O direito em tempos de crise. Fundamentos para uma abordagem global dos direitos humanos

João Gabriel P. Lopes. Aluno da disciplina Direito de Cidadania, ministrada pela Profa. Gloreni Aparecida Machado, durante o Verão de 2009, na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB).

Fonte: Joao Gabriel Pimentel Lopes

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João Gabriel P. Lopes ( * )

Universidade de Brasília
Faculdade de Direito
Curso de Graduação em Direito
Disciplina: Direito de Cidadania

Trabalho final da disciplina Direito de Cidadania, desenvolvido sob a orientação da profa. Gloreni Aparecida Machado, durante o Verão de 2009.

Brasília, janeiro de 2009.

Sumário: Introdução. 1. Direitos humanos de quem? 1.1. Direitos naturais e direitos humanos. 1.2. Os direitos humanos nas obras de Kant e Stuart Mill. 1.3. Liberalismo e social-democracia: politização dos direitos naturais. 1.4. Breve, porém traumático: o século XX e a transformação da razão. 2. Uma nova perspectiva dos direitos. 2.1. Uma introdução à teoria da modernidade de Habermas. 2.2. A orientação principiológica dos direitos. 3. A inclusão de um outro mundo. 3.1. Ocidente e não-ocidente: entre participação e imposição. 3.2. A ilegitimidade do fundamentalismo. 3.3. É possível uma intervenção armada justificada pelos direitos humanos?. Conclusão: O futuro dos direitos. Referências bibliográficas. Anexo.

"O futuro tem muitos nomes.
Para os fracos é o inatingível.
para os temerosos, o desconhecido.
Para os valentes é a oportunidade."
(Victor Hugo)

Introdução

"Guerra é paz. Liberdade é escravidão. Ignorância é força"(1). Os ideais do Partido de ORWELL nunca foram tão presentes na vida real como ao longo do último século. Sob o pretexto de propalar a paz, instauraram-se sucessivos processos de violência gratuita entre os grupos humanos. A batalha por liberdade viu-se reduzida à rasa contraposição política entre esquerda e direita. Por meio de imposições cruéis, instaurou-se a estupidez institucionalizada das vaidosas democracias liberais.

Todos esses processos trouxeram à tona a reflexão acerca do papel desempenhado pelo discurso racional democrático na legitimação das políticas internacionais contemporâneas. Neste aspecto, tem-se um quase uníssono clamor pela aplicação dos direitos humanos como pacificadores universais, pois seriam eles o único sistema possível para abarcar toda a diversidade cultural do planeta, fundamentando assim uma democracia global.

A questão que ora se põe à filosofia política é o porquê de ser essa democracia global um objetivo a ser perseguido pela humanidade. Ao lado disso, questiona-se também sobre a legitimidade do discurso democrático na implantação de políticas (policies) de respeito mútuo e pacificação a povos que não seguiram o mesmo trajeto do que vem se convencionando chamar mundo ocidental.

Neste trabalho, atento para um recorte teórico no interior destas questões que ocupa espaço primordial no debate das ciências sociais na atualidade: procuro estabelecer um trajeto das percepções acerca dos direitos diante dos diversos contextos históricos e em que medida essas percepções contribuíram para o próprio rumo tomado pela humanidade nos últimos séculos.

Como o homem moderno construiu a sua noção de direitos? Qual a influência de uma visão de Estado sobre a perspectiva dos direitos? Qual o papel desempenhado pelos direitos humanos em delicadas questões atuais como fundamentalismo e o reconhecimento de minorias? Essas questões nortearão os argumentos a serem apresentados, pois tentar-se-á verificar, a partir de uma abordagem filosófica centrada na racionalidade comunicativa, a viabilidade fática da aplicação dos princípios jurídicos.

Essa linha de raciocínio filosófico buscará analisar de que forma se expressa a tensão entre faticidade e validade das normas jurídicas de direito internacional no tratamento do tema proposto. Ademais, também é mister analisar a relação entre direitos humanos e identidades locais no intuito de fundar o debate entre universalismo e relativismo, verificando-se as possibilidades de intervenção na soberania de um povo quando se constatam afrontas culturais aos princípios de humanidade dos direitos.

Antes de dar início a esta tarefa, é necessário estabelecer um pressuposto elementar - de que direito estamos tratando? Trago de DWORKIN a definição daquilo que, para além de quaisquer divergências semânticas, têm sido os direitos no decorrer da história humana:

O direito é um conceito interpretativo. Os juízes devem decidir o que é o direito interpretando o modo usual como os outros juízes decidem o que é o direito. Teorias gerais do direito são, para nós, interpretações gerais da nossa própria prática judicial. Rejeitamos o convencionalismo, que considera a melhor interpretação a de que os juízes descobrem e aplicam convenções legais especiais, e o pragmatismo, que a encontra na história dos juízes vistos como arquitetos de um futuro melhor, livres da exigência inibidora de que, em princípio, devem agir coerentemente uns com os outros. Ressalto a terceira concepção, do direito como integridade, que compreende a doutrina e a jurisdição. Faz com que o conteúdo do direito não dependa de convenções especiais ou de cruzadas independentes, mas de interpretações mais refinadas e concretas da mesma prática jurídica que começou a interpretar.(2)

O que aqui se busca, portanto, é o estabelecimento de parâmetros que tornem a interpretação de um direito internacional dos direitos humanos plausível perante o discurso democrático constitucional contemporâneo, tomando-se por base as teorias de HABERMAS e DWORKIN.

1. Direitos humanos de quem?

Pelo bem de uma contextualização melhor, iniciar-se-á com uma breve exposição da significação dos direitos humanos no curso dos últimos três séculos. O marco temporal de início desta abordagem coincide com o aparecimento da idéia moderna de direito enquanto sistema, quando os pensadores "não indagam mais, como os antigos, das relações morais do bem da vida, mas sim de suas condições efetivas e racionais de sobrevivência" (HABERMAS apud FERRAZ Jr., 2007:66).

1.1. Direitos naturais e direitos humanos

Foi, portanto, durante o período que na história da filosofia ficou conhecido como Iluminismo que os direitos ganharam grande proeminência. Começou-se, sobretudo a partir do século XVII, a questionar o fundamento cristão da Auctoritas, e a reta ratio da Antiguidade Clássica, ainda bastante influente, foi substituída por uma razão entendida de uma forma muito distinta daquela predominante na Grécia e na Roma antigas (EDMUNDSON, 2006:23).

A construção dos sistemas funcionais do conhecimento, voltados para si na busca da explicação dos fenômenos observáveis, fez com que o método escolástico fosse substituído por um empirismo que rejeitava a união entre as esferas humana e religiosa. O direito, a partir de então, "não é mais nem contemplação, nem manifestação de autoridade, nem exegese à moda medieval, mas capacidade de reprodução artificial (laboratorial) de processos naturais" (FERRAZ Jr., 2007:69).

O sistema jurídico, antes justificado em entes exteriores aos facilmente verificáveis com a experimentação, passa a obedecer à lógica da razão empírico-cognitivista da modernidade. É neste contexto que surgem as declarações de direitos nas quais se busca uma formulação primeira de direitos humanos, entendidos, àquela época, como aqueles direitos inatos de todos os cidadãos, esfera protetiva contra a autoridade do Estado e até mesmo da própria sociedade.

É neste contexto que se destacam a Bill of Rights norte-americana e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da França revolucionária. A despeito do êxito experimentado pela primeira carta de direitos, a segunda mostrou-se insuficiente para conter as animosidades políticas do período do Terror Jacobino. Todavia, anos mais tarde os Estados Unidos experimentariam de percalços na sua trajetória elucidativa do conteúdo dos direitos, que acabaram por promover uma guerra de dimensões catastróficas:

Ao contrário dos franceses, os norte-americanos não tentaram recriar, em escala nacional, a ágora ateniense ou o foro romano, razão pela qual os Estados Unidos escaparam às convulsões políticas que arruinaram a França. Não obstante, a hora da prova também chegaria para os norte-americanos, e ela estava diretamente relacionada com o conceito de direitos. A grande controvérsia que devorou a nova república norte-americana entre 1791 e 1865 foi a escravidão.(3)

Verificou-se, com os fatos que terminaram por colocar em xeque a naturalidade e a legitimidade das cartas de direitos humanos, uma patente deficiência de efetividade, por mais que as nações que as editaram se vangloriassem de sua primazia. Diante de tal situação, surgem duas notáveis alternativas para uma possibilidade de um direito internacional dos direitos humanos.

1.2. Os direitos humanos nas obras de Kant e Stuart Mill

Em KANT, percebe-se uma enorme preocupação com o estabelecimento de uma situação duradoura de paz mundial, elucidada em seus Doutrina do Direito e À paz perpétua. O autor busca escapar a uma definição meramente moral de tal situação e a condiciona à existência de um estado de direitos que escape aos tradicionais direito público e direito internacional - o direito cosmopolítico.

Essa idéia racional de uma comunidade pacífica perpétua de todos os povos da Terra (mesmo quando não sejam amigos), entre os quais podem ser estabelecidas relações, não é um princípio filantrópico (moral), mas um princípio de direito. A natureza encerrou todos os homens juntos, por meio da forma redonda que deu ao seu domicílio comum (globus terraqueus), num espaço determinado. E, como a posse do solo, sobre o qual o habitante da Terra foi chamado a viver, só pode ser concebida como a posse de uma parte de um todo determinado, por conseguinte, se uma parte sobre a qual cada um deles tem um direito primitivo, todos os povos estão originariamente em comunidade do solo; não em comunidade jurídica da posse (communio) e portanto de uso ou de propriedade desse solo, mas em reciprocidade de ação (comercium) física provável, isto é, numa relação universal de apenas um com todos os demais (...). Esse direito, como a união possível de todos os povos, com relação a certas leis universais de seu comércio possível, pode ser chamado de direito cosmopolítico (jus cosmopoliticum).(4)

Dessa maneira, KANT rompe com a doutrina anterior dos direitos, que atribuía a eles uma fundamentação empírica, mas moral, pautada na vivência valorativa de uma sociedade. Daí o destaque do filósofo alemão diante da sua contribuição para uma formulação jurídica dos direitos humanos.

Isso não significa negar um conteúdo moral dos direitos. Significa, tão-somente, racionalizar o processo de internacionalização dos mesmos, possibilitando sua aceitabilidade comum, de modo a evitar a "barbárie" (KANT, 1993:201). O próprio KANT admite que tornar eficazes os direitos é, em si, um princípio moral, já que viver conforme o direito é um imperativo categórico (conquanto sejam as normas jurídicas imperativos hipotéticos(5)), uma máxima universalizável essencial ao bem-viver. Nesse sentido, KANT defende uma constituição comum aos Estados (como a dos Estados Unidos da América), que faça valer os princípios universais de direito, formando-se uma comunidade internacional indissolúvel.

Só desta maneira [como uma União fundada numa Constituição pública indissolúvel] se pode tornar realizável a idéia da fundação de um direito de gentes, em cujo nome se decidirão os interesses internacionais à maneira civil, isto é, na forma de processo e não de uma maneira bárbara (como os selvagens).(6)

A pretensão kantiana esbarrou, por certo, num condicionamento histórico. O processo de barbárie da civilização atropelou o projeto de uma paz constitucional, desinchando a bolha humanitária de direitos. Os séculos XIX e XX vislumbraram o enrijecimento das fronteiras e o crescimento dos exércitos. A luta pela definição de espaço de atuação política, que acabou desembocando num estado de guerra total nas décadas de 1930 e 1940, tornou necessário repensar as categorias kantianas a partir de seus fundamentos - a natureza pacífica das repúblicas, a força geradora de comunidades, própria do comércio internacional, e a função política da opinião pública (HABERMAS, 2007:200).

Já no início do século XIX, começaram a se destacar intelectuais que adotaram uma posição diversa daquela tomada por KANT. John AUSTIN, Jeremy BENTHAM e John Stuart MILL fundamentaram uma soberania externa das nações, descrentes que estavam após os horrores do Terror Jacobino. Conforme mostra EDMUNDSON, "o Reino do Terror era uma eterna advertência de que um virtuoso regime republicano poderia ser uma tirania" (EDMUNDSON, 2006:92).

O utilitarismo de regras, corrente cujo maior expoente foi J. S. MILL, também pensou os direitos do homem, embora de forma distinta de KANT. Para MILL, eles seriam regras morais embasadas por um princípio de utilidade, sendo a explicação única para a ideia de justiça.

Ter um direito é, segundo penso, ter alguma coisa cuja posse a sociedade deve defender. E se algum contraditor insiste em perguntar por que deve a sociedade fazê-lo, não posso lhe dar outro motivo senão a utilidade geral. Se essa expressão não transmitir suficientemente o sentimento da força da obrigação, nem explicar a energia particular desse sentimento, é porque na composição deste entra não só um elemento racional, mas também um elemento animal.(7)

Dessa maneira, MILL escapa à diferenciação kantiana entre a interioridade e a exterioridade das regras. Para ele, toda regra social possui um conteúdo racional-moral (exterior) e um conteúdo sentimental (interior), associado este último à autopreservação. No entanto, o filósofo inglês cai no erro de sopesar a utilidade, atribuindo graus de felicidade às ações desempenhadas pelo homem.

Como observado por SIDGWICK, isso enfraquece o utilitarismo, pois submete a lógica dos atos a um viés puramente intuitivo, que impediria a racionalização das escolhas morais dos indivíduos (EDMUNDSON, 2006:97).

Assim sendo, também o conteúdo dos direitos estaria submetido a aspectos interiores. A defesa desta asserção é de enorme gravidade, como mostraria a história de um século depois. Deixar a regulação de condutas submetida à intuição dos indivíduos ou a "sentimentos de direito" terminaria por conduzir a humanidade a uma situação de colapso causada pelo simples motivo de que a interioridade de uma regra é questão de preferência e não há motivo para que a preferência do outro se sobreponha à minha. Em se realizando isso, ganho também eu o direito de impor o que é de meu agrado, ainda que para isso tenha de apelar a toda forma de violência.

1.3. Liberalismo e social-democracia: politização dos direitos naturais.

KANT e MILL romperam com a velha doutrina dos direitos naturais. Retiraram dos entes exteriores ao homem a responsabilidade pela conduta deste. Entretanto, não se pode dizer que o jusnaturalismo deixou, com isso, de exercer influência sobre o pensamento filosófico ocidental. Isso é facilmente percebido quando se parte para uma análise do contexto político europeu que se desenvolveria a partir de então.

Os ideais de igualdade e liberdade, marcos centrais do pensamento jusnaturalista, passaram a ser as bandeiras de luta das ideologias políticas novecentistas. Não é difícil constatar que, após séculos de Absolutismo monárquico, tudo o que se desejava nas repúblicas burguesas era a possibilidade de acumulação livre de riquezas, com a asseveração da igualdade de possibilidades de ascensão social baseada em critérios econômicos.

O Estado liberal, em seu apego excessivo às liberdades individuais, fez com que estas adquirissem, tão-somente, um sentido negativo e, por isso, fraco. O zelo desmedido pelo campo do eu esmagou o que restara de uma sociedade esfacelada pela semântica da revolução. Os direitos, dessa maneira, tornaram-se meros cobertores dos indivíduos reprimidos pela autoridade de um Leviatã. Curiosamente, entretanto, nem o mais liberal entre os capitalistas propôs a supressão do Estado, necessário ao afago das comoções sociais e à permanência dos eus no interior dos eus.

Mas os crescentes movimentos interiores da sociedade europeia trouxeram à tona a necessidade de se refletir sobre essas comoções sociais e de se reforçar um enquadramento do eu no interior do nós, por mais virtual que este fosse.

As liberdades positivas, que trouxeram consigo a percepção de que a vivência com o outro carece da imposição de deveres, foram a base para uma nova formulação do Estado nacional europeu, que passou a apelar à igualdade de condições dos indivíduos.

A social-democracia foi a alternativa encontrada pelos capitalistas europeus para preservar seu poder político diante das crescentes insurgências dos partidos socialistas. Para que sobrevivessem no poder, os governantes passaram a dotar equality policies, que adequaram as expectativas sociais à necessidade crescente de coesão social, derivada sobretudo do contexto imperialista.

As ameaças mútuas entre as potências bélicas conviveram durante décadas com o medo da revolução. Se externamente ocorria uma afirmação da ideia de nação, no interior dos países europeus o que se percebia era a falta de homogeneidade acerca dos padrões políticos. Percebe-se, então, a importância de um povo uno, coeso, ainda que a força fosse necessária para isso: somente uma Nação forte poderia sobreviver ao equilíbrio do terror vigente na Europa do início do século XX.

A história do imperialismo europeu entre 1871 e 1914, tal como o nacionalismo integral do século XX (...), ilustra o triste fato de que a idéia de nação serviu muito menos para fortalecer as populações em sua lealdade ao Estado constitucional do que para mobilizar as massas em favor de objetivos que dificilmente se podem harmonizar com princípios republicanos.(8)

O nacionalismo orgânico daquela época, em decorrência de sua patente artificialidade, acabou por ficar vulnerável ao abuso de elites políticas. "O fato de que os conflitos internos sejam neutralizados por êxitos na política externa baseia-se em um mecanismo sociopsicológico do qual os governos sempre fizeram uso" (HABERMAS, 2007:139).

1.4. Breve, porém traumático: o século XX e a transformação da razão

Com o liberalismo e os governos social-democatas da Europa, ocorreu a ideologização dos ideais modernos, que acabaram por chegar a um limite no "breve" século XX.

A política imperialista não mais dava conta de sustentar o equilíbrio forjado das potências bélicas e, de repente, balas em Sarajevo fizeram apagar as luzes da Europa(9). Em 1914, começava um processo de afirmação máxima da violência em nome de uma identidade territorial, ainda que, como já afirmado, fosse absolutamente forjada.

Em meio à guerra, o advento da Revolução Socialista na Rússia trouxe ainda mais instabilidade à já desgastante entropia europeia. Um novo sistema, uma nova alternativa, um novo Estado. Não por isso novos ideais. A igualdade primada na União Soviética não era de modo algum nova, porquanto não passava de discurso vazio que apenas trabalhava para tornar uns mais iguais que outros.

O pior, entretanto, ainda estava por vir. Imerso na maior crise da história do capitalismo, o mundo assistiu aos horrores dos extremismos alemão e italiano entre as décadas de 1930 e 1940, que culminou numa guerra contra a improvável união entre capitalismo liberal e socialismo de Estado (que, diga-se de passagem, andou longe de ter motivos humanitários).

O nazi-fascismo europeu e o stalinismo soviético deram-nos a clara compreensão de que a igualdade só é possível na diferença e que, a cada vez que se tenta impor a igualdade por si incorre-se na mais absurda forma de desrespeito - uma inaceitabilidade do eu perante o nós. Em nome do afirmação nacional e de uma igualdade artificial, gerou-se um saldo de mais de 50 milhões de mortos (HOBSBAWM, 2006).

Mais catastrófico que isso, somente imaginar que regimes totalitários contaram com o apoio de maciça maioria da população nos países que os levaram adiante. Após a guerra, não se podia questionar outra coisa senão por quê?

Na tentativa de resposta a essa questão, ganhou destaque uma escola de pensamento alemã que vinha repensando as categorias sociais já avaliadas por MARX - a Escola de Frankfurt. Os dois principais expoentes da escola - Max HORKHEIMER e Theodor ADORNO - enveredaram por um caminho de extrema decepção com o projeto racional do esclarecimento (Aufklärung).

No sentido mais amplo do progresso do pensamento, o esclarecimento tem perseguido sempre o objectivo de livrar os homens do medo e de investi-los na posição de senhores. Mas a terra totalmente esclarecida resplandece sob o signo de uma calamidade triunfal. O programa do esclarecimento era o desencantamento do mundo. Sua meta era dissolver os mitos e substituir a imaginação pelo saber. Bacon, "o pai da filosofia experimental", já reunira seus diferentes temas. Ele desprezava os adeptos da tradição, que "primeiro acreditam que os outros sabem o que eles não sabem; e depois que eles próprios sabem o que não sabem. Contudo, a credulidade, a aversão à dúvida, a temeridade no responder, o vangloriar-se com o saber, a timidez no contradizer, o agir por interesse, a preguiça nas investigações pessoais, o fetichismo verbal, o deter-se em conhecimentos parciais: isto e coisas semelhantes impediram um casamento feliz do entendimento humano com a natureza das coisas e o acasalaram, em vez disso, a conceitos vãos e experimentos erráticos; o fruto e a posteridade de tão gloriosa união podem-se facilmente imaginar.(10)

A resposta, todavia, mostrou-se insuficiente. ADORNO e HORKHEIMER não conseguiram escapar à razão, ainda que a atacassem. Continuavam tão modernos quanto seus antecessores. Foi somente com um de seus alunos (embora dissidente) que veio um projeto concreto de mudança na abordagem filosófica contemporânea. Jürgen HABERMAS, admitindo o não esgotamento da racionalidade moderna, partiu para uma mudança no perfil dessa razão para estabelecer um projeto de mundo coerente com a necessidade de se ultrapassar as barreiras nacionais para que se tenha uma efetivação democrática global. A partir de agora, passar-se-á a uma análise da construção teórica de HABERMAS para que se possa fundamentar a globalidade dos direitos humanos.

2. Uma nova perspectiva dos direitos.

Até agora, este trabalho se pautou na análise histórica dos direitos. Partiu-se da origem da concepção moderna de direitos, naquilo que EDMUNDSON chamou de "Era da Primeira Expansão". Em seguida, analisou-se a retração da universalidade dos direitos com a afirmação das identidades nacionais, as quais culminaram nas atrocidades de uma guerra que durou alguns anos e custou um século.

Após a Segunda Guerra Mundial, o vazio epistêmico que se constatou levou à elaboração de uma enxurrada de teorias que buscaram um motivo para dar continuidade à própria filosofia. O que há de comum entre elas é o caráter central assumido pelos direitos em seu interior.

Mesclam-se com este aspecto filosófico uma política e uma economia cada vez mais engendradas pela globalização. É um novo projeto de mundo que apresenta dois vieses, como mostra AGUIAR:

A globalização é um fenômeno de aproximação entre grupos humanos que engendram relações produtivas, econômicas, financeiras e políticas, a partir de interesses complementares de dominação ou cooperação. Quando a tecnologia permite a comunicação instantânea e a informação, por todo o globo terrestre, potencializa a presença de grupos econômicos em todo o mundo, que objetivam lucros, investimentos, vantagens perenes ou momentâneas, interferências políticas, introdução de novas práticas ou pressões em favor de seus interesses.

Essa forma de globalização, evidentemente, é deletéria. (...) A globalização, assim entendida, abrange dois aspectos essenciais: a hegemonia e a uniformização. Ora, se a globalização se traduzir tão-somente como forma de ordenar o mundo segundo projetos hegemônicos, ela é a negação da globalização, já que a constitui como uma imposição de um novo provincianismo dominador, que não somente impõe uma prática econômica desigual, como também comete, em nível planetário, um etnocídio global. (...)

Mas essa mesma globalização apresenta uma outra faceta. De qualquer modo, ela propicia o conhecimento maior entre os povos, a consciência dos problemas do globo. (...)

Essa aproximação, mesmo conflitiva, dos seres humanos, aponta para a possibilidade de uma mundialização, de uma aproximação pacífica, diversificada e tão veloz quanto os instrumentos hegemônicos.(11)

Dessa forma, AGUIAR sacramenta as duas opções que temos: ou vivemos numa comunidade global que celebre uma nova forma, pacífica, de convivência e respeito mútuo ou implodimos de vez a nossa espécie. A teoria da modernidade de HABERMAS busca uma alternativa pacificadora das relações humanas, no mesmo segmento da proposta de AGUIAR, que, a um só tempo, não caia na saturação do humano de NIETZSCHE e FOUCAULT, nem na ingenuidade dos iluministas.

2.1. Uma introdução à teoria da modernidade de Habermas.

Parece ser pacífico o entendimento de que a sociedade moderna é complexa. E complexa porque composta de comunicações, as quais possibilitam um sem-número de expectativas, apesar de poucas se realizarem. É uma sociedade contingente, na qual "cada experiência concreta apresenta um conteúdo evidente, que remete a outras possibilidades" (LUHMANN, 1983:45).

O que há de particular no processo da modernidade, segundo HABERMAS, que levou a tal situação, é a interpenetração entre mercado e Estado. A modernidade teria, então, como marcos iniciais a Reforma Protestante, o Iluminismo e a Revolução Francesa(12), que delimitaram a compreensão ocidental moderna do mercado e do Estado, subsistemas fundamentais que "asseguram a reprodução material e institucional da sociedade" (FREITAG, 2005:165). Estes subsistemas comporiam o sistema social, estrutura social na qual ocorre a ação discursiva.

Uma segunda estrutura social é o que HABERMAS chama de "mundo vivido" (Lebenswelt). Trata-se do consenso primordial necessário a toda forma de comunicação, um medium linguístico composto por atos de fala que possibilitam a integração social por meio de suas três formas: controle social (cultura), socialização (sociedade) e aprendizado (personalidade) (FREITAG, 2005:165). No mundo vivido ocorre a ação comunicativa que, quando posta em dúvida leva ao sistema, no qual ocorre o discurso.

Dessa forma, na sociedade, quando há um dissenso acerca dos princípios que a regulam instaura-se um processo argumentativo de convencimento, num espaço público de discussão. Para HABERMAS, o espaço público é a única forma de tornar universalizáveis aquilo que KANT chamaria de máximas da ação. Todavia, não é qualquer espaço público que propicia isso.

De início, HABERMAS nega qualquer acepção religiosa ou metafísica dos argumentos apresentados na esfera pública, assumindo uma posição que ele mesmo denomina de "pós-metafísica", a qual se sustenta numa racionalidade moderna de base empírica, constatável. Na esfera pública, deve ser garantido um procedimento democrático, que confere validade (Geltung) às normas que saem do processo discursivo. Tal procedimento necessita de requisitos mínimos para que seja efetivamente democrático. São eles: publicidade, acesso igual ao debate garantido a todos, oportunidades comunicativas, impossibilidade de ilusões e não-coerção. As normas que regulamentam uma sociedade devem, portanto, ser fruto do debate nessa esfera pública para garantirem a validade necessária à sua legitimação.

No sistema jurídico, o processo de legislação constitui, pois, o lugar propriamente dito da integração social. Por isso, temos que supor que os participantes do processo de legislação saem do papel de sujeitos privados do direito e assumem, através do seu papel de cidadãos, a perspectiva dos membros de uma comunidade jurídica livremente associada, na qual um acordo sobre os princípios normativos da regulamentação da convivência já está assegurado através da tradição ou pode ser conseguido através de um entendimento segundo regras reconhecidas normativamente. Essa união característica entre coerção fática e validade da legitimidade, que tentamos esclarecer através do direito subjetivo à assunção estratégica de interesses próprios, exige um processo de legislação no qual os cidadãos devem poder participar na condição de sujeitos do direito que agem orientados não apenas pelo sucesso. Na medida em que os direitos de comunicação e de participação política são constitutivos de um processo de legislação eficiente do ponto de vista da legitimação, esses direitos subjetivos não podem ser tidos como os sujeitos jurídicos privados e isolados: eles têm que ser apreendidos no enfoque dos participantes orientados pelo entendimento, que se encontram numa perspectiva intersubjetiva de entendimento.(13)

Essas ideias fornecem o embasamento necessário para a introdução da noção de racionalidade comunicativa, proposta por HABERMAS como saída possível para a modernidade. Como acusam FOUCAULT, DERRIDA, BATAILLE, LYOTARD e outros, os quais HABERMAS rotula de "jovens conservadores", a razão, como utilizada até meados do século XX não fora mais que uma razão instrumental, de uso estratégico. Ela serviu para justificar as mais distintas formas de governo, as maiores atrocidades em nome das melhores intenções. A razão, pensada desta maneira, de fato não passa de mera "vontade de dominação", tornando toda ação "um exercício de poder, controle, repressão, tendo como aliado o saber (= razão instrumental)" (FREITAG, 2005:176).

HABERMAS não nega nada disso, mas questiona a proposta que daí surge: a de uma cultura da não-razão, uma decepção acerca de qualquer forma de racionalidade, uma desdiferenciação dos sistemas especializados contemporâneos, jogando tudo no mesmo saco sem fundo do poder. Como bem observa FREITAG, "esses jovens conservadores ou pós-estruturalistas abrem mão do conceito enquanto tal; abdicam do esforço de reflexão e de crítica racional, negam a função política e crítica da filosofia, despejam a criança com a água do banho"(14).

Uma nova racionalidade, vista sob a ótica da comunicação e crente na possibilidade do entendimento faz-se necessária para impedir a volta dos horrores presenciados no século XX. Não pudemos, ainda, escapar da égide da razão. Os que negam a razão afirmando uma "pós-modernidade" o fazem baseados no modo ocidental (e racional) de se realizar a crítica.

Não se pretende, com isso, negar a violência própria dos direitos, mas reconhecê-la, admiti-la, e seguir num projeto viável de construção dos direitos de forma a torná-los o mais sincero e menos doloroso possível. Significa retirar a vaidade do direito sem que para isso seja necessário destruí-lo.

Assumir o papel central na filosofia contemporânea não é tarefa fácil. O direito não pode perder tempo louvando sua própria beleza. Deve, sim, aproximar-se dos fatos e construir suas normas de modo a dar-lhes a necessária eficácia para a construção das liberdades pública e privada, entendendo-as não mais como antípodas, mas como peças de um mesmo quebra-cabeça.

2.2. A orientação principiológica dos direitos.

O que se observou nos anos que antecederam os desastres da Segunda Grande Guerra (e durante ela também) foi a tentativa de racionalizar uma moral inautêntica. A política ariana de Hitler, por exemplo, foi a tentativa da sobreposição de valores morais sobre todo um povo, equalizando-o forçadamente - apelando para a solução final.

O direito, enquanto ordenação social não pode se deixar regrar por um teor moral. Não se pretende com isso negar que os direitos tenham uma origem moral. É reconhecido que direitos não surgem do vazio, mas sua aplicação não pode justificar-se senão pelo próprio direito. Como bem explicita LUHMANN:

O direito não pode mais ter como tarefa, principalmente, a constituição da moralidade da conduta, garantindo assim as condições para a respeitabilidade recíproca. A congruência necessária [entre direito e moral] passa a distinguir-se, até certo grau, de um outro ambiente, mais pessoais, das relações humanas: o respeito mútuo. (...) É necessário abdicar-se da fusão entre a legalidade e as pretensões humanas, que se apresentava de forma especialmente manifesta no pensamento jurídico de cunho ético da filosofia grega. O critério do direito já não pode mais assumir a forma de instrumento ético da justiça como desejável (apenas!) individualmente. A separação entre direito e moral torna-se uma condição de liberdade.(15)

Da mesma forma, os direitos também não se confundem com as políticas. Políticas são programas de ação originalmente voltados para atingir objetivos, que tomam em consideração ponderações morais e razões éticas, voltadas para o bem comum. Os direitos, como se pode aferir do liberalismo contemporâneo, que contraria a lógica utilitarista-pragmática de MILL, devem ser realizados aqui e agora. Como bem mostra DWORKIN:

A legislação oferece a oportunidade de desenvolver um complexo sistema de regulamentação que dependa, em termos de sua eficácia, de uma estratégia geral. (...)

Uma vez porém que o legislador tenha feito sua escolha, os indivíduos têm direitos àquilo que lhes foi atribuído, e do ponto de vista do direito como integridade esses direitos se estendem não apenas às atribuições explícitas, mas à extensão a outras atribuições fundada nos princípios subjacentes à lei, em casos que ainda não foram expressamente solucionados.(16)

Pensar os direitos como integridade, da forma que é aqui defendido, requer pensar o direito in casu. Para além do momento legislativo, como mostra DWORKIN, é necessário sobretudo pensar o direito no momento aplicativo, momento este em que se inicia de fato o processo de construção dos direitos.

Dessa maneira, não se pode incorrer no disparate positivista de pensar o direito como expressão da legalidade estrita. Hoje, pode-se com segurança afirmar que o conceito de direito é interpretativo. Interpretativo num sentido amplo e forte. Amplo, porque não resumido à aparência das palavras(17) e forte, porque vinculativo, decisivo, crucial.

Nesse sentido, não pode ser a lei a base única de formulação da argumentação jurídica. Lei isoladas, pensadas em abstrato, pouco podem contribuir para a correta aplicação do direito. O que faz do direito ser o que é não é senão sua coerência, seu regramento uno e íntegro, que deve ser alcançado no exame complexo das situações que englobam cada caso (DWORKIN, 2007:287).

Dessa maneira, faz-se necessário recerrer a princípios que norteiem a aplicação das regras em cada caso(18). Estes princípios são, por evidente, dotados de um fundamento moral último, mas no momento em que aceitos numa esfera pública política, têm força vinculatória, devendo ser aplicados e podendo ser, a todo instante, reclamados juridicamente.

Dessa maneira, é possível um direito que seja a um só tempo, equânime (fair) e inclusivo, garantindo a todos a participação no debate normativo de justificação que deve sempre preceder a aplicação das regras numa sociedade. Agora, torna-se possível ilustrar o que vem a ser um direito participativo global, bem como os percalços que essa ideia pode vir a enfrentar num futuro próximo.

3. A inclusão de um outro mundo.

Ao que parece, mesmo entre os mais críticos da ideia, temos na atualidade uma situação de mundialização de valores, quebra de fronteiras, fomento do comércio mundial - em síntese, o que vem se chamando de globalização.

Nesse sentido, "a Segunda Guerra Mundial foi um divisor de águas na história dos direitos. Diante das atrocidades em massa praticadas contra civis durante a guerra (...), houve um reavivamento do interesse em evitar as guerras" (EDMUNDSON, 2006:137). Retomando KANT, HABERMAS afirma que "sob o véu da guerra total tramada por Hitler cumpriu-se uma ruptura civilizacional, que desencadeou uma comoção em nível mundial e propiciou a transição do direito internacional ao direito cosmopolita" (HABERMAS, 2007:208). A guerra passa, a partir de então, a ser incriminada como delito, minando-se dessa forma o direito de guerra (HABERMAS, 2007:208).

Partindo do pressuposto kantiano de À paz perpétua, HABERMAS busca fazer uma revisão conceitual a partir dos dados factuais do pós-guerra. Defende o filósofo da Escola de Frankfurt uma institucionalização forte do direito cosmopolita, eficaz na regulação de comportamentos dos Estados-membros de uma comunidade mundial. Além disso, parte para uma defesa firme do respeito aos direitos humanos, bem como revê a própria ideia de paz, que passa a ser entendida num sentido positivo, como "um processo que decorre sem violência, mas que não almeja simplesmente a preservação do poder, e sim o cumprimento de pressupostos reais para o convívio livre de tensões entre grupos e povos" (HABERMAS, 2007:216).

A partir de agora, far-se-á uma análise desses pontos a partir das questões que afligem o mundo contemporâneo, para fundamentá-los e, eventualmente, questioná-los.

3.1. Ocidente e não-ocidente: entre participação e imposição.

EDMUNDSON destaca um fato histórico importante: "Nosso conceito de direitos, propriamente dito, só apareceu na história quando as pessoas começaram a distinguir entre o que é certo em geral e o que é certo com respeito a um indivíduo" (EDMUNDSON, 2007:211). Essa distinção consiste na antiga oposição complementar entre direito objetivo e direito subjetivo. O questionamento que ora se põe é se essa distinção é global, se ela atingiu os povos não-ocidentais, se, enfim, a universalização das proposições acerca dos direitos, especialmente dos direitos humanos, caracteriza uma imposição do Ocidente, um neoimperialismo.

A reflexão sobre esse tema parte de uma constatação, já feita por HABERMAS: "a luta social contra a opressão de grupos que se viram privados de chances iguais de vida no meio social concretizou-se sob a forma da luta pela universalização socioestatal dos direito do cidadão, empreendida tão logo o reformismo socioliberal viu-se capaz de agir" (HABERMAS, 2007:238). No contexto contemporâneo, os grupos sociais tidos como marginalizados procuram uma visibilidade, uma autoafirmação, que se transformam na luta por garantias jurídicas dessa visibilidade.

No momento em que uma tribo ou mesmo um país ingressam nessa luta, eles aceitam participar de uma esfera pública política, que põe em discussão a autonomia daquele grupo. Não a autonomia em sentido fraco, como mera independência, mas no sentido de reconhecimento de práticas culturais, de uma memória institucionalizada e de uma diferenciação inclusiva - é ser diferente entre iguais.

O debate atual gira em torno do modo de reconhecimento desses direitos e da atribuição de responsabilidades (veja-se, por exemplo, a questão da responsabilidade penal dos indígenas) aos grupos que os pleiteiam. Tudo se liga, neste aspecto, à participação. Como afirma HABERMAS, a concatenação interna correta entre direito e democracia mostra que "o sistema dos direitos não fecha os olhos nem para as condições de vida sociais desiguais, nem muito menos para as diferenças culturais" (HABERMAS, 2007:243).

Mas que concatenação correta é essa? Trata-se de uma percepção dos sujeitos de direito não apenas como cumpridores de leis, mas, principalmente, como autores de leis. Somente esse olhar para si enquanto ser autônomo (tanto no sentido público-participativo quanto no sentido privado-protetivo) é capaz de garantir uma inclusão que, ainda que violenta contra uma cultura seja a desejada por um povo.

O que não se pode admitir são dois argumentos bastante recorrentes no discurso socioliberal contemporâneo. Em primeiro lugar, a ideia de direitos que visem tão-somente à realização de projetos políticos (pois, como já explicitado, direitos não são programas, mas realizações do presente). Em segundo lugar, a apropriação indevida do "bem comum".

Este último argumento merece especial destaque nesta abordagem. Os teóricos políticos da atualidade têm tentado estabelecer um padrão ético do Estado. O que não se enxerga é que "o que está inscrito nas questões éticas é a referência à primeira pessoa, e com isso a remissão à identidade (de um indivíduo ou) de um grupo" (HABERMAS, 2007:251). Quando se vislumbra o melhor para um povo não se está mais que impondo uma visão ética (portanto, pessoal) acerca de uma visão ética (esta, de grupo). Ninguém pode se apossar do que pensa o todo, por mais que esteja no interior desse todo. Assim, como mostra DWORKIN, deve-se procurar a afirmação absoluta dos direitos sobre o bem comum, de modo que o justo anteceda o bom.

Um indivíduo ou um grupo só estão submetidos às responsabilidades próprias da democracia se podem ser percebidos democraticamente no interior da discussão construtiva de direitos e obrigações. Isto é, se assumem perante o público uma vontade participativa obediente às regras de fairness, para então participarem também da elaboração das policies que regram o futuro de uma comunidade.

Um projeto de sociedade mundial não pode esquecer destes parâmetros, ou se tornará mesmo uma pretensão dominadora, um mero jogo de poder no qual os direitos ocupam tão-só um papel coadjuvante, de sustentáculo de estabelecidos sobre outsiders. É esta a lógica da razão instrumental - utilizar um argumento racional para fundamentar uma sociedade que não preza pelos princípios elementares da isonomia e da justiça. Assumido este caráter, tem-se o que AGAMBEN descreve como a situação atual dos direitos, especialmente no que toca à questão dos refugiados:

A separação entre humanitário e político, que estamos hoje vivendo, é a fase extrema do descolamento entre os direitos do homem e os direitos do cidadão. As organizações humanitárias, que hoje em número crescente se unem aos organismos supranacionais, não podem, entretanto, em última análise, fazer mais do que compreender a vida humana na figura da vida nua ou da vida sacra, e por isto mesmo mantêm a contragosto uma secreta solidariedade com as forças que deveriam combater. (...)

O refugiado deve ser considerado por aquilo que é, ou seja, nada menos que um conceito-limite que põe em crise radical as categorias fundamentais do Estado-nação, do nexo nascimento-nação àquele homem-cidadão, e permite assim desobstruir o campo para uma renovação categorial atualmente inadiável, em vista de uma política em que a vida nua não seja mais separada e excepcionada no ordenamento estatal, nem mesmo através da figura dos direitos humanos.(19)

AGAMBEN é bem realista em sua análise. Neste ponto, ganha mais mérito que HABERMAS, pois torna mais concreta a situação atual dos direitos. O que vem se notando na política externa dos países de primeiro mundo ao longo dos últimos anos é a impossibilidade de inclusão dos países não-ocidentais no debate humanitário do Ocidente. Enquanto decaem os valores conformadores do Estado-nação, decaem também os princípios de cidadania que se tornaram marco para a modernidade, num claro uso da razão contra ela mesma.

As grandes questões que têm posto em oposição Ocidente e Ásia Central (das quais citam-se as duas guerras do Golfo, os ataques ao Afeganistão e a questão palestina) nada mais são que a expressão clara da ineficácia dos organismos internacionais de proteção dos direitos humanos e do uso destes para legitimar o discurso do terror contra o terror.

Não há direito cosmopolítico no mundo contemporâneo. Não existe racionalidade comunicativa num debate em que tudo se torna profissão de fé. Entretanto, não é isso que vai nos deixar engolir pelo abismo que enxergamos. A crise inspira a reação e a reação só pode surgir de propostas.

3.2. A ilegitimidade do fundamentalismo.

É necessário, contudo, selecionar propostas. Diante dos disparates neoimperialistas do Ocidente, o que se tem visto é o surgimento de forças opostas a tais disparates que atuam em nome de uma moral religiosa para combater com toda a violência física e semântica possível o inimigo a ser exterminado.

Dizer simplesmente que as práticas fundamentalistas de religiosos orientais são ilegítimas porque inadequadas ao discurso democrático parece ser insuficiente. De fato, do ponto de vista da teoria da democracia, atos fundamentalistas são tão incabíveis quanto as intervenções ocidentais sobre a Ásia Central. Mas por que é possível utilizar a teoria da democracia para contrapor o argumento fundamentalista?

Não é, por certo, o fato de ela ser melhor. É, sim, uma questão de responsabilidade. Veja-se, a título ilustrativo, um dos artigos da Constituição do Irã, de 1979:

Capitulo Terceiro

Os Direitos dos Cidadãos

Artigo 19º
Todos os cidadãos da nação, seja qual for a sua origem tribal, cor, raça, língua ou outras particularidades, não têm direito a privilégios e não terão quaisquer preferências.

Artigo 20ºTodos os cidadãos da nação, tanto homens como mulheres, terão igual proteção perante a lei e todos os direitos humanos, políticos, econômicos, sociais e culturais serão baseados nos princípios islâmicos.

Artigo 21º O governo é obrigado a garantir os direitos das mulheres de acordo com os preceitos islâmicos e providenciar o seguinte:

1. Criar condições favoráveis ao desenvolvimento da personalidade da mulher e a defesa dos seus direitos materiais e espirituais.

2. Apoio às mães, especialmente no período de gestação, lactação e educação e proteção às crianças sem tutor.

3. Criação de tribunais competentes para a proteção da existência e continuação da família.

4. Criação de um seguro especial para as viúvas, idosas e pessoas sem qualquer espécie de assistência.

5. Outorgar a tutela de crianças a mães dignas para benefício das crianças no caso de não haver tutor legal (de acordo com a lei islâmica).(20)

Ocorre que, a partir do ilustrado acima, o Irã assume ser uma república constitucional. A partir deste instante, a força vinculatória de uma constituição impõe sobre os governantes uma série de obrigações perante os cidadãos. Quando se observa, no entanto, uma sociedade em que homens gozam de privilégios bem superiores aos das mulheres, questiona-se sobre a força que tem essa mesma constituição.

Ao assumir o compromisso próprio das democracias ocidentais, o Irã se insere no debate político global. Sujeita, assim, aqueles responsáveis pelas políticas às obrigações vindas dos direitos. Se homens e mulheres não são tratados de maneira justa, equânime, isonômica, tem-se o que HABERMAS e APEL chamam de contradição performativa (HABERMAS, 2000), isto é, existe a possibilidade de exigência do que está expresso constitucionalmente num espaço público aberto, que não necessita ser restrito às fronteiras nacionais.

A ilegitimidade do fundamentalismo reside na própria ideia de contradição performativa: a partir do momento em que se incluem num contexto democrático constitucional, os Estados asiáticos expõem-se ao mundo democrático constitucional e a ele devem explicações. Todavia, a retratação violenta às feridas abertas do mundo islâmico, como tem sido realizada, só pode gerar a morte mútua, como tem gerado. Em artigo sobre o 11 de setembro, FREITAG, analisando o ponto de vista de HABERMAS, afirma:

A comunicação distorcida gera, além de mal-entendidos, incompreensão e até mesmo a impostura, uma espiral de violência que somente poderia ser estancada se a comunicação, voltada para o entendimento, fosse restaurada, buscando-se um telos mútuo. Por isso, Habermas não apenas critica o ato [terrorista] (...), mas também a resposta americana de deslanchar uma escalada de violência declarando "guerras preventivas" como a invasão do Iraque (2003).(21)

Além do mais, como afirma MAGNOLI,

O renascimento fundamentalista não é um fenômeno inerente à religião islâmica ou à cultura muçulmana. A dinâmica do fundamentalismo islâmico contemporâneo está conectada ao fracasso do pan-arabismo, aos ressentimentos criados pela política mundial de Washington e ao conflito entre Israel e os palestinos. A hegemonia militar dos Estados Unidos reforçada e atualizada pela operação no Iraque em 2003, não pode suprimir o islamismo político. Ao contrário: tende a conferir audiência ainda maior, nas sociedades árabes e muçulmanas, aos novos "guerreiros da fé".(22)

3.3. É possível uma intervenção armada justificada pelos direitos humanos?

Sob o argumento de defesa dos direitos humanos, tem-se deflagrado uma batalha de dois mundos num só, a qual tem impossibilitado a saída do paradigma das fronteiras artificiais para a comunhão das democracias do mundo. A violência não acabou. Estamos numa transição - conscientes da violência, mas cegos a essa mesma consciência.

Aqui não se pensa em questionar a violência própria da norma - em seus dois sentidos (normativo e normalizador). Direitos, por sua força vinculatória, em algum momento apelam à violência, mas mesmo esta necessita, num âmbito constitucional democrático, ser aprovada numa argumentação pública que justifique qualquer ação.

No âmbito do direito internacional, os organismos atualmente existentes têm sido muito pouco eficazes no sentido de evitar os atropelos neoimperialistas e fundamentalistas. Veja-se, por exemplo, a fragilidade da ONU e da OTAN quando da questão do Iraque, em 2003. A invasão do país do Oriente Médio sequer havia tido um parecer definitivo da Assembléia Geral das Nações Unidas quando se iniciou a ofensiva armada.

Não é preciso mencionar o porquê de ser tão importante o debate anterior a qualquer intervenção militar. As mortes civis motivadas pelos interesses econômicos e políticos explícitos são a expressão do holocausto (do grego todo queimado) global que se teme instaurar e são justificativa por si só.

Direitos não podem se voltar contra direitos. Pensar os direitos como integridade é também admitir sua complementaridade - intervenções no contexto democrático contemporâneo somente são possíveis quando constatada a contradição performativa, e ainda assim, deve ser posto um debate público amplo e participativo, que minimize as inevitáveis lesões que a interferência não sobre um Estado, mas sobre a soberania de um povo pode provocar.

Conclusão: O futuro dos direitos.

De resto, sobra espaço neste artigo apenas para uma reflexão sobre o que se pode esperar do futuro. Como escrito por Victor Hugo, em frase reproduzida no início desta breve construção, o futuro, para os valentes, é oportunidade. A situação da racionalidade moderna, denunciada por FOUCAULT, é crítica, sobretudo, porque os direitos têm-se ocupado somente da violência e, apesar de reconhecê-la, continuam a negá-la. Está-se, desde muito tempo, realizando a sujeição do sujeito que NIETZSCHE descreveu como essencial à própria constituição do sujeito moderno (PEIXOTO, 2002:15). Enquanto continuar pensado dessa forma, o direito não será mais que poder disciplinar, normalizador de condutas à luz do que o Ocidente vem construindo a partir das estruturas de poder/saber imperativas desde o início da Era Moderna.

O jusnaturalismo dos séculos XVII e XVIII foi enviesado pela força das essências metafísicas. O pensamento kantiano, ao romper com essa espécie de ontologia, deu um primeiro passo, apesar de continuar vinculado à ontologia da razão pura. O utilitarismo não fez mais que traçar um projeto político dos direitos que não nota na importância das minorias e se apossa de um coletivo impossível de identificar. As doutrinas liberais, social-democratas e socialistas dos séculos XIX e XX regrediram à ideologização do jusnaturalismo, partindo de princípios que, de tão absolutos restaram vazios. O que sobrou a queda dos muros, das fronteiras e a do World Trade Center, bem como da envelhecida oposição esquerda versus direita foram as migalhas de uma história varrida pela violência.

Mas não é ela que nos impedirá de enxergar uma saída para a modernidade inesgotada. Esperar não é o remédio para as dores da razão. O que se pode esperar de um projeto político daqui para a frente é uma centralidade dos direitos, assumidos enquanto princípios necessários à convivência com o outro. Como afirma BOBBIO, "o universalismo jurídico ressurge hoje não mais como crença num eterno Direito Natural, mas como vontade de constituir um direito positivo único, que recolha em unidade todos os direitos positivos existentes, e que seja produto não da natureza, mas da história" (BOBBIO, 1999:164).

Superando essa dimensão dessa dimensão normativa dos direitos, é necessário pensar em sua efetividade internacional, respeitada a cultura e a legitimidade inclusiva dos povos, para além da artificialidade dos Estados, pois, como mostra AGUIAR, "as nacionalidades estatais são a negação das nacionalidades culturais, são expressão de hegemonias uniformizadores e empobrecedoras. Estão na contramão da diversidade na unidade. Expressam a uniformidade na desunião."(23)

É necessário, pois, diante da afirmação da democracia dos povos, aos povos que a acatam para terem legitimidade, instaurar-se uma esfera pública global que busque o reconhecimento de seus integrantes (individuais ou em grupo) através do estabelecimento de um espaço em que o poder comunicativo desinstrumentalize a razão e do qual resultem normas que possibilitem aos sujeitos enxergarem-se também como agentes.

Longe de esgotar os termos da discussão, este artigo procurou nortear os caminhos dos direitos para a concretização de certos ideais, que parecem ser o pano de fundo da realização democrática.

Emmanuel LÉVINAS, ao se deparar com a questão dos direitos do homem, questiona-se: "Em que e de que modo, efetivamente, a vontade livre ou autônoma que o direito do homem reivindica poderia impor-se a uma outra vontade livre, sem que esta imposição implique um efeito, uma violência sofrida por esta vontade?" (LÉVINAS, 2004:265). Esse questionamento abre espaço à discussão sobre a alteridade que dá rumo aos estudos do filósofo francês. O pensar-no-outro certamente está intimamente ligado às questões que nestes escritos se levantaram, para aquém de toda transcendentalidade, afinal "na boa filosofia, o que importa, sem dúvida, é não pensar os direitos do homem a partir de um Deus desconhecido. É permitido aproximar a idéia de Deus, partindo do absoluto que se manifesta na relação a outrem" (LÉVINAS, 2004:267). Acredito ser essa a futura trajetória da filosofia - o pensar-no-outro parece traçar o debate do porvir acerca da legitimação com base nos direitos, que ocupam hoje posição supra nas relações intersubjetivas.

Referências biliográficas

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BOBBIO, Norberto. "As relações entre os ordenamentos jurídicos". In: Teoria do Ordenamento Jurídico. 10 ed. Brasília: Editora UnB, 2006. (pp. 161-184).

DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

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PEIXOTO, André. Nietzsche e Foucault no poder e no direito. Ciência e Cultura, n. 30, pp. 11-22, Curitiba, mai. 2002.

SGARBI, Adrian. Teoria do Direito: primeiras lições. 1 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.



Notas:

* João Gabriel P. Lopes. Aluno da disciplina Direito de Cidadania, ministrada pela Profa. Gloreni Aparecida Machado, durante o Verão de 2009, na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB). [ Voltar ]

1 - ORWELL (2005). Voltar

2 - DWORKIN (2007, pp. 488-489). Voltar

3 - EDMUNDSON (2006, p. 103). Voltar

4 - KANT (1993, pp. 201-202). Voltar

5 - Sobre esta distinção, ver KANT, Immanuel. A crítica da razão prática. 1 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002. Voltar

6 - KANT (1993, p. 201). Voltar

7 - MILL apud EDMUNDSON (2006, p. 96). Voltar

8 - HABERMAS (2007, p. 139). Voltar

9 - Aqui, faz-se menção à famosa frase de Sir Edward Grey, parlamentar liberal ingles, quando da eclosão da Primeira Guerra Mundial, em 1914: "The lamps are going out all over Europe; we shall not see them lit again in our lifetime". Voltar

10 - ADORNO & HORKHEIMER (2009). Voltar

11 - AGUIAR (2000, pp. 93-94). Voltar

12 - Ao analisar a obra de HABERMAS, FREITAG (2005, pp. 163-164) destaca um importante aspecto: "Habermas inclui no contexto da modernidade as sociedades de classe do capitalismo (liberal e 'tardio', isto é, Spätkapitalismus) e as sociedades de classe do socialismo de estado (Stätssozialismus...)". E continua: "Numa entrevista de 1977, dada a Freudenthal, Habermas afirma: 'ninguém me convence de que o socialismo de estado seja, do ponto de vista da evolução social, mais avançado ou progressista que o capitalismo tardio. Ambas as formações societárias não são senão variantes de uma mesma formação societária... Temos tanto no Leste quanto no Oeste modernas sociedades de classe, diferenciadas em Estado e Economia". A mesma autora faz questão de explicar que a evolução mencionada por HABERMAS não é a mesma dos evolucionistas do século XIX: "Esta nova teoria evolutiva procura evitar as falhas das antigas teorias da evolução (de Comte, Spencer, Darwin), via de regra unilateral e simplificadora, compreendendo os processos de transformação das formações societárias como processos coletivos de aprendizagem". Voltar

13 - HABERMAS (1997, pp. 52-53). Voltar

14 - FREITAG (2005, p. 176). Voltar

15 - LUHMANN (1985, pp. 23-24). Voltar

16 - DWORKIN (2007, p. 374). Voltar

17 - Contraria-se, assim, o velho brocardo segundo o qual In claris, cessat interpretatio. GADAMER e outros já vieram desmascará-lo. Voltar

18 - É importante destacar que princípios não são diretivas políticas, como mostra SGARBI: "Enquanto estas [diretivas políticas] determinam 'objetivos coletivos' de melhoramento da comunidade, os 'princípios' estabelecem 'direitos e obrigações individuais, ou seja, direitos subjetivos'" (SGARBI, 2007:241). Voltar

19 - AGAMBEN (2007, p. 141). Voltar

20 - REPÚBLICA ISLÂMICA DO IRÃ (1979). Voltar

21 - FREITAG (2005, p. 233). Voltar

22 - MAGNOLI (2004, p. 266). Volt

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