Parecer - 2 questões formuladas sobre os direitos nas rescisões de duas empresas de representação comercial

Márjorie VC Leão, Advogada, Pós-Graduanda em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas.

Fonte: Márjorie Viúdes Calháo Leão

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Márjorie VC Leão ( * )

Rio de Janeiro, 18 de abril de 2007.

Ilmo. Sr.
Dr.
São José dos Campos - São Paulo.


Prezado colega:

Coloco inicialmente a questão exatamente como me foi exposta:

Por favor, gostaríamos de comentários no sentido de saber se é devida ou não o pagamento das verbas de rescisão contratual de empresas de representantes comerciais nos seguintes casos:

a) Mantivemos um contrato de representação com um representante comercial pessoa física que se arrastou por mais de 20 anos, até que este veio a falecer na última semana. Indago: É devido algum valor ?

b) Em outra situação face a um acidente de carro, faleceu outro nosso representante , cujo trabalho profissional era coberto por sua empresa X, detendo o falecido 98% das quotas e sua esposa e seu filho 1% cada . Indago: É devido algum valor à sociedade? Caso nossa empresa deseje rescindir o contrato por não desejar ser representada pelos herdeiros, há essa possibilidade legal?


Nas duas hipóteses nosso advogado interno entende que nenhum valor é devido, e que os contratos se extinguiram normalmente face aos falecimentos.

Passo então a responder, sub-censura:

1. Existem respeitáveis opiniões jurídicas em sentido contrário a que vou abaixo manifestar, inclusive a de seu advogado interno, até mesmo porque em direito nada é indiscutível como já dizia Soibelmann;

2. Entendo que para cada situação exposta, se faz necessário um comentário para o exato enquadramento da quaestio;

3. Na primeira situação, V. Sa diz que a vossa empresa manteve um contrato de representação comercial com uma pessoa física por 20 anos, e face ao seu falecimento há entendimento de que nenhum valor é devido.

Nada mais irreal e anti-jurídico, violando o princípio da boa-fé que é um dos norteadores do nosso Novo Código Civil. Ao falecer, após 20 anos de trabalho para vossa empresa, representando-a e certamente com eficiência e lealdade, senão este contrato não se arrastaria na expressão de V. Sa por tanto tempo, é evidente que direitos legais deixou o representante comercial falecido, que se transferem para seus herdeiros legais e sucessores, como um princípio geral de direito, até mesmo porque a lei não faz distinção alguma quanto ao valor devido que deve ser pago, e não exclui do pagamento a indenização em caso de morte. Se a lei não distingue, não cabe ao intérprete distinguir na lição irretocável do saudoso Ministro de nossa Suprema Corte Aliomar Baleeiro.

Pensamos ser este o escopo da Lei 4866/65 alterada pela Lei 8420/92.

Apesar da natureza jurídica diferente, por mera comparação, é de se imaginar se fosse o caso de um empregado e se este viesse a falecer, é evidente que teria a empresa de pagar a rescisão contratual a seus herdeiros, ou à inventariante do Espólio do finado.

4. Na segunda hipótese, com o devido respeito é mais absurdo ainda o entendimento manifestado por vosso jurídico interno, com as vênias de estilo.

O representante comercial falecido, era sócio de uma empresa que representava vossa organização e da qual detinha 98% das quotas, sendo os restantes 2% de sua esposa e filhos em participações societárias.

Então é evidente, que com a morte do principal quotista da empresa de representação, esta não se dissolve, e vai continuar juridicamente existindo, com a sua esposa e filho e com o capital social de 2%, e até que se faça a apuração de haveres dos 98% do sócio falecido.

O contrato de representação comercial continua a valer integralmente, e jamais se pode considerar o mesmo como rescindido, e não há que se falar em rescisão contratual, e em nenhum valor a pagar eis que não se materializou a rescisão contratual em nenhuma das formas constantes da lei dos representantes.

Por cautela pedi a cópia do contrato da empresa de representação e consta expressamente " que no caso de morte , falecimento ou interdição de qualquer dos sócios, a sociedade não se dissolverá continuando com os herdeiros do sócio falecido, não gerando o direito de ocupar o lugar do finado ".

Mesmo com esta redação um pouco deficiente, se verifica claramente que no caso do evento morte, a sociedade não se dissolverá; não custando lembrar que o contrato de representação foi feito com uma pessoa jurídica que como se sabe, tem personalidade distinta da pessoa física de seus sócios.

Quanto à segunda colocação nesta questão, sem dúvida de que a empresa pode tomar a decisão de não mais desejar continuar com o contrato; mas alerto para os termos da última renovação, ou seja há um contrato em vigor por mais 34 meses, que deve ser negociado face à evidente violação à cláusula pacta sunt servanda, e às perdas e danos e lucros cessantes que poderão advir dessa decisão, assim como que devidas são as indenizações e os direitos legais constantes na lei dos representantes comerciais, se a intenção de rescindir sem motivo partir de vossa organização.

Não há pois que se falar que este contrato se extinguiu após o falecimento de um sócio quotista da empresa de representação comercial.

Como examinei um dos contratos que me foram remetidos, para poder responder à segunda questão, ad argumentandum tantum, e somente à guisa de alerta, informo que há um engano nos contratos quando vossa empresa estipula que as comissões dos representantes serão pagas sobre o valor líquido.

Esta cláusula como está já foi considerada abusiva por várias r. decisões judiciais, e após a Lei 8420/92 está e na forma da lei referenciada solidificada a jurisprudência no sentido de que a partir do advento da Lei 8420/92, a comissão devida ao representante comercial incide sobre o valor total das mercadorias, o que significa dizer que nela se inclui o ICMS. ( TAMG -Ap 0247975-6- 3ª. CC- Rel. Juiz EDÍLSON Fernandes- J. 18.2.1998, in RJTAMG 70/203 ).

É como entendo as questões que me foram expostas, s.m.j.

Márjorie VC Leão.
Advogada.
Leão, advogados.


Notas:

* Márjorie VC Leão, Advogada, Pós-Graduanda em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas. [ Voltar ]

Palavras-chave: representação

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