Repúdio à responsabilização penal de adolescentes infratores

Mário Luiz Ramidoff é Promotor de Justiça junto à 1ª (Primeira) Promotoria de Justiça da Infância e da Juventude de Curitiba (PR); Mestre e Doutorando em Direito; Professor das Faculdades Integradas Curitiba; Membro da Associação Brasileira de Magistrados e Promotores de Justiça da Infância e da Juventude - ABMP; E-mail: ramidoff@pr.gov.br.

Fonte: Mário Luiz Ramidoff

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Mário Luiz Ramidoff ( * )

A responsabilização penal de adolescentes infratores, por suas graves conseqüências sociais à juventude brasileira, deve ser repudiada constitucional, humanitária e democraticamente. A falta de conseqüência sociologizante da responsabilização penal juvenil, visceralmente, expõe a funcionalidade meramente utilitarista desta estratégia jurídico-política apenas comprometida com o inadequado oferecimento de soluções imediatistas, que, a qualquer preço pouco se importa com a possibilidade de vitimização da adolescência enquanto matéria prima da sociedade brasileira.

A aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 20, de 1999, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Congresso Nacional, é um retrocesso nas conquistas civilizatórias e humanitárias em prol da infância e da juventude, quando, não, ofende substancialmente o primado da proteção integral consignado no art. 227, da Constituição da República de 1988, senão, o direito individual de cunho fundamental preceituado no subseqüente art. 228, daquela Constituição.

A redução da idade de maioridade penal para 16 (dezesseis) anos circunscreve-se no marco sensacionalista que, diante da opinião pública, ilusoriamente produz o falso sentimento de segurança para contenção da violência urbana. Contudo, tal desordem social não será solucionada pela simples mutação legislativa que pretende reduzir a idade de maioridade penal.

De outro lado, tais escolhas políticas possibilitam a legitimação da inação funcional do Poder Público no (des)atendimento das necessidades sociais vitais. Pois, é certo que tais medidas legislativas de caráter meramente repressivo-punitivo não reduzirão, como nunca reduziram, sequer, minimamente, a violência estrutural - isto é, a miséria, o desemprego, a falta de apoio institucional às famílias, a corrupção ("mensalões", "sanguessugas", "apagões aéreos", "operação furacão", etc.) -, na qual se encontra histórico e culturalmente mergulhada a família, a sociedade e o Estado brasileiro.

Essas exemplificativas espécies de condutas delituosas, por certo, jamais podem ser praticadas por adolescentes, contudo, apesar de suas graves conseqüências sociais, não se categorizam penalmente pela hediondez, mas, certamente, expõem crianças e adolescentes à mendicância, à pivetização e à prostituição infanto-juvenil, haja vista que lhes subtraem a prioridade absoluta na destinação orçamentária de recursos públicos.

Os institutos jurídico-penais não servem para educar adolescentes infratores, pois não lhes agrega valores (humanitários) para convivência social livre, justa e solidária, isto é, para o respeito e a responsabilidade pelos outros cidadãos. A disfunção das medidas legais privativas de liberdade nas experiências jurídico-penais sempre dessocializaram as pessoas criminalizadas, marginalizando-as através da exclusão da convivência familiar e comunitária, senão, também hoje as expulsando socialmente dos lugares públicos para o exercício da cidadania plena.

A proposição teórico-ideológica da Doutrina da Proteção Integral adotada por opção política pelo Constituinte de 1987-1988, e, operacionalizada legislativamente pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, procura mudar a concepão cultural acerca dos adolescentes infratores não só a partir da compreensão da opinião pública acerca do fenômeno infracional, mas, principalmente, do senso comum jurídico, procurando, assim, ensejar outras posturas institucionais (estatais) e organizacionais (comunitárias), em prol de uma nova proposta socioeducativa caracteristicamente humanitária.

É preciso ter capacidade de se indignar e resistir civilmente aos avanços do binômio funcionalista-utilitarista de cunho repressivo-punitivo de um Direito Penal inconseqüente socialmente, o qual não tem qualquer compromisso com a melhoria da qualidade de vida individual ou comunitária do adolescente, da vítima e de suas respectivas famílias. A não responsabilização penal dos adolescentes infratores, enquanto direito individual de cunho fundamental, constitui-se, sim, em cláusula pétrea, segundo o inc. IV, do § 4º, do art. 60, da Constituição da República de 1988, senão, patrimônio personalíssimo reconhecido à infância e à juventude por alinhamento às Convenções Internacionais dos Direitos da Criança, as quais são fontes de lei, no Brasil, consoante o § 2º, do art. 5º, da Magna Carta brasileira.

Curitiba (PR), 3 de maio de 2007.



Notas:

* Mário Luiz Ramidoff é Promotor de Justiça junto à 1ª (Primeira) Promotoria de Justiça da Infância e da Juventude de Curitiba (PR); Mestre e Doutorando em Direito; Professor das Faculdades Integradas Curitiba; Membro da Associação Brasileira de Magistrados e Promotores de Justiça da Infância e da Juventude - ABMP; E-mail: ramidoff@pr.gov.br. [ Voltar ]

Palavras-chave: adolescentes

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