Aumentos dos números de órfãs durante a pandemia e de crianças que ficam com as mães depois do divórcio reabrem discussão sobre guarda parental

Elisa Costa Cruz, da defensoria pública do Estado do Rio de Janeiro, aborda as responsabilidades, os descumprimentos dos cuidados na guarda e como assistência moral e material são essenciais para o amparo e desenvolvimento da criança

Fonte: Elo Augusto

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Imagem de Gerd Altmann por Pixabay

A defensora pública do Estado do Rio de Janeiro, professora da FGV-Rio e doutora em direito civil pela UERJ, Elisa Costa Cruz, lança o livro ‘Guarda Parental: releitura a partir do cuidado’, pela editora Processo. O livro, resultado do doutorado apresentado à UERJ, divide-se em três capítulos que abordam pontos importantes sobre o reconhecimento da criança como pessoa e seu lugar nos processos judiciais que discutem a guarda de menores de idade. Neles, Elisa coloca em discussão quem é a criança para o Direito e como ela está representada nas normas jurídicas. 


“Guarda Parental: releitura a partir do cuidado” também aborda as responsabilidades envolvidas, os descumprimentos dos cuidados na guarda e como assistência moral e material são essenciais para o amparo e desenvolvimento da criança, embora nem sempre observados pelo sistema jurídico como um todo.


Números


Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 60% das guardas em divórcio são para as mulheres, 20% homens e 12% compartilhada.


Números na pandemia


Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o número de crianças e adolescentes que perderam os pais durante a pandemia da Covid-19, chega em torno de 45 mil.


A necessidade de um debate crítico


Outro ponto trazido pela defensora pública é a utilização do termo “guarda” pela Comunidade Jurídica nas ações que discutem o futuro das crianças e dos adolescentes. A autora defende que essa é a hora de começar um debate crítico sobre o uso do termo, já que o Direito costuma entender “guarda” como um contrato de depósito de um objeto, algo inanimado, de natureza geralmente material.


De acordo com a defensora pública a origem do termo remete ao que o Direito esperava dos pais, ou seja, “que os pais conservassem os filhos consigo, no que se aproxima da função do depósito. As distinções surgiam no objetivo a ser atingido, que, no direito de família, seria o processo educacional para tornar a criança um adulto”, escreve a defensora pública.


O problema, de acordo com a autora, é que essa aproximação conceitual leva a guarda de filhos a uma aproximação com posse e propriedade de coisas. “Isso significa que crianças, na exata medida em que ostentam a qualificação jurídica de filhos, serão tornadas objeto de direitos e não pessoas titulares de direitos.”, o que é contrário aos princípios da dignidade da pessoa humana e do melhor interesse da criança.


“A criança não pode converter-se ou aproximar-se da ideia de objeto; ela é pessoa e, como tal, titular de situações jurídicas que serão por ela mesma exercidas de acordo com o seu desenvolvimento, tal como determina a doutrina da proteção integral e o princípio do melhor interesse. Assim, o fundamento da guarda de filhos no direito de família é a dignidade da pessoa humana, o que importa em novas interpretações da guarda, dentre as quais se destaca a efetiva inclusão da criança no debate sobre os cuidados destinados a ela”, afirma.


A criança como pessoa


“Guarda Parental: releitura a partir do cuidado” ainda traz referências históricas relacionadas à criança, que só deixou de ser vista como um receptor passivo das ações a seu favor apenas em 1959. “Essa ascensão da criança como ator jurídico aconteceu com a aprovação, pela Organização das Nações Unidas, da Declaração Universal dos Direitos da Criança. E, somente 30 anos depois, aconteceria a consolidação da criança como pessoa com a aprovação da Convenção sobre Direitos da Criança pela Organização das Nações Unidas”, completa Elisa.  


O livro mostra, ainda, a posição do Estado diante da liberdade familiar, os novos arranjos parentais e a necessidade de buscar novos avanços desde a inclusão da guarda compartilhada no Direito Civil. A guarda compartilhada foi importante avanço na proteção da criança, mas a forma como foi colocada no Código Civil fez parecer que na guarda compartilhada há o direito a conviver com o filho e se responsabilizar por ele, o que não é verdadeiro.


O olhar à preferência materna na guarda, por uma suposta melhor capacidade de exercer os cuidados com os filhos, e as dificuldades desse entendimento diante de pais homossexuais são temas também discutidos


Resenha:


Desde a promulgação da Constituição da República de 1988 a guarda foi analisada de duas formas principais no Direito das Famílias: a primeira, com a releitura constitucional a partir da qual a guarda passou a ser entendida como responsabilidade parental exercida no interesse dos filhos; a segundo, a partir de 2008 e 2014 com a inclusão da guarda compartilhada no Código Civil. Esse livro pretende dar início a uma terceira e nova discussão, sobre o conteúdo e significado da guarda. Busca-se mostrar que a guarda sempre esteve associado à posse da criança ou adolescente, o que não se revela compatível com a doutrina da proteção integral e propor a ressignificação do instituto à luz do cuidado.

Palavras-chave: órfãs guarda parental divórcio crianças

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