Suscitada inconstitucionalidade de artigo que altera forma de intimação da Fazenda Nacional

Fonte: Notícias do Superior Tribunal de Justiça

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A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) suscitou incidente de inconstitucionalidade do artigo 20 da Lei nº 11.033, editada em 21 de dezembro de 2004. Essa lei, apesar de ter-se direcionado à tributação do mercado financeiro e de capitais e instituído o Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária (Reporto), dispôs sobre matéria processual no seu artigo 20 ao estabelecer que as intimações e notificações, quando dirigidas a procuradores da Fazenda Nacional, serão feitas pessoalmente mediante a entrega dos autos com vista.

A questão foi levantada pela ministra Eliana Calmon, relatora de recurso (embargos de declaração) interposto por contribuinte contra acórdão da própria Segunda Turma. Quando os autos já estavam prontos para ser julgados, a Fazenda Nacional, intimada por mandado no dia 3 de fevereiro último, peticionou, requerendo a devolução do prazo para se manifestar sobre o acórdão, publicado em primeiro de fevereiro. Alegou que o prazo de recurso não começara a correr, "porque a intimação da Fazenda, nos termos da Lei 11.033, de 2004, só se dá quando ela é intimada pessoalmente, mediante entrega dos autos com vista".

A ministra Eliana Calmon decidiu, preliminarmente, antes do julgamento dos embargos, tentar resolver o que considera uma grave questão: "Entendo pertinente dirimir uma grave dúvida que está a emperrar o serviço cartorário, criando tumulto de grandes proporções nos cartórios, principalmente nos da Primeira e Segunda Turmas, cujos processos em tramitação ostentam em mais de 80% a Fazenda Nacional como parte."

Esclarece a relatora que a Fazenda Nacional é intimada pessoalmente há vários anos. Em fevereiro deste ano, a Corte Especial do STJ definiu que o prazo, na hipótese da intimação pessoal da Fazenda Pública, é contado a partir da juntada do mandado aos autos, devidamente cumprido. O mesmo ocorre com o Ministério Público. Assim, a rotina seguida pela Secretaria foi alterada pela Lei nº 11.033.

Reforça mais uma vez a ministra Eliana Calmon que o artigo 20 da citada lei acaba com a intimação pessoal já tradicional e utilizada em favor do MP e de todos os demais órgãos públicos, instituindo em favor da Fazenda Nacional, unicamente, uma nova espécie de intimação ? através da entrega dos autos, pessoalmente, aos procuradores. A ministra observa que a Procuradoria não recebe os autos se enviados pelo Tribunal e, mesmo que assim fosse, o prazo somente começaria a correr da data em que o procurador os recebesse da sua Secretaria, onde são entregues.

"Entretanto, em se tratando de prazo comum, os autos não podem ser entregues e não pode a Secretaria certificar o transcurso do prazo", analisa a ministra, pontificando ainda: "Assim, fica o prazo em aberto." Diante de suas ponderações, a ministra entendeu ser necessário o exame da questão da constitucionalidade do artigo 20 da Lei nº 11.033/2004, sugestão acolhida na Turma por unanimidade.

"Após disciplinar a matéria anunciada no preâmbulo, introduziu o legislador, em prática conhecida como ?Cavalo de Tróia?, artigo de natureza eminentemente processual que altera por completo o disposto no artigo 40, parágrafo 2º, do CPC (Código de Processo Civil)", alerta a relatora. Diz o artigo do CPC que, "sendo comum às partes o prazo, só em conjunto ou mediante prévio ajuste por petição poderão os seus procuradores retirar os autos".

O dispositivo questionado, considera a relatora, agride o princípio da igualdade das partes, mesmo se consideradas as especiais, como o MP, a Advocacia-Geral da União e a Defensoria Pública ou, no geral, a representação das Fazendas Públicas, incluídas as autarquias e as fundações públicas federais, estaduais e municipais. "A quebra da identidade e da igualdade, em privilégio da Fazenda Nacional apenas, agride a Carta Maior na medida em que só se torna possível a observância do devido processo legal quando se observa o princípio da igualdade das partes", complementa a relatora. Para a ministra, não pode ser admitida a diferença entre as Fazendas, em privilégio exclusivo da Fazenda Nacional, sem que esteja explicitada na Constituição a natureza de tal regalia.

Concluiu a relatora, ministra Eliana Calmon: "A par da absurda e odiosa norma, sorrateiramente inserida em lei emprenhada com o dispositivo inteiramente estranho à sua finalidade, não se pode deixar de consignar que a observância da mesma, na prática, leva à esdrúxula situação de não ser possível à Justiça certificar nos autos os prazos, o qual fica inteiramente à vontade dos procuradores da Fazenda, além de tumultuar totalmente a rotina dos cartórios judiciais."

Agora, os autos serão encaminhados ao Ministério Público e, após seu parecer, o incidente de inconstitucionalidade será submetido à Corte Especial.

Ana Cristina Vilela
(61) 319-8591

Processo:  Resp 531308

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