As influências do CPC/2015 na teoria das obrigações do direito brasileiro

O CPC/2015 naturalmente operou mudanças na codificação civil vigente, sendo interessante observar que por vezes entrou na contramão da tendência desjudicialização dos conflitos, mas também trouxe, normas mais simplificadas e eficazes para melhor aplicação da legislação referente ao direito das obrigações.

Fonte: Gisele Leite

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No passado, o Código Buzaid[1] também exerceu influências sobre o então vigente Código Civil de 1916 e, prosseguindo, o Novo CPC também traz consequências sensíveis para a teoria geral das obrigações. Particularmente quanto as modalidades de obrigações disciplinadas nos artigos 233 ao art. 235 do C.C. de 2002.


Os dispositivos legais acima mencionados do codex consagram a classificação de obrigações quanto à prestação – obrigações de dar, de fazer e não-fazer[2] e, também trata das obrigações alternativas, divisíveis e indivisíveis e solidárias[3].


A começar pelas obrigações disjuntivas ou alternativas que apresentam duas ou mais prestações as obrigações compostas objetivas, sendo certo que uma delas deve ser cumprida efetivamente pelo devedor.


Tal obrigação é consagrada pela conjunção “ou”. E, diferem das obrigações que também são compostas objetivas, ou seja, dotadas de mais de uma prestação, sendo certo que todas devem ser cumpridas pelo devedor, sob pena de configuração de mora ou de inadimplemento absoluto (identificadas pela conjunção “e”).


Nas obrigações alternativas, a escolha de qual prestação deve geralmente ser cumprida pelo devedor, salvo se o contrário for estipulado por lei ou pelas partes (art. 252 do C.C.). Portanto pode o instrumento obrigacional pode estabelecer o direito de escolha ao credor para concentrar o objeto da relação jurídica obrigacional.


Eventualmente, a escolha pode ser efetuada por um terceiro ou até mesmo pelo juiz. E no caso de pluralidade de optantes, não havendo acordo unânime entre eles, assinado, para a deliberação das partes.


Se o título deferir a opção a terceiro e, este, não quiser ou não puder exercê-la, caberá ao juiz fazer a escolha[4], e também, se não houver acordo entre as partes.


Ressalte-se que as normas de direito civil elaboradas na década de setenta do século XX, quando prevalecia o mote que era o pleno acesso à justiça. E, atualmente, ainda mais conforme é consagrado pelo CPC/2015, contudo, há previsões que se encontram na contramão da tendência de desjudicialização das contendas. Tanto isso é verdade que os derradeiros diplomas legais não encontraram a devida a efetivação prática apesar de passada mais de uma década após a codificação civil brasileira de 2002.


Prevê o artigo 800, caput do CPC/2015 que nas obrigações alternativas, quando a escolha couber ao devedor, este será citado para exercer a opção e, realizar a prestação dentro de dez dias úteis, se outro prazo não lhe foi determinado em lei ou em contrato. Convém lembrar que o art. 139 do CPC/2015 autoriza o magistrado a customizar os prazos processuais conforme a complexidade do caso concreto e a conveniência das partes.


A indicada norma reprisa o teor contido no art. 571 do CPC/73, consagrando a regra como a escolha do devedor, referente a concretização da máxima romana segundo a qual o sistema jurídico deve tutelar o sujeito passivo obrigacional[5] (in favor debitoris[6]).


Mas resta evidente no §1º do art. 800 do NCPC[7] quando a escolha for devolvida para o credor em face da inércia do devedor, ou após ser citado para tanto e escoado o prazo, permanecer silente e inerte.


A escolha[8] deverá ser logo indicada em petição inicial da execução que couber ao credor exercê-la, o que decorre dessa atribuição dada pela lei ao sujeito obrigacional como exceção (§2º do art. 800 CPC/2015).


Mais adiante, o NCPC trata das obrigações de fazer e não-fazer, com uma regra em comum (art. 814), seguindo por uma regulamentação em separado das duas categorias. Há ainda os relevantes preceitos referentes à essas categorias e, também, as obrigações de dar na seção relativa ao “Julgamento das Ações de Prestações de fazer, de não-fazer”, e de entregar coisa (vide arts. 497 ao 501 do CPC/2015).


As obrigações de fazer são positivas, tendo por objeto uma tarefa a ser desempenhada por alguém, podendo ser infungíveis (insubstituíveis) como a personalíssima ou intuitu personae, também podem ser fungíveis ou substituíveis.


O art. 247 do C.C. trata das obrigações de fazer infungíveis[9] ao preceituar que se negando o devedor ao seu cumprimento, estas se convertem em obrigação de dar, devendo o sujeito passivo arcar com as perdas e danos, incluídos os danos materiais ou patrimoniais e os danos extrapatrimoniais ou morais (art. 402 ao 404 do C.C.) e, ainda, o art. 5º, incisos V e X da CF/1988.


Contudo, antes de pleitear a indenização, o autor poderá requerer o cumprimento obrigacional nas duas modalidades, seja por meio da tutela específica com a fixação de multa diária (ou pelas astreintes[10]) fixadas pelo juiz conforme o art. 461 do CPC/1973 (art. 497 do CPC/2015[11]).


Já o NCPC tal consequência consta, mas o art. 814, sem prejuízo de outros comandos prevê: “Na execução de obrigação de fazer[12] ou de não fazer fundada em título extrajudicial, ao despachar a inicial, o juiz fixará multa por período de atraso no cumprimento da obrigação e a data a partir da qual será devida”. “Parágrafo único. Se o valor da multa estiver previsto no título e for excessivo, o juiz poderá reduzi-lo”.


Para o notável doutrinador Flávio Tartuce continua em plena aplicação o teor da Súmula 410 do STJ[13], editada em novembro de 2009, com a seguinte redação: “A prévia intimação pessoal do devedor constitui a condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer e não fazer”.


Não se pode olvidar que na relação de consumo, a tutela específica da obrigação de fazer e de não fazer[14] é prestigiada, inclusive com a mesma viabilidade de multa, consta no art. 84 do CDC[15], posto que privilegie o resultado prático equivalente ao adimplemento e, a conversão em perdas e danos só será admissível quando escolher o autor ou quando for impossível a tutela específica.


Para a tutela específica[16] ou para obtenção de recurso equivalente, poderá o juiz determinar as medidas necessárias, tais como busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas, desfazimento de obra impedimento de atividade nociva, além de requisição de força policial quando for necessário.


De sorte que todos esses preceitos continuam normalmente em pleno vigor, não tendo sido atingido e nem modificado pelo NCPC.


Quanto às obrigações de fazer fungíveis estas continuam a ser possível a aplicação de astreintes, somente com relação ao devedor originário, o que visa à conservação do negócio assumido pelas partes. A conversão em perdas e danos é admitida somente em hipóteses excepcionais para a preservação da autonomia privada e manutenção do pacto celebrado.


Não se pode esquecer que o princípio da conservação dos contratos possui estreita e íntima ligação com o princípio da função social das obrigações e dos contratos, o que é francamente reconhecido pelo Enunciado 22 CJF/STJ. Tendo sido endossado também pelo CPC/2015.


Segundo o art. 248 do C.C., caso a obrigação de fazer, nas duas modalidades (fungível e infungível) vier a tornar-se impossível ou inexequível, sem culpa do devedor, resolve-se a obrigação sem a necessidade de pagamento de perdas e danos assim como ocorre em decorrência de caso fortuito (evento totalmente imprevisível) ou de força maior (evento totalmente inevitável apesar de previsível).


Nessas duas hipóteses, como é notório, a exceção deve ser feita ao devedor em mora que responderá por tais eventos conforme prevê o art. 399 do C.C., a não ser que prove a total ausência de culpa ou que o evento aconteceria mesmo que não estivesse em mora.


A respeito do art. 248 do C.C entendeu o STJ que “resolve-se, por motivo de força maior, o contrato de promessa de compra e venda sobre o qual pendia como ônus do vendedor a comprovação de trânsito em julgado de ação de usucapião na hipótese em que o imóvel objeto do contrato foi declarado território indígena por decreto governamental publicado após a celebração do referido contrato. ”


Sobrevindo a inalienabilidade antes do implemento da condição a cargo do vendedor, não há de cogitar em celebração do contrato diferido nem incidindo a teoria da imprevisão[17]. Trata-se de não perfazimento de contrato por desaparecimento da aptidão do bem a ser alienado (art. 248 do C.C.) STJ, REsp 1.288.033/MA, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. 16.10.2012, publicado no Informativo nº 507.


Em havendo culpa do devedor no descumprimento obrigacional de obrigação de fazer, este deverá arcar com os danos presentes no caso concreto. A culpa não só nesse preceito do art. 248 do C.C., mas, também em outros relativos à teoria geral das obrigações deve ser entendida em sentido amplo ou lato sensu, englobando o dolo (intenção de descumprimento) e a culpa stricto sensu (ato praticado em imprudência, negligência ou imperícia).


Por outro lado, o art. 249 do C.C. é o que apresenta o conceito de obrigação de fazer fungível, ou seja, aquela substituível e que pode ser cumprida por terceiro à custa do devedor originário.


Resta ainda a opção do credor, antes da conversão em perdas e danos, que é a exigência que outra pessoa cumpra a obrigação, conforme os procedimentos que sempre estiveram disciplinados no CPC.


Há a novidade ao determinar que em caso de urgência, poderá o credor, independentemente de autorização judicial, executar ou mandar executar o fato, sendo depois ressarcido. Trata-se de autotutela civil para o cumprimento das obrigações de fazer fungíveis que recebeu críticas nos anos iniciais da codificação material, devido aos perigos que a autotutela pode trazer.


Também essa medida está na linha principiológica adotada pelo NCPC que é inclinada para a desjudicialização das contendas e disputas judiciais.


Ocorrendo o abuso no exercício da referida autotutela serve como controle o art. 187 do Código Civil[18] que veda o abuso do direito, reconhecido como ato ilícito[19], prescrevendo que também comete ato ilícito[20] o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo fim social ou socioeconômico, pela boa-fé ou pelos bons costumes[21].


Esclareça-se que a situação de urgência necessita estar devidamente provada e evidenciada para que seja aplicada essa autotutela civil do art. 249, parágrafo único do Código Civil.


As regras específicas relativas às obrigações de fazer no CPC/2015 que preceituam o seu art. 815 que, quando o objeto de execução for obrigação de fazer, o executado será citado para satisfazê-la no prazo que o juiz designar, se outro não estiver determinado no título executivo.


Essa norma tem aplicação para as duas modalidades de obrigações de fazer expostas, fungíveis ou infungíveis, sendo praticamente uma repetição do art. 632 do CPC/1973.


Continua idêntico ao teor do art. 633 do Código Buzaid, dispõe o art. 816 do NCPC que, se o executado não satisfazer a obrigação no prazo designado, é lícito, ao exequente, nos próprios autos do processo requerer a satisfação da obrigação à custa do executado ou perdas e danos, hipótese em que se converterá em indenização.


O valor das perdas e danos será apurado em liquidação seguindo-se a execução para cobrança de quantia certa. Como há a menção ao cumprimento por terceiro, à custa do executado, conclui-se que o artigo trata das obrigações de fazer fungíveis ou substituíveis em perdas e danos ou em obrigação de dar.


O art. 817 do CPC/2015 correspondente ao art. 634 do CPC/1973 (que já havia passado por alteração recente, pela Lei 11.382/1006). Tal nova feição dada, veio a extinguir a complexa licitação privada antes existente.


Verificando o juiz que a obrigação de fazer é passível de realização por terceiro, haverá dilação probatória onde caberá ao próprio exequente – apesar do silêncio do dispositivo trazer aos autos as eventuais propostas de terceiros interessados na prestação do respectivo fato.


Isto ocorre por meio da apresentação pelo exequente, de alguns orçamentos fixados pelos terceiros eventualmente interessados, não sendo descartada a possibilidade de até mesmo o executado apresentar os orçamentos.


Diante das propostas elaboradas, o juiz estabelecerá o contraditório e deliberará no sentido de aprovação de uma delas, que necessariamente não precisará ser a mais barata se eventualmente não for essa a melhor proposta para atender ao exato cumprimento obrigacional.


Essa decisão poderá ser impugnada por intermédio do recurso de agravo. Aprovada a proposta pelo juiz, caberá ao exequente adiantar as quantias nela previstas para que o terceiro realize o fato (art. 643, parágrafo único do CPC/1973). As quantias adiantadas pelo exequente serão por ele cobradas do executado através do procedimento previsto para a execução por quantia certa.


A última alteração revela-se simples, em face das mudanças do cumprimento da obrigação, contando-se o prazo de cinco dias úteis para o exercício do direito de preferência, por parte do credor, da apresentação da proposta pelo terceiro. O prazo já era tido como decadencial e, não sendo exercido pelo credor, a prestação ficaria a cargo de terceiro que apresentou a proposta.


E, o art. 820 do NCPC confirmou essa ideia. E, ainda sobre as obrigações de fazer fungíveis, o art. 818 do CPC/2015 enuncia que realizada a prestação, o juiz ouvirá as partes no prazo de dez dias. Não havendo qualquer impugnação, considerará satisfeita a obrigação.


Caso haja impugnação, o juiz a decidirá. O art. 635 CPC/1973 não foi objeto de qualquer modificação anterior. Encerrando o tratamento específico das obrigações estatui o art. 821 NCPC que, na obrigação de fazer, quando se convencionar que o executado a satisfaça pessoalmente, o exequente poderá requerer ao juiz que lhe assine prazo[22] para cumpri-la.


Em havendo recusa ou mora do executado, a obrigação será convertida em perdas e danos, caso em que se observará o procedimento de execução por quantia certa. O que corresponde a uma repetição ao teor do art. 638 do CPC/1973.


Partindo para obrigações de não-fazer, estas são as únicas obrigações negativas no direito brasileiro, tendo por objeto a abstenção de conduta. E, por tal razão em caso de inadimplemento, a regra do art. 390 da codificação material merece aplicação, pela qual o devedor é considerado inadimplente quando executou o ato que devia se abster.


A obrigação de não fazer é quase sempre infungível, personalíssima ou intuitu personae sendo também predominantemente indivisível[23] pela sua natureza conforme o art. 258 do C.C.


Caso a obrigação de não fazer se tornar impossível sem culpa do devedor (culpa genérica) esta será resolvida e extinta, o mesmo ocorrendo no caso fortuito ou força maior, conforme o art. 250 do C.C.


A obrigação de não fazer pode ter origem legal ou convencional. É o caso de proprietário de imóvel que tem de abster de construir até uma certa distância do terreno vizinho (vide o art. 1.301 e 1.303 do C.C.).


Já a de origem convencional, cita-se o caso de ex-empregado que celebra com a empresa ex-empregadora um contrato de sigilo industrial por ter sido contratado pelo concorrente (secret agreement)[24].


Prevê ainda, o art. 251, caput do C.C. de 2002 que, praticado o ato pelo devedor, a cuja abstenção se obrigara o credor pode exigir dele que o desfaça, sob pena de desfazer à sua custa, ressarcindo o culpado as perdas e danos.


Se praticado o ato pelo devedor, cuja abstenção se obrigara, o credor pode exigir dele que o desfaça, sob pena de se desfazer à sua custa, ressarcindo o culpado, as perdas e danos.


Poderá ingressar com ação de execução de obrigação de não-fazer, requerendo a cominação de preceito cominatório ou astreintes[25] (art. 814 do CPC/2015 e art. 461 do CPC/1973) e o art. 84 do CDC.


Eventualmente, a pedido do credor e havendo culpa do devedor, a obrigação de não fazer poderá ser convertida em obrigação de dar coisa certa, no caso, em obrigação de arcar com perdas e danos.


Os arts 822 e 823 do NCPC reproduzem os artigos 642 do CPC/1973. Em síntese, diante a obrigação de não fazer quando for convertida em perdas e danos retrata a projeção material do caput do art. 251 do C.C.


Há previsão da autotutela cível na obrigação de não fazer cuja tendência é confirmada pelo NCPC. Mas, cabe ter cautela quando for desfazer ou mandar desfazer alguma obrigação infungível. De qualquer forma, se repreende o abuso de direito principalmente em face da função social ou econômica ou da boa-fé (objetiva) e os bons costumes previstos no art. 187 do Código Civil brasileiro.


A propósito, se ocorrer eventuais excessos, como no caso de direito de vizinhança[26], tendo sido feita construção pelo vizinho, o proprietário prejudicado mesmo sem a permissão judicial, estará autorizado pela lei a demolir o prédio construído irregularmente.


Prescreve o art. 487 do NCPC que, na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o juiz, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção do resultado prático equivalente.


Para a obtenção da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração de ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo.


Esse dispositivo é projeção geral do art. 461 do CPC/1973, para o cumprimento das obrigações de fazer e não fazer. As medidas de tutelas específicas do CPC/2015 confirma a viabilidade destas nas obrigações de dar coisa certa ou obrigações específicas.


Em tais obrigações positivas, o devedor se obriga a dar uma coisa individualizada (móvel ou imóvel) cujas características foram acertadas pelas partes, geralmente em um instrumento negocial.


Na compra e venda, por exemplo, o devedor da coisa é o vendedor, ao passo que o credor é o comprador. Consigne-se, ainda, que nas obrigações de dar coisa certa, o credor não é obrigado a receber outra coisa, ainda que mais valiosa.


Conforme o art. 498, caput do NCPC, na ação que visa a entrega da coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.


Porém, não existe a mesma opção nos casos de obrigações positivas genéricas, ou de dar coisa incerta (aquelas que são indicadas pelo gênero e quantidade), havendo a necessidade de uma escolha, em regra pelo devedor feita, para a determinação do objeto obrigacional.


Isso porque o gênero não perece, conforme a máxima genus non perit não podendo o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, mesmo em decorrência de caso fortuito ou de força maior (art. 246 do C.C.).


Em síntese, não há inadimplência de obrigações genéricas, o que gera a impossibilidade de se exigir a tutela específica. Desta forma, o art. 498 do CPC/2015 aponta que se tratando de entrega de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o credor ou autor poderá individualizá-la na petição inicial, se lhe couber a escolha. Porém, se a escolha couber ao devedor (réu) este a entregará individualizada no prazo fixado pelo juiz.


Portanto, só é cabível a tutela específica quando a obrigação genérica se transformar em obrigação específica, hipótese em que se cogita em inadimplemento obrigacional.


O art. 499 do CPC/2015 confirma a estreita relação entre o princípio da conservação negocial e o princípio da função social dos contratos, além de enfatizar que o cumprimento obrigacional deve ser o que fora convencionado, valorizando assim a autonomia privada.


Ademais, as perdas e danos são plenamente cumuláveis com as astreintes, mas havendo excesso, cabível é a redução, que poderá ser feita pelo magistrado até mesmo de ofício.


Quanto ao julgamento das ações que se refere à classificação tripartida das obrigações, o art. 501 do CPC/2015 preceitua que, na ação que tenha por objeto a emissão de declaração de vontade, a sentença que julgar procedente o pedido, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida. Não há novidade sob o ponto de vista processual.


O NCPC trouxe maiores consequências para as obrigações solidárias que são relevantes, eis que possuem grande aplicabilidade política e prática. Por uma questão de lógica, o seu estudo interesse e somente é pertinente quando houver pluralidade de credores e/ou devedores (obrigações compostas subjetivas).


Em sintonia com o princípio da operabilidade e da simplicidade veio o art. 264 do C.C. prever que há solidariedade quando na mesma obrigação concorrer mais de um credor, ou mais de devedor, cada um com direito ou obrigado à dívida toda. Dessa maneira, na obrigação solidária ativa, qualquer um dos credores poderá exigir a prestação por inteiro.


Na obrigação solidária passiva, a dívida pode ser paga por qualquer um dos devedores. Em resumo, todas as partes sejam ativas ou passivas, ou seja, credores ou devedores, são tratados como fossem uma só (in solidum).


O art. 265 do C.C. de 2002, repetindo tão conhecida regra do art. 896 do C.C./1916, enuncia que a solidariedade não se presume, resultando da lei ou da vontade das partes. Afinal, a solidariedade é instituto técnico que visa reforçar o cumprimento obrigacional.


A solidariedade de natureza obrigacional e relacionada com a responsabilidade civil contratual, que não se confunde com aquela advinda da responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana.


A derradeira solidariedade está tratada pelo art. 942, parágrafo único da lei material privada, pelo qual são solidariamente responsáveis com autores ou coautores e as pessoas designadas no art. 932 do CPC/2015.


Cumpre assinalar que a solidariedade obrigacional constitui regra no CDC, ao contrário do que ocorre na atual codificação civil, em que é exceção. E a justificativa é plena pelo fato da legislação consumerista representar uma tutela diferenciada e protetiva do consumidor (que é presumivelmente vulnerável).


O art. 7º, parágrafo único do CDC que “tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariedade pela reparação de danos previstos nas normas de consumo”. Tal dispositivo traz a presunção da solidariedade contratual.


No CPC/2015 quanto às obrigações solidárias está no seu art. 1.005 (agravo de instrumento), pela qual o recurso interposto por um dos litisconsortes a todos aproveita, salvo distintos ou opostos os seus interesses.


Porém, em havendo solidariedade passiva, entre devedores, o recurso interposto por um devedor aproveitará aos outros, quando as defesas opostas ao credor lhes forem comuns. Como defesas comuns, de cunho material, podem ser citados o pagamento direto ou indireto da obrigação e a prescrição.


Cabe, ainda, o chamamento ao processo nas hipóteses de solidariedade, como constava no art. 77, inciso III do CPC/1973. O que foi reprisada na norma do art. 130, inciso III do CPC/2015, in verbis: “é admissível o chamamento ao processo, requerido pelo réu (...) III – dos demais devedores solidários, quando credor exigir de um ou alguns o pagamento de dívida comum”.


Mantendo o diálogo com o direito civil, continua tendo aplicação o Enunciado 351 CJF/STJ de 2006: “A renúncia à solidariedade em favor de determinado devedor afasta a hipótese de seu chamamento ao processo”.


Consigne-se que a renúncia à solidariedade pode ser utilizada como sinônimo de exoneração da solidariedade. A renúncia é ato jurídico stricto sensu em que o titular de um direito abre mão dele, de forma expressa, sem a necessidade de aceitação expressa da outra parte. Nesse ponto, a renúncia já se diferencia da remissão ou perdão da dívida, que deve ser aceita pelo devedor de acordo com o art. 385 do C.C. de 2002.


Mas, a renúncia à solidariedade também se diferencia da remissão[27] quanto aos efeitos pois com a renúncia o devedor fica inteiramente liberado do vínculo obrigacional, inclusive no rateio da quota do eventual codevedor insolvente, nos termos do art. 284.


Exemplificando, se Alberto é credor de uma dívida de trinta mil reais, havendo três devedores solidários (Beto, Carlos e David), e renuncia à solidariedade em relação ao Beto, este está exonerado da solidariedade, mas continua responsável por dez mil reais. Quanto aos demais devedores continuam respondendo solidariamente pela dívida.


Percebe-se que o art. 282 do C.C. de 2002 não menciona mais que haverá abatimento da parte correspondente aos devedores que foram perdoados, eis que a previsão é desnecessária, por se tratar de regra implícita retirada do art. 284 do C.C. de 2002.


Nesse sentido, Maria Helena Diniz continua entendendo que “ao credor, para que possa demandar os codevedores solidários remanescentes cumprirá abater no débito o quantum alusivo à parte devida pelo que foi liberado da solidariedade”.


Porém, na doutrina contemporânea há quem entenda em sentido contrário, como Jones Figueiredo Alves e Mário Luiz Delgado que aduzem: “ a inovação está no parágrafo único”.


Pelo sistema do Código Civil de Beviláqua, se o credor exonerasse da solidariedade um ou mais devedores, só poderia acionar os demais, abatendo no débito a parte dos que foram exonerados.


Agora, mesmo exonerando um ou mais devedores, poderá o credor acionar os demais devedores pela integralidade da dívida, sem a necessidade de abatimento. Nada obsta obviamente que aqueles que vierem a pagar sozinhos a dívida por inteiro cobrem, posteriormente, as quotas daqueles que foram exonerados.


A questão é polêmica. Filia-se à primeira corrente defendida por Maria Helena Diniz, que é mais justa e em sintonia com a vedação do enriquecimento sem causa. Também é alinhada a esse entendimento a maioria dos juristas que participaram da IV Jornada de Direito Civil com aprovação do Enunciado 349 do CJF/STF[28] que admite o abatimento da parte correspondente aos beneficiados pela renúncia, proposta pelo notável professor e jurista José Fernando Simão.


Evidentemente em havendo a renúncia[29] à solidariedade em favor de um dos devedores, este não poderá ser chamado a processo para responder.


Merece destaque o art. 1.068 do NCPC[30] que deu nova redação ao art. 274 do C.C. É verdade que o dispositivo do direito material fora objeto de críticas por civilistas e processualistas.


A primeira parte do comando legal em questão não apresentava problemas, pois se houver obrigação solidária ativa, julgamento contrário a um dos credores, este não atinge os demais, que permanecem com os direitos incólumes.


Contudo, restam dúvidas quando o julgamento for favorável a um dos credores, hipóteses em que existiam os dois posicionamentos na doutrina civilista.


O primeiro posicionamento, se um dos credores vencesse a ação, essa decisão atingiria a todos os demais credores, salvo se o devedor tivesse em seu favor alguma exceção pessoal passível de ser invocada a outro credor que não participasse do processo.


Desse modo, o devedor não poderia apresentar defesa contra aquele credor que promoveu a demanda, havendo a instituição do regime da extensão da coisa julgada secundum eventum litis[31] (os credores que não participaram do processo apenas podem ser beneficiados com a coisa julgada, mas jamais prejudicados). Tal entendimento constava da obra coletiva de Gustavo Tepedino, Heloisa Helena Barbosa e Maria Velina Bodin de Moraes.


O segundo posicionamento é sustentado por Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho que defendiam dois caminhos que poderiam ser percorridos:


a) se o magistrado não acolhesse a defesa e se esta não fosse natureza pessoal, o julgamento beneficiaria a todos os demais credores;


b) se o magistrado não acolhesse a defesa e se esta for de natureza pessoal, o julgamento não interferiria no direito dos demais credores.


Na doutrina processualista há outro posicionamento que afirmava que a parte final do art. 274 do C.C. não teria qualquer sentido. Isso porque a referida exceção pessoal não existiria em relação ao devedor.


Fredie Didier Junior afirma que: “O julgamento favorável ao credor não pode estar fundado na exceção pessoal, alegação de defesa que é; se assim fosse, a decisão seria desfavorável por força da primeira parte do artigo 274 e não estenderia os efeitos aos demais credores”.


Em resumo: não há julgamento favorável fundado em exceção pessoal; quando se acolhe a defesa, julga-se desfavoravelmente o pedido.


A parte final do art. 274 se interpretada[32] literalmente não faz sentido. Também a doutrina processual entendia de modo muito similar José Carlos Barbosa Moreira.


O processualista baiano apresenta a seguinte solução para o referido dispositivo: a) se um dos credores vai a juízo e perde, qualquer que seja o motivo (acolhimento da exceção comum ou pessoal), essa decisão beneficiará os demais credores, salvo se o (s) devedor (es) tiver (em) exceção pessoal que possa ser oposta a outro credor não participante do processo, pois, em relação àquele que promoveu a demanda o (s) devedor (es) nada mais pode (m) opor. (Art. 474 do CPC).


Essas ideias constavam de proposta de enunciado doutrinário formulado por José Fernando Simão, quando da IV Jornada de Direito Civil, realizada em 2006 pelo Conselho da Justiça Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça.


Era o teor da proposição sobre o tão criticado artigo 274 do C.C: “O julgamento favorável a um dos credores solidários aproveita aos demais, sem prejuízo das exceções pessoais que o devedor tenha o direito de invocar em relação a cada um dos cocredores”.


Como o devedor só pode opor ao credor solidário demandante as exceções que lhe eram pessoais, poderá oportunamente opor aos demais cocredores as respectivas exceções pessoais.


Conclui-se que o NCPC veio finalmente positivar as ideias já constantes de proposta de enunciado doutrinário da IV Jornada de Direito Civil que fora realizada em 2006 pelo CJF/STJ que veio finalmente ser adotada corrigindo o teor complicado do art. 274 do C.C.


Referências


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CORCIOLI FILHO, Roberto Luiz. Credores solidários podem aproveitar da coisa julgada. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2006-set-30/credores_solidarios_podem_aproveitar_coisa_julgada Acesso em 09.03.2016.


JUSTINIANO, Cuerpo del Derecho Civil. Primeira Parte. Digesto. Tomo III. Tradução de Idelfonso García del Cooral. Fac-símile. Valladolid: Lex Nova, 1988.


TARTUCE, Flávio. O novo CPC e o Direito Civil. Impactos, Diálogos e Interações. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015.


_______________. Direito Civil. Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. Vol.2 11ª edição. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016.


SEGALLA, Alessandro. Apostila de Direito das Obrigações (5ª e 6ª aulas). Disponível em: https://blogdojurista.files.wordpress.com/2010/02/direito-das-obrigacoes-51-c2aa-e-6-c2aa-aulas.pdf Acesso 08.03. 2016.


Notas


[1] O CPC de 1973 sofreu influências doutrinárias estrangeiras que, por sua vez, também serviram para moldar, de alguma forma as disposições do C.C. de 1916. Ademais com o advento da urbanização e maior progresso da tecnologia a sociedade transforma-se o que veio influenciar diretamente nas alterações acolhidas pelo Código Civil de 2002.


[2] Em linguagem vulgar usamos o verbo fazer para descrever diversas atividades que tanto corresponderiam à entrega ou restituição de uma coisa, como também a realização de um fato. Por exemplo, falamos em fazer um pagamento, quando pagar é dar dinheiro ou créditos; cogitamos em fazer uma entrega, quando entregar é modalidade de dar, transferir.  No campo jurídico, entretanto, a distinção entre as modalidades de obrigações há de ser técnica: se no contrato há a previsão de alguém para entregar-me algo que já existe no momento da contratação, a obrigação do devedor será de dar (entregar); todavia, se no momento da contratação o devedor tiver de fazer (elaborar, confeccionar, construir) a coisa antes de entregá-la a obrigação será de fazer, pois a entrega será mera consequência do fazer. Em outras palavras, antes de entregar será necessário fazer.


“O substractum da diferença está em verificar se o dar ou o entregar é ou não consequência do fazer. Assim, se o devedor tem de dar ou entregar alguma coisa, não tendo, porém, de fazê-la previamente, a obrigação é de dar; todavia, se, primeiramente, tem de confeccionar a coisa para depois entregá-la, sem tem de realizar algum ato, do qual será mero corolário o de dar, tecnicamente a obrigação é de fazer. ”


[3] A respeito das obrigações solidárias temos o embate entre a teoria pluralista e a teoria unitária com relação o vínculo obrigacional. Haveria contradição entre o art. 264 e o 266 do CC? A teoria pluralista não explica a solução das obrigações solidárias. Se há mais de um vínculo, porque um dos devedores ao pagar exonera os demais e um dos credores ao receber satisfaz os demais?


[4] Se o direito de escolher (concentração) couber a um ou mais sujeitos (o Código Civil se vale da expressão “optantes”) e estes não manifestarem acordo unânime sobre a prestação devida ou a ser exigida, “decidirá o juiz, findo o prazo por este assinado para a deliberação”, conforme estipula o § 3. °, do art. 252 do Código Civil; nesta hipótese será inaplicável a teoria da qualidade média ou intermediária, nos termos da parte final do art. 244 do Código Civil.


[5] A proteção do devedor decorrente do favor debitoris constitui um princípio geral do direito das obrigações no direito brasileiro porque configura uma pauta diretiva a partir da qual as regras serão criadas ou aplicadas nesse ordenamento, requer para sua aplicação uma mediação concretizadora do juiz ou do legislador, quando não positivado, funda-se na ideia de direito como o comprova o desenvolvimento histórico dos seus institutos atenua os rigores do pacta sunt servanda, reequilibrando a noção de obrigação e constitui a ratio e a justificação deontológica das regras protetivas do direito ibérico e latino-americano.


[6] A expressão favor no direito romano assume o significado daquilo que se desvia do rigor do direito, conforme se verifica nas palavras de Ulpiano no Digesto XL, 5,24,10. Moreira Alves considera que a expressão favor denota a atitude do legislador e da jurisprudência de favorecimento a uma situação especial que decorre de uma causa favorabilis, ou seja, a tendência a privilegiar estas, pela sua relevância e importância dentro do ordenamento jurídico, desde que a interpretação dada não seja absolutamente destoante da lógica jurídica.


[7] Art. 800. Nas obrigações alternativas, quando a escolha couber ao devedor, esse será citado para exercer a opção e realizar a prestação dentro de 10 (dez) dias, se outro prazo não lhe foi determinado em lei ou em contrato. § 1º Devolver-se-á ao credor a opção, se o devedor não a exercer no prazo determinado.


§ 2º A escolha será indicada na petição inicial da execução quando couber ao credor exercê-la.


[8] O direito de escolha é também chamado de concentração, o que igualmente ocorre nas obrigações de dar coisa incerta. Nos termos do artigo 252, do Código Civil, o direito de escolher será exercido pelo devedor “se outra coisa não se estipulou”. Discute-se na doutrina nacional e estrangeira o momento em que a concentração se torna irrevogável. A maioria dos doutrinadores entende que a escolha se torna irrevogável quando comunicada à outra parte. De outro lado, se a prestação se tornar impossível após a escolha, mas antes do cumprimento, a obrigação do devedor recairá na prestação subsistente.


[9] No campo das obrigações de fazer infungíveis ou personalíssimas aplica-se o brocardo romano nemo praecise cogi potest ad factum (ninguém poderá ser coagido a praticar um ato [contra a sua vontade]).


[10] Além da multa astreinte existem outras formas de coerção psicológica para o cumprimento obrigacional derivado da tutela específica. Afinal, prevê o art. 77, V do CPC/2015. Ressalte-se ainda que existe colossal diferença entre a multa astreinte e a multa prevista no art. 77 do CPC, o que viabiliza inclusive a sua cumulação. Na primeira, estamos no âmbito da prevenção, cujo objetivo é instituir mera ameaça de aplicação de multa para que convença a parte a adimplir. Na segunda multa, apesar advinda da previsão legal, esta passa a ser devida após o cometimento do ato atentatório à dignidade da justiça, com nítido caráter punitivo.


[11] Os arts. 497 ao 500 institui “Do julgamento das ações relativas as prestações de fazer, de não fazer e de entregar coisa” deve ser compreendida genericamente como o conteúdo que as sentenças, naqueles casos, podem assumir. A produção concreta dos efeitos daquelas decisões é disciplinada no Título II do mesmo Livro I da Parte Especial, dedicado ao cumprimento da sentença. (In: LEITE, Gisele. Sentença e coisa julgada no CPC de 2015. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 20, n. 4549, 15 dez. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/44636. Acesso em: 6 mar. 2016.).


[12] No campo processual as obrigações de fazer são disciplinadas nos arts. 287, 461, 632 a 638, 644 a 645, e 466-A a 466-C, do Código de Processo Civil de 1973 Correspondentes aos artigos 497,498, 815, 821 do CPC/2015).


[13] A Súmula em comento traz a lume o tema das obrigações de fazer e não-fazer em que na primeira pretende-se que alguém pratique um ato, e na segunda que alguém se abstenha da prática de determinado ato.


O tema decorre das hipóteses em que liminarmente se impõe multa à parte devedora com vistas ao adimplemento da obrigação de plano, obrigação esta que deveria ser adimplida livre e voluntariamente.


É lógico que sendo a multa uma sanção pelo descumprimento do preceito contido na decisão judicial, só será aplicável depois que a parte tiver sido intimada a cumprir a determinação e tiver deixado de fazê-lo no prazo que lhe foi assinado.


A multa é prevista pelo atraso no cumprimento do preceito. É preciso, pois, que o prazo da intimação se esgote, uma vez que somente depois de vencido o termo final daquele prazo é que começará a fluir o tempo de atraso justificador da aplicação da multa.


[14] As obrigações de não fazer serão em princípio ilícitas se restringirem direitos da personalidade ou direitos fundamentais, tais como, obrigações de não casar, não ter filhos, de não trabalhar, de manter-se em abstinência sexual etc.


[15] As diferenças entre o Código Civil vigente e o CDC quanto ao tema são grandes, podemos resumir em:


No direito consumerista, a comprovação da onerosidade excessiva não se acha presa ao requisito da exagerada vantagem para a outra parte. De fato, o CDC adotou posicionamento distanciado do enriquecimento sem causa e, que, portanto, é suficiente a prova de que a prestação se tornara excessivamente onerosa para o consumidor, inerentemente desse excesso se reverter em favor do fornecedor.


Mas, a questão ainda não é pacífica. Pois uma parte da doutrina defende que a onerosidade excessiva pode provocar por via oblíqua, o lucro indevido ou exagerado da outra parte, há casos que assim não ocorre, na medida que a onerosidade excessiva não implica necessariamente no lucro indevido da outra parte.


Em direito consumerista é corriqueiro a ocorrência de fatos supervenientes e imprevisto após a celebração contratual, não se fazendo necessário que tais fatos sejam igualmente imprevisíveis e extraordinários. Nesse mesmo sentido, se percebe que o direito de revisão contratual é uma prerrogativa de ambos contratantes (consumidor e fornecedor), desde que a onerosidade excessiva seja superveniente à formação contratual. Apesar de que se exigir a atuação com probidade e lealdade recíprocas, coberta pelo princípio da boa-fé objetiva.


[16] Para a parte da doutrina o desrespeito ao cumprimento da decisão judicial nos casos de tutela específica tipifica o crime previsto no art. 330 do CP que informa: Desobedecer a ordem legal de funcionário público. Pena: Detenção, de 15 dias a 6 meses, e multa. O ato praticado no âmbito do processo civil gera um efeito externo o que enseja o início da persecução penal, com a consequente e devida instauração de inquérito policial para averiguar a ocorrência de crime, inclusive para alguns doutrinadores, ensinando até a possível prisão em flagrante.


[17] O antigo princípio do pacta sunt servanda ao longo da evolução do direito e, particularmente na passagem do Estado Liberal para o Estado Social, veio a sofrer fortes impactos em razão do revigoramento da cláusula rebus sic stantibus, que tem sido denominada de teoria da imprevisão. De fato, na sociedade contemporânea, massificada e sob a influência da globalização na economia, é muito frequente que os contratantes, ao longo dos contratos, particularmente os de longa duração, se encontrem mais onerados em face de acontecimentos supervenientes à formação contratual. E, nesse contexto, é justificável a revisão do contrato e, não propriamente a sua resolução.


Apesar de que a resolução por onerosidade excessiva prevista pelo vigente Código Civil brasileiro para alguns doutrinadores resuma-se em quimera jurídica, de dificultosa aplicação, principalmente por exigir do contratante prejudicado a reunião de cinco requisitos, facultando-lhe apenas pela resolução do contrato e, não a sua revisão, conforme se encontra previsto o CDC.


[18] O abuso do direito é figura moderna e fora construída a partir de decisões judiciais francesas proferidas a partir da metade do século XIX, mas apenas que ganharam corpo nas primeiras d´pecadas do século passado. Está inserido no movimento de queda do voluntarismo, isto é, do predomínio de vontade do titular de um direito como motor absoluto e potente de seu exercício e, por isso, tem servido para evidenciar a funcionalização de uma série de direitos, como a propriedade e os contratos.


A disputa doutrinária a respeito da conceituação do abuso do direito é grande, mas pode-se reduzir os seus termos ao debate atual sobre o abuso como exercício do direito fora de sua função, ou ainda, como exercício do direito de forma a contradizer o valor que o mesmo busca tutelar. Assim, o abuso do direito representaria uma infração aos limites que não estão colocados na existência de direitos de terceiros, mas sim, em elementos típicos do próprio direito, como a sua função ou o seu valor.


No campo da responsabilidade civil, o abuso de direito ganha notoriedade posto que evidencia que, em numerosas hipóteses, seria incorreto, afirmar-se estar na existência de um ato ilícito, muito embora possa ser constatada a ocorrência do dano.


[19] Para Pontes de Miranda, o “abuso de direito é ato ilícito, porque exercício irregular. ” Essa verbalização, que liga os dois conceitos por causa do exercício, termina por igualar ilicitude e abusividade também por conta dos efeitos derivados desse exercício. Nesse sentido, o efeito tanto do ato ilícito como do ato abusivo é a responsabilidade civil do agente, existindo assim uma identidade no sancionamento previsto para o sujeito.


[20] Na coletânea de decisões proferidas pelos tribunais franceses a partir de meados do século XIX até o início do século XX não se encontra a menção a uma “teoria do abuso do direito”. Essa denominação foi cunhada por Laurent que, ao se debruçar sobre as referidas decisões enfocando os limites ao exercício do direito subjetivo, nelas identificou um padrão que poderia servir de base para a criação desse novo instituto.


Uma das decisões mais notórias nesse período histórico é aquela proferida em 1853, na qual um tribunal francês obrigava o proprietário de um terreno a destruir uma chaminé que o mesmo havia edificado anteriormente. Segundo constou do processo, a construção da chaminé havia sido realizada apenas para fazer sombra sobre um terreno adjacente. Em outra oportunidade, decidiu-se que também agia com abuso de direito o proprietário de um terreno que bombeava água para um rio com o exclusivo intuito de diminuir o reservatório de água de um prédio vizinho.


[21] Em várias legislações é percebido a repulsa dada aos atos que expressam o abuso de direito, vigorando em várias codificações a premente intenção de um resultado útil, efetivo, tempestivo do processo e desnudá-lo de qualquer pretensão abusiva de qualquer das partes, neste sentido temos:


1. No Código Suíço - artigo 2º "parte final" - "O abuso manifesto de um direito, não goza de nenhuma proteção".


2. No Código Civil Português - artigo 334 - “Há abuso de direito, sempre que o titular o exerce com manifesto excesso dos limites impostos pela boa-fé”,


3. No Código Polonês de Obrigações - artigo 135 - "Aquele que, intencionalmente ou por negligência, cause dano a outrem no exercício do seu direito, tem de reparar o dano sempre que exceda os limites fixados pela boa-fé ou pelo objeto em atenção ao qual esse direito haja sido outorgado"


[22] É interessante notar que o mero retardo no cumprimento obrigacional não pode se prolongar indefinidamente, quando o devedor, intimado para cumprimento da prestação em prazo razoável, não o faz e impossibilita o credor de requerer a resolução do contrato. Situação interessante se dá quando o devedor, intimado em prazo razoável para cumprimento de obrigação sem termo assinalado, deixa de cumpri-la e, é constituído em mora ex persona. Em atenção à boa-fé objetiva, não pode o credor ser obrigado a esperar indefinidamente pelo cumprimento da obrigação, sem direito à resolução contratual.


Além de o devedor, conforme retrocitado, atentar contra a boa-fé objetiva, a mora é caracterizada pela efemeridade, pois deve ser possível ao devedor purgar a mora, em tempo razoável, sob pena de a prestação se tornar impossível ou inútil ao credor, o que configura a hipótese de inexecução definitiva. OROSIMBO NONATO assim descreve a diferença entre a mora e o inadimplemento absoluto.


[23] Já se a obrigação for indivisível, tal fato se dá em razão da natureza da coisa. E existem duas teorias que explicam: A primeira é a teoria da representação que dizia que na verdade, o credor que recebia, ou o devedor que pagava, agia representando os demais credores ou devedores; A segunda é a teoria da fiança mútua que dizia que haveria entre os credores ou entre os devedores, uma fiança mútua que os vincularia entre si. O que parece explicar mesmo é a teoria unitária, embora de fato existem situações que não sejam compatíveis; no balanço geral, a teoria unitária é, portanto, a mais adequada. Para esta teoria só existe um único vínculo, apesar de com pluralidade de devedores ou credores, cada um estando obrigado ou com direito à dívida toda. O devedor só se libera pagando o todo e não em parte (in solidum).


[24] Pode-se afirmar que é prática comum no direito norte-americano a celebração de acordos ou termos de confidencialidade, também chamados de nondisclosure agreement (NDA), que nada mais são do que contratos celebrados entre 02 (duas) ou mais pessoas com o objetivo de se proteger contra a divulgação não-autorizada de informações de conteúdo sigiloso ou confidencial.


Sendo assim, o acordo de confidencialidade trata-se, na realidade, de um negócio jurídico em que uma ou ambas as partes envolvidas se comprometem a não revelar segredos a terceiros, geralmente mediante uma contraprestação financeira. Dessa forma, o acordo de confidencialidade faz surgir uma relação de confiança entre as partes, ao se proteger segredos e informações contra o acesso indevido de terceiros não-autorizados.


Cabe, ainda, mencionar que os acordos de confidencialidade são variados e podem proteger qualquer tipo de informação, desde informações mais simples, como os contratos firmados entre babás e personalidades do mundo do entretenimento, até os acordos destinados à proteção dos mais complexos segredos industriais e comerciais.


[25] As astreintes constituem medida cominatória imposta pelo Estado-juiz contra o devedor de obrigação de fazer, não-fazer, ou dar coisa, cuja incidência se dá por dia de descumprimento. Trata-se de multa coercitiva oriunda do Direito francês, e que encontra franca aplicação pela jurisprudência brasileira, notadamente do STJ que já definiu em suma que as astreintes devem incidir a partir da ciência do obrigado e, da sua recalcitrância (REsp 699.495); ser computados após a intimação do devedor, por intermédio de seu patrono, acerca da execução provisório e do decurso do prazo fixado para o cumprimento voluntário da obrigação (EAg 857.758); podem ser revogadas, hipótese em que seus valores deverão, inclusive, ser devolvidos por que os recebeu (AgRg no Ag. 1. 383 367); ou até mesmo alteradas quando insuficientes ou excessivas, mesmo após o trânsito em julgado da respectiva decisão de imposição (AgRg no AREsp 14.395).


[26] O Código de obras e Edificações não deve ser entendido apenas como instrumento do poder de polícia municipal. É, em verdade, veículo ideal à garantia da qualidade ambiental urbana, devendo orientar legisladores, projetistas, construtores e usuários quanto às medidas necessárias para a sustentabilidade das edificações, respondendo positivamente às condições climáticas existentes, às necessidades das atividades humanas, às transformações sociais e aos avanços tecnológicos, sem perder de vista a identidade cultural, prática e peculiaridades locais benéficas.


[27] É amplamente debatido o tema, por conta de sua complexidade, que se refere à renúncia da solidariedade e suas diferenças para a remissão da dívida. É sabido que existindo a solidariedade passiva decorrente de lei ou contrato, poderá o credor cobrar de um ou alguns dos devedores, o valor total ou parcial da dívida, afastando, assim, as regras da divisibilidade (concursu partes fiunt). Nota-se que o devedor que solveu a dívida inteira poderá cobrar dos demais codevedores suas respectivas quotas no débito já pago. Caso um dos codevedores se torne insolvente (suas dívidas são superiores ao valor de seu patrimônio), todos os codevedores solidários deverão ratear entre si o débito.


A renúncia à solidariedade pode ser total ou parcial. Será total se em relação a todos os devedores, transformando a obrigação em divisível, pois cada um será responsável por apenas uma parcela do debito. A renúncia à solidariedade parcial é aquela que ocorre em relação a um ou alguns codevedores, subsistindo a solidariedade quanto aos demais codevedores em relação ao remanescente do débito. Já a renúncia ao crédito equivale ao perdão, exonerando-se da obrigação o devedor beneficiado, remanescendo para os demais devedores o restante da dívida. Enquanto que na renúncia à solidariedade, o devedor beneficiado não é exonerado, continua responsável por uma parcela da dívida.


[28] 349 – Art. 282. Com a renúncia da solidariedade quanto a apenas um dos devedores solidários, o credor só poderá cobrar do beneficiado a sua quota na dívida; permanecendo a solidariedade quanto aos demais devedores, abatida do débito a parte correspondente aos beneficiados pela renúncia.


[29] O Enunciado 350 proposto por GUSTAVO TEPEDINO e ANDERSON SCHREIBER tem o seguinte teor


“A renúncia à solidariedade diferencia-se da remissão em que o devedor fica inteiramente liberado do vínculo obrigacional, inclusive no que tange ao rateio da quota do eventual codevedor insolvente, nos termos do artigo 284”. Em sua justificativa, explicam os mestres que como a remissão extingue a dívida com relação à parcela relevada, não pode ela prejudicar terceiros ou os próprios codevedores, daí, adotar a solução alvitrada por POTHIER, no sentido de atribuir ao credor que perdoou o ônus de suportar a perda da fração que competiria ao devedor perdoado no rateio da insolvência.


[30] O art. 274 e o caput do art. 2.017 da Lei 10.406, de 10.01.2002, passam a vigorar com a seguinte redação: Art. 274 O julgamento contrário a um dos credores não atinge os demais, mas o julgamento favorável aproveita-lhes, sem prejuízo de exceção pessoal que o devedor tenha direito de invocar em relação a qualquer deles. Art. 2.027 A partilha é anulável pelos vícios e defeitos que invalidam, em geral, os negócios jurídicos.


[31] A coisa julgada somente se opera em relação àqueles que fizeram parte do processo, independentemente do resultado da demanda; uma vez preenchidos os outros requisitos analisados, sempre surgirá, tanto para o vencedor como para o vencido. Eis o ponto de diferenciação com o outro sistema de produção de coisa julgada, diferenciado, denominado coisa julgada secundum eventum litis.  Neste, a coisa julgada surgirá ou não de acordo com o resultado da demanda.


A lei, pelas mais variadas razões, pode entender que tal ou qual resultado (procedência ou improcedência) não autoriza a imunização. É o que acontece, por exemplo, nas demandas que dizem respeito aos direitos individuais homogêneos, quando a coisa julgada será erga omnes, apenas nos casos de procedência do pedido".


[32] A hermenêutica do referido artigo deve ser teleológica para que seja possível conciliar a coesão de todo o sistema, ao mesmo tempo em que os próprios fins do Estado, expresso no ordenamento jurídico, possam ser atingidos.  Assim a parte final do art. 274 do C.C. que se conclui que a observância do critério do tipo de defesa deduzida pelo demandado com determinante para a extensão dos efeitos da coisa julgada aos demais credores é inconsistente sob o ponto de vista da coesão do sistema.


E, se é autorizada a imunização da decisão, em relação aos cocredores solidários, proferida quando o devedor se defendeu por meio de exceção comum, e sua defesa não prosperou, com igual razão deve ser recrudescida a decisão na hipótese de sequer ter sido levantada defesa alguma, pressupondo-se que se está se referindo aos direitos patrimoniais disponíveis, sujeitos, portanto, ao princípio dispositivo.


Gisele Leite

Gisele Leite

Professora Universitária. Pedagoga e advogada. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Conselheira do INPJ. Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Consultora Jurídica.


Palavras-chave: CPC CDC CC CF Novo CPC

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1 Comentários

Thiago do Nascimento Elias Estudante12/03/2016 22:02 Responder

Precisamos de iniciativas como essa! Está de parabéns Drª, nós acadêmicos, de Direito agradecemos.

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