Princípio da precaução e produção legislativa no campo da biotecnologia

Simone da Rosa Zuliani, Advogada, Consultora Técnico-Legislativa da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, Secretária da Comissão Especial das Células-Tronco de 16/2/2006 até 6/6/2006; Coordenadora Executiva do Projeto Perspectivas e Presidente, designada pela Portaria nº 08/2005-GP, da Comissão para instruir processo licitatório visando à realização de Concurso nos termos da Resolução nº 2941 de 8 de julho de 2005, que instituiu o Projeto Perspectivas no âmbito da Assembléia Legislativa; Concurso Público (Edital 01/2005) que consistiu na recepção, exame e classificação de artigos a serem escritos por universitários, sobre o tema "O Poder Legislativo na construção política do Rio Grande do Sul", cuja publicidade se dá, anualmente, através da Revista Estudos Legislativos,integrante de grupo de estudos do Projeto Práxis Legislativa. E-mail: simone.zuliani@al.rs.gov.br

Fonte: Simone da Rosa Zuliani

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Simone da Rosa Zuliani ( * )

Na paixão pelo conhecer devemos saber o que estamos fazendo, dar sentidos às nossas relações e evitar fatos indesejáveis consumados. Os desacordos devem ser pensados e encarados com profundidade.
Renato Sérgio Balão Cordeiro(1)

Resumo

O presente artigo tem por objetivo demonstrar a relevância da observação dos preceitos constitucionais perante a produção legislativa acerca dos assuntos referentes à biotecnologia, ciência que tem por escopo estudar a vida, atuando em várias áreas do conhecimento, tais qual a medicina. Dá-se ênfase ao princípio da precaução, que traz em seu cerne a prudência, a cautela e a responsabilidade. Como exemplo concreto dessa nova ciência, utilizou-se os estudos sobre as células-tronco embrionárias e a legislação que regulamenta a utilização dessas células em pesquisa e terapia, Lei Federal nº. 11.105, de 24 de março de 2005. O estudo conclui, tendo como base pesquisas teóricas, que, embora os avanços científicos tragam à sociedade insegurança quanto ao que é ético e correto para o presente e futuro responsáveis, o legislador não pode prescindir da prudência e ausência de incertezas ao elaborar normas que regulamentem a tecnologia que rege a vida.

Palavras-chave: princípio da precaução, produção legislativa, biotecnologia

Abstract


The present article analyzes the legislative production in the field of biotechnology and the essentiality of observance, considering the vision of legislators, of the constitutional principles, be they explicit, written in our constitution, or implicit, inferred by deep study of the former. It is given emphasis in the principle of precaution, since it is considered the main foundation to the normative production about all and any science that have as main purpose the study of life.

Keywords: biotechnology - principle of precaution - legislative production

Introdução

Ao avaliarmos a produção legislativa acerca de recentes e inovadoras ciências, como a biotecnologia, cujos estudos podem ser desenvolvidos em várias áreas do conhecimento humano, como, por exemplo, a médica, concluímos que se faz imperiosa a necessidade de o legislador calcar sua posição nos preceitos contidos em nossa Constituição Federal. Neste aspecto, salientamos não somente a necessidade da observância, pela legislação infraconstitucional, dos direitos fundamentais, tais quais a vida e a dignidade humana, como também dos princípios que norteiam nosso ordenamento, estejam eles explícitos, postos de maneira escrita, ou implícitos, inferidos pelo estudo aprofundado e hermenêutico, mas que nem por isso deixam de ter sua relevância no plano jurídico, como o princípio da precaução, que encontra-se implicitamente inserido no texto do inciso V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal de 1988(2), artigo localizado no Capítulo VI, que regula matérias atinentes ao Meio Ambiente.

Vez que, em nosso país, a Constituição é feita para o povo e apresentada à nação pela própria vontade desta, a Carta Magna deve conter os meios necessários à boa feitura de leis, permitindo que estas sejam adequadas à realidade que se impõe, da maneira mais eficaz, ética e justa.

Segundo José Afonso da Silva, a Constituição tem como fim a realização dos valores que apontam para o existir da comunidade.(3)

"Os avanços da biotecnologia e da compreensão dos processos moleculares da célula desencadeiam alterações revolucionárias nas possibilidades de manipulação genética e celular numa velocidade tão acelerada que não há formas nem tempo suficiente para que a alfabetização científica da população os acompanhem. Até mesmo os profissionais atuantes na área sentem-se bombardeados pela quantidade de informações simultâneas que devem ser analisadas, filtradas e processadas antes de seu uso"(4).

Elencando exemplos concretos do progresso acelerado da biotecnologia, citamos as pesquisas com células-tronco embrionárias para fins de pesquisa e terapia.

Podemos definir células-tronco como "...células progenitoras que mantêm a capacidade de diferenciar-se nos inúmeros tecidos (sangue, músculos, nervos, ossos, etc.) do corpo humano. São totipotentes quando têm a capacidade de diferenciar-se em qualquer um dos tecidos humanos e multipotentes quando conseguem diferenciar-se em alguns, mas não em todos os tecidos humanos"(5).

As células-tronco embrionárias, segundo o Documento sobre células-tronco embrionárias, do Observatório de Bioética e Direito de Barcelona, podem, nas condições adequadas, converter-se em qualquer tipo de tecido e pelo que é previsível, em um tempo não muito distante, poder-se-ão obter, por exemplo, neurônios para tratar doenças neurodegenerativas, como o mal de Alzheimer ou o mal de Parkinson(6) (tradução nossa).

Conforme os ensinamentos de José Roberto Goldim (2006), "não é preciso realçar o quanto a utilização das células-tronco embrionárias é tema discutido na comunidade científica mundial (e hoje até mesmo em círculos leigos, pela sua presença constante na mídia). O debate se justifica pela imensa relevância não só científica, mas também por razões éticas, econômicas e pelos efeitos que poderá provocar em muitas áreas do conhecimento"(7).

Produção Legislativa na seara da biotecnologia

Em nosso país, a produção legislativa na seara da biotecnologia ainda é escassa. Manifesta-se, por exemplo, na regulamentação da utilização de células-tronco embrionárias para fins de pesquisa e terapia, com o advento da Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005, a chamada Lei de Biossegurança.

A Lei de Biossegurança, abordando o assunto, em seu artigo 5º e parágrafos(8), permite que sejam utilizadas, para fins de pesquisa e terapia, células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento. No entanto, estabeleceu condições para essa utilização: que os embriões utilizados sejam inviáveis ou estejam congelados há 3 (três) anos ou mais e que haja o consentimento dos genitores para sua utilização.

No cenário científico atual, a normatização objetiva, adequada e consistente das novas tecnologias que têm por escopo a vida se faz mister(9) para que a legislação responda aos anseios de uma sociedade que se depara, dia-a-dia, com a crescente onda de surgimento de novas ciências, pesquisas para as quais essa mesma sociedade não se revela totalmente preparada, já que nos últimos tempos, avanços biotecnológicos são, de tal forma, surpreendentes pela rapidez com que evoluem, adentrando nos campos das leis, da ética, dos fundamentais direitos à vida e dignidade humana, liberdades individuais e coletivas e no comportamento histórico-social dos cidadãos, que, para tomarem posicionamento a respeito, os mesmos são obrigados a pesarem em uma balança valores éticos e morais, valores do certo e errado. Escolhas complexas como quem pode, quem deve, o que é mais correto de acordo com a moral e a lei?

Ao abordar assunto referente a células-tronco embrionárias, afirma Carlos Casabona (2004) "Tal situação aconselha ser extremamente cautelosos em relação com qualquer decisão normativa que implique o embrião in vitro"(10).

É nesta perspectiva que calcamos nossa afirmação de que o princípio da precaução deve nortear a produção legislativa no tocante à normatização de assuntos diretamente ligados à biotecnologia, vez que, por se tratar de ciência que aborda a vida, bem maior do ser humano, deve-se ter a cautela exigida para um assunto de tamanha grandeza.(11)

"Nas proposições de investigações e uso da genética, tão importantes quanto a seriedade no desenvolvimento das atividades científicas e técnicas são as responsabilidades e as preocupações com as conseqüências delas oriundas"(12).

Nesta seara de um conhecimento ainda em amadurecimento não se pode, ou, com mais ênfase, não se deve, em nenhuma hipótese, ignorar o princípio da precaução, princípio este que deve acompanhar o processo legislativo da biotecnologia em todas as suas etapas.

Em momento algum podemos esquecer que os avanços tecnológicos e científicos são feitos pelo homem e para o homem, não podendo esse ser tratado como meio e não como fim de todo e qualquer avanço(13).

"Os perigos determinantes de um emprego imprudente da engenharia genética induzem, portanto, a solicitar a criação de uma regulamentação jurídica em defesa dos vários interesses envolvidos" (tradução nossa)(14).

Bobbio nos ensina que "o problema grave de nosso tempo, com relação aos direitos do homem, não é mais fundamentá-los, e sim o de protegê-los"(15).

Proteger direitos, nessa abordagem, significa adentrar na esfera do incontestável direito à vida(16), legislar sobre o patrimônio maior do ser humano, protegido no art. 5º da Carta Magna com o atributo de ser um direito fundamental e ter assegurada sua inviolabilidade(17). Ao legislar sobre toda e qualquer ciência que ponha em voga esse bem, entendemos que precisa o legislador ser ético e justo. Acima de tudo, tem de ser precavido, ou seja, não olvidar, em nenhum momento, do princípio da precaução.

Breve histórico do Princípio da Precaução

O princípio da precaução, embora tenha sido consolidado na Alemanha, nos anos 70 e conhecido como Vorsorge Prinzip, expandiu-se por todos os países europeus, sendo, na década de 90, abordado na Conferência do Rio de Janeiro, em 1992, e consolidado como princípio 15 da Agenda 21, Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável(18).

"O principio da precaução, que havia sido proposto em 1992, foi objeto de um seminário, realizado na França no ano 2000, onde a sua aplicação foi discutida em diversas áreas, além da saúde e do ambiente, como a comunicação social e o direito. Este Princípio não é uma nova criação, mas sim o amadurecimento de uma idéia, que como foi brevemente apresentado anteriormente, vem acompanhando a geração e a aplicação do conhecimento, pelo menos nos últimos 2400 anos"(19).

É oportuno citarmos algumas definições do princípio da precaução, para que se possa melhor inferir sua amplitude e importância no fazer legislativo:

"O princípio da precaução é a garantia contra os riscos potenciais que, de acordo com o estado atual do conhecimento, não podem ser ainda identificados. Este princípio afirma que a ausência da certeza científica formal, a existência de um risco de um dano sério ou irreversível requer a implementação de medidas que possam prever este dano" (José Roberto Goldim, 2005)(20).

"O princípio da precaução foi formulado pelos gregos e significa ter cuidado e estar ciente" (Rubens Onofre Nodari, 2005)(21).

Portanto, tendo por base as definições acima citadas, é impossível não afirmar que o legislador pátrio, ao normatizar as novas questões da biotecnologia, se alicerce no princípio da precaução. Ao legislar sobre um conhecimento ainda não consolidado, tanto na comunidade legislativa, quanto na médica e leiga, deve aquele ser precavido, moderado, cauteloso.

O princípio da precaução exige uma conduta positiva do legislador, mas, principalmente, responsável.

Paulo Vinícius Sporleder do Souza (2006), dissertando sobre o teor da ética relacionada à vida, nos acrescenta que, na atualidade, "quanto ao seu conteúdo, a bioética está assentada em certos princípios, notadamente, o princípio da responsabilidade, o princípio da prudência, e os consagrados princípios da ética biomédica, quais sejam: o princípio do respeito à autonomia, o princípio da não-maleficência, o princípio da beneficência e o princípio da justiça"(22).

Na esteira do citado doutrinador, concordamos com Ricardo Timm de Souza, que nos elucida que "... sustentando o imperativo científico da prudência, temos algo como um 'imperativo ético radical', sem o qual o indiferenciado das ações conduz a humanidade a riscos apreciáveis e mesmo extremos, como a autodestruição"(23).

A Lei inserida no Estado de Direito

"A lei(24) ocupa ainda um lugar privilegiado na estrutura do Estado de Direito porque ela permanece como expressão da vontade comunitária veiculada através de órgãos representativos dotados de legitimação democrática directa (ipsis literis)"(25).

A Lei Federal nº. 11.105, de 24 de março de 2005, tendo por objetivo regulamentar os incisos II, IV e V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, fez constar em seu Art. 1º a necessidade da observância do princípio da precaução, tendo em vista a proteção do meio ambiente. Louvável a atitude do legislador ao afirmar que a lei terá por uma de suas diretrizes observar tal princípio(26).

Contudo, entendemos que se faz imperiosa a aplicação desse princípio não só nos dispositivos que abordam as questões do meio ambiente; sua aplicação deve ser ampliada para a esfera normativa da biotecnologia em todos os seus setores.

Toda e qualquer lei do âmbito das ciências da vida deve estar sob a égide de um princípio que denote prudência, cautela, vez que por ser lei, é cogente, e por ser cogente, deve ser justa e se amparar em pressupostos justos e dignos.

No âmbito jurídico legislativo, conforme Margarita Boladeras Cucurella (1999), na obra Bioética: "Los políticos desempeñan un trabajo de la máxima trascendencia para la articulación y la cohesión de la sociedad, sin la cual es imposible un desarrollo ordenado de la vida civil. Los distintos proyectos políticos definen objetivos para alcanzar una situación social más valiosa y prioritarias que las propugnadas por los opositores. La realización de los programas políticos requiere llevar a cabo medidas concretas de gobierno (actuación del poder ejecutivo) y promover la legislación necesaria para articular las acciones sociales y políticas. La Cámara legislativa tiene la misión de discutir, reformular, aprobar o rechazar las leyes que le propone el gobierno. Las leyes establecen las reglas de juego de la sociedad, protegiendo derechos, bienes e intereses de los ciudadanos y, por ello mismo, estipulando también sanciones para los que conculquen dichas reglas"(27).

Na esteira do pensamento de Barzotto (1999), depreende-se que para normatizar e interpretar é necessário que a justiça se faça presente, e é na esteira da justiça que devem estar inseridos os princípios que regem nossa vida em sociedade.

Em tempos de progressos ainda sem normatização consolidada, a precaução deve ser uma das vigas para que a lei cumpra a função que J. A. Silva (2005) chama de 'regulamentação fundamental'. "A lei é efetivamente o ato oficial de maior realce na vida política. Ato de decisão política por excelência, é por meio dela, enquanto emanada da atuação da vontade popular, que o poder estatal propicia ao viver social modos pré-determinados de conduta, de maneira que os membros da sociedade saibam, de antemão, como guiar-se na realização de seus interesses..."(28).

Vivemos em um Estado de Direito que, conforme Canotilho (2004), tem por princípio básico "a eliminação do arbítrio no exercício dos poderes públicos com a consequente garantia de direitos dos indivíduos perante esses poderes" (ipsis literis)(29).

Indo além, diz que o Estado de Direito precisa ser democrático, vez que "é a liberdade democrática que legitima o poder"(30).

Deste modo, a lei, ato de extrema relevância no cenário nacional, corpo de regras para a direção da conduta humana, imposta e ministrada aos cidadãos de uma dada sociedade, deve ir ao encontro dos princípios que regem o Estado de Direito, deve ser a imagem da correta interpretação constitucional, adaptando-se aos dias hodiernos e suas céleres mudanças nos diversos âmbitos da vida humana.

Conclusão

Nos últimos tempos, progressos biotecnológicos são de tal forma surpreendentes pela rapidez com que evoluem que, adentrando nos campos da ética, do fundamental direito à vida e do consagrado princípio da dignidade humana, das liberdades individuais e coletivas e do comportamento histórico-social dos cidadãos, acabam por impelirem a sociedade a valorar princípios éticos e morais. Desta forma, acabam por esperar dos legisladores normas que, com presteza e sabedoria rejam essa nova etapa da vida social.

Sendo assim, os inúmeros questionamentos referentes à biotecnologia e seus reflexos lançados ao mundo das leis estão sendo dirimidos, aos poucos, no direito pátrio, em regulamentações recentes, tais como a Lei de Biossegurança.

É na esteira da justiça que devem estar inseridos os princípios que regem nossa vida em sociedade.

A cautela, a prevenção, o cuidado devem estar presentes em todas as ações do mundo legislativo, prioritariamente ao interagir com ciências novas, que estudam a modificação da concepção de vida e que intrigam tanto a sociedade quanto os pesquisadores do tema. Em tempos de avanços ainda sem exaustiva normatização escrita, a precaução deve ser um dos pilares para que a lei cumpra sua função de ser, como afirma José Afonso da Silva (2005), o ato oficial de maior realce na vida política.

"Ato de decisão política por excelência, é por meio dela, enquanto emanada da atuação da vontade popular, que o poder estatal propicia ao viver social modos pré-determinados de conduta, de maneira que os membros da sociedade saibam, de antemão, como guiar-se na realização de seus interesses... A lei não deve ficar numa esfera puramente normativa, não pode ser apenas lei de arbitragem, pois precisa influir na realidade social"(31).

"Diferentemente do que ocorria no passado, quando às Constituições era emprestada a missão de tão-somente definir as normas de organização e competência do Estado, hoje em dia tem-se a 'Constituição principiológica', que transforma em direito positivo, direito legal, certos princípios que tradicionalmente eram tidos como pré-positivos, como, por exemplo, o princípio da dignidade da pessoa humana, entre nós expressamente reconhecido como princípio estruturante ou fundante do Estado Democrático de Direito.

Alexy ensina que 'princípios são o mesmo que valores, contemplado em um caso sob um aspecto deontológico e sob um aspecto axiológico'"(32).

Segundo José Afonso da Silva (2005), "os princípios são ordenações que se irradiam e imantam os sistemas de normas, são [como observam Gomes Canotilho e Vital Moreira] 'núcleos de condensações' nos quais confluem valores e bens constitucionais. Mas, como disseram os mesmos autores, os princípios que começam por ser a base de normas jurídicas, podem estar positivamente incorporados, transformando-se em normas-princípio e constituindo preceitos básicos da organização constitucional"(33).

Essas transformações metodológicas possibilitam a crítica e a reconstrução de certos conceitos fundamentais. Assim como a sociedade, ao longo do tempo, vem se adaptando às transformações que circundam o direito à vida, consagrado fundamental desde o Código de Hammurabi (1690 AC) até os dias de hoje, o saber legislativo também adequa seu entendimento às inovadoras modificações que regem a gama de temas a serem legislados. É nesse conjunto de ciência, ética e normatividade que o princípio da precaução encontra seu lugar como pilar de um processo que necessita ter presente a precaução, a responsabilidade e a justiça.

Vez que o legislador tem o dever de elaborar leis para o conjunto de pessoas que estão sob a égide das mesmas, essas devem ser para o homem e pelo homem. É urgente que, assim como as ciências tenham como limite científico a existência humana, o legislador tenha como limite a prudência, a certeza indubitável de legislar sempre para o bem e para a justiça.

"Dentro deste contexto, assim como podemos dizer que o século XX foi o século da ciência, um período em que uma quantidade avassaladora de conhecimentos e tecnologias foi produzida, provavelmente o debate ético instaurado nos dias atuais leve o século XXI a ser conhecido como o século da ética e das humanidades"(34).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALHO, Clarice Sampaio. Ciência e ética: os grandes desafios. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2006.

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos, trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 2004.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, 3ed. Coimbra: Almedina Editora, 1998.

CASADO, M., EGOZCUÉ, J. Documentos sobre células madre embrionárias. Barcelona: Observatori de Bioética i Direit, 2001.

CLOTET, Joaquim (organizador). Bioética. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2001.

CUCURELLA, Margarita Boladeras, Bioética, Madrid: Editorial Síntesis, S.A., 1999

GOLDIM, José Roberto. O princípio da precaução. Disponível em . Acessado em 15 jan. 2006.

MARTINS-COSTA, Judith, FERNANDES, Márcia Santana e GOLDIM, José Roberto. Lei de Biossegurança. Medusa legislativa? Disponível em . Acessado em 22 jan. 2006.

NODARI, Rubens Onofre. Pertinência da Ciência Precaucionária na identificação dos riscos associados aos produtos das novas tecnologias. Disponível em . Acessado em 08 jan. 2006.

RICCI, Mariella Lombardi, Fabbricare Bambini? La questione dell'embrione tra nuova medicina e genética, Milano, Vita e Pensiero, 1996.

SA, Maria de Fátima Freire de, NAVES, Bruno Torquato de Oliveira (coordenadores). Bioética, biodireito e o novo código civil de 2002. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.

SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite (organizadora). Biodireito, ciência da vida, os novos desafios. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico, 26ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo, 25ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

SOUZA, Ricardo Timm de (organizador). Ciência e ética: os grandes desafios. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2006.

ZATZ, Mayana. Biossegurança e as pesquisas com células-tronco. Revista Jurídica Consulex, ano VII, nº. 180, p. 22-30, 2004.


Notas:

* Simone da Rosa Zuliani, Advogada, Consultora Técnico-Legislativa da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, Secretária da Comissão Especial das Células-Tronco de 16/2/2006 até 6/6/2006; Coordenadora Executiva do Projeto Perspectivas e Presidente, designada pela Portaria nº 08/2005-GP, da Comissão para instruir processo licitatório visando à realização de Concurso nos termos da Resolução nº 2941 de 8 de julho de 2005, que instituiu o Projeto Perspectivas no âmbito da Assembléia Legislativa; Concurso Público (Edital 01/2005) que consistiu na recepção, exame e classificação de artigos a serem escritos por universitários, sobre o tema "O Poder Legislativo na construção política do Rio Grande do Sul", cuja publicidade se dá, anualmente, através da Revista Estudos Legislativos,integrante de grupo de estudos do Projeto Práxis Legislativa. E-mail: simone.zuliani@al.rs.gov.br [ Voltar ]

1 - Renato Sérgio Balão CORDEIRO. A responsabilidade institucional. A moralidade dos atos científicos, p. 13, apud Eduardo de Oliveira LEITE in Maria Celeste Cordeiro Leite SANTOS. Biodireito: ciência da vida, os novos desafios, p.99.Voltar

2 - Cf. Constituição Federal de 1988, "Art. 225 - Todos têm direito a um meio-ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º. - Para assegurar a efetividade desse direito incumbe ao poder público: ... V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio-ambiente;".Voltar

3 - José Afonso da SILVA, Curso de direito constitucional positivo, 25ª edição, P. 39.Voltar

4 - Clarisse Sampaio ALHO, Ciência e ética: os grandes desafios, p. 16.Voltar

5 - Mayana ZATZ, Biossegurança e as pesquisas com células-tronco, Revista Jurídica Consulex, ano VII, nº. 180, p. 23Voltar

6 - M. CASADO e J. EGOZCUE (coordenadores), Documento sobre células madre embrionárias, p. 5.Voltar

7 - Judith MARTINS-COSTA, Márcia Santana FERNANDES e José Roberto GOLDIN, Lei de biossegurança. Medusa legislativa? Publicado no site www.bioetica.ufrgs.br.Voltar

8 - Lei 11.105 de 24 de março de 2005, art. 5º: "É permitida, fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições: I - sejam embriões inviáveis; ou II - sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei ou que, já congelados na data da publicação desta lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data do congelamento. § 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores. § 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e à aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa. § 3º É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei nº. 9.434, de 4 de fevereiro de 1997".Voltar

9 - Cf. Mariella Lombardi RICCI, Fabricare bambini? La questione dell'embrione tra nuova medicina e genética, introduzione. "Si incomincia ad interrogarse se di fatto si è possibile separare fatti scientifici da connesso giudizio di valore su di essi. È sempre più presente l'esigenza di uma riflessione comune, scientifica ed ético-filosofica insieme, dal momento che appare sempre più difficile considerare separate la ricerca scientifica, da un latto, e l'applicazione tecnologica dall'altro".Voltar

10 - Carlos Maria Romeo CASABONA in Maria de Fátima Freire de SÁ e Bruno Torquato de Oliveira NAVES (coordenadores), Bioética, biodireito e o novo Código Civil de 2002, p. 148.Voltar

11 - Margarita Boladeras CUCURELLA, na p. 31 da obra Bioética, abordando o princípio da beneficência, nos informa:"La máxima utilitarista de "lograr el mayor bien para el mayor número de personas" o"el menor mal para el menor número de personas " es un intento de cuantificar y calificar de manera concreta- idea de bien como bienestar de uno o más individuos...".Voltar
12 - Clarice Sampaio ALHO in Ricardo Timm de SOUZA (org.), Ciência e Ética: os grandes desafios, p. 18.Voltar

13 - Ingo Wolfgang SARLET, Dignidade da Pessoa Humana, p. 33. Citando Kant, Ingo Sarlet expõe: "... Kant sustenta que o homem e, duma maneira geral, todo o ser racional, existe como um fim em si mesmo, não simplesmente como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade. Pelo contrário, em todas as suas ações, tanto nas que se dirigem a outros seres racionais, ele tem sempre de ser considerado simultaneamente como um fim...".Voltar

14 - Lorenzo CHIEFFI in Maria Celeste Cordeiro Leite SANTOS (org.), Biodireito: ciência da vida, os novos desafios, p.58.Voltar

15 - Norberto BOBBIO, A era dos direitos, trad. Carlos Nelson COUTINHO, p. 45.Voltar

16 - José Afonso da SILVA, Curso de direito constitucional positivo, 25ª edição, p.198Voltar

17 - Art. 5º da Constituição Federal Brasileira de 1988: "Todos são iguais perante alei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:...".Voltar

18 - Princípio 15 da Agenda 21, documento elaborado na Declaração do Rio de Janeiro sobre meio ambiente e desenvolvimento: "Com o fim de proteger o meio ambiente, os Estados deverão aplicar amplamente o critério de precaução conforme suas capacidades. Quando houver perigo de dano grave ou irreversível, a falta de certeza científica absoluta não deverá ser utilizada como razão para se adiar a adoção de medidas eficazes em função dos custos para impedir a degradação do meio ambiente".Voltar

19 - José Roberto GOLDIM, O princípio da precaução, publicado no site www.bioetica.ufrgs.br.Voltar

20 - Ibid.Voltar

21 - Rubens Onofre NODARI, Pertinência da Ciência Precaucionária na identificação dos riscos associados aos produtos das novas tecnologias, p. 1.Voltar

22 - Paulo Vinícius Spoleder de SOUZA in Ricardo Timm de SOUZA (org.), Ciência e ética: os grandes desafios, p. 125.Voltar

23 - Ricardo Timm de SOUZA (org.), Ciência e ética: os grandes desafios, p. 145Voltar

24 - De Plácido e SILVA,Vocabulário Jurídico, 26ª edição "No conceito jurídico, dentro de seu sentido originário, é a regra jurídica escrita, instituída pelo legislador, no cumprimento de um mandato, que lhe é outorgado pelo povo".Voltar

25 - José Joaquim Gomes CANOTILHO, Estado de direito, p. 64.Voltar

26 - Art. 1º da Lei 11.105 de 24 de março de 2005, regulamentada pelo Decreto nº. 5591, de 22 de novembro de 2005: "Esta Lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente modificados - OGM e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente".Voltar

27 - Margarita Boladeras CUCURELLA, Bioética, p.203.Voltar

28 - José Afonso da SILVA, Curso de direito constitucional positivo, p. 121.Voltar

29 - José Joaquim Gomes CANOTILHO, Estado de direito, p.11.Voltar

30 - Ibid., p.28.Voltar

31 - José Afonso da SILVA, Curso de direito constitucional positivo, p. 121.Voltar

32 - Joaquim CLOTET, Bioética, p. 71.Voltar

33 - José Afonso da SILVA, Curso de direito constitucional positivo, p. 92.Voltar

34 - Ivana Beatrice Mânica da CRUZ, Questionamento ético na pesquisa de células-tronco nos seres humanos, Ética em pesquisa: reflexões, p. 71.Voltar

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