TRF3 reconhece legitimidade de companheiro homossexual de falecido para autorizar doação de órgãos

Desembargadora firmou que a inexistência de regra expressa que contemple o companheiro homossexual com a possibilidade de autorizar a remoção post mortem de órgãos, tecidos e partes do corpo do companheiro falecido para transplante não impede o reconhecimento do seu direito

Fonte: TRF da 3ª Região

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A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) confirmou, por unanimidade, decisão da 9ª Vara Federal de São Paulo que julgou procedente ação civil pública e determinou que a União, na qualidade de gestora do Sistema Nacional de Transplantes, passe a considerar o companheiro ou companheira homossexual como legitimado a autorizar a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo do companheiro falecido para transplante, desde que cumpridos os mesmos requisitos e apresentados os mesmos documentos exigidos de companheiros heterossexuais.


A União apelou da decisão de primeiro grau alegando que a união homoafetiva não é reconhecida no Brasil, condição que, por si só, impediria ao companheiro autorizar a doação de órgãos, tecidos e partes do corpo para transplantes, sendo necessária, nesses casos, a permissão das pessoas relacionadas no artigo 4º, da Lei 9.434/97 (cônjuge ou parente).


Argumentou ainda o artigo 226, parágrafo 3º, da Constituição Federal, afirma que a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado e que esse dispositivo reconhece somente a relação entre o homem e a mulher como entidade familiar. Alegou também que o Poder Judiciário não pode exercer função legislativa para ampliar o alcance da Lei 9.434/97.


O Ministério Público Federal, autor da ação, também apelou ao TRF3, com o objetivo de obrigar a União a editar ato administrativo que reproduza os termos da sentença de primeiro grau.


A desembargadora federal Monica Nobre, relatora do acórdão no TRF3, afirmou que a inexistência de regra expressa que contemple o companheiro homossexual com a possibilidade de autorizar a remoção post mortem de órgãos, tecidos e partes do corpo do companheiro falecido para transplante não impede o reconhecimento do seu direito.


Declarou ainda que não há como considerar como legitimados para autorizar a doação post mortem de órgãos somente o cônjuge ou o companheiro heterossexual, pois “tal entendimento contraria princípios norteadores da Constituição, que consagram a igualdade, a dignidade da pessoa humana e a promoção do bem de todos”.


Ela ressaltou a importância de ser observado o princípio constitucional contido no artigo 3º, inciso IV, da Constituição Federal, que veda a adoção, seja pelos particulares ou pelo próprio Estado, de comportamentos, comissivos ou omissivos, que impliquem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. “Trata-se de princípio cuja aplicabilidade é plena e a qual deve ser atribuída a máxima eficácia”, destacou a desembargadora.


Além disso, destacou que a questão já se encontra pacificada no Supremo Tribunal Federal que, no dia 5 de maio de 2011, na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.227 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 132, com eficácia erga omnes e efeito vinculante, declarou a aplicabilidade de regime de união estável às uniões entre pessoas do mesmo sexo.


“Com isso, a união homoafetiva deixou de ser considerada uma mera sociedade de fato e passou a ser reconhecida como uma entidade familiar. Os casais homossexuais passaram a ter os mesmos direitos dos casais heterossexuais em regime de união estável, como divisão de bens, pensão alimentícia em caso de separação, declaração em conjunto no imposto de renda, pensão e herança em caso de morte de um dos parceiros, etc.”, explicou a desembargadora.


Ela salientou, ainda, que o Conselho Nacional de Justiça aprovou, em 2013, a Resolução 175, que impede os cartórios brasileiros se recusem a converter uniões estáveis homoafetivas em casamento civil.


“Dessa forma, preenchidos os requisitos da união estável (relações homoafetivas), a União, através de todo Sistema Nacional de Transplantes, deve considerar o(a) companheiro(a) homossexual como legitimado(a) a autorizar a remoção post mortem de órgãos, tecidos e partes do corpo do(a) companheiro(a) falecido(a) para transplante”, declarou a magistrada.


Porém, sobre a apelação do Ministério Público Federal, a desembargadora afirmou que o Poder Judiciário não pode determinar a expedição de atos administrativos e que, no máximo, pode recomendar à União que edite ato administrativo reproduzindo o entendimento adotado na decisão.


Assim, a desembargadora negou provimento aos recursos e determinou que a União comunicasse ao Sistema Nacional de Transplantes (Ministério da Saúde, Secretarias de Saúde dos Estados, Distrito Federal e Municípios, bem como estabelecimentos hospitalares autorizados e rede de serviços auxiliares necessários) o teor da decisão.

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