Comissão de Constituição e Justiça dá 7 dias para senadores analisarem relatório sobre abuso de autoridade
Relator leu parecer favorável ao projeto na sessão desta quarta-feira (29). Texto pode ser votado na semana que vem, mas ainda não há consenso.
O senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), que presidiu a reunião da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) desta quarta-feira (29), concedeu vista coletiva (mais prazo para análise) de uma semana para que os integrantes do colegiado estudem o relatório do senador Roberto Requião (PMDB-PR) favorável ao projeto de abuso de autoridade.
Com isso, a votação pode ficar para a próxima quarta-feira (5) e a proposta, se aprovada pela comissão, poderá ser incluída na pauta de votações do Senado.
No entanto, não há consenso sobre a data de análise do relatório. Requião, que fez a leitura do parecer nesta quarta, chegou a sugerir que o projeto fosse votado pela CCJ no dia 19 de abril, mas a data ainda não foi definida.
O projeto revoga a lei em vigor sobre abuso de autoridade, que é de 1965, e cria uma nova legislação, com punição mais rigorosa e com a inclusão de mais situações em que uma autoridade pode ser enquadrada na prática de abuso.
O texto tem sofrido críticas de juízes e procuradores que afirmam que a medida é uma reação de parlamentares a investigações do Ministério Público e da Polícia Federal, como a Operação Lava Jato.
Já defensores do projeto dizem que a legislação existente sobre abuso de autoridade é obsoleta e precisa ser atualizada. Eles também argumentam que o texto tem o objetivo de proteger os cidadãos das camadas mais populares de abusos, principalmente, de policiais.
Na sessão desta quarta, a CCJ aprovou requerimentos para que sejam realizadas audiências públicas para aprofundamento do debate da proposta. Os convidados dessas reuniões e as respectivas datas das audiências não foram definidos.
Texto do Ministério Público
Nesta terça (28), o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou um projeto alternativo à proposta sobre abuso de autoridade em análise pela CCJ.
Na proposta de Janot, não há previsão de punição para a divergência de interpretação da lei ou dos fatos durante um processo, que poderia gerar punições a quem investiga ou quem julga.
Entre os pontos do projeto, está a punição para a chamada “carteirada”.
O senador Roberto Requião não acolheu, no relatório, os trechos sugeridos do procurador-geral da República.
Entre os pontos da sugestão de Janot, está a punição para a chamada “carteirada”.
O projeto
No portal do Senado na internet, o projeto sobre o abuso de autoridade recebeu mais de 150 mil avaliações de internautas. A maioria, 149,6 mil pessoas, opinou contra o texto. Apenas 2,4 mil usuários se declararam a favor da proposta.
Uma das críticas de juízes à proposta é o trecho que trata sobre a interpretação da lei penal na avaliação de fatos e provas. Magistrados afirmam que o texto pode criminalizar a interpretação das leis e processos investigatórios.
De acordo com o juiz federal Sérgio Moro, responsável pelos processos da Lava Jato em primeira instância, a atual redação do texto sobre o tema é confusa e, aparentemente, pelo texto, o magistrado será obrigado à interpretação literal da lei de abuso de autoridade.
Isso, segundo o juiz, do ponto de vista do Direito, que comporta várias interpretações, não é correto. Ainda conforme Moro, não há como o legislador restringir o juiz a um método de interpretação.
O magistrado paranaense chegou a sugerir a seguinte redação sobre o tema para a proposta: “não configura crime previsto nesta lei a divergência na interpretação da lei penal ou processual penal ou na avaliação de fatos e provas”.
No entanto, Requião afirmou que a redação sugerida por Moro é genérica e daria liberdade total para magistrados e procuradores cometerem excessos.
No relatório, Requião trata do tema da seguinte maneira: “Não constitui crime de abuso de autoridade o ato amparado em interpretação, precedente ou jurisprudência divergentes, bem assim o praticado de acordo com avaliação aceitável e razoável de fatos e circunstâncias determinantes, desde que, em qualquer caso, não contrarie a literalidade desta lei [sobre abuso de autoridade]”.
Para o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), um dos artigos do projeto -- o que prevê reclusão de 1 a 5 anos para autoridade que dar início ou fazer persecução penal, civil, ou administrativa com abuso - pode significar o "fim" de investigações do Ministério Público.
"A criminalização da persecução penal ofende a autonomia do Ministério Público. Se for aprovado esse projeto, como está, é o fim de investigações como a Lava Jato", declarou o parlamentar do Amapá.
Outros pontos do relatório
O texto também prevê punir as seguintes práticas:
Divulgar gravação sem relação com a prova que se pretendia produzir, “expondo a intimidade ou a vida privada, ou ferindo a honra e a intimidade” do acusado ou do investigado no processo. Punição: de 1 a 4 anos de detenção e pagamento de multa;
Realizar interceptações ou escutas sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei. Pena: reclusão de 2 a 4 anos e multa;
Punição para a autoridade que estende a investigação sem justificativa e em “prejuízo do investigado”. Detenção de 6 meses a 2 anos de multa.
Detenção de 1 a 4 anos e multa para quem decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia que extrapole exacerbadamente o valor estimado para a satisfação da dívida da parte.
Pena de 1 a 4 anos de detenção, além do pagamento de multa, para delegados estaduais e federais, promotores, juízes, desembargadores e ministros de tribunais superiores que ordenarem ou executarem "captura, prisão ou busca e apreensão de pessoa que não esteja em situação de flagrante delito ou sem ordem escrita de autoridade judiciária".
A proposta estabelece ainda pena de detenção de 1 a 4 anos para a autoridade policial que constranger o preso, com violência ou ameaças, para que ele produza provas contra si mesmo ou contra terceiros.
Invadir, entrar ou permanecer em casas de suspeitos sem a devida autorização judicial e fora das condições estabelecidas em lei (pena de detenção de 1 a 4 anos);
Obter provas, durante investigações, por meios ilícitos (pena de detenção de 1 a 4 anos);
Não fornecer cópias das investigações à defesa do investigado (pena de detenção 6 meses a 2 anos).
Audiências
Durante a reunião da CCJ desta quarta, vários senadores contrários à proposta solicitaram a realização de audiências públicas para que o texto fosse mais debatido antes da votação do relatório.
“A sociedade tem muitas dúvidas com relação a este projeto”, afirmou Ronaldo Caiado (DEM-GO), que tentou adiar a leitura do relatório de Requião.
Já Ricardo Ferraço (PSDB-ES) disse que “a pressa é inimiga da perfeição” na análise de propostas.
A CCJ aprovou a realização de audiências públicas, mas ainda não determinou quem serão os convidados e nem as datas em que os debates vão acontecer.