais e o regime governamental do Estado e dos direitos
políticos dos cidadãos, senão também, nas suas bases fundamentais, a
organização social, sobre a qual se ergue a ordem política em sentido estrito),
e cujo autor, além disso, tem por escopo esse mesmo resultado específico ou
assume o risco de seu advento. Crime político relativo é o crime comum, isto é,
lesivo de interesses de direito comum, mas praticado por motivo político, ou
como meio de crime político, formando com este unidade jurídica (crime
complexo), ou no curso ou por ocasião de crime político, apresentando-se um e
outro intimamente conexos (crime político por conexidade)”. Para que possa
caracterizar-se o crime político é indispensável que a ofensa aos interesses da
segurança do Estado se faça com um especial fim de agir. É indispensável que o
agente dirija a sua ação com o propósito de atingir a segurança do Estado. (…)
Pode-se dizer que o fim de agir é aqui um elemento essencial ao desvalor da ação
neste tipo de ilícito, sem o qual verdadeiramente não se pode atingir os
interesses da segurança do Estado. A exigência do fim de agir é uma
indefectível marca de uma legislação liberal nessa matéria. Mas pode-se também
dizer que essa exigência do fim de agir está na natureza das coisas. Não há
ofensa aos interesses políticos do Estado de direito democrático se o agente
não dirige sua ação deliberadamente contra a segurança do Estado.” Independente
da se aceitar ou não o especial fim de agir como elemento subjetivo específico
nestes delitos, certo é que a partir da conceituação doutrinária, consolidou-se
entendimento de que os crimes políticos em sentido puro estavam positivados na
Lei 1.802/53 (Lei de Segurança Nacional) – que tipificava os delitos contra a
segurança interna do País –, bem como em dispositivos esparsos do Código Penal
Militar (Dec. Lei 6.227/53), do Código Eleitoral (Lei 1.164/50) e da Lei de
Imprensa (Lei 2.083/53) (HUNGRIA, 1960, p. 7-8).
Na vigência da CR/1969,
discutiu-se novamente a respeito dos crimes políticos, pois de um lado, o art.
125, IV, determinava a competência da Justiça Federal para o processo e
julgamento de crimes políticos, ao mesmo tempo em que o art. 129, § 1º,
dispunha que a competência para o processo e julgamento de crimes contra a
segurança nacional seria da Justiça Militar.
[27]
O advogado Rui Barbosa impetra habeas corpus em favor do Senador
Almirante Eduardo Wandenkolk e outros cidadãos, indiciados por crimes de
sedição e conspiração, presos ou desterrados em virtude de decretos expedidos
pelo Vice-Presidente da República, Marechal Floriano Peixoto, na função de
Presidente. Tais atos determinam a suspensão das garantias constitucionais,
decretando-se o estado de sítio no Distrito Federal. Fundamenta-se o pedido na
inconstitucionalidade do estado de sítio e na ilegalidade das prisões
ocorridas, umas antes de decretado o estado de sítio, outras, depois de
terminada a sua vigência, quando devem imediatamente ser restabelecidas as
garantias constitucionais. Relator: Ministro Costa Barradas. Data do
Julgamento: 27.4.1892. Decisão: Negada
a ordem, por maioria (10x1). Publicação do acórdão: Revista O Direito, v. 58/302-307 COSTA,
Edgard. Os Grandes Julgamentos. RJ. v. 1, Ed. Civilização Brasileira, 1964, p.
26-33. BARBOSA, Rui. Obras Completas de Rui Barbosa, RJ, v. XIX, 1892, t. III,
MEC, 1956, p. 355-361.
[28]
Julgamentos do STF: Caso do navio "Júpiter" – HC. Impetrado habeas corpus por Rui Barbosa, em
favor de David Ben Obill e outros, brasileiros e estrangeiros civis, num total
de 48, presos por militares cumprindo ordem do Vice-Presidente da República,
Marechal Floriano Peixoto, a bordo do navio mercante "Júpiter",
capturado no litoral de Santa Catarina. Presos por crime militar inafiançável,
juntamente com todos os ocupantes do navio, ficam retidos ilegalmente, conforme
alegação do advogado, nas Fortalezas de Santa Cruz e Lage, no Rio de Janeiro,
sem nota de culpa e à disposição da Justiça Militar, incompetente para julgá-lo.
Relator: Ministro Barros Pimentel. Data do julgamento: 2.8.1893 e 9.8.1893. Decisão:
Concedida a ordem de soltura em favor dos detidos, por maioria. Publicação do
acórdão: BARBOSA, Rui, Obras Completas de Rui Barbosa, RJ, v. XX, 1893, t. V,
MEC, 1958, p. 291. Revista O Direito, v. 62/86-88.
[29]
Cumpre expor as principais diferenças existentes entre o estado de defesa e o
estado de sítio que são previstos nos artigos 136 e 141 da Constituição
brasileira de 1988 e representam situações de restrições aos direitos
fundamentais em nome da preservação do próprio Estado. Logo, a primeira
diferença diz respeito à forma de decretação, pois o estado de defesa exige
decreto do Presidente da República, que a seguir, é sujeito ao exame do
Congresso nacional. Já no estado de sítio, o Presidente da República precisa ser
o primeiro a solicitar ao Congresso Nacional a autorização para sua decretação,
diante de sua maior gravidade. A segunda diferença é referente ao tempo de
duração de cada regime. O estado de defesa possui a duração máxima de trinta
dias, sendo prorrogável, uma vez por igual período. No caso de estado de sítio
envolvendo comoção grave de repercussão nacional ou em caso de ineficácia do
estado de defesa, o regime excepcional permanece no máximo trinta dias,
prorrogável, de cada vez, por igual período. Existe, ainda, outra modalidade de
estado de sítio disciplinada pelo artigo 137, II CF/1988, quando haverá duração
indeterminada, já que se trata de causa decorrente de guerra ou resposta a
agressão armada estrangeira. A derradeira diferença refere-se às medidas a
serem tomadas durante o estado de defesa e no estado de sítio. Enquanto no
primeiro podem ser tomadas as medidas previstas no art. 136, §1º da CF vigente;
no caso de estado de sítio, podem ser adotadas as medidas contempladas no
artigo 139 da mesma Constituição brasileira;
já no caso do estado de sítio decretado com fundamento no artigo 137,
II, não há previsão expressa das medidas que podem ser tomadas, o que evidencia
a gravidade da situação. Cumpre sublinhar que durante a vigência do estado de
defesa, de sítio ou de intervenção federal a Constituição Federal não poderá
ser emendada, em face de haver situações de limites circunstanciais ao
exercício do Poder Reformador.
[30] Agamben recorre à reflexão de Carl Schmitt sobre o estado de exceção. Depois de uma longa citação de Teologia Política: quatro capítulos sobre a doutrina da soberania (1922), na qual a exceção é definida com o um caso exterior ao ordenamento jurídico que revela um elemento formal jurídico específico, que é a decisão, ele enfatiza o seu efeito, a instauração do estado de exceção, ao invés detratar da própria decisão, em cujo monopólio reside a essência da soberania para Schmitt. O interesse de Agamben, como fica claro no decorrer de sua análise, é destacar o caso excepcional, que ele considera o meio pelo qual o soberano cria e garante a situação da qual o direito tem necessidade para sua própria vigência. Como na teoria jurídica de Schmitt é o soberano quem decide sobre o estado de exceção, garantindo dessa maneira sua ancoragem na ordem legal, Agamben infere que o soberano é logicamente definido pela exceção, colocando-se na mesma situação paradoxal do estado de exceção, ou seja, numa condição que não está nem fora nem dentro do ordenamento jurídico: “o lugar e o paradoxo do conceito schmittiano de soberania derivam do estado de exceção”.
[31]
Decreto 592, de 6 de julho de 1992. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm Acesso em 13.3.2021. O Pacto Internacional
dos Direitos Civis e Políticos, de fato, consagra muitos dos direitos
fundamentais da pessoa humana, reafirmando a Declaração Universal. Vários dos
princípios previstos mostraram-se genéricos, tornando-se mais detalhados em
outros diplomas internacionais específicos, como a Convenção Americana de
Direitos Humanos, a Convenção Interamericana para prevenir e punir a tortura, a
Convenção para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher e tantas
outras citadas. De qualquer forma, o Pacto constitui-se inequivocamente num
rico instrumento para a proteção dos direitos fundamentais da pessoa humana,
que, embora reconhecidos neste e noutros tratados internacionais e, em grande
parte, na própria legislação interna, inclusive constitucional, ainda carecem
de efetiva introjeção na cultura do povo brasileiro, com vistas a garantir a
concretização de um Estado Democrático de Direito.
[32]
Havendo ainda duas restrições explícitas, previstas pelo art. 136: que o Estado
de Defesa ocorra em “locais restritos e determinados” e que, antes de sua
decretação, sejam ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa
Nacional (vale ressaltar que esses órgãos são meramente consultivos, não
estando o Presidente obrigado a adotar seus pareceres). Em que contextos
específicos, então, seria possível determinar Estado de Defesa?
Exemplificativamente, o instrumento poderia ser acionado em caso de rebeliões
populares ou em que um desastre natural seja de tamanhas proporções que chegue a
ameaçar a ordem pública ou a paz social. No caso do desastre da mineradora
Samarco em Mariana, por exemplo, caso a Presidência considerasse haver tal
ameaça, poderia fazer uso desse mecanismo (o que não ocorreu).
[33]
Diversos países como a Itália e Brasil e cidades como Nova York declararam em
25.3.2020, o estado de emergência face à epidemia do novo coronavírus. A
declaração tem de ser feita exclusivamente em situações fora do comum e o
governo pode alterar algumas de suas funções para melhor enfrentá-la, seja esta
situação causada por desastres naturais, crises políticas ou econômicas e até
mesmo epidemias, como é o caso do Covid-19.
[34]
Henrique Batista Duffles Teixeira Lott (1894-1984) foi militar e político
brasileiro que galgou o posto de marechal e, foi Ministro da Guerra e concorreu
à Presidência da República nas eleições de 1960. Porém, foi derrotado por Jânio
Quadros. Após isso tentou ainda permanecer na vida pública. Em 1961,
declarou-se contrário à tentativa de golpe planejada pelos ministros militares
para impedir a posse de João Goulart após a renúncia de Jânio e foi de extrema
importância para a Campanha da Legalidade de Brizola ao aconselhar a buscar
apoio em chefes militares nacionalistas locais. No caso, os generais de
Exército Oromar Osório, comandante em Santiago, e Peri Constant Bevilacqua,
comandante em Santa Maria. Para assegurar a legalidade, em 26 de agosto de 1961
(dia seguinte à renúncia do presidente Jânio Quadros), fez um importante
manifesto às Forças Armadas No início de 1956, Lott continuou como ministro da
Guerra no governo de JK, pois garantira a posse do presidente, mobilizando as
tropas nas ruas. Foi quando recebeu uma espada de ouro da comunidade defensora
da legalidade constitucional (segundo familiares e amigos próximos, Lott teria
recusado a espada de ouro, ao brandir sua tradicional espada de general). Este
acontecimento ficou conhecido com Movimento de 11 de novembro.
[35]
Termo em inglês vem sendo usado para descrever medida de fechamento de regiões
na pandemia de Covid-19 para obrigar ao isolamento social. “Lockdown"
é uma expressão em inglês que, na tradução literal, significa confinamento ou
fechamento total. Ela vem sendo usada frequentemente desde o agravamento da
pandemia da Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2).
Embora não tenha uma definição única, o "lockdown" é, na prática, a medida mais radical imposta por governos para que haja distanciamento social – uma espécie de bloqueio total em que as pessoas devem, de modo geral, ficar em casa. Veja as diferenças dos termos relacionados à reação à pandemia de Covid-19: Isolamento social – é, em princípio, uma sugestão preventiva para todos para que as pessoas fiquem em casa; Quarentena – é uma determinação oficial de isolamento decretada por um governo. Lockdown – é uma medida de bloqueio total que, em geral, inclui também o fechamento de vias e proíbe deslocamentos e viagens não essenciais; Se um governante impõe um "lockdown", a circulação fica proibida, a não ser que ela se dê, por exemplo, para compra de alimentos, transporte de doentes ou realização de serviços de segurança. In: Portal G1. Entenda o que é "lockdown". Disponível em: https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/05/06/entenda-o-que-e-lockdown.ghtml Acesso em 12.3.2021.
[36]
A definição do termo quarentena está na Portaria nº 356/2020 do Ministério da
Saúde. A medida tem como objetivo garantir a manutenção dos serviços de saúde
em local certo e determinado. Para adoção da quarentena é necessária a
publicação de ato administrativo formal (lei, decreto, portaria) e ampla
divulgação pelos meios de comunicação. Pode ser ordenada em âmbito nacional,
estadual ou municipal, pelo prazo máximo até 40 dias, mas pode ser estendida
“pelo tempo necessário para reduzir a transmissão comunitária e garantir a
manutenção dos serviços de saúde no território”.