Clínica psiquiátrica responsabilizada por suicídio

Enfermo cometeu suicídio após ter sido autorizado a ir ao banheiro sozinho.

Fonte: Espaço Vital

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A internação de um paciente em clínica psiquiátrica de Caxias do Sul (RS) acabou em tragédia: o enfermo cometeu suicídio após ter sido autorizado a ir ao banheiro sozinho.

 

A triste história é contada em uma ação de reparação de danos morais movida contra a Clínica Professor Paulo Guedes pela mãe da vítima, que sofria de séria depressão associada a várias tentativas de suicídio. O enfermo chegou a ser internado contra a sua vontade, mediante ordem judicial e emprego de força policial, devido ao grande risco de atentado contra a própria vida.


No terceiro dia da internação, a vítima teria conseguido se suicidar ao ficar sem vigilância por parte do estabelecimento de saúde, o que o teria permitido utilizar uma tira de lençol para se enforcar no banheiro.


Em primeiro grau, o pedido foi julgado improcedente pela juíza Luciana Fedrizzi Rizzon - da 6ª Vara Cível da comarca de Caxias do Sul -, que entendeu que a clínica ré tomou todas as providências possíveis para evitar o suicídio. Inclusive, afirmou a juíza que "há indícios de que quaisquer tentativas de evitar o suicídio apenas retardaria o episódio, como se pôde concluir das declarações das testemunhas, inclusive amigos do falecido e da mãe dele, ora autora."


Entretanto, a 9ª Câmara Cível do TJRS deu provimento à apelação da autora, amparando-se, a partir do voto do relator, desembargadora Iris helena Medeiros Nogueira, em três suportes fundamentais:


1) A clínica foi negligente porque empregou uma abordagem terapêutica equivocada para o caso;


2) O histórico clínico de internações do paciente na mesma clínica psiquiátrica era vasto. A clínica conhecia o alto risco e o potencial suicida. Por isso, não poderia ter permitido ao paciente direito à privacidade integral, o que resultou no suicídio por enforcamento no banheiro.


3) No conflito de interesses entre direito à privacidade e direito à preservação da vida, o último prevalece.


A relatora qualificou o caso como sendo "uma daquelas situações limítrofes em Direito." A vítima tinha problermas mentais sérios e fazia uso de drogas pesadas, tendo sido levada compulsoriamente à internação. Por isso, o ocorrido é de difícil avaliação quanto à capacidade da clínica de efetivamente impedir o resultado danoso e se esta exigência é razoável.


"É preciso atentar para não se impor uma exigência inexeqüível, sob pena de se cometer uma injustiça", realçou a relatora.


De acordo com os autos, o falecido foi internado onze vezes na clínica ré, o que criara um quadro bastante conhecido pelo estabelecimento de saúde, que era sabedor do potencial suicida. "A resolução deste jovem em morrer era muito grande, mas isso era do conhecimento da clínica", anotou a desembargadora.


Segundo o voto condutor, a falha na prestação do serviço ocorreu pela adoção de uma terapia incorreta para o caso, pois a clínica não poderia ter preservado integralmente o direito de privacidade do paciente, nem permitido que ele fosse ao banheiro sozinho, sem qualquer supervisão. O direito à vida deveria se sobrepor ao direito à privacidade.


Para a magistrada, as provas mostram que o paciente - no mesmo dia - já mostrara indicativos de que seu quadro de saúde mental tinha se agravado, pois apresentava alucinações, já tentara se suicidar e estava agitado. "A constatação desses sinais impunha a clinica a mitigação do direito à privacidade. Impunha, também, o dever de fiscalizar rigorosamente as ações do paciente suicida."


Entendeu a julgadora que bastava uma vigilância superior sobre o paciente, inclusive sedá-lo e mantê-lo em local que evitasse o suicídio. O contrário resultou em negligência profissional.


O acórdão revela que o paciente se matou com uma “tirinha do lençol” escondida em suas vestes, a qual tratou de enrolar ao redor do pescoço e prender entre o marco e a porta do banheiro. O interno foi encontrado morto, em pé, amarrado pelo pescoço.


Interessante trecho do julgado informa que nos países em que é admitida a pena de morte por enforcamento, levada a cabo com métodos eficazes, o óbito leva no mínimo 15 minutos para ocorrer. Por isso, o paciente não possuía as condições ideais para se enforcar, sendo "pouco crível que sua morte tenha efetivamente ocorrido num intervalo tão curto de tempo – 03 a 05 minutos, como disseram as testemunhas".


A reparação pelo dano moral impingido à mãe e autora da ação foi arbitrada em R$ 15 mil, mais IGP-M e juros de 1% ao mês. "O valor módico de indenização", como mencionou a relatora, deveu-se à consideração de culpa leve da clínica, pois a prova dos autos demonstra que a morte "realmente era uma questão de tempo".


Além disso, o acórdão afirma que a ré não tem potencial econômico para pagar uma indenização superior, sem falar na função social que a clínica exerce na Serra gaúcha, de modo que uma condenação pesada poderia inviabilizar suas relevantes atividades.

 
A própria vítima não tinha grandes posses econômicas, o que se mostra uma barreira, "para que a indenização não signifique uma forma de enriquecimento sem causa", disse a desembaradora.


Proc. nº 70035400878

Palavras-chave: Paciente Suicídio Clínica Psiquiátrica Atentado Enfermidade

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